Temer disse que Dilma caiu por não ter aplicado plano do PMDB? Linguista analisa
Atualizada às 15h46
Michel Temer disse ou não, em Nova York, que Dilma Rousseff caiu por não ter aplicado o plano "Uma Ponte para o Futuro", do PMDB? O Palácio do Planalto diz que não – que não houve a adoção do plano no governo da petista porque, nesse meio tempo, ocorreu o processo de impeachment. Mas, para o docente emérito da USP, professor titular convidado do Departamento de Linguística da Unicamp e especialista em gramática da língua falada Ataliba Castilho, a assessoria do governo não leva em conta a relação "causa-efeito" correta da frase de Temer.
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Segundo Castilho, a língua falada não tem, normalmente, "uma articulação precisa das ideias". A interpretação delas depende das "das circunstâncias em que as palavras foram proferidas, e isto abre caminho a mais de um entendimento, a mais de uma interpretação".
Mesmo assim, prossegue, na fala de Temer, admite-se sim uma relação de "causa e efeito", mas não na interpretação dada pelo Planalto.
A frase, dita pelo presidente, é a seguinte: "Quem estiver exercendo a Presidência da República deverá fazê-lo na sua plenitude. E por isso mesmo que, embora ainda no período da interinidade, o que nós fizemos foi exata e precisamente, levar a diante projetos julgávamos indispensáveis ao país. Indispensáveis, que como dito aqui, nós estamos na vida pública há algum tempo, há muitíssimos meses atrás, dez, doze meses, nós lançamos - até eu ainda vice-presidente -, lançamos um documento chamado Uma Ponte para o Futuro. Porque nós verificávamos que seria impossível o governo continuar naquele rumo e até sugerimos ao governo que adotasse as teses que nós apontávamos naquele documento chamado Ponte para o Futuro. Como isso não deu certo, não houve adoção, instaurou-se um processo que culminou agora com a minha efetivação como Presidência da República."
"É possível identificar três tópicos na fala presidencial", afirmou o linguista, por e-mail, a Opera Mundi. "Primeiro, um presidente da República deve exercer seu cargo na plenitude; segundo, mesmo na interinidade, Temer informa que tinha lançado o projeto 'Uma ponte para o futuro'" - e aqui há um descompasso no tempo, pois ele informa que era ainda vice-presidente, isto é, não presidente interino quando lançou esse projeto, fundamentado em sua longa experiência política. O terceiro tópico trata da instauração de um processo, supõe-se que seja o processo do impeachment - mas isso não foi dito, tendo caído no domínio dos implícitos. Ou seja, admite-se uma relação de causa-efeito entre o plano 'Uma ponte para o futuro' e a não adoção daquele plano, "que culminou no processo". A interpretação do Palácio do Planalto não tomou em conta a relação de causa-efeito contida no terceiro tópico da fala do Presidente", afirmou.
Beto Barata/PR
Presidente Michel Temer durante encontr com empresários e investidores na quarta-feira em Nova York
Questionamentos ao Planalto
Questionada sobre o que Temer quis efetivamente dizer neste trecho, a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto afirmou a Opera Mundi, em conversa telefônica, que a fala de Temer havia sido "clara" em relação ao "Uma Ponte para o Futuro". A assessoria de imprensa informou também à reportagem que não enviaria uma nota oficial sobre o tema, pois o discurso do presidente, de acordo com o Planalto, é "autoexplicativo".
De acordo com a assessoria, não houve a adoção do plano no governo Dilma Rousseff porque, nesse meio tempo, ocorreu o processo de impeachment, cuja consequência foi a destituição de Dilma e a posse de Temer como presidente. Ou seja, segundo o governo, não foi possível adotar o plano em função da troca de governo.
Opera Mundi perguntou à assessoria, então, se o plano estava em vigor "agora", mas foi informada de que isso se trata de "outra história" e que não havia condições de responder à pergunta.
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O plano "Uma Ponte para o Futuro"
O plano "Uma Ponte para o Futuro" afirma que tem como objetivo "preservar a economia brasileira e tornar viável o seu desenvolvimento, devolvendo ao Estado a capacidade de executar políticas sociais que combatam efetivamente a pobreza e criem oportunidades para todos".
Dentre os pontos presentes no documento, estão a necessidade de ajuste fiscal, de flexibilização do Orçamento e reforma da previdência.
"Nesta hora da verdade, em que o que está em jogo é nada menos que o futuro da nação, impõe-se a formação de uma maioria política, mesmo que transitória ou circunstancial, capaz, de num prazo curto, produzir todas estas decisões na sociedade e no Congresso Nacional", diz o texto.
Convite para 'participar' do crescimento brasileiro
Durante este encontro com empresários, promovido pelo Conselho das Américas – Nova York/EUA, Temer afirmou que o país passou por um período de "certa" instabilidade política.
Ele disse também estar "transmitindo" a realidade econômica do país, que segundo ele consiste em um grande déficit orçamentário e desemprego acentuado.
Dentre suas iniciativas à frente da Presidência, o mandatário destacou a Proposta de Emenda Constitucional que fixa um teto de gastos para a União, "que está sendo processada com muita rapidez lá no Congresso Nacional", além da reforma previdenciária.
Além de falar sobre as mudanças recentes no país, ele explicou aos investidores os motivos de sua viagem. "Estamos fazendo aqui, acompanhado de seis, sete ministros que nos acompanham, é falar da infraestrutura brasileira, que é exata e precisamente onde os senhores empresários poderão ter um interesse maior", explicou Temer, que acrescentou que o Brasil possui hoje "uma estabilidade política extraordinária".
Ele disse também ter ido aos Estados Unidos para "convidar" os empresários para participar "do crescimento do país". "Venho aqui aos Estados Unidos e em outras tantas atividades, (...) convidá-los a participar desta nova fase, digamos assim, de crescimento do país".
Leia na íntegra o discurso de Michel Temer no encontro com empresários na última quarta em Nova York.
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