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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

28.8.08

Raposa Serra do Sol: Leia a íntegra do voto de Ayres Brito no STF

Único a votar no julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a reserva indígena Raposa Serra do Sol, o relator da ação, ministro Carlos Ayres Britto, entendeu que a demarcação de terra indígena é prerrogativa exclusiva do Poder Executivo, contestou a tese de que "índio atrapalha o desenvolvimento" e votou pela rejeição da ação que contesta o decreto que demarcou as terras em Roraima. O ministro disse que o Congresso Nacional já fez sua parte quanto ao problema, ao assentar, na Constituição Federal de 1988, as coordenadas para a demarcação. Por isso, afirmou, só lhe restar duas prerrogativas referentes à área indígena: autorizar a exploração de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de minérios e pronunciar-se sobre a remoção de populações indígenas de seu território, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco a sua população, porém garantindo seu retorno imediato, uma vez cessado o risco. Para Britto, portanto, cabe constitucionalmente à União instaurar, seqüenciar e efetivar materialmente o processo de demarcação de áreas indígenas, por atos que se situam na esfera do Poder Executivo. Ele lembrou que o Estatuto do Índio (Lei 6.0001/73) detalha as coordenadas dadas pela Constituição para o processo, cabendo ao presidente da República homologar a respectiva portaria demarcatória. O ministro considerou que a demarcação das áreas indígenas do país, particularmente a da Raposa Serra do Sol, está atrasada, pois o artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988 estabeleceu um prazo de cinco anos, a partir da promulgação da Constituição, para demarcação de todas as terras indígenas brasileiras. Carlos Britto disse que este dispositivo do ADCT é uma "medida compensatória" das desvantagens que as populações indígenas têm sofrido em relação aos não-índios. Segundo ele, a Constituição foi além do valor social, marcando um novo estágio da integração comunitária de todo o povo brasileiro, prevendo uma "sociedade fraterna" em consonância com o artigo 3º, inciso I, da Constituição, que prevê, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, "construir uma sociedade justa, livre e solidária". Em outra parte de seu voto, o ministro Carlos Brito qualificou de "falso" o pretenso antagonismo existente entre os índios e o desenvolvimento. Ele lembrou que os índios ajudaram a defender o território brasileiro contra franceses e ingleses e que se comete uma "injustiça histórica" ao não reconhecer que eles tiveram — e têm — contribuição importante para consolidação e desenvolvimento do país. "Eles são co-autores da ideologia nacional", sustentou. Britto lembrou que existe, em Niterói (RJ), uma estátua em homenagem ao índio Araribóia, que recebeu a sesmaria de Niterói como reconhecimento pela sua contribuição para rechaçar os franceses de território brasileiro. O ministro afirmou que o Brasil adotou uma política correta ao não hostilizar, mas sim permitir a integração do índio brasileiro à sociedade e à economia, sem abandonar a sua cultura, que prioriza o coletivo sobre o individual; o enriquecer sem prejuízo alheio; a utilização não-predatória do espaço vital em proveito coletivo e uma postura de respeito ao meio ambiente. "Nenhum documento estrangeiro supera a Constituição brasileira neste particular." Clique aqui para ler o voto.

Serra do Sol: governo defende demarcação e diz que reserva não ameaça soberania

O advogado-geral da União, José Antônio Dias Toffoli, afirmou que a tese de ameaça à soberania na região da reserva Raposa/Serra do Sol não tem fundamento para anular a homologação das terras indígenas. "Se houver alguma declaração de independência, o Estado brasileiro vai lá e age. Um Estado da federação brasileira também pode fazer isso e querer independência. Não podemos trabalhar sobre o imponderável. Há que se fazer valer a constituição e defender a soberania", ressaltou Toffoli.
Também falando em nome da Funai (Fundação Nacional do Índio), o advogado-geral da União contestou o argumento de que Roraima está reduzida a 10% de seu território, levantado anteriormente na sessão pelo advogado Francisco Rezek.
"Que sejam os 10%, ainda assim seria maior do que muitos Estados, maior do que Sergipe, que é um Estado centenário", disse Toffoli. "
E, se a terra é da União, é muito mais seguro, muito mais fácil de defender as fronteiras, do que se a terra fosse de particulares", completou.
O procurador-geral da República Antonio Fernando Barros de Souza, destacou a necessidade de se manter a demarcação de forma contínua e assegurar "todo o espaço físico necessário" para garantir ao índio seu sustento e "assegurar sua identidade cultural". "A definição da terra é definida pelo modo de vida do índio. Não há como recusar que o direito às terras pelos índios é um direito constitucional que garante a afirmação de sua identidade e o reconhecimento de sua dignidade", disse. Segundo ele, os que questionam a demarcação "não apontam qualquer ilegitimidade com consciência para invalidá-lo". O procurador-geral lembrou ainda que o processo de demarcação foi "cauteloso, cuidadoso e traumático" e seguiu os marcos definidos na homologação. O advogado Paulo Machado Guimarães, representante da comunidade Socó, que faz parte da reserva Raposa/Serra do Sol, manifestou-se contrário à demarcação em ilhas. "Não existe meio-termo em um ato administrativo como não existe meio-termo nos direitos constitucionais dos indígenas", disse. "A unidade da Federação nunca esteve tão conservada como agora. As comunidades indígenas que contribuem para o desenvolvimento do Estado, trabalham, são um orgulho para o país. São, portanto, partícipes da construção de um Estado plural e que respeita a diversidade étnica", completou.
Índia faz defesa inédita no STF
De rosto pintado, a primeira índia a se formar em direito no Brasil, a wapichana Joênia Batista de Carvalho, fez a defesa da demarcação contínua da reserva Raposa/Serra do Sol no Supremo Tribunal Federal. Com isso, tornou-se a primeira advogada índia a defender uma causa no STF.
Representando várias comunidades indígenas, ela iniciou sua fala destacando a violência contra os indígenas ao lembrar que "21 líderes já foram assassinados, casas foram queimadas e ameaças foram feitas."
A advogada defendeu que a definição da terra indígena é responsabilidade do próprio povo indígena.
"O que está em jogo são os 500 anos de colonização", ressaltou. Joênia alertou para o risco de os índios perderem partes da terra já homologada. "Já nos tiraram a sede do município de Normandia. De pedaços em pedaços estão tirando. E amanhã, como ficará isso?", questionou. A contribuição da população indígena para a economia de Roraima foi outro ponto destacado. "Nós temos nossa economia, e isso sequer é contabilizado pelo Estado de Roraima, que não fala quanta economia circula ali dentro da reserva Raposa/Serra do Sol."

ENTREVISTA - EMIR SADER

Construir uma nova hegemonia é desafio para América Latina
. Em entrevista ao jornal argentino Página 12, Emir Sader analisa o atual momento político da América Latina. Para o sociólogo brasileiro, o que está faltando para a integração da região avaçar é um projeto estratégico de futuro, uma compreensão mais clara do que é a América Latina hoje. As propostas do Banco do Sul, de uma moeda única e de um Banco Central Único apontam para essa direção, defende Sader.
. Raúl Dellatorre – Página 12 .
BUENOS AIRES - O processo político da última década na América Latina deu como resultado governos de um sinal distinto do neoliberalismo. Alguns decididamente opostos, outros com “traços contraditórios”, segundo a expressão empregada por Emir Sader, analista político brasileiro e diretor executivo do Conselho Latinoamericano de Ciências Sociais (Clacso). Apesar das coincidências que se observam em muitos sentidos, no plano econômico os países da região parecem não terminar de romper o molde que a enquadra nem de afastar de cima de si as sombras de seu passado. Sobre estes e outros temas, Emir Sader conversou com o Página 12.
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O que está faltando aos países da região para integrar-se e avançar de forma mais acelerada rumo a um processo de transformação?
Emir Sader: Um projeto estratégico de futuro, uma compreensão mais clara do que é a América Latina hoje, da natureza de seus regimes econômicos e sociais em função do papel do Estado. E pensar que futuro pode haver para além do neoliberalismo.
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Na sua avaliação, em que aspectos se avançou?
Emir Sader: Alguns ladrilhos dessa construção já existem, seja como realidades ou como menções no discurso. O Banco do Sul, a idéia de uma moeda única, o Banco Central único, tudo o que significaria uma política econômica única, são elementos importantes. Mas, ao mesmo tempo, é preciso discutir que modelo de sociedade queremos e isso significa pronunciar-se a favor de uma sociedade desmercantilizada. Discutir que tipo de Estado queremos, propondo um Estado que não esteja dominado pela financeirização. Definir que tipo de cultura, que identidade e diversidade cultural devemos ter. Dizer que tipo de espaço alternativo criamos, por fora da hegemonia unipolar norte-americana.
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O que implica tudo isso?
Emir Sader: Esse processo implica não somente integração econômica e social, mas também tecnológica, cultural, educacional, midiática e de estruturas políticas. Existe um esboço de parlamento latinoamericano, mas ainda estamos muito longe de ter estruturas supra-nacionais de caráter latinoamericano ou sul-americano. O tema, poderíamos dizer, agora é político, é discutir futuras relações de poder. Que tipo de sociedade, que nova hegemonia queremos construir.
Aparentemente, alcançar esses objetivos exigiria um salto de consciência importante das sociedades e de sua classe política, uma mudança em relação ao paradigma neoliberal da década anterior. Neste sentido, que papel estão desempenhando os intelectuais da América Latina, sejam eles economistas ou cientistas sociais?
Temos uma trajetória extraordinária do pensamento crítico latinoamericano. A grande virada foi a crítica que a Cepal fez à teoria do comércio internacional, que deu a volta ao mundo, e pensou o intercâmbio a partir da periferia e as formas de desenvolvimento desigual, de intercâmbio desigual. Foi pensar na acumulação a partir da periferia, com todas as debilidades deste processo. A grande novidade histórica da segunda metade do século passado, em termos econômicos, foi a industrialização da periferia. Até aí, esse era um tema monopolizado pelo centro. A periferia era agricultura, mineração, pecuária e nada mais.
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Quais foram os efeitos dessa virada?
Emir Sader: Essa mudança no pensamento econômico elevou o nível de identidade nacional, colocou a relação com as potências imperiais em um nível superior. O nacionalismo foi o grande fenômeno do século passado na América Latina. Com tons anti-imperialistas maiores ou menores, segundo o caso. Mas foi concebido pela intelectualidade, E, em anos recentes, várias teorias elaboradas nessa época ajudaram a pensar a ação política dos novos governos na região. Mas não em todos os casos.
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Poderia dar exemplos dos dois casos?
Emir Sader: Na Bolívia, deu-se por meio de um grupo pequeno de intelectuais, chamado “La Comuna” (do qual surge o atual vice-presidente, Álvaro García Linera). Um núcleo de acadêmicos articulou-se fora da Universidade e ajudou o movimento indígena a repensar sua identidade, sua trajetória. A fazer uma auto-crítica da esquerda boliviana, de seu passado. No Equador, também há setores intelectuais que estão articulados entre si e com o processo político. Na Venezuela, em troca, dá-se um processo de mudança com uma ausência enorme de uma intelectualidade que ajude a pensar esse processo. E isso é grave.
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E como você classificaria os casos da Argentina e do Brasil?
Emir Sader: São dois países com uma trajetória intelectual muito maior do que a dos quecitei anteriormente, com muito mais raízes no pensamento crítico. No entanto, hoje mostram uma ausência relativa desta intelectualidade nos temas políticos, ideológicos, culturais e econômicos, uma ausência muito grave.
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Venezuela, Brasil, Argentina. Está falando dos países economicamente mais fortes e relativamente mais desenvolvidos e são os que apresentariam maiores debilidades no plano intelectual para promover uma mudança.
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Emir Sader: Minha conclusão é que o conjunto da intelectualidade, não apenas seu pensamento crítico, foi pega de surpresa pelo atual período histórico. Aparece como a voz de menor resistência aos sistemas de dominação, ficando muitas vezes atrás dos movimentos sociais. É preciso destacar que a América Latina foi território de várias teorias avançadas do pensamento crítico em décadas anteriores, mas hoje não encontramos a expressão de muitas dessas teorias no movimento político latinoamericano. Não estão ajudando a pensar o processo contemporâneo.
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Qual foi o comportamento desses pensadores?
Emir Sader: Pode-se perceber que muitos intelectuais do pensamento crítico de outra época terminaram aderindo ao neoliberalismo, porque viam essa tendência como algo inevitável. E quando se vêem as coisas assim, isso marca o que será feito. Fernando Henrique Cardoso foi um brilhante intelectual de esquerda nos anos 60, mas seu governo nos 90 não foi distinto do de Menem. E eu não diria, tomando as coisas em seu conjunto, que é uma postura de direita, mas sim um conformismo histórico. Outra parte da intelectualidade ficou refugiada em posições que eu chamaria de ultra-esquerda, posições que estão descoladas do processo real. A ultra-esquerda tem uma capacidade crítica enorme, mas nunca conseguiu construir processos de transformação revolucionária.
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Neste debate sobre os governos e as políticas na América Latina, muitos pensadores e dirigentes de esquerda seguem julgando como governos de direita a aqueles que não produziram uma ruptura com o neoliberalismo.
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Emir Sader: Há uma postura que tende a tomar determinados aspectos da realidade e absolutizá-los, perdendo assim a objetividade. Hoje a divisão fundamental não é entre uma esquerda boa e uma esquerda má. Essa é uma postura de direita que divide a esquerda. A linha é entre os que estão a favor do projeto de integração regional e os que estão a favor de tratados bilaterais de comércio com os Estados Unidos. No marco daqueles que defendem a integração regional, há alguns que avançaram rumo à ruptura do modelo, como Equador, Bolívia e Venezuela. Outros, como Brasil e Argentina, conseguiram flexibilizar o modelo, e aí está seu mérito. Tudo o que é feito para a manutenção do modelo anterior no Brasil e na Argentina é negativo. Mas a política externa é positiva, a política social é positiva. E isso vale.
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Não está justificando-os?
Emir Sader: Não, mas é preciso dar-se conta que ainda que tenham ocorrido avanços importantes na América Latina, vivemos em um mundo de hegemonia neoliberal: hegemonia econômica, de valores, na relação de força social. Não se pode esquecer que o neoliberalismo colocou todo o movimento popular na defensiva. A luta contra o modelo, por conseguir por em contradição seus paradigmas, deu-se contra a direita e desde posições anti-neoliberais que não eram de esquerda. Conseguimos ter governos com traços contraditórios e isso foi o resultado da luta, de uma luta exitosa. A alternativa era ter governos de direita, não de esquerda.
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O predomínio e a crise do capitalismo: “Desmercantilizar a economia”
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Emir Sader caracteriza o período histórico vivido na segunda metade do século XX como “a passagem de um mundo bipolar para outro unipolar”, como uma hegemonia absoluta do capitalismo e dos Estados Unidos como potência dominante. Além disso, destaca a passagem, dentro do capitalismo, do modelo keynesiano para o neoliberal. No entanto, apesar deste “triunfo espetacular” do capitalismo, Sader sustenta que este processo acaba não garantindo “nem um ciclo tranqüilo para a hegemonia dos Estados Unidos nem um crescimento sustentável”. Segundo o sociólogo e historiador brasileiro, a hegemonia capitalista deu-se através de “uma vitória extraordinária dos Estados Unidos nos planos político, militar e ideológico”. “A hegemonia econômica e cultural é tal que o modo de vida capitalista se impõe hoje sem disputa no mundo. Não há outro modelo comparável. Até na China, as cidades se transformam e desenvolvem como espelho das cidades estadunidenses. Os pobres têm expectativas de consumo de acordo com o estilo norte-americano”.
No entanto, o capitalismo mostra seus limites. A crise atual da economia norte-americana, sustenta Sader, poderia ser o início de “um período longo de instabilidade com turbulências”. Os obstáculos ou contradições do mundo unipolar têm seu reflexo na excessiva concentração de renda, na devastação ecológica e na guerra, adverte. “O capital se deslocou fortemente rumo à atividade especulativa financeira. Cerca de 90% dos movimentos de capital no mundo hoje são mudanças de papéis de uma mão para outra, não são o resultado de atividades comerciais, assinala Sader. Mas enquanto isso ocorre nos centros financeiros mundiais, no coração do sistema capitalista, na periferia ele descreve uma dinâmica diferente.
“Nas décadas de 80 e 90, a América Latina foi o laboratório mais avançado do neoliberalismo. O arco político da região aderiu em conjunto ao modelo e foi o primeiro a explicitá-lo. México, Brasil e Argentina foram as expressões mais claras disso”. Mas esse modelo entrou em crise, gerando fortes contradições.
Hoje, diz ainda Sader, a América Latina é “a única região com projetos de integração relativamente independentes dos Estados Unidos, condição necessária mas não suficiente para a ruptura com o modelo neoliberal”. Diante da crise de hegemonia, os países do subcontinente reagiram de diversas formas, de acordo com sua capacidade de reconstruir as forças para uma disputa de poder. Bolívia e Equador, segundo Sader, são exemplos de sublevação popular com saída eleitoral que permitiu refundar o Estado. Destacou que estes países “puderam recompor sua identidade porque tiveram menos penetração cultural do neoliberalismo, o modelo não deitou raízes”. Um fenômeno diferente do ocorrido no México, Chile e Argentina, onde se enraizou.
Sader destacou como modelo de integração independente a proposta da ALBA (Alternativa Bolivariana para os povos da América), impulsionada pela Venezuela. “Democratizar a economia é desmercantilizar”, defende o sociólogo brasileiro, como bandeira na luta anti-hegemônica. Ainda que não deixe de reconhecer a distância existente entre o sistema capitalista atual e um modelo que possa substituí-lo. “Existe um abismo entre o esgotamento do modelo atual e a aparição de outro ou outros. O panorama é contraditório. Mas o mundo novo é um modelo ainda não elaborado”, postulou.
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Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

SEMINÁRIO

A Escola de Formação Fé, Política e Trabalho da Diocese de Caxias do Sul, em parceria com o Instituto Humanitas – Unisinos está promovendo o:
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SEMINÁRIO “As eleições municipais no contexto do Brasil que queremos”
. Data: 6 de setembro de 2008 (sábado) .
Horário: 9h às 17 horas .
Assessoria: Prof. Dr. Osvaldo Biz – PUCRS e Prof. Dr. Laurício Neumann – Unisinos .
Participantes: Os que fizeram a Escola Fé, Política e Trabalho em 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 e o público em geral. .
Valor: Será cobrado o valor de R$ 10,00 (dez reais) aos participantes .
Inscrições: Pede-se a gentileza de confirmar a presença até o dia 04 de setembro pelo telefone 54-3211-5032 ou endereço eletrônico. .
Local: Centro de Pastoral Rua Emílio Ataliba Finger, 685 - Bairro Colina Sorriso - Caxias do Sul – RS Telefone: (54) 3211.5032 coord.pastoral@diocesedecaxias.org.br http://www.diocesedecaxias.org.br/

21.8.08

A nova utopia brasileira

O Brasil foi cativado, em décadas passadas, pela proposta do desenvolvimento econômico e das promessas que traria. Trouxe o que conseguimos que trouxesse, não tivemos força para impedir que o golpe militar imprimisse a esse fluxo de desenvolvimento outro caráter, centrando-o na exportação e no consumo de luxo.
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A economia retomou um ciclo expansivo, sob os fortes condicionamentos impostos pela ditadura – arrocho salarial, fechamento dos sindicatos, abertura da economia -, promovendo ao mesmo tempo um acelerado processo de concentração de renda, que fez do Brasil o pais mais injusto do mundo, o de pior distribuição de renda, isto é, uma ditadura não apenas políticas, mas a maior ditadura social do mundo, com a reprodução do acesso privilegiado aos bens materiais e espirituais pela mesma e restrita elite.
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Terminada a ditadura, a sociedade brasileira substituiu o objetivo do consumo proposto pela ditadura, pelo da democratização. Que acabou sendo um importante processo de recomposição do Estado de direito, com os outros direitos políticos correspondentes, porém sem democratização social e econômica. Ao contrário, a concentração de poder e de riqueza na terra, no sistema bancário, nos meios de comunicação – para citar apenas a alguns – se intensificaram. Isto se deu, em grande medida, porque ao invés de eleger pelo voto direto ao primeiro presidente civil do Brasil depois da ditadura, este se deu mediante a via espúria do Colégio Eleitoral, que consagrou uma fórmula que comprometia a democracia com os fortes resquícios do velho regime. Como resultado, a democratização foi política, mas se intensificou ainda mais a ditadura econômica e social que caracteriza o Brasil.
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Uma democracia formal foi facilmente capturada pelo neoliberalismo e serviu docilmente para a implantação do modelo mercantilizador, de afirmação do reino do dinheiro e do mercado contra a esfera dos direitos. FHC conseguiu, com o valioso auxilio da grande mídia privada, impor ao país o objetivo da estabilidade monetária como o central, no lugar do desenvolvimento econômico e social. A estabilidade se impôs, mas às custas da estagnação e do aumento da desigualdade e da injustiça no país.
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Lula foi eleito com os votos da decepção e da rejeição desses objetivos. Manteve o objetivo central da estabilidade monetária e quase sucumbiu, não tanto pelas denúncias da oposição, mas principalmente porque a economia não saía da recessão, apesar das promessas de Palocci de que finalmente se voltaria a crescer. Foi quando o governo passou a flexibilizar o modelo econômico, com as mudanças na equipe de governo – dente as quais a saída de Palocci foi a mais significativa -, e o acento novo nas políticas sociais, que o país começou a mudar, porque mudar significa retomar o desenvolvimento, intrinsecamente vinculado a ataques às situações de desigualdade, de injustiça e de falta de direitos da massa da população.
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A geração de uma nova utopia nacional passa pela construção democrática de um novo consenso nacional a favor da justiça, da superação das desigualdades, da universalização dos direitos – econômicos, sociais, políticos, culturais – a todos. Que o lema Brasil para todos se torne uma realidade em todos os planos, o que só será possível com a geração de novos espaços de informação e de debate mais além dos grandes monopólios privados da mídia mercantil, antagônicos a objetivos que favoreçam à grande maioria dos brasileiros.
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Uma nova utopia, de justiça social, requer a mudança do modelo econômico, que preserva a maior taxa de juros reais do mundo, freando as possibilidades de expansão econômica e favorecendo a consolidação do capital financeiro como hegemônico. Requer um imenso trabalho de organização social e política da enorme massa beneficiada pelas políticas sociais do governo, uma estreita articulação com os movimentos sociais, um empenho forte no fortalecimento do campo da imprensa alternativa, até porque sem democratização dos meios de comunicação, nunca chegará a haver uma democracia com alma social no Brasil.
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Uma alternativa de esquerda terá muita dificuldade para triunfar, apenas baseada nos efeitos positivos das políticas sociais do governo. Os adversários já prometem se camuflar em um “pós-lulismo”, conscientes da dificuldade de ser “anti-lula”, dificultando a configuração de um campo nítido de forças que possa configurar um governo claramente posneoliberal. Este terá que personificar o contraponto claro do neoliberalismo: a centralidade da luta pela justiça social, contra a desigualdade, pela extensão universal da esfera dos direitos. . Postado por Emir Sader - 10/08/2008 às 13:45

Fernando Lugo e o novo Paraguai

A eleição de Fernando Lugo como presidente do Paraguai inaugura um processo de transformações, deslocando do poder ao Partido Colorado depois de 71 anos, por um processo eleitoral, realizado em 10 de abril deste ano.
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A candidatura do ex-bispo mobilizou os amplos setores que haviam estado marginalizados do sistema político paraguaio. Sua figura simboliza o descontentamento e a crise final do regime político colorado, mas as estruturas de poder – corruptas, clientelistas – sobreviveram.
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Agora se inaugura finalmente um processo de transição democrática, em que a liderança de Lugo simboliza todas as esperança de transformações. A coalizão de partidos que o elegeu e apóia a seu governo é muito heterogênea, inclui desde o tradicional Partido Liberal, principal força opositora aos governos colorados, moderado, que representa a grandes produtores rurais e também a setores médios, com profundas contradições internas.
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Participam os liberais com postos chave no governo de Lugo, além de se constituírem na principal força parlamentar de que depende o novo presidente. . Postado por Emir Sader - 18/08/2008 às 07:05

A dignidade de Allende

Mais de uma vez eu ouvi Salvador Allende utilizar duas citações de sua preferência. Uma de um poema de Antonio Machado: “Caminante, no hay camino, se hace camino al andar". A outra, a dedicatória do Che em um livro que este lhe deu de presente: “Para Salvador, que luta por outros meios pelos mesmos objetivos”. A combinação de ambos permite perceber como Allende dedicou sua vida política à busca de um novo caminho estratégico para a esquerda.
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Um caminho que ele mesmo tinha ajudado a construir quando, como jovem médico, foi ministro da Saúde do governo da Frente Popular, no final dos anos 30 do século passado. Um caminho que tinha se iniciado muito antes, em 1830, com uma continuidade institucional inédita não apenas no nosso continente, que só foi interrompida em 1891 e entre 1927 e 1931, antes do golpe de 1973, em processos de alternância, que fazia crer que o vencedor nas eleições poderia cumprir seu mandato. Foi acreditando nessa legitimidade institucional que Allende se propôs liderar um processo de transição institucional ao socialismo.
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Ele não poderia imaginar a cena final do golpe militar, com Allende cercado no Palácio de La Moneda, bombardeado por aviões, empunhando um fuzil soviético que lhe havia presenteado Fidel e capacete recebido de trabalhadores mineiros chilenos. Era o último homem a defender a democracia, entregando a vida pelo mandato que havia jurado cumprir até o final ou morrer na sua defesa.
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Sua tentativa era difícil, porque foi eleito com um programa anticapitalista, que se centrava na nacionalização dos 150 maiores conglomerados econômicos, recebendo porém apenas 34% dos votos. Ao não conseguir incorporar um setor significativo da esquerda da Democracia Cristã, o bloco socialista-comunista ficou isolado, conseguiu, pouco meses antes do golpe, depois de um brutal campanha interna e externa contra, 44% dos votos. A alternativa que tinha Allende era a de tentar avançar o programa socialista com o qual tinha sido eleito ou abandoná-lo, por não dispor de maioria, porém traindo os votos que o tinham eleito.
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Allende pretendia que o executivo conquistado na eleição, introduzisse uma cunha no aparato de Estado, que permitisse ir ampliando-se, gerando um instrumento de poder de transformação anticapitalista. O que aconteceu foi o contrário: Allende foi cercado e afogado dentro do aparato estatal, pelas outras instâncias – o Parlamento, o Judiciário, a burocracia e as Forças Armadas.
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O golpe militar de Pinochet encerrou a longa tradição democrática chilena, com a ditadura militar destruindo o movimento popular e a institucionalidade do país, em todas as suas dimensões. De símbolo de um projeto de transição democrática ao socialismo, o Chile passou a ser exemplo mundial de regime de terror. E o país, que era um dos menos desiguais no continente, passou a ser aproximar do pólo oposto, tornando-se um dos mais injustos.
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Os 100 anos do nascimento de Allende merecem ser comemorados pela dignidade da sua vida e da sua luta. .
Postado por Emir Sader - 10/08/2008 às 17:44

Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz