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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

18.6.08

DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE MORALIDADE A MORALIDADE POR PRINCÍPIO

Jacques Távora Alfonsin
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A crise político-administrativa por que passa o nosso Estado, deflagrada por uma conversa telefônica mantida entre dois integrantes do primeiro escalão do governo, gravada e publicada por um deles, dá chance a que se examine o respeito devido pela administração pública ao princípio jurídico de moralidade, previsto no art. 37 da Constituição Federal. .
Se a moral privada, aquela que mal ultrapassa os limites da conduta individual própria de cada cidadã/o, se justifica pela necessidade incontestável de ela/e bem viver sua felicidade pessoal, respeitando esse mesmo valor nas/os outras/os, a pública tem o elenco todo das obrigações morais multiplicado ao mais alto grau, pois, num Estado que se pretenda democrático e de direito, é ela que tem a obrigação de garantir a possibilidade de convivência das demais, para tanto equipada até com a sanção de leis. .
O problema é que aí entram todas as nunca bem resolvidas questões derivadas das relações entre direito e moral, as quais não deixam de se refletir sobre as responsabilidades pessoais que os administradores públicos devem à sociedade, justamente pela sua condição de administradores e não de proprietários do Estado. Essa pessoa jurídica, como se sabe, somente se reconhece como existente, de maneira muito resumida, quando é dotada de povo, território e governo. Em termos de governo, por isso mesmo, o dever moral de prestar contas ao povo, somente pode ter avaliada a sua lisura, como é óbvio, através dos seus administradores. Moral, aí, é identificada como virtude. Analisada a conversa denunciada sob enfoque ético, então, convém seja ela examinada, de acordo com o que a mesma revela de moralidade ou imoralidade no relacionamento que a administração do Poder Público estadual mantém com aqueles três elementos. .
Tomado o primeiro e principal sujeito dessa composição, o povo que vive neste território e que elegeu democraticamente este governo, é de indiscutível clareza a infidelidade moral que a dita conversa revela, pois ela ofende sua soberania, quando admite desvio do poder e do dinheiro públicos para fins alheios aos do seu titular; ofende sua cidadania, quando esquece que a origem da investidura de qualquer condutor político da administração pública somente se legitima e justifica pelo voto; ofende sua dignidade e seus direitos humanos fundamentais, quando inverte os fins dos mandatos políticos, ignorando que “público” é sinônimo de comum, sem autorização social para ser tratado como privado, coisa sujeita ao interesse imediatista e oportunista das conveniências de ocasião. .
Se os desvios de recursos públicos, então, serviram para sustentar campanhas eleitorais, o povo foi legal e moralmente roubado por aqueles administradores, que faltaram com o seu dever legal e moral de vigilância sobre dinheiro alheio, pelos partidos que tiverem se locupletado com essa manobra ilícita, fazendo da disputa por poder um fim em si, e por quem quer que tenha viabilizado esse procedimento ilícito. .
A indignação ética que essa ilicitude provoca se acentua muito na medida em que a conversa faz passar como “normal”, “rotineiro” um tal crime, cuja imoralidade causa maior revolta quando se compara um tal desperdício com as prioridades que o Estado tem escolhido, em flagrante desinteresse pelas urgências que afligem o povo, o verdadeiro dono do dinheiro desviado. .
Isso aparece de maneira mais visível ainda, quando a atual administração pública do Estado, enfrenta o povo em suas relações com o seu território.
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Desde sua posse, ela não descansou enquanto não entregou a Fepam às facilidades exigidas pelas indústrias transnacionais do papel e da celulose, sob o argumento terrorista de que somente por aí seria possível desenvolver-se a metade sul do Rio Grande. É como se o povo que passa até fome por lá não tivesse sido assim vitimado, exatamente pela exploração latifundiária dos ricos que ali exploram as suas terras, fazendo-o credor de uma reforma agrária injustificável e permanentemente prorrogada. Entre o dever moral de promoção econômico-social dessa gente historicamente pobre e excluída por um desenvolvimento econômico e social saudável, ecologicamente sustentado, o governo do nosso Estado prefere o produtivismo (terra e seus frutos como meras mercadorias) à produtividade (preservação da terra e da natureza, função social da propriedade privada). Sendo um “bem de uso comum do povo”, como diz o art. 225 da Constituição Federal, o meio-ambiente apropriado à natureza e à gente do Rio Grande não pode ser irremediavelmente comprometido, por maior que as perspectivas econômicas de lucro das empresas estrangeiras queiram passar por progresso aquilo de que elas mesmas pretendam se apropriar. Não há ecologista sério que não esteja temendo pelo nosso futuro ambiental e alimentar com esse tipo de política predatória e entreguista, cuja imoralidade nem se dá ao trabalho de disfarçar o modo como burla a Constituição Federal, na nossa faixa de fronteira, criando empresas brasileiras laranjas que façam passar por legais as suas aquisições de terra nessa parte do nosso território. .
Em contexto de moral política, Norberto Bobbio indicou saída para esse povo assim vitimado. Analisando o pensamento de Gramsci, afirmou ele que o povo organizado em defesa da sua dignidade e dos seus direitos humanos fundamentais, é um sujeito ético-político capaz de construir a sua própria emancipação. Esse conselho tem sido seguido por multidões pobres e trabalhadoras, procurando defender-se por conta própria, sim, da injustiça social que padecem, por conta de um modelo de economia, de política, e de direito, moral e jurídicamente infiel ao próprio poder que foi delegado democraticamente à atual administração publica do Estado. .
Seus protestos, todavia, têm sido reprimidos com um abuso de autoridade tão arrogante e prepotente como o do poder econômico que pretende defender e garantir. A segurança pública do nosso Estado, pelas palavras diárias do recentemente indicado comandante da Brigada Militar, de pública não tem nada, pois já escolheu claramente de que lado está. Recuperou a concepção historicamente atrasada da palavra território, que era considerado o lugar onde podia se espalhar o terror. Pré julga todo aquele povo como delinqüente, fazendo cair sobre ele, do modo mais humilhante, estúpido e violento, o peso desproporcional das suas armas, sempre sob a excusa de que precisa manter a ordem, e está agindo dentro da lei. Não hesita em fazer juízo de valor sobre as/os pobres trabalhadoras/es, como se quem abusa da autoridade tivesse autoridade moral para isso. .
Ignoram, tanto ele como o governo ao qual obedece, que a imoralidade desses gestos está solenemente condenada pela mesma lei que eles apregoam cumprir. A Constituição Federal, sem falar em vários dos seus dispositivos que sustentam a juridicidade dessas manifestações populares de protesto, previu soberania, cidadania e dignidade humana como fundamentos da própria República, em seu primeiro artigo. No 3º, entre seus objetivos “fundamentais” estão a erradicação da pobreza e da marginalização, além da promoção do bem de todos. O Código Penal, por sua vez, em seu art. 350, capitula como abuso de poder o do funcionário que “submete pessoa que está sob sua guarda ou custódia a vexame ou constrangimento não autorizado em lei.” Pelo visto, para essa autoridade, erradicação da pobreza se faz batendo nas/os pobres. .
O que mais ignoram a mesma autoridade e o seu (!) governo, porém, é que a dignidade humana das suas vítimas é um princípio constitucional supra positivo o que significa tanto a lei como o Estado existirem em função dela e não ela em função da lei. A “moralidade” do atual governo do Estado, portanto, pelo menos no que se refere aos seus deveres de depositário dos bens e dos dinheiros públicos, bem como da segurança devida ao povo, não tem a moralidade por princípio. Àquela a quem ele obedece não é a do art. 37 da Constituição Federal. .
Na época de Jesus Cristo, quem se apregoava guardião da moralidade pública eram os fariseus e o “mestres da lei”, partidários ferrenhos de uma obediência cega às leis, desde que seus privilégios jamais fossem ameaçados pela aplicação delas. Não é de hoje, portanto, que uma ferrenha defesa das leis pode ocultar muita injustiça. Num Estado como o nosso que se proclama cristão, não só por muitos dos seus políticos, mas por grande parte da mídia que, se não apóia, pelo menos silencia sobre as políticas públicas acima denunciadas, talvez conviesse questionar-se em que medida toda a criminalização da pobreza, todo o escândalo que causa a sua luta por emancipação, não cabem na grave censura que esse tipo de comportamento recebeu daquele pobre nazareno, justamente pelo muito que a hipocrisia farisaica esconde da sua torpe e opressora imoralidade: “... amarram fardos pesados e os põem nas costas dos outros, mas eles mesmos não os ajudam, nem ao menos com um dedo, a carregar esses fardos.” (Mt. 23, 4).
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MST denuncia "volta da ditadura" no Rio Grande do Sul

VIOLÊNCIA & AUTORITARISMO

Coordenação do movimento diz que há um nefasto projeto em curso no RS, envolvendo a proteção dos interesses de empresas estrangeiras, que são também grandes financiadores da campanha de Yeda Crusius, a supressão de direitos civis e a repressão policial. Movimentos sociais, sindicatos e partidos de oposição pretendem levar 5 mil pessoas para a frente do Palácio Piratini nesta quinta-feira.

Marco Aurélio Weissheimer

PORTO ALEGRE - A coordenação estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) no Rio Grande do Sul divulgou nota oficial desta quarta-feira denunciando as recentes ações da Brigada Militar e os argumentos utilizados pelo Ministério Público gaúcho para a execução do despejo de dois acampamentos no interior do Estado. Segundo a nota, “os métodos e argumentos do Ministério Público e da Brigada Militar ressuscitam a ditadura militar no RS”.“Há um nefasto projeto político em curso no Rio Grande do Sul, envolvendo a proteção dos interesses de empresas estrangeiras, que são também grandes financiadoras de campanha, a supressão de direitos civis e a repressão policial”, denuncia o MST.
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A íntegra da nota:
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"No dia de ontem (17/06), centenas de famílias de trabalhadores sem-terra foram despejadas de dois acampamentos pela Brigada Militar do Rio Grande do Sul no município de Coqueiros do Sul. As duas áreas pertencem a pequenos proprietários e estavam cedidas para a instalação das famílias. Os barracos e plantações foram destruídos, além das criações de animais, que foram espalhados, para que as famílias não pudessem levá-los. Cumprindo ordens do Poder Judiciário, as famílias foram jogadas à beira da estrada em Sarandi no final da tarde. É preciso lembrar que este acampamento à beira da estrada para onde foram levadas, é o mesmo local de onde foram despejadas há um ano. Até quando estes trabalhadores vão permanecer lá? Quanto tempo levará até o próximo despejo?
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O despejo de ontem não se trata apenas de mais um ato de violência e intransigência da Governadora Yeda Crusius e da Brigada Militar. Há um nefasto projeto político em curso no Rio Grande do Sul, envolvendo a proteção dos interesses de empresas estrangeiras, que são também grandes financiadoras de campanha, a supressão de direitos civis e a repressão policial. A ação faz parte de uma estratégia elaborada pelo Ministério Público Estadual para impedir que qualquer movimento social possa se organizar ou manifestar-se. Juntos, o Ministério Público Estadual e a Brigada Militar ressuscitam os métodos e práticas da ditadura militar, ameaçando qualquer direito de reunião, de organização ou de manifestação.
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Na ação civil que determinou o despejo ontem, os promotores deixam claro sua inspiração pelo golpe militar de 1964, ao lembrarem que o golpe que restringiu as liberdades civis no Brasil, “ pacificou o campo”. O despejo de uma área cedida, a ameaça de multa a seus proprietários se voltarem a apoiar o MST e as promessas de que novos despejos ocorrerão nos acampamentos em São Gabriel (num pré-assentamento), em Nova Santa Rita e em Pedro Osório (ambos em áreas de assentamentos) são decisões autoritárias que ameaçam não apenas o Movimento Sem Terra, mas estabelecem uma política de repressão para todo e qualquer movimento social.
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Ao mesmo tempo em que os movimentos sociais são perseguidos e criminalizados, não se vê nada para recuperar os R$ 44 milhões roubados dos cofres públicos para o financiamento eleitoral no esquema do DETRAN. Da mesma forma, quando grandes empresas estrangeiras criam empresas-laranja e adquirem terras ilegalmente no Rio Grande do Sul, que somente agora foram indeferidas pelo executivo, não se vê nenhuma ação do Ministério Público, judiciário ou do executivo estadual. No ano passado, após a Marcha à Fazenda Guerra, o Ministério Público propôs um termo de ajuste onde o Poder executivo federal assumia o compromisso em assentar mil famílias até o mês de abril deste ano. Nos causa estranheza que não haja mais cobranças do Ministério Público para o cumprimento do acordo, que este mesmo poder propôs. E ainda, que agora decrete o despejo das famílias, que poderiam estar assentadas e produzindo alimentos, caso o mesmo acordo tivesse sido respeitado. Há interesses que ainda se encontram ocultos nas ações desta semana e nas medidas que o MPE anuncia. O certo é que a volta dos regimes autoritários e repressivos, a serviço de interesses obscuros, ameaça a todo o povo gaúcho".
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Deputados criticam Brigada Militar e MP estadual
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Na Assembléia Legislativa, o líder da bancada do PT, Raul Pont, condenou a operação da Brigada Militar em dois acampamentos do MST e expressou preocupação com as sucessivas investidas da BM e do Ministério Público Estadual contra os movimentos sociais. “Este procedimento objetiva criminalizar os movimentos sociais”, denunciou.
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Pont também chamou a atenção para a manchete do jornal Zero Hora nesta quarta-feira, “MST sofre contra-ataque ao amanhecer”. “Qual foi o ataque? Qual foi a invasão feita ontem?” – questionou. A Brigada, acrescentou o deputado, não combate a violência nas cidades e tampouco faz policiamento preventivo, mas com a maior facilidade reúne 500 policiais para um contra-ataque a um ataque que não aconteceu num acampamento majoritariamente composto por crianças e mulheres. “Essa é a atual política do Estado”, resumiu Pont.
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Na mesma linha, o deputado Dionilso Marcon disse que o governo do Estado e o Ministério Público têm raiva de pobre. “Vou pedir à Comissão de Direitos Humanos do Senado para interferir junto ao MP a fim de que este órgão deixe de perseguir os pobres”, anunciou o deputado que criticou ainda o MP por ter pouca disposição para apurar denúncias de corrupção no Detran e em outros órgãos públicos.
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Protestos e greve contra governo Yeda
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Policiais civis, servidores do Instituto Geral de Perícias (IGP) e da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) realizaram, nesta quarta-feira, um protesto contra a corrupção no governo Yeda e em defesa de direitos das categorias. A manifestação ocorreu em frente ao Palácio Piratini. Os policiais lavaram as calçadas do palácio para denunciar a corrupção no Estado. Os agentes da segurança pública reivindicam concurso público, reajuste salarial, contra o corte de 50% das horas-extras e pelo fim do constrangimento às regras diferenciadas de aposentadoria.
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Nesta quinta-feira, será realizado um novo ato contra o governo tucano. A mobilização convocada por movimentos sociais, sindicatos e partidos políticos inicia às 11 horas, em frente ao Palácio Piratini. Os organizadores esperam reunir cerca de 5 mil pessoas na Praça da Matriz.
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O Sindiágua está mobilizando os funcionários da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) para uma paralisação de 24 horas, também nesta quinta-feira, pelo fim da corrupção, contra as péssimas condições de trabalho na empresa e para denunciar o desmonte da companhia patrocinado pelo governo Yeda Crusius.

Ação do MP gaúcho contra MST repete discurso anti-comunista pré-1964

DE VOLTA À GUERRA FRIA
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17/06/2008
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Dois promotores do MP-RS acusam MST de "práticas criminosas" e de "ameaçar a segurança nacional", citando um "notável trabalho de inteligência". Baseado em matérias da imprensa e em relatos do serviço secreto da PM gaúcha, o trabalho fala, em tom de denúncia, da presença de livros de Florestan Fernandes e Paulo Freire, entre outros autores, nos acampamentos do MST e acusa "fraseologia agressiva inspirada no bloco soviético".
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Marco Aurélio Weissheimer
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PORTO ALEGRE - A inicial da ação civil pública apresentada pelos promotores Luís Felipe de Aguiar Tesheiner e Benhur Biancon Junior, do Ministério Público do Rio Grande do Sul, pedindo a desocupação de dois acampamentos do MST, próximos à fazenda Coqueiros (região norte do Estado), parece uma peça saída dos tempos da ditadura, reproduzindo a paranóia delirante anti-comunista dos anos 50 e 60 que alimentou e deu sustentação ao golpe militar no Brasil. A Vara Cível de Carazinho deferiu a liminar requerida pelo MP. Na avaliação dos promotores, os acampamentos Jandir e Serraria são “verdadeiras bases operacionais destinadas à prática de crimes e ilícitos civis causadores de enormes prejuízos não apenas aos proprietários da Fazenda Coqueiros, mas a toda sociedade”. Essa terminologia resume uma lógica de argumentação que muitos julgavam estar extinta no Brasil.
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Na primeira página da inicial da ação, os promotores comunicam que seu trabalho é resultado de uma decisão do Conselho Superior do Ministério Público do RS para investigar as ações do MST que “há muito tempo preocupam e chamam a atenção da sociedade gaúcha”. O documento anuncia que os promotores Luciano de Faria Brasil e Fábio Roque Sbardelotto realizaram um “notável trabalho de inteligência” sobre o tema. Uma nota de rodapé define o trabalho de “inteligência” realizado nos seguintes termos:
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O art. 1º, § 2º, da Lei nº 9.883/99, que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteligência e criou a ABIN, definiu a inteligência como sendo “a atividade que objetiva a obtenção, análise e disseminação de conhecimentos dentro e fora do território nacional sobre fatos e situações de imediata ou potencial influência sobre o processo decisório e a ação governamental e sobre a salvaguarda e a segurança da sociedade e do Estado”.
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O relatório que segue faz jus a esse conceito, apresentando o MST como uma ameaça à sociedade e à própria segurança nacional. O resultado do trabalho de inteligência inspirado nos métodos da ABIN é composto, na sua maioria, por inúmeras matérias de jornais, relatórios do serviço secreto da Brigada Militar e materiais, incluindo livros e cartilhas, apreendidas em acampamentos do MST. Textos de autores como Florestan Fernandes, Paulo Freire, Chico Mendes, José Marti e Che Guevara são apresentados como exemplos da “estratégia confrontacional” adotada pelo MST. Na mesma categoria, são incluídas expressões como “construção de uma nova sociedade”, “poder popular” e “sufocando com força nossos opressores”. Também é “denunciada” a presença de um livro do pedagogo soviético Anton Makarenko no material encontrado nos acampamentos.
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As subversivas Ligas Camponesas e o “movimento político-militar de 1964”
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Na introdução da ação, os promotores fazem um “breve histórico do MST e dos movimentos sociais”. Esse histórico se refere à organização do Movimento dos Agricultores Sem-Terra (Master) no Rio Grande do Sul, nos anos 1960, e à “atmosfera de crescente radicalização ideológica”. As Ligas Camponesas de Francisco Julião, em Pernambuco, são acusadas de “sublevar o campo e incentivar a violência contra os proprietários de terra, criando um clima de guerra civil”. Essa “agressividade”, na avaliação dos promotores, contribuiu para o “movimento político-militar de 1964”. O “movimento político-militar de 1964” a que os promotores se referem é o golpe militar que derrubou o governo constitucional de João Goulart, suprimiu as liberdades no país e deu início à ditadura militar.
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Logo em seguida, a ação apresenta uma caracterização do MST, toda ela baseada na visão de uma única pessoa, o sociólogo Zander Navarro. O trabalho de inteligência dos promotores também se baseia, em várias passagens, em uma “revista de circulação nacional” (Veja) e em matéria críticas ao MST publicadas em jornais como Folha de São Paulo, Zero Hora e Estado de São Paulo, entre outros. Após apresentar um “mapa” dos movimentos sociais no campo brasileiro, os promotores questionam, em tom de denúncia, as fontes de financiamento público desses movimentos. Eles revelam que “o Ministério Público encaminhou um questionamento ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, acerca da existência ou não de alguma fonte de financiamento ou ajuda, direta ou indireta, aos participantes do MST acampados no Rio Grande do Sul”.
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Os promotores citam ainda o relatório da CPMI da Terra, realizada no Congresso Nacional, sustentando que há malversação de verbas públicas, “pelo repasse de dinheiro público efetuado diretamente pelo Incra, na forma de distribuição de lonas, cestas básicas e outros auxílios”. Além disso, citam a “doação de recursos por entidades estrangeiras, notadamente organizações não-governamentais ligadas a instituições religiosas, como a organização Caritas, mantida pela Igreja Católica”. E identificam, em tom crítico, a rede de apoio internacional ao MST que mostraria ao público estrangeiro “uma visão do Brasil frontalmente crítica à atuação do Poder Público e inteiramente de acordo com os objetivos estratégicos do MST”. Citando o jornal Zero Hora, os promotores apontam que a Escola Florestan Fernandes (do MST) foi construída “com vendas do livro Terra, com texto do escritor português José Saramago, fotografias de Sebastião Salgado e um disco de Chico Buarque, além de contribuições do exterior”.
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Mídia, PM 2 e Denis Rosenfield: as fontes da argumentação dos promotores
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Ao falar sobre a estratégia do MST, os promotores valem-se de relatórios do serviço secreto da Brigada Militar (a PM2). O relatório do coronel Waldir João Reis Cerutti, de 2 de junho de 2006, afirma que os acampamentos do movimento são mantidos com verbas públicas do governo federal, recursos de fontes internacionais e até das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). O coronel Cerutti não apresenta qualquer comprovação da existência do “dinheiro das FARC” e segue falando da suposta influência da guerrilha colombiana sobre os sem-terra. Segundo ele, o MST estaria planejando instalar um “território liberado” dentro do Estado: “Análises de nosso sistema de inteligência permitem supor que o MST esteja em plena fase executiva de um arrojado plano estratégico, formulado a partir de tal “convênio”, que inclui o domínio de um território em que o governo manda nada ou quase nada e o MST e Via Campesina, tudo ou quase tudo”.
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Em seguida é apresentado um novo relatório do Estado Maior da Brigada Militar sobre as ações do MST no Estado. Esse documento pretende analisar a “doutrina e o pensamento” do MST, identificando, entre outras coisas, as leituras feitas pelos sem-terra. Identifica um “panteão” de ícones inspiradores do movimento, “a maior parte ligada a movimentos revolucionários ou de contestação aberta à ordem vigente” (onde Florestan Fernandes e Paulo Freire estão incluídos, entre outros). E fala de “uma fraseologia agressiva, abertamente inspirada nos slogans dos países do antigo bloco soviético (“pátria livre, operária, camponesa”)”. A partir dessas informações, os promotores passam a discorrer sobre o caráter “leninista” do MST, invocando como base argumentativa o livro “A democracia ameaçada – o MST, o teológico-político e a liberdade”, de Denis Rosenfield, que “denuncia” que o objetivo do movimento é o socialismo.
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Para os promotores, “já existem regiões do Brasil dominadas por grupos rebeldes” (p. 117 da ação). A prova? “A imprensa recentemente noticiou....” (uma referência as ações da Liga dos Camponeses Pobres, no norte do Brasil). Em razão da “gravidade do quadro em exame”, concluem os promotores, “impõe-se uma drástica mudança na forma de trato das questões relativas ao MST e movimentos afins”. A conclusão faz jus às fontes utilizadas no “notável trabalho de inteligência”: “o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra não constitui um movimento social, mas, isso sim, um movimento político”. O MST, prosseguem os promotores, “são uma organização revolucionária, que faz da prática criminosa um meio para desestabilizar a ordem vigente e revogar o regime democrático adotado pela Constituição Federal”. Em nenhum momento da ação, o “notável trabalho de inteligência” dos promotores trata de problemas sociais no campo gaúcho.
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NOTA SOBRE VIOLÊNCIA CONTRA OS MOVIMENTOS SOCIAIS NO RIO GRANDE DO SUL

A sociedade gaúcha foi surpreendida pela ação da Brigada Militar, comandada pelo Coronel Paulo Mendes, contra integrantes de movimentos sociais, estudantes, sem terra. desempregados, sindicalistas, crianças e mulheres que caminhavam em direção ao Palácio Piratini para protestar pacificamente contra o aumento do preço dos alimentos e pela corrupção no governo de RS . O resultado da ação da polícia militar foram dezessete feridos, e doze pessoas foram presas.

O ocorrido faz lembrar os anos trágicos em que a democracia sucumbiu à ditadura em nosso país.

Repudiamos o emprego da violência e apelamos para que ações como estas não se tornem rotineiras no agir da Brigada Militar.

O direito a ir e vir e a livre manifestação estão consagrados na Constituição Federal de 1998 e na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

É de extrema importância evitar que o relacionamento da sociedade com as forças da ordem seja marcado pelo medo (como é próprio nos regimes ditatoriais), mas sim pelo respeito.

Caxias do Sul, 12 de junho de 2008.


CENTRO DE ESTUDOS, PESQUISA E DIREITOS HUMANOS
CEPDH –
cepdh@correios.net.br – Caxias do Sul
Filiado ao MOVIMENTO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS

12.6.08

Yeda Crusius manda Brigada Militar reprimir protestos contra governo

11/06/2008 Copyleft
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CRISE POLÍTICA NO RS
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Primeira grande manifestação de rua denunciando corrupção no governo Yeda Crusius (PSDB) foi duramente reprimida pela Brigada Militar. Policiais impediram que manifestantes se dirigissem para a frente do Palácio Piratini. O novo comandante da polícia militar gaúcha, coronel Paulo Mendes, classificou a manifestação como "baderna provocada por gente desocupada".
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Marco Aurélio Weissheimer
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PORTO ALEGRE - A governadora Yeda Crusius (PSDB) determinou ao novo comandante geral da Brigada Militar, coronel Paulo Mendes, que reprimisse duramente manifestações contra o governo estadual. E o coronel começou a colocar a orientação em prática na manhã desta quarta-feira. Pelo menos dezessete pessoas ficaram feridas e outras 17 foram detidas na ação da tropa de choque da Brigada Militar contra manifestantes que se dirigiam ao Palácio Piratini para protestar contra a corrupção no governo Yeda.
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Os policiais, comandados pelo coronal Paulo Mendes, lançaram bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha contra o grupo e atingiram, inclusive, os deputados Raul Carrion (PCdoB) e Dionilso Marcon (PT), que acompanhavam a marcha e tentavam negociar e liberação pacífica da manifestação. No final da manhã, a Brigada cercou os manifestantes dentro do Parque da Harmonia, na área cenrtral de Porto Alegre, e proibiu que eles prosseguissem para protestar no Piratini
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A marcha de protesto foi organizada pela Via Campesina, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) e Movimento Nacional da Luta pela Moradia. Cerca de 400 policiais da tropa de choque da Brigada Militar foram mobilizados para reprimir os cerca de três mil manifestantes.
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A ação violenta da Brigada Militar começou pela manhã quando integrantes dessas entidades, estudantes e sindicalistas iniciaram uma caminhada em direção ao Palácio Piratini. No trajeto, os manifestantes pretendiam fazer um protesto pacífico contra a alta dos alimentos no supermercado Nacional, do grupo Wal-Mart. A manifestação foi duramente reprimida com balas de borracha, bombas e gases lacrimogênio e pimenta. Mais tarde, quando tentaram reiniciar a marcha, os manifestantes foram novamente impedidos de caminhar, empurrados para o Parque Harmonia e agredidos pela Brigada Militar. Um oficial da BM disse aos manifestantes que eles não iriam para a frente do Palácio Piratini de jeito nenhum. Os principais ferimentos foram provocados por balas de borracha. Um agricultor teve o braço quebrado por um brigadiano.
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"Baderna provocada por gente desocupada"
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O comandante-geral da Brigada Militar, coronel Paulo Mendes, classificou o incidente como uma "baderna provocada por gente desocupada". “A BM vai tomar uma atitude muito firme”, anunciou. Ligado ao PSDB, especialmente ao prefeito de Canoas, Marcos Ronchetti (PSDB), faz parte da “linha-dura” da Brigada. Sua nomeação para o comando da institutição foi uma declaração de guerra da governadora Yeda Crusius contra os movimentos sociais e o movimento sindical gaúcho.
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Admiradora do “estilo” de Mendes, a governadora quer que ele imprima sua marca na Brigada. Como subcomandante da Brigada Militar, o coronel Mendes notabilizou-se por comandar a repressão a protestos de professores e agricultores sem-terra no Estado. Nos últimos meses, quando houve alguma manifestação de protesto ou ação de movimentos sociais, a governadora acionou o coronel Mendes para a repressão imediata.
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"Tem que ir pro paredão"
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Nos últimos meses, o coronel comandou ações de repressão violentas da Brigada em uma manifestação de professores no Centro Administrativo do Estado, na ocupação da fazenda da Stora Enso, em Rosário do Sul, na destruição de um acampamento de sem-terra em São Gabriel, entre outras ações. Defensor da pena de morte, o coronel Mendes é autor da frase: “Não tem jeito, tem que ir pro paredão”.
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Em 2007, Mendes defendeu que a população deveria reagir a assaltos, contrariando a orientação da polícia para situações deste tipo. No mesmo ano, durante um debate televisivo, abordou-se o caso de um pedreiro morto pela polícia em Gravataí. Segundo a família, ele foi confundido com um assaltante e acabou morrendo em razão de surra que levou após ser preso. O comentário do coronel: “Às vezes, se preocupam com uma eventual pessoa que a polícia tenha matado”.
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A nomeação de Mendes para o comando da Brigada e o apoio irrestrito que a governadora dá às suas ações aprofunda o clima de tensão política no Estado. O secretário estadual de Segurança, José Francisco Malmann, teria recomendado a Yeda Crusius que não nomeasse o coronel Mendes. Se recomendou, não foi ouvido. O coronel comandou pessoalmente a repressão aos manifestantes.
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Várias manifestações de protesto contra a corrupção no governo Yeda Crusius estão marcadas para os próximos dias. A julgar pelo que se viu nesta quarta-feira, a Brigada Militar não parece muito preocupada em respeitar os direitos constitucionais de ir-e-vir e de livre manifestação. Sindicatos e movimentos sociais preparam um grande protesto para o próximo dia 19, em frente ao Palácio Piratini. O Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS/Sindicato) divulgou nota oficial exigindo a saída da governadora e o aprofundamento das investigações sobre o esquema de fraude no Detran e em outros órgãos públicos do Estado.
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RS vive estado de sítio, denuncia CUT
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A direção estadual da Central Única dos Trabalhadores divulgou nota na tarde desta quarta-feira para condenar a atitude do governo Yeda Crusius, sob o comando do coronel Paulo Mendes, de repressão violenta à manifestação dos movimentos sociais. A entidade protesta contra o Estado "anti-democrático que se instalou no Palácio Piratini", afirma que o coronel Mandes exibe os 17 feridos na operação como troféus e adverte que a mobilização em defesa da liberdade e a luta contra a corrupção será ampliada. A nota denuncia que o Rio Grande do Sul está vivendo um estado de sítio:
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"Em mais uma atitude repressiva do governo do Estado, os movimentos sociais são impedidos de manifestar a sua opinião. Em uma caminhada pacífica dos trabalhadores e trabalhadoras, a Brigada Militar, sob comando do Cel. Mendes, agiu de forma truculenta, autoritária e arbitrária.
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Para o Cel. Mendes, as 17 pessoas feridas - algumas com graves ferimentos -, e presas são um troféu. A CUT e os movimentos sociais expressam uma profunda indignação com este Estado de repressão e anti-democrático que se instalou no Palácio Piratini. Talvez não tenhamos visto cenas como as promovidas hoje pelo Cel. Mendes nem na ditadura, que todos nós tanto lutamos para derrubar.
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Nós, da Central Única dos Trabalhadores e dos movimentos sociais deste Estado, defensores que somos de um Estado democrático e da liberdade dos cidadãos, não ficaremos somente na denúncia pública, mas ampliaremos a mobilização na defesa da democracia e da liberdade e, mais do que isso, lutaremos contra este governo corrupto que se instalou no RS”.

Governo do RS aciona polícia para reprimir ato pacífico










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11/06/2008

O Movimento de Trabalhadores Desempregados, sindicatos, estudantes e movimentos sociais do campo organizados pela Via Campesina foram impedidos de marchar até o Palácio Piratini em protesto contra a corrupção no Governo do Rio Grande do Sul.

Cerca de dez pessoas, inclusive uma mulher e sua filha pequena, foram feridas. Os policiais, comandandos pelo coronel Paulo Mendes, lançaram bombas de gás lacrimogênio e dispararam tiros com balas de borracha contra o grupo e atingiram, inclusive, os deputados Raul Carrion e Dionilso Marcom, que acompanhavam a marcha e tentavam negociar a liberação da manifestação.Neste momento, a Brigada Militar cerca os manifestantes dentro do Parque da Harmonia. Há poucos instantes, a segunda leva de pessoas feridas foi conduzida ao Hospital de Pronto Socorro e algumas delas estão sendo atendidas no departamento médico do Tribunal Regional Federal.

Este foi o segundo conflito entre movimentos sociais e a Brigada Militar hoje. No início da manhã, os movimentos sociais ocuparam o supermercado Nacional, do grupo Wal-Mart, em protesto contra a falta de política para a produção dos alimentos e o controle do comércio agrícola por empresas multinacionais.

Doze pessoas foram presas após o conflito com a Brigada Militar.

Também não há o número exato de trabalhadores feridos, mas pelo menos um agricultor encontra-se no hospitalizado.

Ontem, a Brigada Militar feriu sete agricultores em frente à Bunge, na região norte. A Brigada Militar também impediu alimentos fossem doados à população. As manifestações prosseguem na região sul, onde duas áreas da Votorantim Celulose e Papel estão ocupadas pela Via Campesina em Herval e Piratini.

Da propriedade privada à pública

O direito à propriedade existiu muito antes do capitalismo, mas só neste ele assumiu a centralidade que tem, a ponto dos liberais clássicos incluírem-no entre os direitos naturais do homem, da mesma forma que os de vida, de privacidade, de circulação, de manifestação da opinião. Mas foi sempre um direito com contrapesos. Só no capitalismo tornou-se uma variável independente, praticamente critério para definir se se vive em uma sociedade livre. Liberdade e direito de propriedade tendem a identificar-se.
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Mesmo em Locke, o pai do liberalismo, esse direito tinha limitações: a propriedade da terra – o grande direito de propriedade na época – só tinha legitimidade na extensão que conseguissem trabalhá-la o proprietário e sua família. Locke pensava assim numa sociedade da pequena produção mercantil, em que todos poderiam ter acesso à terra.
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Quebrar um dos grandes dogmas do pensamento único é demonstrar como a propriedade privada é anti-social, freia a expansão econômica, se choca com a democracia e com a ética. O tema dos medicamentos genéricos trouxe à superfície uma questão essencial: a saúde das pessoas, a saúde pública, o direito à vida, a luta contra as doenças, por uma longa e boa qualidade de vida não pode depender da apropriação privada, por imensos monopólios internacionais, das fórmulas dos remédios fundamentais. Estes foram pegos no contrapé, aparecem como defensores dos seus lucros como empresas, em contraposição às necessidades da grande maioria da humanidade, que não têm recursos para pagar os preços que eles cobram, mas podem ter acesso aos genéricos.
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Por isso essas mega-empresas tentam burlar de todas as maneiras as políticas de genéricos, que tem que ser defendida e estendida a uma quantidade crescente de remédios. Raciocínios similares podem ser feitos ao direito à propriedade da terra, do acesso às músicas, entre tantos outros.
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Porém, a questão do direito à propriedade, da chamada propriedade intelectual é muito mais abrangente e tem uma dimensão política estratégica para a construção de mundo posneoliberal, de um mundo democrático. (Veja-se a esse respeito, “Propriedade intelectual – Para uma outra ordem jurídica possível”, de Carol Proner, Editora Cortes, a melhor introdução ao tema, assim como “Comunicação digital e a construção dos commons”, de vários autores, da Perseu Abramo, para um maior desenvolvimento da questão.).
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A categoria "propriedade intelectual" abarca temas muito diversos, como direitos de autor, patentes de invenção, contatos de transferência de tecnologia, saberes tradicionais (como folclore), plantas medicinais, entre outros. A defesa do “direito de autor” – de músicas, que é o caso mais em debate – parece fazer justiça a quem produz algo – seja obra de arte, nova tecnologia, etc. Mas hoje esse tema remete menos para o criador, do que para as empresas que se apropriam dos produtos e os comercializam. É o problema da democratização do acesso a patrimônios públicos. Para o que se faz necessário redefinir o conceito mesmo de propriedade.
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Os chamados commons pretendem essa redefinição, procurando afirmar-se como espaços livres das restrições impostas pelo mercado, entendidas estas como filtros pelo poder de compra, pelos monopólios de tecnologia, pela apropriação privada do que é público por natureza. Os fantasmas da direita apontavam sempre a propriedade individual como esfera de defesa contra a apropriação pelo Estado de bens privados.
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A construção da democracia, ao contrário, requer a superação da absolutização do direito de propriedade e a construção do direito à propriedade comum, à propriedade pública, a única que compatibiliza os direitos individuais com os direitos coletivos.
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Postado por Emir Sader - 09/06/2008 às 09:58

Entre recomeços e crises

*Adão Villaverde
A queda de secretário do governo flagrado tomando “chopinho” com lobista-réu; as gravações telefônicas reveladas pela Polícia Federal evidenciando formação de quadrilha; a veiculação de carta-denúncia enderaçada à governadora detalhando desvios de recursos do Detran e a conversa gravada entre o vice-governador e o ex-Chefe da Casa Civil, em que este admite que dois grandes partidos gaúchos se financiam de esquemas em órgãos públicos, fizeram explodir o epicentro político do governo Yeda, deixando o Rio Grande perplexo e escandalizado. Aliás, núcleo de governo que renovou-se após derrota do pacote de impostos e que assumiria o papel de ser o centro pensante e de estratégia do “novo jeito de governar”.
Estamos diante de um momento singular na história política do RS, a ponto de a própria governadora assumir que seu governo se encontra frente a uma crise ética. Pois sequer completou ano e meio e já realizou sucessivos redesenhos e recomeços.
O primeiro, no início do governo, redesenhava a administração pública, em um contexto que o Detran foi retirado da Segurança Pública e passado à Administração. Este modelo fez àgua já ao fim do primeiro ano, resultado da lógica conflitiva de governar, que viu-se esfacelar do ponto de vista da base legislativa, em total confronto com o Judiciário e quase rompido com os setores empresariais. Descortinou-se aí, uma crise política no RS.
O segundo recomeço foi baseado na recomposição do núcleo de articulação e gestão, tendo como principais artífices os hoje ex-secretários, da Casa Civil e da Secretaria Geral de Governo. Não passaram quatro meses e estoura a crise ética, assim definida pela governadora, e cujas causas não se devem a divergências de projetos, nem tampouco a uma intencionalidade da oposição, mas sim aos desacertos e interesses de caráter interno ao governo.
E agora, mais um recomeço, com a criação do “Gabinete de Transição”, talvez mais adequado “Gabinete de Crise”. Como forma de reação frente ao que se pode caracterizar de crise institucional que assola o Estado gaúcho. Enquanto as entidades, as instituições, as cidadãs e os cidadãos contavam com iniciativas fortes frente ao atoleiro ético da gestão, às denúncias, às investigações e aos indiciamentos, o que vemos, mais uma vez, são simples medidas maquiadoras. Numa nítida tentativa de substituir as posições e atitudes firmes que se esperaram de um gestor público sério e responsável, por mero factóide. * Professor, engenheiro e deputado PT-AL/RS
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O Gabinete de Crise e a crise no gabinete .
*Adão Villaverde
Um governo que sequer completou ano e meio e que, de forma recorrente, não consegue superar suas sucessivas crises, necessita fazer uma avaliação e uma reflexão mais rigorosa e desapaixonada, sob pena de colocar em risco o futuro do Estado.
A situação do governo gaúcho já era difícil no fim de 2007, com a gestão carimbada como fortemente conflitiva. E mesmo num esforço de recompor vertebrado pelos dois ex-secretários da Casa Civil e da Secretaria Geral, o governo não superou a crise e eles acabaram sendo pivôs dos últimos acontecimentos, que levaram o Palácio Piratini à uma situação absolutamente crítica.
Entretanto, de forma simplificada e equivocada, o governo continua a não alcançar a dimensão e as origens da crise. De um lado, busca justificá-la nos desacertos entre o vice e a governadora, como esta afirma e reafirma. De outro, quando da recente reação do ex-Chefe da casa Civil, ao se ver acantonado pela revelação da gravação, adotou a mesma postura. Isto evidencia no mínimo incompreensão. Mas o mais grave é a inaptidão em tomar iniciativas evitando a crise institucional que avança e se impõe.
Quando se está diante de um governo incapaz de enfrentar a grave situação político-ética que assola órgãos públicos e sua base institucional se fragiliza de forma acelerada, na opinião pública fica evidente sua desmoralização e perda de legitimidade. O imobilismo e a paralisia tomaram conta da gestão e a população já está indo às ruas exigindo medidas mais firmes e contundentes. Num modelo presidencialista quando o Executivo chega a tão grave situação, só arrogância e autoritarismo associados a paliativos ou simplificações, como “Gabinete de Transição” ou “de Crise”, são meros factóides diante das reais e necessárias medidas que o povo gaúcho espera de seus governantes.
*Professor, engenheiro e deputado estadual PT/RS

10.6.08

Governo Yeda, uma panela sem tampa

9/6/2008 22:39:18

Por
Frei Pilato Pereira
de Santa Maria, RS

O novo jeito de governar da Yeda Crusius, do PSDB, é mesmo algo sem precedentes na história política do Rio Grande do Sul. É verdadeiramente novo, nunca se viu nada igual. No Rio Grande já tivemos governos bastante odiosos e odientos, como é o caso do governo Britto, que por pouco não vendeu todo o Estado, guardando para si uma gorda comissão premiada de bom vendedor. Já tivemos governos que não souberam cuidar dignamente da saúde, da educação, da segurança pública, enfim, não foram capazes de garantir um mínimo de bem estar comum na sociedade gaúcha.

Com a Yeda e seus aliados (PSDB, DEM-PFL, PP, PMDB, PTB, PPS...), temos um governo que traz consigo tudo o que havia de mais retrogrado nos governos anteriores comandados por estes mesmos partidos em diferentes momentos. Mas, agora existe algo de diferente que é o desgoverno. Os outros governos, deste bloco que podemos chamar de direita, também tiveram uma linha anti-popular, mas todos os seus agentes marchavam mais ou menos juntos na mesma direção. Agora, porém, o Governo de Yeda é tão desarmônico e inconseqüente que nem precisou da oposição para se desgastar política e moralmente.

Tem um ditado popular que diz que "o diabo faz a panela, mas não faz a tampa" e outro dito afirma que "Deus escreve certo por linhas tortas". Acredito que Deus nos dá a liberdade de escrevermos nossa história e quando as linhas estão tornas, Ele nos ajuda a escrever o mais certo possível. E às vezes um grande erro - como é o caso deste que o povo gaúcho cometeu ao eleger a Yeda - pode servir de lição para reencontrar o caminho certo na vida. Pode ser que desta vez os gaúchos e gaúchas tirem uma grande lição de um grande erro. Pois é preciso andar para frente e não sapatear para traz onde ficou o esterco do cavalo.

É bem verdade que aqui no Rio Grande inventaram uma panela com todos os ingredientes necessários para enfeitiçar o povo. E conseguiram iludir os eleitores e impedir que, em 2007, Olívio Dutra voltasse ao Piratini para recomeçar o governo popular democrático. Fizeram uma boa panela de ferro, bem consistente e inquebrável, mas não souberam fazer a tampa e agora tudo está sendo revelado aos olhos do povo gaúcho. De pouco a pouco estamos vendo a podridão que tem nesta panela que alimenta o governo do Estado. E a conclusão é de que não poderia dar certo mesmo. Esta tal panela sem tampa só poderia servir para vencer a eleição, mas jamais garantiria forças para um governo saudável. Pois, é muita podridão para uma só panela. Ou mais cedo ou mais tarde teria que explodir.

E nestas alturas, a melhor coisa que podemos fazer é começar tudo de novo. Como nos aconselha o Evangelho de Jesus Cristo, não adianta tirar retalho de roupa nova para remendar roupa velha. E também não adianta colocar vinho novo em barris velhos (cf. Lc 5,35-37). Está claro e evidente que o "novo jeito de governar" da Yeda é tão antigo, maquiavélico e arcaico quanto a mentira. E o Rio Grande precisa com urgência de um novo governo, de verdade, constituído por forças políticas e movimentos que representem o povo gaúcho. Até agora a Yeda e seus aliados não fizeram nada de bom para o Estado e se quiserem fazer um gesto de grandeza nesta hora, devem deixar o governo. E se eles não renunciarem, a nossa autêntica façanha republicana é pedir já o "Impeachment" de todo o governo Yeda.
Frei Pilato Pereira é frade capuchinho.

Movimentos sociais deflagram campanha "Fora Yeda"

A Coordenação dos Movimentos Sociais, reunida nesta sexta-feira (6), na sede da CUT Estadual, discutiu as denúncias de corrupção do governo do Estado e a CPI do Detran.

Deliberou ações contra o governo Yeda.

-Campanha pelo “Fora Yeda” e seu governo neoliberal;
-Grandes atos nas regionais da CUT-RS pelo Fora Yeda no dia 12 de junho;
-Panfleteações em massa pelo “Fora Yeda”;
-Apoio as mobilizações do CPERS Sindicato no dia 13 de junho;
-Vigília e acampamento em frente ao Palácio Piratini no dia 18 de junho;
-Grande ato em Porto Alegre pelo Fora Yeda;
-Apoio as paralizações realizadas pelo Sindiágua (O Sindiágua iniciou uma campanha para realização de uma CPI na CORSAN, em virtude dos graves desvios de recursos);
-Apoio as atividades da Via-campesina;
-Reunião de avaliação das ações dos Movimentos Sociais e preparação da Vigília e do Grande ato “Fora Yeda”, no dia 16 de junho, segunda-feira, as 14 horas, na sede da CUT-RS, Rua Barros Cassal, 283, Porto Alegre.

Por Coordenação Movimentos Sociais.

MOBILIZAÇÃO TOTAL CONTRA O GOVERNO YEDA

09/06: Instalou-se a vigília permanente no Palácio Piratini

10/06, terça: Ato no Banrisul

11/06, quarta, 17h: Ato da Juventude (concentração em frente a prefeitura)

12/06, quinta: Atos regionais da CUT em Pelotas, Santa Maria, Caxias do Sul, Missões, Passo Fundo e Santa Cruz do Sul.

13/06, sexta: Ato do CPERS às 15h no Palácio Piratini.

16/06, 16h: Plenária Estadual dos Movimentos Sociais! Local: Pompéia

19/06: Grande ato estadual no Palácio Piratini! Todos a Porto Alegre.

Veio a público o maior escândalo de corrupção no RS, com fortes indícios de crime eleitoral. É preciso barrar o programa neoliberal no RS.
O governo Yeda cortou 50% do orçamento da educação, cortou 20% do orçamento da saúde, mantém 06 bilhões em isenções para os grandes empresários e, recentemente, cortou as políticas de isenção e incentivos para os pequenos. O governo Yeda desmonta a UERGS, sucateia a EMATER, vendeu parte do Banrisul e agora sabemos que planeja liquidá-lo como patrimônio dos gaúchos.
Os movimentos sociais, através da CMS, já estão nas ruas contra essa política!

Clica na imagem para ampliar!

Brasil - Condenação criminal pública, mesmo antes de prova, defesa e sentença

09.06.08 - BRASIL

Jacques Távora Alfonsin *

Anda em curso no Rio Grande do Sul um abuso de autoridade "continuado" (!) que, à margem da lei e da justiça, como todo o abuso desse tipo, visa criminalizar e desmoralizar os agricultores sem terra, a qualquer custo, em sua legítima reivindicação pela reforma agrária, inexplicável e permanentemente prorrogada.

Depois da violentíssima repressão que a Polícia Militar do Estado promoveu contra as agricultoras que promoveram o protesto de março em defesa do nosso meio-ambiente, em Rosário do Sul, chegou a vez de atacar os acampados em área de terra já desapropriada pelo Incra (!), no município de São Gabriel, no início de maio passado. Em Viamão, neste início de junho, novo ataque. Em São Gabriel, além da destruição de barracos, de vôos rasantes de um helicóptero para aterrorizar acampados, entre os quais idosos, mulheres e crianças, de terra jogada sobre a comida deles, de duas prisões flagrantemente ilegais, mas que mantiveram recluso um agricultor durante quatro dias, chegou-se a vasar para uma parte da mídia trechos de diários dos agricultores acossados e perseguidos durante horas.

O "sucesso" dessa revista proposital e perversamente humilhante, que em muito excedeu os limites impostos pelo mandado judicial que a autorizava, baseou-se em desproporcional e custosa operação militar, mas foi engrandecido e elogiado pelos latifundiários gaúchos, os quais patrocinam, através de uma das suas entidades, programa de rádio diário na mesma empresa de comunicação que recebeu os tais diários. Aplaudiram a política de segurança pública que o governo estadual vem mantendo relativamente aos sem-terra, visivelmente sintonizada com o triste ideário de um conhecido chefe de polícia do Estado Novo que, ainda no século passado (!), dizia que a "questão social é um caso de polícia". Assim, polícia militar e parte da mídia anteciparam publicamente aquilo que somente uma sentença judicial tem competência para fazer - a condenação dos "crimes" dos sem-terra que ambas se julgam com autoridade para julgar.

É de se imaginar a vergonha que, certamente, pelo menos alguns dos soldados encarregados de cumprir as ordens dos seus chefes tiveram de sofrer, não só pela escandalosa desnecessidade de se reunirem numa força tão grande contra homens trabalhadores, mulheres e crianças pobres, abrigadas em barracos de lona, mas principalmente pelo desvirtuamento flagrante das finalidades próprias da sua corporação.

Entre as crueldades que se praticavam na época da escravatura brasileira, admitia-se que os latifundiários marcassem o rosto dos escravos que fugiam das atrocidades a que eram submetidos, com ferro em brasa em forma de "F", assim identificando suas vítimas como "fujões". Já que isso seria muito difícil de repetir hoje, e contaria com pronta reação dos sem-terra feridos em sua dignidade própria, a segurança dos privilégios que mantem a terra do país ignominiosamente distribuída em nosso país achou um outro jeito de obter efeito atroz para eles: denunciá-los independentemente de qualquer devido processo legal, acusá-los independentemente de defesa ou contraditório e condená-los independentemente de sentença judicial. Nem a morte dessa gente fica excluída, como a CPT comprova todos os anos, arrolando as vítimas abatidas no país inteiro, que mais não reclamam do que o reconhecimento devido aos seus direitos humanos fundamentais, previstos expressamente na Constituição Federal.

Tudo isso se explica, embora não se justifique, pelo que esses agricultores são - um testemunho multitudinário do fracasso do nossa economia e do nosso direito em garantir-lhes vida decente e digna - e não pelo que eles fazem.

A repressão que a polícia militar gaúcha movimentou recentemente em trts dos nossos municípios, testemunhou concretamente a manifesta incapacidade do nosso sistema econômico, político e jurídico de enfrentar e vencer a injustiça social que historicamente nos vitima, confundindo pobreza com criminalidade, favorecendo a promiscuidade do Poder Público com privilégios seculares que escravizam a nossa terra e grande parte do nosso povo. Uma coisa é investigar, legalmente, outra é perseguir, abusivamente, como o enforcamento de Tiradentes provou.

Os oficiais da Brigada Militar do Rio Grande do Sul que comandaram essas últimas ações contra os sem-terra que nos perdoem, mas se o patrono das polícias militares brasileiras fosse vivo, certamente morreria de novo, e de vergonha, com o que aconteceu em Rosario do Sul, São Gabriel e Vamão, tamanha é a distância que essas atrocidades guardam do seu amor a liberdade, da sua coragem, do seu heroismo e, principalmente, da sua resistência e luta contra toda a injustiça que se prevalece do seu poder e autoridade para, a pretexto de "manter a ordem e a segurança", abusar de uma e outra, impondo-se por violência arbitrária, preservando opressão e assegurando a exclusão social.

[Autor do livro "O Acesso à Terra como Conteúdo de Direitos Fundamentais à Alimentação e à Moradia", da Editora Sérgio Fabris]

* Professor de Direito Civil e de História do Direito na UNISINOS; Procurador do Estado do Rio Grande do Sul aposentado; Mestre em Direitos Fundamentais; Advogado de sem-terra e de sem-teto

Movimentos realizam jornada nacional de luta

09.06.08 - BRASIL

Amanhã (10), começa a Jornada Nacional de Luta, organizada pela Assembléia Popular (AP) Nacional. Até o próximo dia 13, integrantes de movimentos populares, de diversas cidades do Brasil, participam de manifestações, debates e atos, para reivindicar a construção de um país mais justo.

"Queremos que estas sejam também lutas da cidade, dos trabalhadores e trabalhadoras dos grandes centros. Para que isso ocorra é fundamental a ampliação da articulação e coordenação das ações, desta forma ampliamos a participação de todos e todas nesta jornada e na própria Assembléia Popular", disse, na convocação, a organização da Jornada.

Os movimentos levarão às ruas lutas em comum, como o aumento abusivo dos preços dos alimentos. Mas cada cidade, de acordo com as especificidades locais, vai focar seus protestos em um tema. Assim, serão levantadas bandeiras: energéticas, pela diminuição da tarifa de energia; da soberania alimentar, contra as ações das transnacionais, da campanha contra a privatização da Vale do Rio Doce.

Em Minas Gerais e no Pará, será essa privatização o centro dos debates, das manifestações e das passeatas. Segundo os organizadores, mesmo com as diferentes agendas, todas convergirão "para o mesmo objetivo: um Brasil mais justo, igualitário, como distribuição da riqueza, e principalmente na construção do Projeto Popular para o Brasil".

Em São Paulo, os movimentos irão apresentar suas reivindicações sobre a tarifa de energia em debates, manifestações, denuncia, distribuição de panfletos e apresentação da auto-declaração nas empresas de energia.

A Jornada, que começou a ser organizada na última Plenária Nacional da AP, em Luziânia, fará ainda denuncia, organizada pela Via Campesina, contra o agronegócio, os transgênicos e o agro-combustível.

4.6.08

PT na TV


Fases da luta anti-neoliberal

A luta contra o neoliberalismo já tem história, já passou por várias fases – da resistência ao inicio da construção de alternativas – e agora enfrenta um novo momento, o da contra-ofensiva da direita. No mesmo ano do lançamento do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta) -1994-, os zapatistas conclamavam a resistir à nova onda hegemônica. Ignacio Ramonet chamava, em editorial do Le Monde Diplomatique -1997-, a lutar contra o “pensamento único” e o Consenso de Washington.
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O Forum Social Mundial – 2001 -convocava à construção de “um outro mundo possível”. As manifestações contra a OMC, iniciadas em Seattle – 2001 -, revelavam a extensão do mal estar com o novo modelo hegemônico e o potencial popular da luta de resistência. Era uma fase de resistência, de defensiva, diante da virada regressiva de proporções históricas gigantescas operada pela passagem de um mundo bipolar ao unipolar, sob hegemonia imperial norte-americana, e do modelo regulador ao modelo neoliberal.
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No plano governamental, a consolidação da hegemonia neoliberal, produziu-se pela passagem da geração direitista inicial que a lançou – a de Pinochet, Reagan, Thatcher – para a segunda, que alguns dos seus protagonistas reivindicaram como a “terceira via” – Clinton, Blair, Cardoso -, ocupando quase todo o espectro político. Essa força compacta começou a ser furada com a eleição de Hugo Chavez na Venezuela – 1998 -, concentrando-se na América Latina a partir desse momento, com a derrota eleitoral dos principais promotores do novo modelo – Cardoso, Menem, Fujimori, Carlos Andrés Perez, o PRI -, revelando o seu fracasso.
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No entanto, essa reação popular refletida nos triunfos eleitorais que sucederam ao de Chavez – Lula (2002), Kirchner (2003), Tabaré Vazquez (2004), aos que se pode acrescentar o de Daniel Ortega (2006) –, apresentaram um cenário diferente do que se pensava. Ainda que vitoriosos contra governos ortodoxamente neoliberais, esses novos governantes não apontaram para a ruptura com o modelo neoliberal, mantendo-o, com distintos graus de flexibilização – principalmente pelo peso que passaram a ter as políticas sociais.
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Esses matizes, somados à opção pelos processos de integração regional – antes de tudo o Mercosul -, e à derrota da Alca – ao que eles colaboraram ativamente - revelavam, no entanto, diferenças significativas em relação aos governos que os antecederam, contribuindo para o surgimento de um cenário político inédito no continente, pela existência simultânea de uma quantidade de variadas formas de governos que se opunham aos tratados e políticas de livre comércio pregadas pelos Estados Unidos, assim como a sua política de “guerra infinita” – que teve apenas na Colômbia uma adesão explícita na região.
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As vitórias de Evo Morales (2005) e de Rafael Correa (2006), ao lado do lançamento da Alba, do Banco do Sul, do gasoduto continental, da adesão da Venezuela e da Bolívia ao Mercosul, deram contornos mais amplos e fortaleceram um eixo de governos que, além do privilegio dos processos de integração regional, começavam a construir modelos de ruptura com o neoliberalismo, modelos neoliberais. O triunfo eleitoral de Fernando Lugo (2008) alarga o campo dos governos progressistas no continente, ao que pode somar-se proximamente El Salvador.
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No entanto, a partir de 2007, depois de pega relativamente de surpresa pela proliferação de governos progressistas na região, a direita retomou capacidade de iniciativa. Estes governos haviam capitalizado, no plano eleitoral, o descontentamento social gerado pelas políticas neoliberais, avançando neste plano – o elo mais frágil da cadeia neoliberal.
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Para recompor sua capacidade de iniciativa, a direita – cujo campo conta com a velha direita oligárquica e com as correntes social-democratas que aderiram ao neoliberalismo – lançou mão das esferas sobre as quais sua hegemonia não havia sido tocada ou que conservava, no essencial, sua força: o poder econômico e o mediático. Essa contra-ofensiva assumiu caras um pouco distintas em cada país, porém com elementos comuns: crítica da presença do Estado e de seus processos de regulação, dos processos de integração regional e com o Sul do mundo. Temas como a “corrupção” – centrado sempre nos governos e no Estado -, o desabastecimento, a autonomia dos governos regionais contra a centralização estatal, as supostas “ameaças” à “liberdade de imprensa” – identificada para eles com imprensa privada, etc.
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Passada a surpresa da multiplicação de governos em que o controle do aparato estatal escapava a seu controle direto, a direita retomou a iniciativa. No Brasil, com as campanhas de denúncias contra o governo Lula; na Venezuela, depois da tentativa de golpe de 2002, na defesa dos monopólios privados da mídia, a corrupção e o desabastecimento; na Bolívia, contra a reforma agrária, a nova Constituição e o uso dos novos impostos à exportação do gás para que o governo central realize políticas sociais; na Argentina, contra formas de regulação de preços e o desabastecimento; no Equador, contra a nova Constituição e as novas formas de regulação estatal. Conta também com os dois principais governos de direita na região – México e Colômbia -, tentando abrir um processo de privatização da empresa estatal do petróleo, Pemex, no primeiro, intensificando o epicentro das guerras infinitas na região, no segundo caso.
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Depois de ter ficado na defensiva nos anos de expansão da economia internacional, que favoreceu a obtenção de recursos do comercio exterior para intensificar suas políticas sociais, a direita retoma a ofensiva também neste plano, de denuncias sobre os riscos de retomada da inflação, sobre a necessidade de novos ajustes, de elevação novamente das taxas de juros, buscando retomar a prioridade da estabilidade monetária sobre a expansão econômica.
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A fase atual está marcada pelo recrudecimento dos enfrentamentos entre os governos progressistas e a oposição de direita, no plano político e ideológico. As tentativas de desqualificação do papel do Estado ganha destaque central como tema centralizador do conjunto de debates e polêmicas entre direita e esquerda. Se perfilam hoje no continente países que seguem com o esquema do Estado mínimo – com o México tentando dar início a um processo de privatização da empresa petrolífera Pemex, como exemplo do novo ímpeto privatizador do neoliberalismo no continente, com o Perú, aderido recentemente, assim como a Costa Rica e o Chile, embora concertando alguns dos graves buracos do seu outrora modelo de previdência privada, mantêm-se como o “caso” exibido como de sucesso desta vertente -, por um lado.
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Por outro, países buscam a refundação dos seus Estados, em base a esquemas posneoliberais e posliberais, no sentido de buscar novas formas de representação política, mais além do formalismo liberal, como são os casos da Bolívia, do Equados – ambos buscando fundar Estados plurinacionais, pluriétnicos, pluriculturais – e da Venezuela. Entre eles, se situam países que colocam em prática níveis de regulação do Estado, sem recompor os Estados prévios ao neoliberalismo, mas freando o desmantelamento dos aparatos estatais e fortalecendo capacidades setoriais de regulação estatal, brecando os processos de privatização anterior, fomentando o novo crescimento do trabalho formal e reequipando o funcionalismo público e os serviços públicos – de que os casos do Brasil e da Argentina são exemplos.
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O destino do neoliberalismo no continente não está definido. Ele continua hegemônico, seja pelos países que mantêm ortodoxamente o modelo, seja porque ele continua hegemônico em vários dos principais países do continente, de uma ou outra forma – Brasil, México, Argentina, Colômbia, Chile, Peru, Uruguai, Costa Rica, - em um mundo dominado pelo neoliberalismo. Seu destino será decidido antes de tudo nos três países de economias mais fortes. Entre eles, por enquanto o México avança consolidando a hegemonia neoliberal, a Argentina e o Brasil preservam o modelo, com flexibilizações, porém ameaçados por forças opositoras de direita.
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O espaço mais significativo de construção pós-neoliberal é a Alba – Iniciativa Bolivariana para as Américas -, em que os países que dela participam – Venezuela, Cuba, Bolívia, Nicarágua, mais intercâmbios importantes com o Equador -, constróem relações de intercâmbio solidárias, buscando responder às necessidades e possibilidades de cada país, de forma alternativa às leis do “livre comércio” da OMC, praticando o que o Fórum Social Mundial chama de “comércio justo”. Este é um espaço tipicamente pós-neoliberal, que depende da consolidação dos processos políticos nesses países.
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Postado por Emir Sader, 02/06/2008 às 12:36
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Emir Sader debate experiência de esquerda em Porto Alegre
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O mandato da deputada federal Maria do Rosário inicia no dia 5 de junho, às 18h30, um ciclo de debates com personalidades de diversas áreas para discutir o futuro das cidades, suas vocações e soluções.
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O primeiro encontro será com o professor Emir Sader, na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
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O debate com Emir Sader terá como tema "A importância da experiência de Porto Alegre e do Fórum Social Mundial para a esquerda latinoamericana."
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No evento também será lançada a Revista Margem Esquerda n° 11 - Estudos Marxistas, publicação semestral da editoral Boitempo.
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A deputada Maria do Rosário ressaltou que o objetivo do debate é discutir o papel de Porto Alegre e das cidades na construção de uma alternativa de esquerda ao processo de abertura neoliberal. "Vivemos um novo momento, em que os valores de comunidade e cooperação precisam estar acima da competição, da alienação e da segregação. Queremos aproveitar nossas iniciativas e experiências para pensar a gestão das cidades num novo horizonte democrático e socialista", declarou.
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Emir Sader é professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, onde dirige o Laboratório de Políticas Públicas, e exerce o cargo de Secretário Executivo do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais.

A Argentina é um problema nosso

Por Gilson Caroni Filho - do Rio de Janeiro
Ser latino-americano compreende viver sobressaltado ante as incansáveis estratégias urdidas por forças políticas que têm como único objetivo a promoção do retrocesso. Nossas elites, baseadas em um trotskismo às avessas, se empenham em estratégias que podem ser definidas como "involução permanente”. Uma procedimento recorrente em toda a América Latina que, com o apoio ostensivo das corporações midiáticas locais, visa à desestabilização de governos emergentes do campo democrático-popular.
Nesse sentido, o crescente conflito entre o agronegócio e o governo de Cristina Kirchner é algo que, ultrapassando o território de origem, incide diretamente na agenda do governo Lula. Um breve retrospecto se faz imperativo para recordar dois pontos que, com distinções de origem, convergem para um encontro que não pode ser perdido de vista: a origem do dois governos e a trajetória de seus líderes.
Um nasceu há 63 anos em Garanhuns, cidade incrustada no agreste pernambucano. Quatro décadas após uma viagem de pau-de-arara rumo a São Paulo, chegou à Presidência da República. Inequívoca inflexão ética de um eleitorado secularmente conservador, sua vitória foi festejada como o fato político mais importante da história recente da América Latina. Um ex-retirante, forjado no embate político-sindical, líder do mais importante partido de esquerda do subcontinente, sobrepujava os preconceitos da elite e os receios de parcela expressiva da classe média. A esperança teria, enfim, vencido o medo. Com 61,2% dos votos válidos. Em 2006, apesar da maciça artilharia da mídia conservadora, se reelegeu com 60,83% dos votos contra 39,17% de seu oponente tucano.
O outro, 59 anos, veio de Santa Cruz, província argentina rica em petróleo e gás natural. Advogado, desde jovem filiado à ala revolucionária do Partido Justicialista, foi governador de sua terra natal por duas vezes. No dia 25 de maio de 2002, com 46% dos 37 milhões de argentinos vivendo em estado de pobreza, chegou à Casa Rosada em meio à maior crise política, econômica e social dos últimos 100 anos. Ao contrário do primeiro, não foi tão festejado nem despertou tanta expectativa de mudança efetiva. Foi empossado com 22% dos votos, depois da desistência do ex-presidente Carlos Menem.
Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Carlos Kirchner têm em comum o período em que chegaram ao poder e a herança deixada por ditaduras e políticas neoliberais dos antecessores. O governo petista recebeu uma dívida interna equivalente a 62% do PIB, inflação na casa de 25,3% e uma economia à beira da ruptura financeira. Tais indicadores já haviam levado, ainda na campanha, o candidato Lula a assinar a ''Carta ao Povo Brasileiro'', em que eram mantidas as metas básicas dos acordos firmados pela equipe econômica de FHC com o FMI. A política de manutenção dos superávits foi aprovada simultaneamente ao programa de governo pela direção nacional do PT.
Kirchner se deparou com uma economia tomada pela informalidade, taxa de desemprego superior a 20%, dívida pública superior a US$ 146 bilhões e avançado estágio de sucateamento de um parque industrial cuja pujança remontava ao início do século XX.
Ao não quitar débitos estimados em US$ 14 bilhões com o Fundo, Buenos Aires recebeu elogios da conservadora revista The Economist. Obteve, ainda, apoio internacional à proposta de pagamento da dívida privada com deságio significativo. O resultado foi um crescimento em ritmo asiático superior a 8% em quatro anos consecutivos, que somado ao reajuste de 50% do salário mínimo, congelado desde 1993, e à política de programas sociais negociados com o movimento sindical, tirou a Argentina do limbo. Em 2007, conseguiu eleger sua mulher, Cristina Fernández de Kirchner, com 44,8% dos votos.
Não há dúvidas que ainda faltam correções para pavimentar o caminho do crescimento sustentável, tanto aqui como na Argentina, mas a correção de rota não pode ser confundida com um retorno ao neoliberalismo da banca. E muito menos com uma política externa que volte a vislumbrar uma reinserção subalterna no cenário internacional. Por tudo isso, o que se delineia no país vizinho é preocupante demais como já observou Marco Aurélio Weissheimer em O alerta que vem da Argentina.
Os locautes dos setores agroexportadores não podem ser vistos apenas como resultado de uma equação fiscal complicada. A natureza da paralisação patronal, por não aceitar a redução dos seus lucros, é, antes de qualquer coisa, uma ação política que atinge a classe trabalhadora urbana com desabastecimento e elevação de preços. Pede-se, em especial aos setores de esquerda, que não percam o foco de quem é o real adversário a ser combatido.
Manifestações como a da Frente Obrero Socialista (FOS), corrente trostskista que segue o pensamento de Nahuel Moreno, beiram a insanidade política. Ao afirmar que "foi correto nos colocarmos contra os dois (governo e ruralistas) e chamar os trabalhadores da cidade e do campo a unirem-se em torno a um programa operário para garantir a alimentação", os morenistas parecem não ter aprendido que do gueto não se faz revolução. É, quando muito, um atalho curto que leva a alamedas de cemitérios ou a presídios mais próximos.
Cortes nas estradas e “caçarolaços” nas classes médias das cidades evocam um passado tão recente que talvez a melhor saída, a mais sensata, seja parafrasear Terêncio, o grande dramaturgo romano: Nada do que é latino me é estranho. Precisamos redobrar a atenção. Lidamos com derrotados que costumam vencer ao primeiro cochilo da crítica.
Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro.

América do Sul - É difícil mudar

Por Selvino Heck - Adital - de Brasília
Todos nós em algum momento, na virada de ano, no aniversário, na passagem de uma década para outra, prometemos fazer isso ou aquilo, mudar nossa vida, superar os defeitos, fazer exercícios físicos, ler, beber menos, perder uns quilinhos, correr menos no trânsito, doar-se mais à família e à comunidade, ser mais gente, ser mais solícito e carinhoso.
Mas não é fácil mudar. É preciso disposição, vontade, coragem. Mudar significa enfrentar medos, significa superar o desânimo, significa não se deixar intimidar, significa desacomodar-se. Os vícios já instalados, os condicionantes do dia a dia, a falta de compromisso com a decisão já tomada acabam nos acomodando à rotina, ao fazer o mesmo todos os dias, a repetir os mesmos gestos, os mesmos erros, a ter as mesmas manias.
Não é muito diferente quando falamos de estruturas, sistemas, sociedades. Com certeza é muito mais difícil e problemático. Estes dias um grande jornal do Rio Grande do Sul publicou a seguinte nota no seu Informe Especial, referindo-se aos acontecimentos da Bolívia: "DOIS É DEMAIS. Pode ser definida brevemente a autonomia de Santa Cruz na América do Sul. Ou seja, corremos o risco de ter dois Evo Morales."
Esta nota revela várias coisas. De um lado, o preconceito em relação a Evo Morales, um indígena, lutador social há décadas, presidente eleito soberana e democraticamente pelo povo boliviano. De outro, é o medo da mudança. Quem está estabelecido e tem privilégios teme perdê-los. Tem medo do diferente, do novo.
A mudança está em curso na América do Sul. Não se sabe bem onde vai dar. Os países são diferentes, assim como as culturas, a história e as lutas de cada povo. Não se sabe ainda se vai ser, como diz Rafael Correa, presidente do Equador, uma mudança de época ou apenas uma época de mudança. Mas é certo que os governantes não são mais os mesmos, não têm mais a tradicional origem de sempre, não têm os mesmos compromissos que outros historicamente tiveram.
Parecia que o neoliberalismo tinha cristalizado a história, como alguém profetizou. Ou que o continente sul-americano jamais sairia de uma espécie de ‘stop and go’: longas ditaduras entremeadas de pequenos períodos democráticos. Não se pode esquecer, por exemplo, o Brasil, onde de 1930 para cá só quatro presidentes eleitos diretamente terminaram seu mandato. O resto, ou foi ditadura, ou houve suicídio, golpe e impeachment.
Por isso, o estranhamento com a nota do jornal sobre a Bolívia e Evo Morades. Além de desrespeitar a vontade soberana de um povo, que é pobre, mas tem história de organização e luta social, mostra como é difícil fazer a mudança na América do Sul. Não basta agir segundo as regras do jogo, participar de eleições, conquistar a maioria, instalar o governo sonhado há décadas pelos índios bolivianos, que são ampla maioria em seu país e pela primeira vez conseguem ver sua voz ouvida e respeitada.
Os ventos da mudança têm sempre um ar inesperado. Não se sabe bem quando e onde irão soprar. Mas certamente só acontecerão quando pelo menos duas coisas acontecerem ou se revelarem: um regime ou modelo econômico-social-cultural esgotado, não deixando alternativas e esperança para o povo; e a existência de uma vontade nacional de mudança. As ditaduras bolivianas, os golpes de Estado, a pobreza renitente, a exclusão secular dos mais pobres criaram o caldo histórico para que a vontade nacional de mudança pudesse prevalecer na Bolívia e em outros países sul-americanos. Mesmo assim, os dominantes nunca se resignam, não querem perder parte de seu poder ou riqueza, muitas vezes adquirida sob meios escusos ou sem um mínimo de justiça social.
Assim, como na vida pessoal, é preciso confiar na possibilidade da mudança, acreditar. E jamais deixar-se levar pelo medo, muito menos pelo preconceito. Imagina se os negros escravos não tivessem fugido de seus donos e criado as comunidades quilombolas, e depois resistido aos brancos que queriam voltar a dominá-los! E mesmo quando ainda escravos mantinham formas de resistência, na música, na comida, nos ritos religiosos. Imagina se os índios, tendo sofrido um verdadeiro genocídio, não tivessem resistido, não continuem resistindo como na Raposa Serra do Sol! E assim hoje se possa dizer, para nosso orgulho e felicidade, que ainda existem como povos, inclusive se recompondo em termos numéricos.
Mudar é sempre difícil. No caso da América do Sul, com certeza esta é a melhor oportunidade histórica, que não pode ser desperdiçada. Por isso, o debate político-ideológico sobre os rumos da mudança é sempre necessário, defendendo sua originalidade, sua capacidade inovadora. É preciso envolver a população na mudança, fazendo-a massiva e ampla. É preciso um permanente trabalho de conscientização sobre os conteúdos da mudança política, econômica, social e cultural, para que seja compreendida e a assumida por todos de forma consciente e organizada.
Os poderosos do mundo nunca se curvam aos pobres e deserdados por vontade própria. Os pobres só chegam ao poder quando muito organizados e com consciência clara do que querem para o futuro. Este é o trabalho a ser feito por quem quer e acredita na mudança.
Selvino Heck é assessor Especial do Presidente da República. Fundador e Coord. do Movimento Fé e Política

Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz