Páginas

pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

31.1.12

Altamiro Borges: Greve de fome em frente à TV Globo

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

 

Greve de fome em frente à TV Globo

 

Por Jéssica Oliveira, no sítio do Portal Imprensa:

Pedro Rios Leão não se considera jornalista. Cursou rádio e TV, não concluiu, mas usa sua câmera para noticiar e denunciar assuntos de interesse público, tentando chamar atenção da sociedade e da grande mídia. Nas últimas semanas, isso não bastou. Desde às 18h do último domingo (29), Rios está algemado e faz greve de fome em frente à sede da Rede Globo, no Rio de Janeiro. Mais do que um protesto, reivindica transparência da imprensa sobre a reintegração de posse ocorrida na comunidade do Pinheirinho, em São José dos Campos, interior de São Paulo. A ação foi criticada por inúmeras entidades e associações de defesa de direitos humanos.

À Imprensa, o carioca explicou que veio a São Paulo para acompanhar a ação na comunidade, mas não imaginava que ficaria tão perturbado com o que viu, nem que isso mudaria completamente sua rotina dali em diante. "Aquilo foi um latrocínio, uma chacina cometida pelo governo do Estado de São Paulo, a mando do Naji [Nahas, que reclamou a posse do terreno]. Nunca fiquei tão assustado na minha vida", disse. Depois disso, com as imagens feitas por sua câmera, tentou chamar atenção da imprensa.

Rios afirma que houve mortes na reintegração de posse e que, além dessas notícias não serem divulgadas, tanto o Naji Nahas, como governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o banqueiro Daniel Dantas representam um risco a sociedade e deveriam ser presos imediatamente por violação dos direitos humanos. "Esse caso não é uma questão de provas. A única coisa que pode fazê-los saírem impunes, é a imprensa abafar o caso. Eu espero que algum veículo de imprensa tenha a decência de falar o que aconteceu lá. Porque até agora, o que a imprensa, o governador, e o prefeito de São José fizeram, foi ridicularizar com a nossa cara”, desabafou.

O carioca afirma que nunca foi de partido político, nem de fazer militância, mas que dessa vez não teve como ficar sem fazer nada. "Já estava sem conseguir comer e dormir em casa. Tinha que tentar algo", conta. Algemado há quase três dias em frente a emissora, Rios disse não conhecer ninguém específico na Globo, mas mesmo assim tem sido bem tratado pelos repórteres e pelo comércio local. "Alguns repórteres passam meio constrangidos. Acredito que seja um assunto na hora do almoço. É isso que eu quero, que a sociedade civil discuta isso", diz. "Eu espero que os jornalistas passem por mim e pensem 'eu estou acobertando assassinato de crianças'", disse.

Sobre sair do local, Rios é claro. "Só pretendo sair daqui quando as pessoas começarem a perder a cabeça e tomarem atitudes. O mínimo é o Governo Federal intervir no caso", explica.

Críticas

Em dois vídeos postados no youtube, Rios critica a imprensa. Em um deles, diz que é muito importante que os jornalistas se manifestem, "porque cada minuto de silêncio deles, é uma vítima que pode ter desaparecido. E eles sabem disso". Em outro, critica o fato de jornalistas o questionarem se há provas de suas denúncias. "Se algum jornalista tivesse pisado em São José, não teria coragem de exigir provas".

 

Miro

 

http://altamiroborges.blogspot.com/2012/01/greve-de-fome-em-frente-tv-globo.html?spref=tw

 

Altamiro Borges: Fernando Morais versus Yoani Sánchez

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

 

Fernando Morais versus Yoani Sánchez

Por Altamiro Borges

Conhecido defensor de Cuba e um dos jornalistas mais renomados do Brasil, autor do clássico “A Ilha” e do recém-lançado “Os últimos soldados da guerra fria”, Fernando Morais não se curva diante do endeusamento midiático da dissidente Yoani Sánchez. De Porto Alegre, onde participou do Fórum Social Temático, ele foi taxativo: “Não mexerei um palito pela blogueira cubana”.

O motivo é simples. Para ele, toda a campanha midiática em defesa de Yoani Sánchez e as críticas à revolução cubana “só ajudam o inimigo” – os Estados Unidos, que mantêm um criminoso bloqueio à ilha. “Sou defensor da liberdade de expressão. Mas, em primeiro lugar, defendo o direito de 11 milhões de cubanos que estão sendo espezinhados pelos americanos”.

Sem inocência diante dos EUA

Fernando Morais participou de um debate na sexta-feira (27) sobre o seu novo livro, “Os últimos soldados da guerra fria”, que trata da prisão e condenação nos EUA dos cinco cubanos que investigavam as ações terroristas da máfia de Miami. Ele conhece a fundo as provocações patrocinadas e financiadas pelo império contra a revolução cubana e não se ilude com o alarde midiático.

“Já perdi a inocência com os Estados Unidos. Na política externa, não faz a menor diferença se é democrata ou republicano. Quem meteu os americanos nas piores aventuras externas foram os democratas”, argumentou. Para ele, o governo Obama “não mudou absolutamente nada” nas relações com Cuba e mantém o bloqueio, as provocações e os subsídios à conspiração na ilha.

Em defesa da soberania cubana

“Em nome das minhas convicções, não posso apoiar uma moça que vem dedicando sua vida a combater a revolução. Eu não vou mexer um palito para que essa moça venha ao Brasil”, concluiu. Fernando Morais reconhece que há erros e limitações em Cuba, mas afirma que isto não justifica as tentativas do império para derrubar o regime cubano, ferindo sua soberania e independência.

Miro

 

http://altamiroborges.blogspot.com/2012/01/fernando-morais-versus-yoani-sanchez.html?spref=tw

O Caso Pinheirinho: um desafio à cultura nacional

O Caso Pinheirinho: um desafio à cultura nacional

 

Jorge Luiz Souto Maior(*)

 

Eu não tenho onde morar
É por isso que eu moro na areia

 

Eu nasci pequenininho
Como todo mundo nasceu
Todo mundo mora direito

Quem mora torto sou eu

 

(Dorival Caymmi - Eu Não Tenho Onde Morar - 1960)

 

O que aconteceu na localidade conhecida por Pinheirinho, em São José dos Campos, município que possui um dos maiores orçamentos "per capita" do Brasil, pode ser considerado uma das maiores agressões aos Direitos Humanos da história recente em nosso país.

 

Querem dizer que tudo se deu em nome da lei, mas com tal argumento confere-se ao Direito uma instrumentalidade para o cometimento de atrocidades e, pior, tenta-se fazer com que todos os cidadãos sejam cúmplices do fato. Só que o Direito não o corrobora. Senão vejamos.

 

Na base jurídica do ato cometido está, dizem, o direito de propriedade. Um terreno foi invadido, obstruindo-se o direito da posse tranqüila ao seu titular, e, portanto, precisa ser desocupado. Simples assim...

 

Mas, o direito de propriedade, conforme previsto constitucionalmente, deve atender à sua função social (art. 5º. XXIII, da CF). Sem esse pressuposto nenhum direito de propriedade pode ser exercido.

 

A Constituição, ainda, garante a todos os cidadãos, como preceito fundamental, o direito à moradia (art. 6º, inserto no Título II, do Capítulo II, da CF).

 

Desse ponto de vista, a ocupação, para fins de moradia, de uma terra improdutiva, abandonada, sobre a qual o proprietário não exerce o direito de posse, que não serve sequer ao lazer e que pela sua localidade e tamanho precisa, necessariamente, atender a uma finalidade social, não é mera invasão. Trata-se, em verdade, de uma ação política que visa pôr à prova a eficácia dos preceitos constitucionais, cabendo esclarecer que essa não é uma temática exclusiva do meio rural já que as normas jurídicas mencionadas não fazem essa diferenciação e também a Constituição de 1988 passou a admitir o usucapião de imóveis urbanos (art. 183).

 

Assim, diante de uma ocupação dessa natureza compete ao proprietário, que pretenda recuperar a posse da terra, com o pressuposto que de fato a exerça, demonstrar que sua propriedade cumpre uma função social, tendo direito, inclusive, a uma decisão liminar, proferida logo no início do processo judicial, quando o esbulho tenha ocorrido a menos de um ano e um dia da propositura da ação possessória. Vale reforçar: como fundamento da ação não basta demonstrar o título de propriedade. Deve-se demonstrar a posse e provar que a propriedade cumpre uma função social. Do contrário, a ocupação representa uma desapropriação indireta do imóvel, que recupera a função social da propriedade, agindo o particular em substituição ao Estado, que se mostra inerte em duplo sentido: no aspecto da realização de políticas públicas efetivas de construção de moradias dignas para todos; e no que tange à exigência plena das finalidades sociais das propriedades privadas. Nesse caso, confere-se ao proprietário a possibilidade de acionar judicialmente o Estado para pleitear o recebimento de indenização equivalente ao valor de mercado do imóvel, que, então, deve ser desapropriado para atender sua função social. Vide, a propósito, decisão proferida no Processo n. 1.0000.00.271812-0/000(1), da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator Des. Garcia Leão, que julgou procedente o pedido do proprietário de receber indenização do Estado pela desapropriação. Quando propriedades rurais ou urbanas, cuja posse não é exercida por seu titular, e que não atendem função social alguma, estando apta a tanto, passam a ser ocupadas por cidadãos que não têm onde morar, também os respectivos proprietários são atingidos pela inércia do Estado, vez que só existem cidadãos prontos para o ato em questão porque o Estado não cumpre a sua obrigação constitucional.

 

Várias, são, aliás, as decisões da Justiça do Estado de São Paulo no sentido da afirmação da função social da propriedade, aplicada em situações análogas à do Pinheirinho. Em sentença proferida pelo juiz Amable Lopez Soto, em janeiro de 2006, nos autos do processo n. 007.96.318877-9, em trâmite na Vara Cível do Fórum Regional VII de Itaquera, restou consignado:

 

Ocorre que hoje a área transformou-se em um dos muitos bairros pobres de São Paulo, logo, a partir da inação do Estado em criar as condições de moradia para milhares de pessoas que vivem na rua, sem teto próprio, estas, por extrema necessidade, acabaram por praticar o ato de desapropriação indireta do imóvel, repartindo o espaço de forma a permitir uma moradia minimamente digna.

A partir da inação do Estado parte da população fez uso de um dos instrumentos que, a princípio, só ao Estado é permitido, o de desapropriação indireta de área que não cumpria sua função social.

 

Ao final, julgando improcedente o pedido de reintegração, concluiu:

 

Enfim, o que se tem nestes autos é uma verdadeira impossibilidade de reintegração de posse ante o tempo e a situação hoje existente, cabendo ao autor, como forma de não se empobrecer sem justa causa e, ante a responsabilidade do Estado, propor a ação de reparação que permita recompor, pela via da indenização, seu patrimônio.

 

No corpo de sua sentença, Amable cita várias outras decisões com igual teor.

 

a)

O particular que tem sua propriedade invadida por mais de cinco mil pessoas que, se desalojadas, não terão para onde ir, deve buscar do Poder Público a indenização a que faz jus decorrentes da desapropriação indireta. Entretanto, a reintegração de posse não deve ser deferida, em homenagem ao princípio da função social que a propriedade tem, nos termos do art. 2º, IV, da Lei 4.132/62 e art. 5º, XXIII, da Constituição Federal.

(....)

...tecnicamente a sentença não merece reparos. Mas o direito evolui, situação que, particularmente, atingiu o direito de propriedade. Não é mais possível idealizar a proteção desse direito no interesse exclusivo do particular, pois hoje princípios da função social da propriedade aguardam proteção mais efetiva. Não fora isso, a função do Judiciário, de solucionar conflitos de interesse, não pode desprezar a necessidade de por fim ao embate posto nos autos, mas de impedir, com a decisão dada, que outras lides venham a acontecer.

Está em estudo um litígio entre um particular que teve suas terras inutilizadas invadidas e um grupo de mais de cinco mil famílias que ali se instalaram por não ter outro lugar para ficar.

Retiradas do local, por certo deverão ocupar outro. Se particular, novo conflito será criado. Se públicas, também o Poder Público, em tese, tem direito de recuperá-las. O certo é que, para qualquer local onde sejam essas pessoas levadas, o mesmo problema que aqui aparentemente se resolve será novamente criado. Sequer condenar os requeridos a flutuar é possível, pois em tese o espaço aéreo sobre um imóvel pertence ao dono da superfície (art. 526 do CC).

Quando o Poder Público, responsável pela proteção de todos os cidadãos, inclusive dos aqui requeridos, permite durante muito tempo que muitos se instalem em determinado local, há de ser reconhecida a desapropriação indireta. É o sacrifício do um proprietário, indenizado, entretanto, por toda a sociedade, que servirá de solução a um conflito que se eternizaria com a simples determinação de sua desocupação.

Entendido que o imóvel foi, de forma indireta, desapropriado, não caberia a ação possessória que tem por finalidade recuperar a posse em decorrência da propriedade. Mas, tendo havido perda desta, para o interesse público em disputa, a pretensão deve ser tão somente indenizatória contra o Poder Público responsável pela política urbana.

Os bens indiretamente expropriados, porque aproveitados para fins de necessidade, utilidade pública, ou de interesse social, não podem ser reavidos in natura, impossível vindicar o próprio bem, a ação cujo fundamento é o direito de propriedade, visa, precipuamente, à prestação do equivalente da coisa desapropriada, que é a indenização... (STF, RTJ 61/389). (José Luis Gavião de Almeida, Acórdão proferido na apelação n. 823.916-7, J. 27/08/02 – RT 811/243):

 

b)

A Prefeitura do Município, reconhecendo a existência do problema social ínsito nesta ação e em duas outras de áreas contíguas que tramitam nas duas outras varas cíveis deste foro, ajuizou ação de desapropriação ora em trâmite na 5ª Vara da Fazenda Pública.

Pretende-se regularizar a situação de fato já consolidada no tempo (os réus ocupam o imóvel, no mínimo, desde 1.994), mediante pagamento de indenização a quem de direito.

Não é razoável que para proteção da posse de uma empresa seja destruído um bairro inteiro numa verdadeira operação de guerra, desencadeada pelo Estado, quando existe outra solução mais afinada com o interesse social, isto é, a desapropriação do imóvel com o pagamento da indenização a quem faça. (Magistrado Mário Dacache, autos do processo n. 2.122/95, juízo cível do Fórum Regional VII de Itaquera)

 

c)

No caso dos autos a coisa reivindicada não é concreta, nem mesmo existente. É uma ficção.

Os lotes de terreno reivindicados e o próprio loteamento não passam, há muito tempo, de mera abstração jurídica. A realidade urbana é outra. A favela já tem vida própria, está, repita-se, dotada de equipamentos urbanos. Lá vivem muitas centenas, ou milhares de pessoas. (…) Lá existe uma outra realidade urbana, com vida própria, com os direitos civis sendo exercitados com naturalidade. O comércio está presente, serviços são prestados, barracos são vendidos, comprados, alugados, tudo a mostrar que o primitivo loteamento só tem vida no papel. (…).

Loteamentos e lotes urbanos são fatos e realidades urbanísticas. Só existem, efetivamente, dentro do contexto urbanístico. Se são tragados por uma favela consolidada, por força de uma certa erosão social, deixam de existir como loteamento e lotes.

A realidade concreta prepondera sobre a 'pseudo-realidade jurídico-cartorária'. Esta não pode subsistir em razão da perda do objeto do direito de propriedade. Se um cataclisma, se uma erosão física, provocada pela natureza, pelo homem ou por ambos, faz perecer o imóvel, perde-se o direito de propriedade.

É verdade que a coisa, o terreno, ainda existe fisicamente.

Para o direito, contudo, a existência física da coisa não é fator decisivo, consoante se verifica dos mencionados incisos I e III do art. 78 do CC (de 1.916). O fundamental é que a coisa seja funcionalmente dirigida a um finalidade viável, jurídica e economicamente. Pense-se no que ocorre com a denominada desapropriação indireta. (…)

Por aí se vê que a dimensão simplesmente normativa do Direito é inseparável do conteúdo ético social do mesmo, deixando a certeza de que a solução que se revela impossível do ponto de vista social é igualmente impossível do ponto de vista jurídico. (…)

O princípio da função social atua no conteúdo do direito. E, dentre os poderes inerentes ao domínio, previstos no art. 524 do Código Civil (usar, fruir, dispor e reivindicar), o princípio da função social introduz outro interesse (social) que pode não coincidir com os interesses do proprietário. (…)

Assim, o referido princípio torna o direito de propriedade, de certa forma, conflitivo consigo próprio, cabendo ao Judiciário dar-lhe a necessária e serena eficácia nos litígios graves que lhe são submetidos" (apCiv. 212.726-1-8-SP, j.  16.12.1994, Desembargador José Osório)

 

Não se pode esquecer, ademais, que o Estado atual é o Estado de Direito Social e neste sentido rege-se, juridicamente, pela obrigação de garantir a eficácia dos direitos sociais, constitucionalmente consagrados, não lhe cabendo, portanto, assegurar o direito de propriedade numa perspectiva meramente liberal, até porque também esse direito está vinculado a cumprir uma função social e isso não é retórica, tratando-se de expressão inequívoca da lei.

 

Em resumo, instalado um tal conflito de ocupação, cabe ao Estado assumir sua responsabilidade perante o problema, desapropriando o imóvel para o fim de integrá-lo a um projeto habitacional, e não fingir que não faz parte do problema, vendo a situação como mero embate entre particulares e, pior, impor uma solução que atenda, exclusivamente, o interesse do direito de propriedade, numa perspectiva liberal, passando por cima de vários outros valores integrados ao ordenamento jurídico como Direitos Fundamentais.

 

No caso do Pinheirinho o que se viu foi um profundo desrespeito à ordem jurídica.

 

Entendamos o caso: em 2004, em São José dos Campos, um terreno urbano de um milhão e trezentos mil metros quadrados, foi ocupado por algumas famílias, para fins de moradia. O terreno pertencia a uma empresa falida, Selecta, e estava abandonado. Até antes da ocupação o terreno não cumpria função social alguma. As famílias em questão eram vítimas do "déficit" imobiliário daquele município, numa situação inconcebível, já que São José dos Campos é uma das cidades mais ricas do Brasil.

 

Não se tratou, pois, de mera invasão, mas de ato político organizado para extrair o Estado de sua inércia e para buscar a eficácia dos preceitos constitucionais do direito à moradia e da função social da propriedade. Não se tratou, igualmente, de ato de pessoas espertas, que quiseram se aproveitar da situação, passando à frente na fila dos milhões de brasileiros que também não têm onde morar, pois, como bem ponderou Ricardo Boechat, comentando o assunto, nenhum esperto tem como projeto de vida morar em um terreno ocupado, em precárias condições habitacionais. Os espertos estão em outros lugares, bem mais confortáveis, por certo. Os ocupantes do Pinheirinho são, ao contrário, pessoas injustiçadas e sofridas, vítimas da inércia de governantes que insistem em tratar as estruturas do Estado fora da perspectiva do Direito Social e do respeito aos Direitos Humanos. Claro, como insistiram em mostrar os autores da agressão, lá também havia consumidores de drogas e até alguns objetos frutos de furto, mas isso em nada altera a configuração jurídica refletida na situação, até porque drogas se consumem, infelizmente, por todos os cantos e o encontro de objetos furtados não representa, por si, identificação de autoria do crime e, de todo modo, a pena pelo furto não é a perda do direito à moradia. É forçoso reconhecer, portanto, que aquelas pessoas foram vitimadas pela histórica péssima distribuição de renda que reina em nosso país. Nossa profunda injustiça social está na base do fenômeno e não pode ser negligenciada.

 

Mas, admitamos que toda essa análise jurídica esteja errada, que nada disso justifique o ato cometido pelos cidadãos que se tornaram, pela ocupação, moradores do Pinheirinho. Partamos do princípio de que um erro não justifica o outro e que não se corrige a ilegalidade da inércia do Estado com outra ilegalidade, cometida pelo particular. Reconheçamos, enfim, que houve um ato ilegal pela "invasão" e que a autoridade do ordenamento jurídico precisava mesmo ser recomposta.

 

O problema é que para que a recomposição da realidade anterior todas as inserções jurídicas do fato consumado precisavam ser consideradas. Quando se coloca em pauta a autoridade do ordenamento jurídico é do todo jurídico que se fala e não de um aspecto único e isolado. Assim, mesmo abstraindo as noções de que a ocupação para moradia não se trata de mera invasão e de que a retomada da posse precisa passar pelo crivo da avaliação da função social da propriedade, a efetivação do direito do proprietário de reaver a posse do imóvel deve ser confrontado com outros direitos que porventura estejam em jogo na situação fática existente.      O ato da reintegração, por conseguinte, não pode ser feito de forma a atingir a integridade física das pessoas, mesmo se tratadas, juridicamente, como "invasoras", conforme já fixado pelo STJ em decisão proferida em pedido de intervenção federal no Estado do Mato Grosso, requerida pela Massa Falida de Provalle Incorporadora Ltda, por não haver o Governador daquela unidade federativa atendido requisição de força policial do Juízo de Direito da Vara de Falências e Concordatas de Goiânia - GO - para dar cumprimento a mandado de reintegração de posse em área de 492.403m²:

 

EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL. INTERVENÇÃO FEDERAL. ORDEM JUDICIAL. CUMPRIMENTO. APARATO POLICIAL. ESTADO MEMBRO. OMISSÃO (NEGATIVA). PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PONDERAÇÃO DE VALORES. APLICAÇÃO. 1 - O princípio da proporcionalidade tem aplicação em todas as espécies de atos dos poderes constituídos, apto a vincular o legislador, o administrador e o juiz, notadamente em tema de intervenção federal, onde pretende-se a atuação da União na autonomia dos entes federativos. 2 - Aplicação do princípio ao caso concreto, em ordem a impedir a retirada forçada de mais 1000 famílias de um bairro inteiro, que já existe há mais de dez anos. Prevalência da dignidade da pessoa humana em face do direito de propriedade. Resolução do impasse por outros meios menos traumáticos. 3 - Pedido indeferido. (INTERVENÇÃO FEDERAL Nº 92 - MT (2005⁄0020476-3) - RELATOR: MINISTRO FERNANDO GONÇALVES)

 

No caso Pinheiro esse entrelace de direitos foi solenemente ignorado, a começar pelos aspectos processuais. A ação política da ocupação do terreno teve início em 2004. No mesmo ano, o proprietário do imóvel, a Massa Falida da empresa Selecta, ingressou com a ação de reintegração, mas não obteve decisão liminar favorável à sua pretensão. Interpôs, então, recurso denominado agravo de instrumento, tendo conseguido, junto à 16ª. Câmara do Tribunal de Justiça, a concessão da liminar para a reintegração. Mas, tal decisão, em virtude de vícios processuais formais, foi cassada, mediante mandado de segurança, impetrado pelos moradores. O processo, então, prosseguiu seus trâmites normais, com diversos embates jurídicos, sendo que em 2010 a nulidade do meio processual utilizado pela Massa Falida para tentar reformar a decisão que negou a liminar foi confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça, prevalecendo, então, a decisão inicial, que negou a liminar de reintegração.

 

Nesse meio tempo, a ocupação foi se organizando ainda mais e se consolidou com a constituição de uma Associação de Moradores, que urbanizou o local com a formação de ruas, praças e a divisão do terreno em lotes com 250 metros quadrados, obedecendo-se, ainda, a regra, fixada pela Associação, de uma família por terreno. Formou-se no lugar um autêntico bairro, com novos moradores, pessoas oriundas da comunidade local, São José dos Campos, trabalhadores com ocupações diversas e também, é claro, desempregados, que para lá se dirigiam e investiam na construção de suas casas, agindo de tal forma, com boa-fé, principalmente em razão do aceno dado pelas três esferas do poder, Federal, Estadual e Municipal, em torno da possibilidade concreta da regularização da situação. Representantes das esferas do Poder visitaram por diversas vezes a comunidade.

 

E, de repente, em julho de 2011, uma nova juíza atuando no processo, tendo ciência da definição da questão pelo STJ, que consolidava a situação favorável aos moradores, concede liminar para a reintegração de posse, sem motivação específica baseada em fato novo.

 

É isso mesmo! O que se viu no Pinheirinho teve por fundamento uma decisão liminar, concedida sete anos e meio depois do ingresso da ação de reintegração, não se considerando a alteração fática havida no local, que, em verdade, apenas reforçava as razões para a rejeição da reintegração, ainda mais em sede de decisão liminar. É evidente, pois, a impropriedade da medida, de caráter liminar, insista-se, diante do tempo já decorrido, que eliminou a urgência para esse tipo de solução para um conflito tão complexo, estando, ademais, ultrapassado, há muito, o requisito do ano e dia, e, sobretudo, em razão da profunda alteração fática advinda no local desde o início do processo. Segundo o Censo realizado pela própria Prefeitura de São José dos Campos, já viviam no local 1.577 famílias, ou, mais precisamente, 5.488 pessoas, sendo 2.615 com idade entre 0 e 18 anos. Além disso, o assentamento, ou bairro como também era tratado, continha 81 pontos comerciais, seis templos religiosos e um galpão comunitário.

 

Bem se vê que a questão envolvia um feixe enorme de direitos, não estando em jogo única e exclusivamente o direito de propriedade da Massa Falida. Assim, ainda que fosse para privilegiar o direito de propriedade da Massa Falida, sem a necessidade de justificá-lo pelo pressuposto da finalidade social, haver-se-ia, no mínimo, que assegurar que outros direitos não fossem, simplesmente, desprezados.

 

O ato da desocupação, portanto, mesmo se considerada legítima, deveria ser precedido de uma organização tal que permitisse a preservação dos demais direitos envolvidos. Ainda que os moradores se apresentassem armados, dispostos a lutar contra a ordem judicial, as negociações, com todos os meios institucionais possíveis, deveriam conduzir à solução da situação. E, ademais, era o que se anunciava, tanto que a própria Massa Falida assinou documento, levado ao processo da falência, aceitando a prorrogação da efetivação da ordem de reintegração. No Pinheirinho houve até festa para comemorar a reabertura das negociações, que não se encaminhavam, propriamente, em torno da forma de reintegração, mas na direção, enfim, da desapropriação por atuação direta da Federação, o que talvez não interessasse aos propósitos especulativos locais e às pretensões eleitorais dos governos do Estado e do Município.

 

Assim, o que se verificou na seqüência, já no dia seguinte, foi uma reviravolta inexplicável da postura do Judiciário frente às possibilidades de negociação e a utilização da "trégua" como estratégia para desarmar os moradores, possibilitando a concretização da violência policial, típica de uma guerra, contra os cidadãos do Pinheirinho, ação esta que já estava preparada, por certo, há muitos dias, diante de seu vulto, e que vai ficar para os anais da nossa história, em razão dos efeitos produzidos, como uma das maiores aberrações humanitárias já vistas, ainda que os seus comandantes a queiram apontar como uma ação "limpa", conforme assinalado pelo juiz Rodrigo Capez, assessor da presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo: "Pelo Poder Judiciário, representando a presidência do TJ, gostaríamos de expressar nosso agradecimento pelo belo trabalho executado pela Polícia Militar. Uma ação bem planejada e muito bem executada. Para aqueles que imaginavam que haveria um novo Eldorado do Carajás, um massacre, essa ação limpa demonstrou que esses temores eram absolutamente infundados. Hoje se cumpre a reintegração de posse" (http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/01/25/pm-e-justica-restituem-posse-de-pinheirinho-e-exaltam-operacao.htm).

 

Em concreto, o Poder Judiciário e o Governo do Estado de São Paulo se uniram contra os moradores do Pinheirinho, tratando-os como inimigos. Não cola o argumento da defesa da legalidade e do resgate da autoridade do ordenamento jurídico, como visto. E mesmo que houvesse, repita-se, por que, depois de quase oito anos de uma situação consolidada, em que um terreno baldio, que servia à especulação imobiliária, foi transformado em um bairro de moradores de baixa renda, teve-se tanta pressa para devolver a posse do terreno à Massa Falida? Por que, para chegar a esse objetivo, mobilizar 2.000 Policiais Militares, helicópteros, cães e armas de todo tipo (ainda que menos letais)? Por que expulsar, de forma abrupta e violenta, pessoas de suas casas na calada da noite de um domingo, fazendo com que essas pessoas deixassem para trás seus pertences, utensílios, roupas e até documentos? Por que fazer tudo isso sem qualquer preocupação com a condição humana dessas pessoas, conduzindo-as a abrigos improvisados, sem condições minimamente dignas de sobrevivência? (As imagens dos abrigos falam por si e tendo constatado a situação "in loco" posso assegurar que as imagens não refletem o total drama vivido por aquelas pessoas). Por que submeter essas pessoas, nos abrigos, ao uso de pulseiras com cores diferentes, para que pudessem ser identificadas como moradoras do Pinheirinho? Por que deixarem crianças e jovens assistirem tamanha brutalidade contra seus pais? Que mal essas crianças cometeram? Que tamanho mal, ademais, cometeram todos aqueles que lá estavam à procura de um lugar para morar, sendo certo que não era um lugar nenhum pouco glamoroso? Por que passar um trator por cima das casas e estabelecimentos comerciais que foram construídos no local ao longo de oito anos de consolidação do bairro?

 

Tudo isso para entregar o terreno a uma Massa Falida, que nunca se preocupou com a função social daquela propriedade e que certamente não vai exercer a posse sobre o terreno?

 

Ora, em nenhuma ponderação de valores que se faça da situação vivenciada, atendendo os pressupostos da razoabilidade e da proporcionalidade, vai se chegar ao peso que foi dado ao interesse da Massa Falida, valendo acrescentar que a empresa em questão, Selecta, proprietária do imóvel, também ela, nunca cumpriu qualquer função social, jamais tendo produzido um alfinete sequer, vez que foi constituída apenas para servir de fachada nas intermediações de negociações imobiliárias das empresas de um grupo econômico. No processo de falência respectivo, inclusive, não há credores trabalhistas ou quirografários. O único credor é o próprio Estado, sobretudo o Município de São José dos Campos, com relação à dívida de IPTU, em torno de R$14.000.000,00 (quatorze milhões de reais).

 

Alguma razão não muito clara, que pode ser, por hipótese, um melindre entre as esferas de Poder Estadual e Federal, já que uma autorizava a reintegração e a outra a recusava, ou que pode ser a necessidade do governo estadual de afirmar sua autoridade diante dos movimentos sociais, sobretudo diante do alcance eleitoral que a questão atingiu, foi determinante para que a Justiça Estadual, em ato que chegou a ser reivindicado pelo Presidente do Tribunal, que enviou assessor direto para cuidar do assunto, passasse por cima de todos os Direitos Humanos envolvidos e determinasse a reintegração da posse, sendo auxiliada, com a maior presteza possível, pelo governo Estadual, que, com a intervenção direta do próprio governador, autorizou a instauração de uma ação de guerra contra os cidadãos do Pinheirinho.

 

É isso mesmo! Os nossos co-cidadãos foram vítimas de uma ação militar típica de guerra, que foi programada durante quatro meses, conforme reconheceu, em recente entrevista, a juíza do processo de reintegração, e que, por isso mesmo, precisou ser executada passando por cima até do acordo judicial assinado pelas partes, no processo da falência, em torno da suspensão da reintegração. E um dado extremamente importante deve ser destacado, que torna a origem da ação policial, a mando do Estado de São Paulo, ainda mais questionável: em entrevista ao Jornal, O Vale, a juíza do processo de reintegração, que concedeu a liminar, confessou que o ato policial não estava plenamente sob o seu controle e que sabia dos riscos que estava impondo aos moradores do Pinheirinho. Disse ela, textualmente: "A operação me surpreendeu, positivamente."

 

Seja como for, o fato é que os cidadãos do Pinheirinho foram tratados como inimigos do Estado. Foram presos sem processo, já que ficaram várias horas impossibilitados de sair do assentamento, enquanto a Polícia mantinha luta aberta contra moradores do bairro vizinho que se insurgiram contra ação policial intentada no local. Foram marcados como se estivessem em um campo de concentração. Foram desalojados. Foram conduzidos, por força, a um local inabitável, sem qualquer condição de higiene, não tendo havido, inclusive, qualquer cuidado especial com crianças, idosos e doentes. Ou seja, foram profundamente agredidos em sua dignidade. Registre-se, a propósito, que se trata de Princípio Fundamental da República Federativa do Brasil a proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º. III, CF) e que constituem objetivos fundamentais da República "construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação" (art. 3º., CF), valendo lembrar, ainda, que o Brasil deve reger-se nas suas relações internacionais pela "prevalência dos direitos humanos" (art. 4º. II, CF).

 

Os moradores do Pinheirinho, inclusive, tiveram o seu direito de propriedade, com relação aos seus pertences, desrespeitado e continuam, ainda hoje, sem que o Estado reconheça sua responsabilidade quanto ao problema do qual tudo se originou: a ausência de moradia.

 

Em concreto, aquelas pessoas, que de boa-fé puderam acreditar em um projeto de vida, por mais precário que fosse, com a formação do Pinheirinho, estão agora mendigando local para se alojar e, de certo modo, estão sendo tratadas como animais.

 

E o pior disso tudo é que essa situação foi imposta pelas forças institucionalizadas do Estado, cuja função seria a de, em primeiro plano, proteger o cidadão. E, ademais, quem vai pagar pela operação realizada? Os custos da operação serão calculados e inseridos no processo? Certamente não e a sociedade como um todo, portanto, arcará com a despesa que se fez necessária para a prática do ato destinado à defesa da posse de um terreno privado e que, ao mesmo tempo, soterrou vários Direitos Humanos. Vai se dizer que o governo estadual colaborou com a Justiça para a efetivação de uma ordem judicial, mas esse mesmo governo não se tem mostrado nenhum pouco colaborador no que se refere às decisões judiciais que visam o resgate da autoridade dos direitos sociais de incontáveis cidadãos. O Estado de São Paulo deve cerca de R$20 bilhões em precatórios, que se arrastam interminavelmente, sendo R$15 bilhões a título de créditos trabalhistas e previdenciários.

 

A questão mais relevante que se apresenta, de todo modo, é: o que fazer agora?

 

Solidarizar-se com os ex-moradores do Pinheirinho é importante, mas não basta.

 

É preciso que a autoridade do ordenamento jurídico, visto de forma integral, seja imediatamente recobrada. Há urgência na prevenção e reparação dos direitos, que foram desrespeitados, dos, agora, "ex-moradores" do Pinheirinho.

 

Se o Estado se mostrou eficiente para preservar o direito de propriedade, cumpre-lhe, presentemente, demonstrar a mesma presteza para garantir a essas pessoas uma moradia digna e para reparar as agressões de que foram vítimas. Essa eficiência, alias, seria necessariamente antecedente à reintegração "manus militaris" operada, mas deve, enfim, ser operada. Assim, em razão de sua inércia perante o problema e por terem, pela própria inação, induzido os moradores do Pinheirinho a acreditarem na viabilidade do assentamento, e por terem sido completamente incapazes de construir uma solução para o problema, jogando tudo nas mãos do Judiciário, devem ser responsabilizados o Município de São José dos Campos, o Estado de São Paulo e mesmo o Governo Federal, sendo que o Judiciário, nas ações judiciais que venham a ser movidas, deve, mostrando que sua eficácia não tem lado, conceder liminar para obrigar os entes mencionados a pagarem indenização aos desalojados pelos danos pessoais experimentados, considerando a forma como foram tratados, assim como para determinar às esferas de poder competentes a construção imediata de casas com, no mínimo, o mesmo padrão que essas pessoas possuíam, com todos os seus utensílios, garantindo-lhes, enquanto a obra não for concluída, uma ajuda de custo para moradia e alimentação, sob pena de multa e demais conseqüências legais por desobediência à ordem judicial, mobilizando, para fazer cumprir a decisão garantidora dos Direitos Humanos, se necessário, o mesmo aparato policial utilizado na ação de reintegração de posse. E o terreno para tanto? Bom, cumpre aos entes públicos encontrá-lo!

 

Independente disso, a questão deve ser levada, imediatamente, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para que o Estado brasileiro não reste impune, em suas relações internacionais, da grave agressão aos Direitos Humanos que permitiu ocorrer em seu território, conforme preconizado no Manifesto de Juristas, organizado pelo professor Fábio Konder Comparato e o Procurador do Estado de São Paulo, Márcio Sotelo Felippe (http://www.viomundo.com.br/denuncias/juristas-e-entidades-comprometidos-com-a-democracia-denunciam-caso-pinheirinho-a-oea.html).

 

E se nada disso puder ocorrer? E se for apenas um devaneio acreditar que tais respostas jurídicas possam ser dadas à presente situação? Sem que outras medidas, igualmente eficazes para reparar os Direitos Humanos agredidos, se apresentem, há se questionar, então, se não é hora de re-fundar o Brasil, a começar pelo Impeachment dos responsáveis pelas atrocidades identificadas no caso do Pinheirinho, não sendo demais lembrar que no caso do Estado de São Paulo o fato se insere em um contexto determinado de enfrentamento aos movimentos sociais, de desrespeito às liberdades democráticas e de ataque à pobreza por meio de força bruta.

 

O caso Pinheirinho foi muito grave e a sociedade brasileira como um todo está desafiada a encontrar soluções que recomponham, imediatamente, a credibilidade na eficácia do Estado Democrático de Direito Social, instituído constitucionalmente.

 

O maior risco que vislumbro em situações como estas é o da produção, e acatamento, de argumentos que tentam legitimar as atrocidades verificadas, desconsiderando-as enquanto tais ou as justificando por intermédio do Direito, como se os atores não fossem responsáveis pelos seus atos, apresentando-se apenas como espécies de escravos de uma imposição legislativa. Essa racionalidade é destruidora dos vínculos de solidariedade, desvirtua a finalidade social e humanística do Direito e das estruturas de poder, gera a perda da própria consciência humana e, no caso específico do Brasil, acaba servindo para preservar, sem possibilidade concreta de oposição, a injustiça social que assola a maior parte da população brasileira. A falta de moradia e o desrespeito à dignidade humana das classes economicamente menos favorecidas, aliás, chegam a fazer parte da cultura nacional. E, "se o senhor num tá lembrado, dá licença de contá. Ali onde agora está esse adifício arto era uma casa véia, um palacete assobradado. Foi ali, seu moço, que eu, mato Grosso e o Joça, construímo nossa maloca. Mas um dia, nóis nem pode se alembrá, veio os home c'as ferramenta, o dono mandô derrubá. Peguemo todas nossas coisa, e fumo pro meio da rua apreciá a demolição. Que tristeza que nóis sentia, cada táuba que caía, doía no coração. Matogrosso quis gritá, mas em cima eu falei: 'Os home tá com a razão, nóis arranja outro lugá'. Só se conformemo quando o Joca falô: 'Deus dá o frio conforme o cobertô'. E hoje nóis pega as paia nas grama dos jardim, e pra esquecê nóis cantemo assim: Saudosa maloca, maloca querida, qui dim donde nóis passemo os dias feliz da nossa vida." (Adoniram Barbosa, "Saudosa Maloca", 1951).

 

Uma cultura, ao mesmo tempo, de insensibilidade e de resignação com a injustiça, que o próprio Adoniram Barbosa, em 1969, tentou mudar, com nova música, Despejo na Favela, a qual, no entanto, não restou tão difundida quanto a primeira:

 

Quando o oficial de justiça chegou
Lá na favela
E contra seu desejo

Entregou prá seu Narciso

Um aviso prá uma ordem de despejo, assinada seu Doutor

Assim dizia a petição:

Dentro de dez dias quero a favela vazia e os barracos todos no chão

É uma ordem superior,
Ôôôôôôôô, meu senhor, é uma ordem superior

Não tem nada não seu Doutor,

Não tem nada não
Amanhã mesmo vou deixar meu barracão
Não tem nada não seu Doutor

Vou sair daqui

Prá não ouvir o ronco do trator

Prá mim não tem problema

Em qualquer canto me arrumo

De qualquer jeito me ajeito
Depois o que eu tenho é tão pouco

Minha mudança é tão pequena que cabe no bolso de trás
Mas essa gente aí, hein, como é que faz????

 

Pois é, já passou mesmo da hora de alterar a base cultural em torno das questões sociais para reescrevermos nossa história!

 

São Paulo, 30 de janeiro de 2012.

 

Jorge Luiz Souto Maior

 

Juiz do trabalho, titular da 3ª. Vara do Trabalho de Jundiaí.

Membro da Associação Juízes para a Democracia.

Professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP.



 

Carta Maior - Laurindo Lalo Leal Filho - Crítica da mídia é sucesso na TV argentina

Colunistas| 31/01/2012 | Copyleft

 

DEBATE ABERTO

Crítica da mídia é sucesso na TV argentina

Na Argentina a televisão pública vem surpreendendo o telespectador com um debate até então inédito, levado ao ar pelo programa 6 7 8. Com bom humor, ironia e documentação consistente, os grandes jornais e as emissoras comerciais de rádio e TV são analisados e criticados diariamente em horário nobre.

Laurindo Lalo Leal Filho

Criticar a mídia não é tarefa fácil. Primeiro pela falta de espaço. Salvo a internet são raros os canais abertos para a discussão do papel dos meios de comunicação na sociedade atual. Contam-se nos dedos os veículos que fazem algum tipo de autorreflexão. O padrão geral é o da arrogância pura e simples.

Lembro da Ong TVer, no final dos anos 1990, encaminhando reclamações recebidas de telespectadores sobre uma menina, exposta no Fantástico, tendo que decidir se ficava com a mãe biológica pobre ou com a adotiva rica. A resposta da emissora foi de uma soberba a toda prova. Não entrava no mérito limitando-se a dizer que sabia o que o público queria, mais ou menos isso.

Ouvidorias na mídia brasileira existem apenas em dois jornais diários e nas emissoras públicas de rádio e TV da EBC. Programas de crítica da mídia são raros. Acostumada a se apresentar como quarto poder, ela não admite qualquer debate público sobre o seu trabalho. Coloca-se acima do bem e do mal, não faltando teóricos a ela alinhados para arrumar justificativas positivistas para esse papel quase divino.

A internet tem sido um instrumento importante para quebrar essas barreiras. Quase diariamente os meios convencionais têm seus erros e omissões denunciados em sites e blogues. Mas ainda atingem parcela restrita da população. Daí a importância de se discutir a mídia nos meios de largo alcance.

Na Argentina a televisão pública vem surpreendendo o telespectador com um debate até então inédito, levado ao ar pelo programa 6 7 8. Com bom humor, ironia e documentação consistente, os grandes jornais e as emissoras comerciais de rádio e TV são analisados e criticados diariamente em horário nobre.

A estreia ocorreu em 9 de março de 2009 e seu nome 6 7 8 refere-se à presença de seis debatedores, no canal sete, às oito da noite. Mudou de horário (passou para as 21 horas) e ampliou o número de participantes mas não alterou o nome.

O uso do arquivo é uma das armas mais poderosas do programa. Selecionam previsões de analistas de política ou economia dos grandes meios, feitas algum tempo atrás, e as confrontam com a realidade atual, sempre diferente. É como se aqui fossemos buscar nos arquivos as previsões catastróficas de comentaristas como Miriam Leitão ou Carlos Sardenberg e mostrássemos como elas estavam furadas. É, no mínimo, divertido.

O sucesso do programa é tal que já há até um livro sobre ele: “6 7 8 La creación de otra realidade” (Editorial Paidós). Trata-se de uma longa conversa entre uma ex-apresentadora do programa Maria Julia Olivan e o sociólogo Pablo Alabarces, além de depoimentos do criador do 6 7 8 Diego Gvirtz e do jornalista, especializado em TV, Pablo Sirvén.

O objetivo central do programa é explicitado no livro: contradizer a realidade construída pelos grande meios. Para isso procuram mostrar os mecanismos de construção da realidade no jornalismo que “se apresenta como real, como verdade, quando é antes de tudo uma narração sobre essa realidade”.

Maria Julia deixa isso mais claro ao dizer que “como produto televisivo, 6 7 8 nos conta a sua verdade ou a sua maneira de ver a realidade. Clarín, ao contrário, faz circular a sua opinião dizendo que essa opinião é a realidade”.

Esse debate, levado diariamente à casa do telespectador, é inédito. Chega ao grande público uma prática que, até então, estava restrita ao mundo acadêmico e a alguns militantes políticos: a chamada leitura critica dos meios de comunicação.

As conseqüências são palpáveis. Acompanhar o 6 7 8 tornou-se uma forma de ação política ou “um ato de militância, de adesão” segundo Maria Julia. No Facebook há mais de 450 mil seguidores. O sociólogo Pablo Alabarces diz que o programa é uma espécie de semiologia para a classe média que “os estudantes de comunicação têm no ciclo básico comum e aqui se transforma em vulgarização televisiva”.

Talvez seja por isso que a mãe de Maria Julia tenha dito que “até começar a ver o programa, eu acreditava que todas as notícias eram realidade mas depois me dei conta que a informação é construída; que não é o mesmo se te dizem as coisas de uma maneira ou de outra”.

6 7 8 não esconde seu alinhamento com o governo. No entanto revela, ao mesmo tempo, a existência de um público que apóia o governo e não era contemplado pelos demais meios de comunicação. Nesse sentido o livro ressalta a existência, pela primeira vez na história da Argentina, de uma política oficial de comunicação. Entre seus objetivos está o de contradizer os meios de comunicação tradicionais, papel desempenhado com desenvoltura pelo programa 6 7 8.

 

Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial). Twitter: @lalolealfilho.

http://cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5437

NOTA PÚBLICA - Sobre as violações de Direitos Humanos na reintegração de posse do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos/SP - Secretaria de Direitos Humanos

Data: 31/01/2012

 

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS

 

  

NOTA PÚBLICA

  

Diante das denúncias de violações aos Direitos Humanos decorrentes das ações de reintegração de posse do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos/SP, no último dia 22, representantes do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI), juntamente com a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, realizaram diligência in loco no município. Os conselheiros visitaram quatro abrigos e se reuniram com membros do Ministério Público e Defensoria Pública estaduais e do Poder Executivo local.

 

Foram constatadas diversas violações aos Direitos Humanos da população envolvida na desocupação do bairro Pinheirinho. Dentre elas, a ausência de condições de higiene, saúde e alimentação adequada nos abrigos; superlotação nos alojamentos; negligência psicológica, falha na comunicação entre agentes do Poder Executivo local, entre si, e com os desabrigados; entre outras violações.

 

Considerando esse cenário de vulnerabilidade física e psíquica na qual se encontram os abrigados, a força tarefa apresentou reivindicações de caráter humanitário e emergencial ao Sr. Secretário de Desenvolvimento Social do município de São José dos Campos, João Francisco Sawaya de Lima, que se comprometeu em assegurar as seguintes garantias aos ex-moradores do baixo Pinheirinho:

 

1 – Garantia de matrícula/rematrícula e material escolar para as, aproximadamente, 1.065 crianças e adolescentes presentes nos abrigos;

 

2 – Melhoria na atual oferta de alimentação, respeitando critérios básicos de segurança alimentar e nutricional;

 

3 – Realização de mutirão, no prazo de dois dias, de saúde nos abrigos;

 

4 – Disponibilização de atendimento psicológico diurno nos abrigos;

 

5 – Reforços das equipes sanitárias que trabalham nos alojamentos;

 

6 – Implementação de fiscalização para controle de zoonoses;

 

7 – Emissão de carta de garantia referente ao pagamento do aluguel social;

 

8 – Posto itinerante avançado de cadastramento e oferta do banco de vagas de emprego;

 

9 – Aprimoramento do fluxo de informações básicas entre todos os agentes de atendimento imediato às pessoas alojadas.

 

Na audiência com o Ministério Público, foi solicitada a imediata fiscalização quanto ao efetivo cumprimento das demandas citadas acima por parte da Prefeitura Municipal.

 

 

São José dos Campos, 31 de janeiro de 2012.

 

 

Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH)

Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda)

Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI)

Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos

http://www.sdh.gov.br/clientes/sedh/sedh/2012/01/nota-publica-sobre-as-violacoes-de-direitos-humanos-na-reintegracao-de-posse-do-bairro-pinheirinho-em-sao-jose-dos-campos-sp

TeleSURtv.net _ Nuestro Norte es el SUR

Presidentes de Cuba y Brasil reconocieron importancia de la Celac

 

Los presidentes de Cuba, Raúl Castro, y de Brasil, Dilma Rousseff, reconocieron la importancia de la puesta en marcha de la recién creada Comunidad de Estados Latinoamericanos y Caribeños (Celac) para enfrentar los grandes retos de los países de la región.

 

Dilma Rousseff arribó a Cuba para revisar temas bilaterales

 

 

Dilma Rousseff inicia gira por Cuba y Haití para fortalecer lazos de cooperación

http://www.telesurtv.net/

nesta quinta, às 22h

Foto: Giovanni Rocha

 

Amaury Ribeiro Jr. no Frente a Frente

Frente a Frente recebe o jornalista Amaury Ribeiro Jr.

 

O Frente a Frente desta quinta, 2/02, às 22h, recebe o jornalista e escritor Amaury Ribeiro Jr. O autor do livro A Privataria Tucana fala sobre a obra e os bastidores da política no Brasil. Foram convidados para a bancada do Frente a Frente os jornalistas Flávio Pereira, do jornal O Sul, Paula Coutinho, repórter do Jornal do Comércio, e Antônio Augusto Mayer dos Santos, colunista da Revista Voto. 

O programa Frente a Frente também é transmitido pela rádio FM Cultura, que pode ser sintonizada pela frequência 107,7 ou pela internet acessando o site
www.fmcultura.com.br.  

O Frente a Frente tem apresentação de Vitor Dalla Rosa e produção de Sandra Porciúncula 

 

TVE 
Frente a Frente 
Quinta, 2/02, às 22h
 
Reprise no domingo, 5/02, às 21h (somente na TVE)

 

http://www.fcp.rs.gov.br/?model=conteudo&menu=83&id=838

hipocrisia midiática


CUBA, MÍDIA E  HIPOCRISIA

A  Folha desta 3ªfeira dedica meia página da Ilustrada a entrevista com ilustre escritora cubana desconhecida. Sem piscar, nem engasgar, lá pelas tantas, Zoé Valdés, que vive em Paris, afirma que o regime de Fulgência Batista era mil anos luz melhor que o de Fidel Castro. Passemos. Na 'totalitária' Cuba uma Comissão de Direitos Humanos convocou ontem uma coletiva de imprensa internacional, livremente realizada (será que na sempre poupada Arábia Saudita isso seria possível?). Colocou à disposição dos jornalistas a viúva de um suposto dissidente morto após greve de fome. O motivo original da prisão, reconhecido pela viúva, não foi político, mas uma briga de casal, que levou  sua mãe a pedir socorro aos vizinhos e estes à polícia. Nota da União Patriótica Cubana, de oposição, admite que o  'estreitamento de laços' do suposto dissidente com a UPC só teria ocorrido após a prisão. No mínimo nebuloso, este é o caso em torno do qual a mídia demotucana tentou transformar a visita oficial da Presidenta Dilma a Havana num constrangimento diplomático. O jornal O Globo, como se sabe um veículo de impecável tradição democrática, reclama, também na edição desta 3ª feira, que a entrevista coletiva da viúva teve a  participação da imprensa oficial cubana, cujas perguntas provocaram, digamos assim, ruídos na narrativa conservadora do caso. Carta Maior defende a democracia em todas as latitudes e considera incompatível o socialismo sem soberania popular, mas não compactua com a hipocrisia midiática que subestima a inteligência do leitor e menospreza a História.

(Carta Maior; 3ª feira; 31/01/ 2012)

http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm


Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz