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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

30.4.08

Quando a gente muda

muda,
que quando a gente muda, o mundo muda com a gente
a gente muda o mundo na mudança da mente
e quando a mente muda, a gente anda pra frente>>

7 de maio
é o prazo para fazer ou transferir o título


>>na mudança do presente, a gente molda o futuro

até quando - gabriel o pensador



(clica na imagem para visualizar melhor!)

Fome: alimentos como negócio

Leonardo Boff 29/4/2008 O mundo está se alarmando com a alta do preço dos alimentos e com as previsões do aumento da fome no mundo. A fome representa um problema ético, denunciado por Gandhi: “a fome é um insulto, ela avilta, desumaniza e destrói o corpo e o espírito; é a forma mais assassina que existe”. Mas ela é também resultado de uma politica econômica. O alimento se transformou em ocasião de lucro e o processo agroalimentar num negócio rentoso. Mudou-se a visão básica que predominava até o advento da industrialização moderna, visão de que a Terra era vista como a Grande Mãe. Entre a Terra e o ser humano vigoravam relações de respeito e de mútua colaboração. O processo de produção industrialista considera a Terra apenas como baú de recursos a serem explorados até à exaustão. A agricultura mais que uma arte e uma técnica de produção de meios de vida se transformou numa empresa para lucrar. Mediante a mecanização e a alta tecnologia pode-se produzir muito com menos terras. A “revolução verde” introduzida a partir dos anos 70 do século XX e difundida em todo mundo, quimicalizou quase toda a produção. Os efeitos são perceptíveis agora: empobrecimento dos solos, devastadora erosão, desfloretamento e perda de milhares de variedades naturais de sementes que são reservas face a crises futuras. A criação de animais modificou-se profundamente devido aos estimulantes de crescimento, práticas intensivas, vacinas, antibióticos, inseminação artificial e clonagem. Os agricultores clássicos foram substituídos pelos empresários do campo. Todo este quadro foi agravado pela acelerada urbanização do mundo e o consequente esvaziamento dos campos. A cidade coloca uma demanda por alimentos que ela não produz e que depende do campo. Vigora uma verdadeira guerra comercial por alimentos. Os países ricos subsidiam safras inteiras ou a produção de carnes para colocá-las a melhor preço no mercado mundial, prejudicando os paises pobres, cuja principal riqueza consiste na produção e exportação de produtos agrícolas e carnes. Muitas vezes, para se viabilizarem economicamente, se obrigam a exportar grãos e cereais que vão alimentar o gado dos países industrializados quando poderiam, no mercado interno, servir de alimento para suas populações. No afã de garantir lucros, há uma tendência mundial, no quadro do modo de produção capitalista, de privatizar tudo especialmente as sementes. Menos de uma dezena de empresas transnacionais controla o mercado de sementes em todo o mundo. Introduziram as sementes transgênicas que não se reproduzem nas safras e que precisam ser, cada vez, compradas com altos lucros para as empresas. A compra das sementes constitui parte de um pacote maior que inclui a tecnologia, os pesticidas, o maquinário e o financiamento bancário, atrelando os produtores aos interesses agroalimentares das empresas transnacionais. No fundo, o que interessa mesmo é garantir ganhos para os negócios e menos alimentar pessoas. Se não houver uma inversão na ordem das coisas, isto é: uma economia submetida à política, uma política orientada pela ética e uma ética inspirada por uma sensibilidade humanitária mínima, não haverá solução para a fome e a subnutrição mundial. Continuaremos na barbárie que estigmatiza o atual processo de globalização. Gritos caninos de milhões de famintos sobem continuamente aos céus sem que respostas eficazes lhes venham de algum lugar e façam calar este clamor. É a hora da compaixão humanitária traduzida em politicas globais de combate sistemático à fome. Fonte: Leonardo Boff Teólogo

RS. Um silêncio de angústia atravessa o deserto verde


30/4/2008

Entrevista especial com Kathia Vasconcellos

O zoneamento ambiental da silvicultura do Rio Grande do sul, apresentado há algumas semanas, chocou, de certa forma, o movimento ambientalista gaúcho. O resultado visualizado no documento mostra uma forte pressão das papeleiras sobre o governo do estado, o qual já estava ligado às empresas desde a época do processo eleitoral. Os prejuízos que este novo zoneamento ambiental da silvicultura pode trazer ao meio ambiente rio-grandense são inúmeros, inclusive o risco de acabar com o pampa gaúcho.

“Da forma como esse zoneamento ambiental foi estruturado podem ser plantados grandes maciços florestais e isso o que impacta no ambiente natural e na paisagem rio-grandense”, manifesta-se a ambientalista Kathia Vasconcellos, que é membro do Núcleo Amigos da Terra – NAT. Em entrevista concedida à IHU On-Line, realizada por e-mail, Kathia, falou sobre os riscos que este novo zoneamento pode trazer ao meio ambiente gaúcho e sobre a forma como o documento foi conduzido.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Que tipos de ameaças ao nosso meio ambiente esse novo zoneamento ambiental pode trazer?


Kathia Vasconcellos – O zoneamento ambiental da silvicultura aprovado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) pode trazer inúmeros prejuízos por não definir o tamanho das áreas que podem ser plantadas, as distâncias entre as áreas destinadas à cultura de eucalipto e pínus e por ter eliminado a matriz de vulnerabilidade de cada unidade de paisagem. Da forma como esse zoneamento ambiental foi estruturado, podem ser plantados grandes maciços florestais, o que impacta no ambiente natural e na paisagem rio-grandense.

IHU On-Line – Como a senhora avalia a atuação das grandes mídias nesse caso do novo zoneamento ambiental?

Kathia Vasconcellos – As grandes mídias tiveram papel importante na aprovação do zoneamento ambiental da silvicultura, uma vez que, de forma geral, não aprofundou os impactos negativos das plantações florestais. O comportamento da grande mídia foi parcial, mostrando somente o lado de interesse de empresas e do governo do estado fazendo com que o cidadão comum não tenha base para ter opinião crítica sobre essa problemática.

IHU On-Line – Qual é a sua avaliação sobre as diretrizes de segurança deste zoneamento ambiental?

Kathia Vasconcellos – Este zoneamento ambiental da silvicultura não apresenta nenhuma evolução em termos de proteção ambiental, uma vez que o item mais importante, que é a área a ser ocupada, foi retirada da proposta que foi aprovada. Os outros itens que constam no zoneamento ambiental da silvicultura, de uma forma ou de outra, precisariam ser seguidos como, por exemplo, o tipo de proteção destinado à reserva da biosfera da Mata Atlântica.

IHU On-Line – O bioma do pampa gaúcho está em risco?

Kathia Vasconcellos – O bioma pampa gaúcho está em risco, sim, pela sua ocupação descontrolada, pela falta de regras de como deve ser a ocupação do seu solo, em especial as atividades agropastoris. Em minha opinião, os eucaliptos são um problema, mas não o único, nem o maior.

IHU On-Line – Quais as principais diferenças entre os três zoneamentos ambientais?

Kathia Vasconcellos – Imagino que estejas se referindo ao zoneamento original, o aprovado pelo Consema e o protocolado no Consema pelos técnicos da Fundação Zoobotânica. Neste caso, a grande diferença é a inexistência de definição do limite para ocupação das unidades de paisagem pela silvicultura, bem como a exclusão da matriz de vulnerabilidade. A versão apresentada pela Fundação Zoobotânica e não debatida é uma proposta aperfeiçoada da primeira versão do zoneamento ambiental da silvicultura.

IHU On-Line – Como a senhora analisa a atuação dos ambientalistas gaúchos nesse caso?

Kathia Vasconcellos – Muitos dos meus colegas trabalharam e continuam a trabalhar muito a questão da silvicultura. Fazem isso de forma incansável, com muita ética e dedicação. Não é fácil trabalhar "contra tudo e todos". Eles precisam de muita força e resignação para não desistir. Só os determinados resistem a tudo isso e por muito tempo.

IHU On-Line – Como o povo gaúcho deve agir diante desse problema?

Kathia Vasconcellos – O povo deve agir como um verdadeiro cidadão, ou seja, deve se informar; deve se manifestar junto aos meios de comunicação – como os espaços destinados às cartas dos leitores dos jornais, por exemplo –, deve escrever para os políticos e para os formadores de opinião, enfim, creio que o povo gaúcho deve participar de algum movimento social. São essas coisas básicas que transformam uma pessoa num verdadeiro cidadão.

Leia mais:

» O Pampa e o monocultivo do eucalipto. Edição 47 da Revista IHU On-Line

» Pampa. Silencioso e desconhecido. Edição 190 da Revista IHU On-Line

» Zoneamento Ambiental do RS: um faz-de-conta. Entrevista especial com Paulo Brack

» O zoneamento florestal e as empresas de celulose. Entrevista especial com Althen Teixeira Filho

» O pampa gaúcho entregue às multinacionais. Entrevista especial com Maria da Conceição Carrion e Flávio Lewgoy

24.4.08

Semente de uma terra nova

Marcelo Barros A ONU convida toda humanidade a celebrar o 22 de abril como o “dia da terra”. Trata-se de ajudar as pessoas a tomar consciência dos direitos da Terra, como solo fecundo da comunidade da vida, congregada neste planeta. Para isso, é preciso que se transformem a própria sociedade e as relações entre as pessoas. Ora, os desafios são imensos. Nesta semana, os lavradores recordam o massacre dos lavradores Sem Terra em Eldorado de Carajás (17/04/1996). Ainda nestes dias, fazendeiros de Roraima, fortalecidos pelo Supremo Tribunal Federal que ordenou a suspensão da retirada de brancos da reserva indígena Raposa Terra do Sol, ameaçam ser mais violentos com os índios do que já costumam ser. A CNBB pede ao governo proteção para três bispos, cuja vida está ameaçada, porque defendem os pobres e a terra da Amazônia. O professor José de Souza Martins escreve: “Em um estudo sobre a ocupação das frentes de expansão brasileiras, Darcy Ribeiro diz que o Brasil é representado, no contato com o índio, pelo pior tipo de brasileiro que pode haver, violento e desumano. As populações nativas e caboclas do Brasil profundo não têm mais sorte do que os índios: o Brasil das instituições a elas se apresenta para negar as instituições; a lei se apresenta como escárnio da lei; e não raro as autoridades agem como cúmplices ou omissas em face de violações da lei e do direito que negam o Estado e a própria civilização” (O Estado de S. Paulo, 13/04/2008). Neste final de semana, a Organização da ONU para a Agricultura e Alimentação (FAO) encerrou em Brasília o seu 30º Congresso e reconheceu que se espalha pelo mundo uma nova onda de carestia e falta de alimentos básicos. Nos primeiros meses deste 2008, do Egito às Filipinas, os preços dos gêneros básicos para a alimentação subiram desproporcionalmente. A média do aumento dos preços foi 40%, sendo que alguns alimentos chegaram a ser 126% mais caros do que há apenas um ano (revista Internazionale, 17/04/2008). Isso tem provocado manifestações populares nas ruas das grandes cidades da Ásia e da África, com repressões policiais e mortes em Abdijam, Cairo e outras cidades. Esta crise, diz a FAO, é fruto de causas meteorológicas, como secas em algumas regiões e inundações em outras, ambas provocadas pelo aquecimento global. Entretanto, a causa maior é uma especulação selvagem por parte das Transnacionais. Até pouco tempo, na maior parte do mundo, pequenos lavradores eram responsáveis por 70% ou mais da produção agrícola dos países. Conforme a FAO, de um ano para cá, no Brasil, 23 milhões de terras férteis, antes usadas para a agricultura, foram desviadas para a monocultura de soja para os porcos da Europa ou cana de açúcar para produção de etanol para os automóveis norte-americanos. Isso sem falar em 12 milhões de hectares que os patrões reservam para a especulação imobiliária. A alimentação depende, agora, de Transnacionais interessadas no lucro e não na vida das populações. Existe alimento suficiente para toda a humanidade, mas está estocado para a especulação e o aumento do lucro das Transnacionais e, para elas, pouco importa que morram, cada dia, de fome, milhares e milhares de crianças inocentes e de adultos, vítimas deste sistema iníquo. Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, lançou um apelo para que se proclame internacionalmente um “new deal” alimentar (o termo se refere ao acordo que o governo norte-americano lançou na época da depressão para assistir às vítimas da fome). Entretanto, este tipo de medida não visa transformar o modelo econômico. Apenas o ajusta para evitar o pior. Graças a Deus, na contramão desta calamidade social, em vários países da América Latina, organizações indígenas estão reorganizando o Estado a partir da terra e da pluralidade cultural. Vários países fizeram novas constituições, nas quais são assegurados os direitos de todos à plena cidadania e o cuidado com a Terra, como mandamento obrigatório. Estas constituições se inspiram na “Carta da Terra” que se encerra com estas palavras: “Como nunca antes na história, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. (...) Isto requer uma mudança na mente e no coração. Pede um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável. Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa, e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar esta visão. (...) Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação da luta pela justiça e pela paz, e a alegre celebração da vida. * Marcelo Barros é monge benedetino, escritor, assessor de movimentos sociais. Vive em Goias

FERNANDO LUGO,UMA VITORIA DO POVO PARAGUAIO

Entre 1750-56 houve a guerra guaranítica no sul do Brasil. Exércitos de Portugal e Espanha, abençoados pelo Vaticano, trocaram Montevideo pelo atual território do Rio grande do sul que era habitado por 600 mil guaranis e Charruas. Os gaúchos verdadeiros que há milênios habitavam aquele território.. Da guerra, sobraram apenas 30 mil. Um parte foi morta e a outra, fugindo da barbárie européia, cruzou o rio Uruguai e foi somar-se a outros parentes guaranis, no territorio do Paraguai. Em 1808-12 implantou-se a Republica no Paraguai e um jovem estadista, Dr França fez reforma agrária, e implementou a primeiras regras republicanas do continente. Foi derrubado pela oligarquia. Entre 1865-70 outro jovem republicano Solano Lopez, implantou a primeira siderúrgica da América do sul, e sonhava com um modelo de industrialização do país. Provocou o império inglês. Que contratou os exércitos argentinos, uruguaios e brasileiros, e fizeram a guerra do Paraguai, tão bem descrita e recuperada pelo nosso historiador Chiavenato. Mataram 90% de todos os homens adultos. Um massacre, para preservar os interesses da indústria inglesa. Como aliás fariam mais tarde também aqui no Brasil com o assassinato de Delmiro Gouveia. O primeiro industrial nacionalista brasileiro. Veio o século XX, e o país foi governado sempre por ditadores. Strossner, de origem alemã e afiliação nazista, governou por 40 anos. E seu partido, o Colorado, governou desde a segunda guerra 1945, até hoje. Dia 20 de abril, houve eleição no Paraguai. Ganhou um bispo da teologia da libertação, líder dos pobres, que fala fluentemente guarani: Fernando Lugo. Nem partido tem. Mas tem o povo e suas forças, que derrotaram os colorados e outro filhote da ditadura militar o general Oviedo. Finalmente, o povo paraguaio retoma as rédeas de seu destino. E nós os brasileiros, estamos histórica, étnica e economicamente vinculados a eles. Cabe a nós, contribuir de todos os modos possíveis, para que o povo paraguaio recupere a dignidade, a justiça, a soberania e melhore suas condições de vida. Os ventos da América latina estão começando soprar a favor dos povos. João Pedro Stédile, membro da coord. nacional do MST e da Via Campesina Brasil. ............................................................................... Que viva Paraguay! (una pequeña crónica guarany) João Alfredo Telles Melo Para Félix Sánchez, João Luis Duboc Pinaud e João Pedro Stedile Escrevo este relato já impactado pelos primeiros resultados que dão a vitória ao ex-bispo Fernando Lugo, da Aliança Patriótica pela Mudança (Câmbio, em espanhol, daí a sigla APC), que atenua o cansaço de um dia que começou às 4 da manhã deste domingo, 20 de abril, para trabalhar como observador internacional nas eleições gerais paraguaias, como um dos representantes indicados pela Via Campesina/MST. Muitos sentimentos me povoaram nesta rápida passagem de um pouco mais de dois dias em Assunción. Ceticismo, um pouco de interesse e, principalmente, de curiosidade me acompanharam desde que saí à tardinha, da sexta, dia 18, de Fortaleza rumo ao Paraguay. Afinal, meu espírito crítico extremamente aguçado me fazia desconfiar de uma aliança de partidos e movimentos de esquerda com um partido autodenominado liberal (que indicou o vice da chapa), ainda que a candidatura de Lugo, um bispo comprometido com a causa dos pobres, militante da Teologia da Libertação, me inspirasse uma simpatia de quem já havia acompanhado com fervor, há quase trinta anos, a Revolução Sandinista da pequenina Nicarágua. Experiência, que, com a participação decisiva da igreja popular, embalou (e depois veio a frustrar) os sonhos de juventude de minha geração. Dentro do avião, no trecho São Paulo/Assunción, ao ler um importante periódico paraguaio, recebo o primeiro choque de realidade: uma nota da associação representativa dos proprietários rurais desancando o programa agrário do movimento "Tekojoja", que dá suporte à candidatura da APC. Ali, os ruralistas, muitos deles certamente de origem brasileira, rechaçavam, virulentamente, as propostas de agroecologia, reforma agrária e agricultura familiar que orientam o programa de desenvolvimento rural de Lugo. A luta de classes irrompia através do lado mais "moderno", do ponto de vista do capital agropecuário, o do agronegócio, que segue, no entanto, extremamente arcaico em sua face socioambiental. O programa de câmbio, no campo, se mostrava para valer e isso já impactava meu olhar e meus sentimentos. No entanto, foi o contato - em que pese o pouco tempo de permanência - com o povo paraguaio que me foi cativando e me desvendando uma realidade até então desconhecida para mim. Chegar ao aeroporto de madrugada, sem ninguém a me esperar, e ter a ajuda, de forma interessada e gentil, de um taxista para me levar a uma pousada, começou a me revelar uma característica tão próxima a meus conterrâneos cearenses, a hospitalidade. Mas, não só. Suas raízes indígenas, a língua guarany, da qual não abrem mão, o orgulho de sua história, o amor a seu país, a vontade de mudança política estiveram sempre presentes nas falas que colhi do povo mais simples de Assunção. Um capítulo à parte, para mim, foi o contato com a língua guarany, que, à maneira dos ideogramas orientais, permite traduções não literais e têm uma riqueza muita larga de significados. Observe-se "Tekojoja", nome do movimento da candidatura de Lugo. Dos paraguaios, ouvi três diferentes traduções: "todos juntos", "estamos (ou vivendo) juntos" e "somos todos iguais", que me pareceu a mais apropriada (embora sem contradição com as demais), pois "joja" significa "paralelo", "no mesmo plano", a dizer que ninguém é maior do que o outro (como que recuperando o "ethos" da república comunista-cristã dos guaranys, de Sepé-Tiaraju). Nessa hora, não dá para esconder uma ponta de inveja por termos perdido quase que completamente, pelo decreto de Pombal, nossa língua geral brasileira, o "nheengatú" (que sobrevive em pouquíssimos recantos do Brasil), de raízes tupi, pela imposição do português como idioma único e oficial. Ouvir deles que seu herói nacional é o "Mariscal (Marechal) López" - o Solano López, pintado como um ditador implacável em meus livros de história do primário - não deixa de nos trazer um certo sentimento de vergonha, pelo que o Brasil, a Argentina e o Uruguay, em sua Tríplice Aliança, fizeram covardemente com esse povo, ao matar centenas de milhares de homens, destruir a nascente infraestrutura do país, golpeando, significativa e fortemente, o desenvolvimento desse país. Nessa hora, é que nosso sentimento de solidariedade emerge com muita força e se fortalece ainda mais pela companhia, multidiversa e multipartidária, dos observadores eleitorais convidados pela APC. Gente de todo o mundo, de partidos de esquerda e centroesquerda, que viemos a Assunção para presenciar o início do que esperamos venha a ser uma verdadeira Revolução Democrática, através da derrota - e agora os resultados se confirmam – de 61 anos de corrupção, violência e exploração do povo guarany pelas elites políticas e econômicas, representadas, principalmente, no Partido Colorado. Agora, os noticiários televisivos confirmam a vitória de Lugo (com o reconhecimento da derrota pelos dois principais adversários, a oficialista Blanca Ovelar e sua dissidência, de corte militarista, o General Oviedo) e o povo já toma as ruas, marchando, com suas bandeiras tricolores e buzinaços, em direção à Praça do Panteón. Estranha – e explosiva – metamorfose! Durante todo o dia, o que vimos foi a presença ofensivamente ostensiva da estrutura do Partido Colorado: carros, camionetas, ônibus, a carregar os eleitores, sem nenhum pudor de portar, inclusive, às portas das seções eleitorais, cartazes, adesivos, bandeiras, demonstrando a prepotência de mais de 60 anos de dominação e corrupção. As aparências – que enganavam o observador mais leigo – escondiam a decisão - já tomada, mesmo que de forma discreta, porém resoluta, pela ampla maioria do povo – de derrotar o regime que lhe infelicitava há décadas. Esse sentimento latente já se manifestara, ali e acolá, quando os fiscais dos partidos de oposição nos procuravam, aos observadores internacionais, para denunciar as mais variadas formas de corrupção eleitoral (tão conhecidas de nós, brasileiros), como as ameaças aos servidores e a compra de votos junto aos eleitores pobres. Na periferia, observamos o caso de mais de quatrocentas famílias que haviam sido pressionadas a votar nos colorados, sob pena de serem expulsas de uma ocupação recente. A preocupação maior, no entanto, era com a fraude, no momento da feitura das atas pelas mesas eleitorais, que funcionariam também como mesas apuradoras. Aliás, só o receio da fraude é quem pode explicar o fato de que, nas pesquisas de boca-de-urna, eleitores de Lugo desacreditarem de sua vitória. No entanto, a ampla maioria de quase dois votos a um, nas urnas da capital, para a candidatura do "Câmbio" ("palavra mágica", no dizer de Lugo, em sua primeira coletiva de imprensa após a eleição), e sua ampla e imediata divulgação, é que veio a impedir qualquer tentativa de corromper o resultado eleitoral. O que vai se passar, em nosso vizinho, a partir de agosto, quando o candidato dessa ampla aliança de partidos e movimentos tomar posse, é a indagação que fazemos os socialistas de todo o mundo que para lá acorremos e nos tornamos testemunhas dessa virada histórica. Como vão se dar as negociações com o governo brasileiro, em torno do preço – atualmente injusto e defasado - da energia de Itaipu, diante do que o programa da APC designa de "soberania energética"? Será possível a construção de um novo modelo de desenvolvimento rural – social e ambientalmente justo e responsável - com a realização de uma reforma agrária ecológica, que golpeie o latifúndio, os transgênicos, os agroquímicos e a monocultura e devolva a terra para os seus legítimos donos? A governabilidade de Lugo vai se sustentar unicamente em sua contraditória frente partidária ou se apoiará na organização e mobilização dos movimentos sociais? O que seria essa "terceira via" entre Lula e Chávez a que o bispo, agora presidente, se referiu quando questionado sobre seu modelo de governo? O tempo – e a luta social – é quem nos dirão. Agora, o que fica em minha memória é a resposta do taxista que me levou ao aeroporto, quando lhe perguntei "Que tal?". Ele me disse tão somente: "Especial!". João Alfredo Telles Melo, é advogado, professor e ex-deputado federal pelo PSOL/CE.

Viva Paraguay!

José Arbex Jr. “Viva Paraguay!”, grita a viejita, muito altiva e orgulhosa, envolvida pela bandeira tricolor - vermelha, azul e branca - de seu país. “Viva!”, respondem dezenas de pessoas eufóricas que, no bar, acompanham pela televisão o pronunciamento do Tribunal Superior da Justiça Eleitoral que reconhece a vitória, nas urnas, do ex-bispo católico Fernando Lugo. No lado de fora, uma multidão imensa toma as ruas; a pé e de carro, todos se dirigem espontaneamente à praça localizada bem diante do Panteón Nacional de los Héroes. Cantam, desfraldam a bandeira nacional, dançam, gritam palavras de ordem – “Y llora Blanca, llora”, “que se vaya Nicanor”, “el pueblo unido jamás será vencido”, às vezes substituída por “Lugo querido jamás serás vencido”, “se siente, Lugo presidente”, além de outras menos suaves, como “acima, abajo, Nicanor al carajo”. É 20 de abril, noite de lua cheia – aliás, cheíssima, plena de luz e de graça -, e todos, talvez pela primeira vez em suas vidas, estão orgulhosos de serem paraguaios. Eles enterram seis décadas de autoritarismo colorado, incluindo 35 anos da ditadura sangrenta e corrupta de Alfredo Stroessner (1954 – 1989). O Paraguai renasce das cinzas. "Hoje queremos renovar o nosso compromisso com o povo paraguaio, com os mais humildes, com os mais pobres e a maioria do povo, que é um povo jovem. (...) Hoje assemelha-se aos 14 e 15 de Maio de 1811 [data da independência do país]. Vocês são os grandes responsáveis pelo 20 de Abril de 2008. Finalmente, além de dizer que nós os estimamos, e estamos com vocês comprometidos, pedimos: nunca nos abandonem”, declara Lugo, no alto de um palanque improvisado na praça, para o delírio da multidão. Sim, sem dúvida, a imensa maioria do povo é formada por jovens e por descendentes dos guaranis, gente permanentemente humilhada e, eventualmente, escravizada pela elite branca. Hoje, eles dão o troco. Significativamente, o movimento liderado por Lugo é conhecido, entre os paraguaios, como Frente Tekojoja, nome guarani cujo significado é “viver entre iguais”. Totalizadas as urnas, o líder da Alianza Patriótica para el Cambio (APC), que inclui a Frente Tekojoja, obteve 40,8% de um total de 1.726.906 votos válidos (participaram 65% dos quase 2,9 milhões de paraguaios aptos); sua principal oponente, Blanca Ovelar, candidata do Partido Colorado e apoiada pelo presidente Nicanor Duarte, conquistou 30,7% dos votos, o general reformado Lino Oviedo ficou com 22% e o empresário Pedro Fadul, da frente Pátria Querida, com 2,4%. Estes são os números, mas números podem confundir e obscurecer, ainda quando pretendem dizer a mais rigorosa verdade. Os meros dez pontos percentuais que separam Lugo de Blanca, algo como 170 mil votos, representam um vasto abismo entre um país orgulhoso, potencialmente capaz de tomar os próprios destinos em suas mãos, e aquilo que, até agora, era o Paraguai: um quintal das operações da CIA, uma grande hacienda governada com base no terror policial e repressivo, por corruptos, contrabandistas e narcotraficantes, um país espoliado, com boa parte de seu território ocupado por latifundiários brasileiros, e explorado de modo vil pelo Tratado energético de Itaipu, firmado em 26 de abril de 1973, entre duas ditaduras, a brasileira e a de Stroessner. Claro, claro, claro: uma eleição não resolverá, de uma tacada, uma herança maldita de seis décadas, para não falar do legado deixado pela destruição do país arquitetada pela Tríplice Aliança (Brasil, Argentina e Uruguai), entre 1864 e 1870, sob as ordens do imperialismo inglês. Seria uma tolice infantil imaginar algo do tipo, ainda mais quando se sabe que a frente liderada por Lugo abarca sete partidos que defendem as mais distintas ideologias, além de duas dezenas de movimentos sociais das mais diversas origens. Será um governo duro, difícil, com imensos desafios pela frente. Mas, por enquanto, o principal está feito. O período colorado acabou, e um novo capítulo se abre na história da América do Sul, mais uma vez com o protagonismo decisivo dos jovens e dos povos originários. E foram eles, sem dúvida, que venceram as eleições. Toda a campanha de Blanca Ovelar foi feita com base no medo: cerca de um terço da população adulta paraguaia é (ou era) filiada ao Partido Colorado, não necessariamente por convicção, mas por ser uma via obrigatória aos que queriam fazer carreira no funcionalismo público ou que, simplesmente, não ousavam enfrentar as tremendas pressões políticas feitas pela “máquina”; toda essa gente foi constrangida a votar em Blanca. Os votos decisivos foram dados por aqueles que estavam fora do alcance punitivo colorado: os jovens e os camponeses guaranis. Lugo fez uma campanha voltada para eles. Os dois pontos principais de seu programa são: reforma agrária imediata, com conseqüências importantes para os latifundiários brasileiros produtores de soja, proprietários de grandes áreas ao leste do país, e a revisão do Tratado de Itaipu – em princípio, válido até 2020 - , mediante o qual o Paraguai se compromete a vender ao Brasil, ao preço de custo, todo o excedente de energia elétrica (tudo o que sobra após o seu uso pelo próprio Paraguai). Segundo o engenheiro Ricardo Canese, secretário de Relações Internacionais do Tekojoja – um sujeito simpático, meio parecido com o ator italiano Giancarlo Giannini quando jovem -, o Paraguai perde, com isso, 3,6 bilhões de dólares por ano. Não é difícil imaginar o que isso significa para o país, quando se recorda que o seu PIB é de 7,5 bilhões de dólares. Caso Lugo consiga, de fato, implementar o seu programa, não faltarão gritos na imprensa burguesa brasileira, incitando o país à guerra contra aqueles que querem “prejudicar os interesses dos nossos empresários da soja” e /ou ignorar acordos internacionais, exatamente como aconteceu no ruidoso caso da Petrobras com a Bolívia de Evo Morales. Se e quando isso acontecer, será dever de todo brasileiro democrático, politicamente consciente, ou simplesmente de boa fé rejeitar as provocações vis daqueles que vivem de parasitar as riquezas alheias e estender as sua mãos aos nuestros hermanos de Paraguay que, neste momento, dão um exemplo histórico de ousadia, soberania e fé no futuro. Talvez seja a hora de se cumprir como profecia o desejo expresso pelo poeta paraguaio Elvio Romero, em 1947 (providencialmente relembrado por João Pedro Stedile): "Y en un murmullo solar, / se encenderán los caminos." O jornalista José Arbex Jr acompanhou as eleições, em Assunção, como observador internacional, a convite da Frente Tekojoja.

De ferro e flexíveis


Maria Cecília Minayo -
Editora Garamond

"A descrever as marcas do Estado Empresário e as conseqüências da privatização da Vale na subjetividade dos trabalhadores e na vida social e política da cidade em que vivem, Maria Cecília Minayo traz à tona uma visão complexa e não-maniqueísta do que significam as determinações e a liberdade na vida pessoal, social e cidadã. Com isto, de forma inédita, responde a indagações que todos temos, nestes tempos de transição, sobre como se processam as forças internas e coletivas para responder a uma realidade que nós mesmos construímos, produzindo riquezas e transformando-nos."

Vejam também uma reportagem sobre o livro no site da FIOCRUZ - site

Pesquisa analisa a saga dos operários das minas de ferro em Itabira

Foi em Itabira (MG), cidade que tem hoje cerca de 100 mil habitantes, que nasceu Carlos Drummond de Andrade. Foi também na cidade que surgiu, em 1942, a Companhia Vale do Rio Doce. Em pleno século 21, Itabira representa apenas um pontinho no universo diversificado da companhia. No entanto, os operários itabiranos sempre vão registrar que, com suas mãos, eles construíram a maior empresa de extração de minério de ferro a céu aberto do mundo. É o que revela um trabalho feito pela socióloga, antropóloga e sanitarista Maria Cecília Minayo, coordenadora científica do Centro Latino-americano de Estudos de Violência e Saúde (Claves) da Fiocruz.

Mais de 90% da economia do município, direta ou indiretamente, giram em torno da companhia. A empresa, mais forte que as instâncias políticas locais, monopoliza os empregos e interfere na organização social da pequena Itabira. Maria Cecília constatou que, nesses mais de 60 anos de existência da Vale do Rio Doce, a consciência política e a cidadania cresceram entre os itabiranos. As condições de vida também melhoraram. Contudo, as taxas de suicídio aumentaram no período estudado.

Os anos 70 foram de expansão para a Vale do Rio Doce. Dentro da ideologia estatizante e desenvolvimentista dos governos militares, a companhia conseguiu se consolidar tanto no cenário nacional como no internacional. "Na memória dos trabalhadores, esse foi o tempo da abundância e do otimismo e, para Itabira, o tempo da efervescência econômica, do boom da construção civil e do mercado imobiliário, o que transformou a cidade em um pólo dinâmico para o emprego industrial e para a arrecadação municipal", diz Maria Cecília no livro.

Com o avanço da mineração, a Vale do Rio Doce introduziu mão-de-obra terceirizada. Como conseqüência, uma camada populacional de baixa renda se multiplicou em Itabira. Em 1989, líderes sindicais conseguiram organizar uma greve memorável, que mobilizou todos os trabalhadores e teve repercussão nacional. O movimento inaugurou um período de medo e incerteza para os operários. A reestruturação do trabalho na companhia se intensificou no início da década de 90, quando Fernando Collor de Mello foi eleito presidente da República e instaurou uma política de abertura de mercados e de reforma do Estado. Nesse contexto, consolidou-se a privatização da Vale do Rio Doce, em 1997.

De acordo com Maria Cecília, a trajetória dos trabalhadores da empresa em Itabira se divide em duas fases. A primeira é a da companhia estatal, em que os operários são convocados, treinados e disciplinados para produzir e exportar minério de ferro, em nome dos interesses do país. A segunda é aquela relativa à privatização da Vale do Rio Doce.

Curiosamente, Maria Cecília observou que, nessa conjuntura de insegurança provocada pela reestruturação produtiva e pela privatização da companhia, a sociedade itabirana voltou-se para suas raízes e reuniu suas forças. Assim, conseguiu elaborar projetos e propostas criativas para a diversificação produtiva, social e cultural.

Embora seja fruto de uma pesquisa etnográfica, o livro De ferro e flexíveis tem uma importância muito mais abrangente. Ele analisa um segmento operário que nasce com o processo de substituição da importação no Brasil: sua origem está no período getulista e do lançamento da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). A análise vai até o momento presente, o da reestruturação produtiva, vivida nacional e internacionalmente pelas empresas e pela classe trabalhadora.

No começo, os operários da Vale do Rio Doce em Itabira cavavam as minas com marretas. Em seguida, viveram uma etapa de mecanização e de automação dos processos, que entrou em seu auge nos anos 1990. A saga desses trabalhadores, a partir de sua inserção naquela que é hoje a maior empresa de exportação de minério de ferro do mundo, é o foco central do livro De ferro e flexíveis. Mas esta não é a primeira obra de Maria Cecília sobre os mineradores de Itabira. Em 1985, ela publicou Homens de ferro, fruto de sua dissertação de mestrado, defendida na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

21.4.08

Socialistas chegam ao poder no Paraguai

20/4/2008 23:10:55

Por Redação, com agências internacionais - de Assunção

Os primeiros resultados parciais da eleição realizada neste domingo no Paraguai revelam a vitória do ex- bispo da Igreja Católica Fernando Lugo, candidato da oposição pela Aliança Patriótica para a Mudança (APC, na sigla em espanhol), com 40,37% dos votos (506.268). No total, foram apuradas 66,8% das mesas eleitorais. A candidata do governista Partido Colorado, Blanca Ovelar, recebeu 31,3% ou 392.538 votos. A diferença entre os dois presidenciáveis superava os 100 mil votos, com sinalização, segundo o Tribunal Superior de Justiça Eleitoral de ampliação desta margem favorável a Lugo.

A vitória de Lugo encerra, após 61 anos, a presença do Partido Colorado no poder, incluindo 35 anos de ditadura militar (1954-1989). Também será a primeira vez, recordam historiadores, em quase 200 anos de história, desde a formação dos partidos políticos após a Guerra do Paraguai, que haverá uma mudança política pacífica sem golpe militar. A posse será no dia 15 de agosto.

'Les quiero mucho'

Quatro horas após o fechamento das urnas, uma multidão comemorava no centro de Assunção, erguendo bandeiras do país, cantando e fazendo batucada. Duas horas e meia após o fechamento das urnas, Lugo fez suas primeiras declarações à imprensa e a seus seguidores, reunidos na sede da sua coligação política, em Assunção. Com a bandeira do Paraguai nos ombros, disse:

- Hoje, podemos afirmar que os pequenos também estão capacitados para vencer. Esse é o Paraguai que eu sonho, de todos os rostos, de todos. Hoje, mais que nunca, esse Lugo, que tem coração, quer dizer a vocês: les quiero mucho - disse Lugo.

Mais tarde, diante de mais de cem jornalistas nacionais e estrangeiros, ele convidou todos os partidos a construir um Paraguai "forte, como já foi um dia". E como já é tradição em suas mensagens, ele falou em Deus.

- Quero pedir ao bom Deus que abençoe esse país (...) com tantos paraguaios que (por falta de oportunidades) vivem em Buenos Aires, Nova Iorque e no Brasil - disse.

A APC foi formada há oito meses e é formada pelo tradicional partido de centro-direita Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) e diferentes movimentos sociais de esquerda. Lugo se define como de centro – "o centro do ponche", costuma dizer, em referência a uma de suas roupas típicas.

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DIRETO DE ASSUNÇÃO

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Paraguai vota contra a oligarquia dos partidos tradicionais

Com a totalidade dos votos para presidente apurados, confirma-se a vitória de Fernando Lugo, novo presidente do Paraguai. A vitória indica a consolidação democrática do país. Festa da Aliança Patriótica para a Mudança reuniu todas as forças políticas em frente ao Panteão dos Heróis, no centro de Assunção.

Clarissa Pont

ASSUNÇÃO - A confirmação da vitória de Fernando Lugo ocorreu por volta das nove horas da noite de domingo, quando os dez pontos percentuais de diferença que separavam a Aliança Patriótica para a Mudança do Partido Colorado indicavam ser inviável uma reviravolta nos resultados. Neste momento, observadores internacionais presentes no Hotel Granado, centro de Assunção, onde Lugo concedeu a primeira coletiva de imprensa como virtual presidente, estavam atentos à contagem de votos transmitida pela televisão.

“O ato eleitoral foi para todos os paraguaios uma forma de expressar o sentimento de mudança. Apesar de termos visto em alguns locais de votação as dificuldades e a estrutura de controle que o Partido Colorado possui, acreditamos que tudo correu bem. É muito importante para o Paraguai a vitória de uma aliança progressista como esta. Para nós estar aqui hoje e fundamental, junto com o povo do Paraguai a quem tanto devemos; os uruguaios, os argentinos e os brasileiros; depois daquela triste guerra. Apoiamos esta aposta da democracia e essa aposta de seguir mudando a direção dos ventos na América Latina”, assinalou a deputada pela Frente Ampla, do Uruguai, Eleonora Bianchi.

O secretário geral do Partido Socialista do Uruguai, Eduardo Fernández, também acredita que a vitória de Fernando Lugo faz parte de um processo continental. “Já acompanhei outra eleição no Paraguai e o Partido Colorado não aparecer como favorito é uma coisa bem estranha. A vontade de mudança do povo paraguaio, pelo que vimos até agora, vai ser confirmada nos resultados finais. O Paraguai entrou no caminho progressista que marca a América Latina já há alguns anos”, avaliou. Neste momento, apenas metade dos votos haviam sido contabilizados, mas a vitória de Lugo já era anunciada. Na Junta de Governo do Partido Colorado, pela primeira vez, não havia festa.

No mesmo hotel, Fernando Lugo concedeu uma coletiva de imprensa na qual foi apresentado como virtual presidente. “Há alguns meses, nenhum de nós sonhava que isso poderia ter acontecido. Um grupo de sonhadores políticos colocou o país em primeiro lugar”, disse. “Muito se falou antes das eleições, se atemorizou as pessoas com notícias de atos de violência, mas agora podemos concluir o contrário. Nunca mais se fará política com base no clientelismo neste país”. Em frente ao hotel, centenas de manifestantes comemoravam e aguardavam Lugo para o discurso que faria em frente ao Panteão dos Heróis, perto dali.

Militante do Movimento Popular Tekojoja, Adolfo González não escondia a felicidade. “Eu sou do interior e, para nós, é muito importante esta mudança. Tenho 65 anos e venho lutando por isso há muito tempo”. Osvaldo Souza, 19 anos, votou pela primeira vez este ano, em Fernando Lugo. “É uma conquista histórica, porque o Paraguai está cansado do continuísmo, de que poucos sejam os donos do país, desta oligarquia que se formou”, declarou o jovem coberto por uma bandeira paraguaia.

Segundo o secretário geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, “estas foram eleições históricas. Apesar das diferenças, os partidos e os movimentos políticos chegaram a um consenso fundamental sobre as regras do jogo que, aqui e no resto da América Latina, constitui um mínimo imprescindível para a construção da democracia”. A missão da OEA presente no Paraguai realizou um comunicado oficial na manhã desta segunda-feira reconhecendo a legitimidade da vitória de Fernando Lugo. Um percentual de 65% do eleitorado compareceu às urnas no domingo.

Primeira dama e Brasil são os temas da imprensa

A imprensa paraguaia tratou, nesta segunda-feira, fundalmentalmente sobre o tema de Itaipú. Segundo o diário de Assunção ABC Color, o presidente Lula teria declarado a jornalistas brasileiros que a revisão do Tratado não está em seus planos. “O Tratado de Itaipú não muda”, teria afirmado Lula ao comentar a vitória de Fernando Lugo. Outro personagem presente na mídia desde ontem é a irmã de Lugo, Mercedes. Na manhã desta segunda-feira a futura primeira dama manifestou interesse em centrar seu trabalho no serviço social e na educação. Para ela, o ensino é a principal condição para o desenvolvimento da cidadania paraguaia.

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21.4.08
domingo de festa

"Há alguns meses, nenhum de nós sonhava que isso poderia ter acontecido. Um grupo de sonhadores políticos colocou o país em primeiro lugar"

Paraguai vota contra a oligarquia dos partidos tradicionais






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DIRETO DE ASSUNÇÃO

“Somos todos iguais na República Independente do Paraguai”

No último comício antes das eleições presidenciais, a Aliança Patriótica para a Mudança lotou a Praça das Armas, no centro de Assunção. Favorito nas pesquisas de intenção de voto, o candidato Fernando Lugo proclamou igualdade para todos e afirmou que o povo paraguaio tem de ser protagonista de sua própria história.

Clarissa Pont

ASSUNÇÃO - Em festa que começou às 4 horas da tarde de quinta (17) e só terminou após a meia noite, Fernando Lugo e o candidato a vice-presidente Federico Franco receberam nomes importantes da música latino-americana, como o uruguaio Daniel Viglietti e a argentina Liliana Herrero. Do Brasil, Chico Batera, percursionista de Chico Buarque, esteve em Assunção para apoiar o candidato da Aliança. Mas foi o portenho Victor Heredia que garantiu os momentos de maior emoção. “Todavia Cantamos” foi entoada por todo o público presente.

“Não queremos terminar com a propriedade privada, como dizem por aí. Ao contrário, queremos que todos os paraguaios sejam proprietários de seu pedaço de terra”, disse Franco. O candidato a vice-presidente convidou os trabalhadores do Paraguai a anteciparem as comemorações do 1º de Maio nas urnas: “vamos celebrar o Dia do Trabalhador neste domingo, 20 de abril”. Fernando Lugo, que cantou com Heredia antes de discursar, falou da importância de ver tantas bandeiras e partidos diferentes na manifestação.

As alianças que apóiam a candidatura do ex-bispo são tão múltiplas, e por vezes antagônicas, que sequer no QG de sua campanha é possível obter uma lista com todos os partidos e movimentos que estão sob a insígnia da Aliança Patriótica para a Mudança. Inclusive o Partido Colorado tem setores que estão com Lugo.

Embora os números que indicam a quantidade de pessoas nestas manifestações nem sempre sejam precisos, a organização do evento afirmou que a Aliança reuniu 120 mil pessoas em frente ao Congresso Nacional. Segundo o jornal Ultima Hora, foram 80 mil. O diário de Assunção obteve fotos aéreas do comício de Blanca Ovelar, na quarta-feira, e de Fernando Lugo, no dia seguinte. Comparando as imagens, o jornal afirmou que a Aliança conseguiu reunir o maior número de militantes, mesmo sem dispor da máquina pública para realizar o encontro.

“Sobram apenas três dias aos que seqüestraram a esperança do povo paraguaio”, afirmou Lugo. Às mulheres, às comunidades originárias e aos jovens, ele disse: “Sou simplesmente um companheiro de caminhada com vocês. Sonhem e construam conosco esta nova pátria”.

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DIRETO DE ASSUNÇÃO

"A desalambrar", o grito de guerra de Daniel Viglietti

"Desalambrar", do espanhol, significa retirar os arames que cercam um território. Canção entoada pelo músico uruguaio e militante tupamaro Daniel Viglietti, foi um dos hinos do comício da Aliança Patriótica para a Mudança, de Fernando Lugo, na noite de quinta-feira. Carta Maior conversou com Viglietti sobre seu apoio à candidatura de Fernando Lugo.

Clarissa Pont

Data: 18/04/2008

ASSUNÇÃO - “O conceito de pátria grande me acompanha desde que nasci. Sou muito uruguaio, mas pertenço a outra pátria, esta onde se pode ser uruguaio, argentino, brasileiro, paraguaio, mexicano. Somos todos parte disso que José Martí chamava de Nuestra America. É isso que me faz estar aqui, que cante no ato de fechamento de campanha de Fernando Lugo”. O uruguaio segue em pé de guerra contra injustiças sociais e a mediocridade que impera na maioria das produções musicais recentes. Segundo Viglietti, “há muitos laços que unem o Paraguai e o Uruguai, não somente o som que rima, mas também laços históricos que vêm de longe. As terras do Paraguai souberam dar refúgio a José Artigas, depois de toda a luta por independência que ele cumpriu”.

Sobre a emoção de cantar “A Desalambrar” esta semana em Assunção, contou que “fiquei sabendo, nos anos 60 através justamente de um sacerdote, que a música é cantada em guarani. O Padre Oliva assinou uma publicação no semanário Marcha, do Uruguai, dizendo que a música era cantada em guarani por comunidades campesinas. Eu gostaria de ouvir”.

Para Viglietti, também a música paraguaia é um elo entre os países. “Eu escutava muita música paraguaia quando criança. Encantava-me a harpa paraguaia, sempre gostei muito de um harpista magistral que teve que viver exilado durante a ditadura, Felix Perez Cardozo. Tive a emoção de conhecer Soledad Barret, uma lutadora contra a ditadura no Paraguai. Eu a conheci, fomos muito amigos, e no Brasil ela foi assassinada naquela terrível história. Tenho uma canção com o nome dela. Tudo isso forma parte desse livro de história que estamos escrevendo os latino-americanos. Ensinaram-nos uma história tão cheia de mentiras e trampas que temos que a reescrever”.

Na ditadura militar paraguaia, Viglietti enfrentou o cárcere em seu país e um exílio de mais de dez anos. No início dos anos 70, com a repressão à guerrilha urbana dos tupamaros , nomes como Alfredo Zitarrosa, Eduardo Galeano e Viglietti sentiram na pele a fúria do governo, tornando-se vítimas de censura, ameaças e prisões. “Tivemos muita solidariedade de fora. Eu sempre me lembro que no lançamento da campanha da Frente Ampla, depois do final da ditadura, nós tivemos apoio do Chico Buarque. Eu estava voltando do exílio em Paris e o Chico me telefonou e perguntou que coisa é essa de Frente Ampla. Eu lhe respondi que, bueno, era uma força progressista, com diferentes setores dentro, que não era algo perfeito, mas era a possibilidade que tínhamos de fazer algo novo”. A prisão de Viglietti culminou em uma campanha encabeçada por gente como o filósofo Jean Paul Sartre, o estadista François Miterrand, o escritor Júlio Cortázar e o arquiteto Oscar Niemeyer. Em 72, Viglietti rumou para o exílio em Paris.

“É muito importante que nossos países, de alguma maneira e jogando dentro dos esquemas democráticos que queremos viver, tenham possibilidade de mudanças políticas, de modificações. Como aconteceu no Brasil, no Uruguai, na Bolívia, no Equador e na Venezuela. Tudo isso na América Latina contra uma tradição que parecia de pedra e que, no final, deu passagem a outras forças de governo. Parece-me que um país que sofreu o que o Paraguai sofreu, com 35 anos de ditadura, em alguma altura da história merece mudanças. Merece oportunidade a outras linhas políticas”, explicou.

Fotos de Eduardo Seidl no blog Celeuma.

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A direita hoje

As vitórias eleitorais de Angela Merkel na Alemanha, de Sarkozy na França e de Berlusconi na Itália, servem para lembrar-nos da força da direita hoje no mundo. Na Europa ocidental, com as exceções da Espanha e da Noruega, a direita está no governo. Aqui mesmo, na América Latina, os governos do PAN no México, de Uribe na Colombia, são representantes indiscutíveis da direita latino-americana. No Brasil, a direita está representada politicamente pelo bloco tucano-pefelista e ideologicamente pelas grandes empresas mercantis da mídia.

O que pensa e proclama a direita hoje, aqui e nos outros lugares do mundo? Seu grau de homogeneidade é relativamente grande, inclusive porque foi ela que formulou o Consenso de Washington, que justamente propõe um único esquema mundial para todos os governos, independentemente do lugar que ocupem no sistema mundial.

O primeiro dos seus pontos programáticos é o privilégio do mercado em relação ao Estado e, em particular, a qualquer tipo de regulação estatal, favorecendo a livre circulação do capital. O que significa o privilégio do dinheiro em relação aos direitos, do consumidor em relação ao cidadão, dos interesses privados em relação aos interesses públicos. Um de seus corolários mais importantes é o papel estratégico que atribuem às grandes empresas privadas, identificadas com o dinamismo e a eficiência econômica, em contraposição ao Estado, desqualificado como ineficiente, burocrático, corrupto.

Como contraponto, a direita execra os gastos públicos e os impostos para financiá-los. Não importa quem perde, de quem se dessolidarizam, prega sempre menos impostos, mais isenções fiscais, créditos estatais e subvenções para eles, porém menos funcionários públicos, menos gastos nos seus salários, recursos sempre menores para políticas sociais. Em outras palavras, pregam acentuar o caráter de classe, de privilégio do Estado para a acumulação privada do grande capital e menos ou nada para atender aos direitos da grande massa popular de cada país.

A direita está pelas alianças – sempre subordinadas, pela força que tem esses possíveis – com as grandes potências do centro do capitalismo, às expensas das alianças latino-americanas e no Sul do mundo. São adeptos da grande imprensa privada – isto é, não pública, da imprensa mercantil - e contrários à mídia pública, democrática.

A direita está a favor do impulso geral às exportações, favorecendo atualmente em particular as de soja, com transgênicos, em detrimento da economia familiar, da expansão do mercado interno, preferindo sempre que esta se dê na direção do consumo suntuário e não do consumo popular. Por isso detesta as políticas de distribuição de renda, os aumentos de salários, a elevação do nível de emprego, os contratos formais de trabalho, o fortalecimento e extensão da educação e da saúde pública – privilegiando sempre a educação e a saúde privadas -, dos programas de habitação popular, de saneamento básico, de cultura popular, de democratização do acesso às universidades – como as políticas de cotas -, de rádios comunitárias, entre outras.

Odeia os movimentos sociais, a reforma agrária, a demarcação de terras indígenas, a sindicalização dos trabalhadores, os programas de alfabetização popular, a politização como forma de acesso à consciência social do que passa no país e no mundo. São conservadores, gostam do mundo tal qual eles mesmos o produziram ao longo de toda a história, com todas suas iniqüidades, e lutam ferozmente contra qualquer mudança nas relações de poder que afete seus interesses.

A direita não gosta da América Latina, do movimento popular, não gosta de falar do imperialismo, das guerras que ele promove, da exploração, da discriminação, da alienação, da opressão, do capitalismo. Não gosta do Brasil, execra o país fazendo sempre comparações depreciativas do país – arte em que Fernando Collor e FHC foram exímios.

Em suma, a direita é de direita – se me permitem a tautologia. Resta que a esquerda seja de esquerda, para combatê-la e fazer avançar a democracia política, a justiça social, a soberania nacional e a integração regional.

Postado por Emir Sader 20/04/2008 às 08:07

O novo Paraguai

O Paraguai tem a melhor oportunidade, nas seis décadas de ditadura do Partido Colorado, de se ver livre dele e colocar em prática as reformas que o país necessita, democratizando- em termos políticos e sociais, para superar seus graves problemas econômicos e sociais. A liderança de um grande combatente da oposição - o bispo da teologia da libertação, Fernando Lugo - permite ao povo paraguaio dispor de uma real alternativa à candidata do Partido Colorado, Blanca Ovelar, e a um ex-dirigente desse partido, Lino Oviedo, envolvido em graves acusações na justiça por participação no assassinato de um ex-vice presidente, entre outras.

A eleição se realizará no dia 20 de abril, em um único turno. Lugo está à frente em todas as pesquisas, por margens que vão de 5 a 10%. Pela tradição de fraude por parte do Partido Colorado, teme-se que possa tentar repetir esses mecanismos e impedir uma vitória que, sem fraude, parece inevitável, terminando com a perpetuação dos colorados no poder. Esta é uma primeira dificuldade, que se trata de superar pela vigilância dos movimentos que apóiam a Lugo e pela presença de uma grande Comissão de Controle, que vigie a transparência do pleito, especialmente no campo, onde pode ser mais fácil cometer fraudes.

O programa da Aliança Patriótica para a Mudança, que reúne a 9 partidos políticos – entre eles um tradicional, o Partido Liberal, e um novo, o Tekojoja - e a mais de 20 movimentos sociais, propõe uma reforma agrária integral, que não represente apenas uma distribuição de terras, mas transformar os camponeses e os indígenas, aqueles que realmente trabalham a terra, em sujeitos de um novo modo de produção agrícola. Propõe também um programa de reativação econômica estreitamente associada à equidade social, para que o Paraguai deixe de ser um dos países mais pobres e de concentração de riqueza do continente, democratizando a reativação econômica.

Ao mesmo tempo, propõe a recuperação da institucionalidade da repúbica e a independência do poder judicial, despartidarizando-o, elementos ambos da democracia política que termine com a apropriação do Estado pelo Partido Colorado. Além disso, propõe a conquista da soberania nacional, incluindo a soberania energética, para que o Paraguai deixe de ser apenas um pais agrícola, produtor de gado e exportador de matérias primas.

A renegociação dos contratos de Itaipu e de Yaciretá – assinados pelas ditaduras de Stroessner e pelas ditaduras militares dos dois países vizinhos - com os governos argentino e brasileiro faz parte da plataforma da candidatura de Lugo, assim como de todos os candidatos, refletindo uma espécie de unanimidade nacional no Paraguai.

Com os recursos a mais que pretende obter, Fernando Lugo se compromete com um amplo programa social, que inclui:

- criação de empregos para 100 mil família desocupadas, em trabalhos comunitários e em obras públicas, que custarão 300 milhões de dólares por ano;

- pensões para 200 mil pessoas da terceira idade, com um gasto total de 150 de milhões de dólares anuais;

- créditos subsidiados para a produção, de 150 milhões, que gerarão 18 mil novos postos de trabalho por ano;

- construção de 40 mil casas por ano, com o custo de 200 milhões de dólares e a criação de 50 mil novos postos de trabalho ao ano;

- construção de estradas, obra sanitárias e infra-estrutura por 200 milhões de dólares ao ano, com a criação de 50 mil postos de trabalho anuais;

- contratação de 30 mil professores para melhorar a educação, com um custo de 60 milhões de dólares por ano;

- construção de 20 novas salas de aula por ano, custando 60 milhões de dólares por ano, criando 15 mil postos de trabalho anuais;

- melhoria da educação primária, média e técnica, custando 40 milhões de dólares ao ano e aumento salarial de para 10 mil professores;

- apoio à pesquisa e à cultura, usando 40 milhões de dólares por ano e gerando 2 mil postos de trabalho anuais;

- contratação de 10 mil enfermeiros para atenção primária da saúde, com o gasto de 40 milhões de dólares ao ano;

- compra de remédios por 50 milhões de dólares ao ano para atenção gratuita de saúde;

- investimento em centros de saúde por 40 milhões de dólares anuais com criação de 10 mil novos postos de trabalho ao ano;

- distribuição de 30 mil lotes de terra para camponeses e indígenas por ano, com o custo de 90 milhões de dólares anuais;

- assistência técnica e creditícia a 300 mil famílias camponesas indígenas, com o custo de 90 milhões de dólares anuais;

- tarifa de água social para 800 mil famílias, com o custo de 40 milhões de dólares por ano;

- tarifa elétrica gratuita para 400 mil famílias e tarifa social para outras 400 mil famílias, com o custo de 40 milhões de dólares por ano;

- tarifa elétrica produtiva reduzida para 50 mil pequenos produtores, com o custo de 30 milhões de dólares anuais;

- melhoramento de redes elétricas para 800 mil usuários rurais e suburbanos, com o custo de 80 milhões de dólares por ano.

Lugo pretende elevar a arrecadação do governo, com a renegociação dos contratos de Itaipu e Yaciretá, em um bilhão e oitocentos mil dólares, para colocar em pratica esse programa de resgte social do Paraguai. Serão criados 315 mil empregos, se aumentará a renda de 310 mil trabalhadores, entre tantos outros benefícios, que permitirão ao Paraguai construir um país novo para seu povo. Para isso tem que contar com a solidariedade e o apoio político e econômico de todos os governos, partidos e forças sociais e culturais comprometidos com a democracia, a justiça social e a soberania nacional.

Postado por Emir Sader 12/04/2008 às 15:09

La naturaleza no es muda

Eduardo Galeano
18 de abril de 2008
Semanario Brecha de Uruguay

El mundo pinta naturalezas muertas, sucumben los bosques naturales, se derriten los polos, el aire se hace irrespirable y el agua intomable, se plastifican las flores y la comida, y el cielo y la tierra se vuelven locos de remate.

Y mientras todo esto ocurre, un país latinoamericano, Ecuador, está discutiendo una nueva Constitución.. Y en esa Constitución se abre la posibilidad de reconocer, por primera vez en la historia universal, los derechos de la naturaleza.

La naturaleza tiene mucho que decir, y ya va siendo hora de que nosotros, sus hijos, no sigamos haciéndonos los sordos. Y quizás hasta Dios escuche la llamada que suena desde este país andino, y agregue el undécimo mandamiento que se le había olvidado en las instrucciones que nos dio desde el monte Sinaí: "Amarás a la naturaleza, de la que formas parte".

Un objeto que quiere ser sujeto

Durante miles de años, casi toda la gente tuvo el derecho de no tener derechos.

En los hechos, no son pocos los que siguen sin derechos, pero al menos se reconoce, ahora, el derecho de tenerlos; y eso es bastante más que un gesto de caridad de los amos del mundo para consuelo de sus siervos.

¿Y la naturaleza? En cierto modo, se podría decir, los derechos humanos abarcan a la naturaleza, porque ella no es una tarjeta postal para ser mirada desde afuera; pero bien sabe la naturaleza que hasta las mejores leyes humanas la tratan como objeto de propiedad, y nunca como sujeto de derecho. Reducida a mera fuente de recursos naturales y buenos negocios, ella puede ser legalmente malherida, y hasta exterminada, sin que se escuchen sus quejas y sin que las normas jurídicas impidan la impunidad de sus criminales. A lo sumo, en el mejor de los casos, son las víctimas humanas quienes pueden exigir una indemnización más o menos simbólica, y eso siempre después de que el daño se ha hecho, pero las leyes no evitan ni detienen los atentados contra la tierra, el agua o el aire.

Suena raro, ¿no? Esto de que la naturaleza tenga derechos... Una locura. ¡Como si la naturaleza fuera persona! En cambio, suena de lo más normal que las grandes empresas de Estados Unidos disfruten de derechos humanos. En 1886, la Suprema Corte de Estados Unidos, modelo de la justicia universal, extendió los derechos humanos a las corporaciones privadas. La ley les reconoció los mismos derechos que a las personas, derecho a la vida, a la libre expresión, a la privacidad y a todo lo demás, como si las empresas respiraran. Más de 120 años han pasado y así sigue siendo. A nadie le llama la atención.

Gritos y susurros

Nada tiene de raro, ni de anormal, el proyecto que quiere incorporar los derechos de la naturaleza a la nueva Constitución de Ecuador.

Este país ha sufrido numerosas devastaciones a lo largo de su historia. Por citar un solo ejemplo, durante más de un cuarto de siglo, hasta 1992, la empresa petrolera Texaco vomitó impunemente 18 mil millones de galones de veneno sobre tierras, ríos y gentes. Una vez cumplida esta obra de beneficencia en la Amazonia ecuatoriana, la empresa nacida en Texas celebró matrimonio con la Standard Oil. Para entonces, la Standard Oil de Rockefeller había pasado a llamarse Chevron y estaba dirigida por Condoleezza Rice. Después un oleoducto trasladó a Condoleezza hasta la Casa Blanca, mientras la familia Chevron-Texaco continuaba contaminando el mundo.

Pero las heridas abiertas en el cuerpo de Ecuador por la Texaco y otras empresas no son la única fuente de inspiración de esta gran novedad jurídica que se intenta llevar adelante. Además, y no es lo de menos, la reivindicació n de la naturaleza forma parte de un proceso de recuperación de las más antiguas tradiciones de Ecuador y de América toda. Se propone que el Estado reconozca y garantice el derecho a mantener y regenerar los ciclos vitales naturales, y no es por casualidad que la Asamblea Constituyente ha empezado por identificar sus objetivos de renacimiento nacional con el ideal de vida del sumak kausai. Eso significa, en lengua quichua, vida armoniosa: armonía entre nosotros y armonía con la naturaleza, que nos engendra, nos alimenta y nos abriga y que tiene vida propia, y valores propios, más allá de nosotros.

Esas tradiciones siguen milagrosamente vivas, a pesar de la pesada herencia del racismo que en Ecuador, como en toda América, continúa mutilando la realidad y la memoria. Y no son sólo el patrimonio de su numerosa población indígena, que supo perpetuarlas a lo largo de cinco siglos de prohibición y desprecio. Pertenecen a todo el país, y al mundo entero, estas voces del pasado que ayudan a adivinar otro futuro aposible.

Desde que la espada y la cruz desembarcaron en tierras americanas, la conquista europea castigó la adoración de la naturaleza, que era pecado de idolatría, con penas de azote, horca o fuego. La comunión entre la naturaleza y la gente, costumbre pagana, fue abolida en nombre de Dios y después en nombre de la civilización. En toda América, y en el mundo, seguimos pagando las consecuencias de ese divorcio obligatorio.

(En Uruguay exclusivo para Brecha)

17.4.08

Carajás: 12 anos de impunidade

Até quando?

15/04/2008

Em 17 de abril de 1996 aconteceu o Massacre de Eldorado de Carajás, que ganhou repercussão internacional e deixou a marca na história do país, ao lado do Massacre do Carandiru (1992) e da Chacina da Candelária (1993), como uma das ações policiais mais violentas do Brasil.

Passados 12 anos do massacre no Pará, permanecem soltos os 155 policiais que mataram 19 trabalhadores rurais, deixaram centenas de feridos e 69 mutilados. Entre os 144 incriminados, apenas dois foram condenados depois de três conturbados julgamentos: o coronel Mário Collares Pantoja e o major José Maria Pereira de Oliveira, que aguardam em liberdade a análise do recurso da sentença, que está sob avaliação da ministra Laurita Vaz, do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Hoje, os trabalhadores Sem Terra cobram da atual governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT), o cumprimento de diversas promessas como atendimento médico multidisciplinar aos sobreviventes feridos durante o massacre, que ficaram com balas alojadas pelo corpo. Até hoje esse atendimento não começou.

“A gente lamenta essa mentalidade de grande parte dos juristas, que acha que a pessoa deve recorrer eternamente, pela chamada presunção de inocência. Esse processo acaba gerando impunidade total e absoluta” afirma o promotor de Justiça do caso, Marco Aurélio Nascimento.

O advogado do MST, Carlos Guedes, que acompanhou o caso desde abril de 1996 até o último julgamento, em maio de 2002 acredita que a Justiça ainda não resolveu o caso. Guedes também alerta que existem dois tipos de responsabilidades em relação ao massacre que a Justiça tem de levar em consideração: as responsabilidades criminal e política.

“Se todos os que foram denunciados, desde o coronel Pantoja até o último soldado, tivessem sido condenados, isso por si só seria insuficiente. Outras pessoas tiveram participação decisiva no massacre, como o governador (Almir Gabriel), o comandante geral da Polícia Militar e o secretário de Segurança Pública (Paulo Sette Câmara). Estes sequer foram envolvidos no caso”, contesta o advogado.

Na opinião dos sobreviventes do massacre e dos advogados do MST, a justiça ainda não veio. As pessoas mutiladas, assim como as 13 viúvas que tiveram seus maridos executados naquele dia, ainda não receberam indenizações.

Tanto para o coordenador nacional do MST no Pará, Charles Trocate, quanto para os mutilados do massacre, o Estado foi o culpado pelo incidente. “A cultura da violência gera a cultura da impunidade. Carajás evidenciou um problema em proporções maiores, mas o Estado não foi capaz de criar instrumentos que corrigissem isso. Primeiro se negou julgar e condenar o governador, o secretário de Justiça e o comandante geral da PM. Segundo, nestes 10 anos, não foi produzida nenhuma condenação porque é o Estado que está no banco dos réus”, afirmou Trocate.

Caminho do processo na Justiça

Abaixo, leia a cronologia do processo dos envolvidos no Massacre de Eldorado de Carajás.

Junho de 1996 - Início do maior processo em número de réus da história criminal brasileira, envolvendo 155 policiais militares. Em 10 anos, o processo ultrapassou as 10 mil páginas.

16 de agosto de 1999 - Primeira sessão do Tribunal do Júri para julgamento dos réus em Belém, presidida pelo juiz Ronaldo Valle. Foram absolvidos três oficiais julgados - coronel Mário Colares Pantoja, major José Maria Pereira de Oliveira e capitão Raimundo José Almendra Lameira. Foram três dias de sessão com cerceamento dos poderes da acusação, impedimento da utilização em plenário de documentos juntados no prazo legal, permissão de manifestações públicas de jurados criticando a tese da acusação e defendendo pontos de vista apresentados pela defesa.

Abril de 2000 - O Tribunal de Justiça do Estado do Pará determinou a anulação do julgamento, decisão mantida em um segundo julgamento, em outubro de 2000. Antevendo a anulação do julgamento, o juiz Ronaldo Valle solicitou o afastamento do caso. Dos 18 juízes criminais da Comarca de Belém, 17 informaram ao Presidente do Tribunal de Justiça que não aceitariam presidir o julgamento, alegando, na maioria dos casos, simpatia pelos policiais militares e aversão ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e aos trabalhadores rurais.

Abril de 2001 - Nomeada uma nova juíza para o caso, Eva do Amaral Coelho, que designou o dia 18 de junho de 2001 como data para o novo julgamento dos três oficiais. Alguns dias antes do início da sessão, a juíza determinou a retirada do processo da principal prova da acusação, um minucioso parecer técnico da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), com imagens digitais que comprovavam que os responsáveis pelos primeiros disparos foram os policiais militares. O MST reagiu e a juíza reviu sua posição, suspendendo o julgamento sem marcar nova data.

14 de maio a 10 de junho de 2002 - O julgamento foi retomado. Após cinco sessões, entre os 144 acusados julgados, 142 foram absolvidos (soldados e 1 oficial) e dois condenados (coronel Pantoja e major Oliveira), com o benefício de recorrer da decisão em liberdade. Em decorrência dos benefícios estendidos aos dois únicos condenados, as testemunhas de acusação não compareceram mais ao julgamento, em função de ameaças de morte e por não acreditar na seriedade do julgamento. Durante vinte dias, jornais do Estado do Pará publicaram detalhes sobre intimidações e ameaças de morte que estariam recebendo as principais testemunhas da acusação, principalmente Raimundo Araújo dos Anjos e Valderes Tavares. Nada foi feito em relação à proteção e salvaguarda de tais testemunhas. O MST não aceitou participar de um julgamento onde não estivessem sequer garantidas a segurança e a tranqüilidade das pessoas fundamentais para a acusação.

Novembro de 2004 - A 2ª Câmara do Tribunal de Justiça do Pará julga numa só sessão todos os recursos da defesa e da acusação e mantém a decisão dos dois julgamentos realizados pelo Tribunal do Júri, absolvendo os 142 policiais militares e condenando o coronel Pantoja (228 anos de prisão) e o major Oliveira (154 anos de prisão).

22 de setembro de 2005 – O coronel Pantoja é posto em liberdade por decisão do Supremo Tribunal Federal.

13 de outubro de 2005 – O major Oliveira é posto em liberdade por decisão do Supremo Tribunal Federal.

2006 - Depois de dois anos, aguarda-se o julgamento do recurso especial apresentado ao Superior Tribunal de Justiça e posteriormente do recurso extraordinário apresentado ao Supremo Tribunal Federal.

17 de abril: día internacional de la lucha campesina


COMUNICADO DE PRENSA - La Vía Campesina

Movilizacion mundial campesina para proponer una solucion a la crisis del precio de los alimentos

(17 de abril 2008, Jakarta) Hoy, organizaciones de pequeños campesinos y sus aliados celebran el día internacional de la lucha campesina y conmemoran la matanza hace 12 años de 19 trabajadores y trabajadoras sin tierra que lucharon para la tierra en Brasil. Hoy docenas de grupos, comunidades y organizaciones en más de 24 países en el mundo organizan más de 50 aciones : mercados campesinos, conferencias, acciones directas, actividades culturales y manifestaciones... para defender su derecho a la comida y su derecho a ser fuente de comida para sus comunidades.

En Yakarta el sindicato campesino indonesio (SPI) junto a otros sindicatos, asociaciones de derechos humanos, pescadores, organizaciones de mujeres y otros grupos están teniendo una asamblea general en contra de las empresas transnacionales. Henri Saraigh – coordinador general del movimiento campesino internacional La Vía Campesina – abrió el evento diciendo: “"Hoy es el día en el que las comunidades acalladas levantan sus voces. Los campesinos y los pueblos rurales representamos casi la mitad de la población de la tierra, sin embargo, nuestras voces no vienen escuchadas y nuestras preocupaciones vienen ignoradas. Demasiadas veces hemos sido marginalizados, empobrecidos y oprimidos. Pero el día 17 de abril celebramos nuestra lucha por la vida!”"

En Argentina, el Movimiento Nacional Campesino e Indígena (MNCeI) se está movilizando en siete provincias y está organizando protestas en contra de los grandes productores de soja que están tomando la tierra y destruyendo el suelo. El MNCeI está organizando acciones en contra de Syngenta y Monsanto, manifestaciones por la vida y en contra del saqueo de mano de las empresas multinacionales. En Alemania una coalición de varias organizaciones de base, ONGs y redes activas en el campo de la agricultura global ha organizado una semana entera de acciones en Berlin y alrededores. Estas incluyen una exposición de fotos, una ventana dedicada a la biodivesridad en una tienda ecológica, una seleción especial de libros sobre agricultura global en una librería, una carrera de bicicletas y una acción en un campo donde se hacen investigaciones sobre OGMs de la macroempresa química BASF y otras. En Camerún, el consejo para el desarrollo agrícola y pesquero (CORDAP) está organizando una conferencia en Yaounde' para discutir “¿Qué tipo de política alimentaria queremos desarrollar en Camerún en la era del aumento internacional de los precios de los alimentos?”

(Una lista completa de las actividades está disponible en www.viacampesina.org)

Esta movilización global ocurre ahora que el hambre ha vuelto a ser tema de actualidad. Los precios de la comida han aumentado de manera impresionante en el último año y disturbios debidos al hambre se suceden en diferentes partes del mundo. Para La Vía Campesina, la crisis alimetaria actual es debida principalmente a la especulación y a la liberalización del mercado en el sector agrícola. Hoy en día, grandes comerciantes de comida están especulando sobre futuras escaseces alimentarias y están subiendo los precios de manera artificial, creando así hambre y aumentando la pobreza. Por otro lado, el desmantelamiento continuo de los mecanismos estatales (como buffer stocks - inventarios amortiguadores - y control de la importación) ha dejado, en las últimas decadas, a los países en una posición extremadamente vulnerable frente a la volatilidad de los precios de la comida.

Las organizaciones campesinas miembras de La Vía Campesina y todos sus amigos y aliadas movilizadas hoy, creen que la agricultura sostenible y la produción alimentaria local puede solucionar la crisis actual. Todos están dispuestos a afrontar el desafío.

Para más información ver: www.viacampesina.org

Por Reforma Agrária e investimento nos assentamentos

19/03/2008

A Reforma Agrária está parada. Cresce a concentração fundiária, os assentamentos não recebem apoio efetivo e aumenta a violência contra os sem-terra e a impunidade dos latifundiários e do agronegócio. O Massacre de Eldorado de Carajás é o principal símbolo do descaso do Estado brasileiro com os trabalhadores rurais, com o povo brasileiro. Depois de 12 anos da chacina que assassinou 19 trabalhadores rurais, no município de Eldorado de Carajás, no Pará, no dia 17 de abril de 1996, pouco mudou para os sem-terra.

150 mil famílias continuam acampadas, as empresas do agronegócio avançam sobre o território brasileiro, conquistando terras que deveriam ser destinadas às trabalhadoras e trabalhadores rurais. O governo tem dado prioridade ao agronegócio. Só o Banco do Brasil emprestou 7 bilhões de dólares para 15 grupos econômicos, enquanto nossos assentamentos não têm apoio suficiente.

Estamos nesta semana fazendo ocupações de terras, marchas, acampamentos, manifestações e protestos, em sedes de bancos públicos, secretarias e órgãos de governos federal e estaduais, cobrando assentamentos das famílias acampadas e por investimento nas áreas de assentamento para ampliar a produção e para a construção de habitações rurais.

A Jornada de Lutas pela Reforma Agrária do MST, neste mês de abril, denuncia a lentidão da Reforma Agrária, os efeitos negativos do agronegócio e apresenta propostas para reverter a situação. Precisamos mudar a política econômica vigente, que beneficia as grandes empresas e o capital financeiro, enquanto a população sofre com o desrespeito dos seus direitos sociais, previstos na Constituição, e com a falta de políticas públicas efetivas para enfrentar a desigualdade e a pobreza.

O Brasil está atrasado no processo de democratização da terra e na organização da produção para garantir a sustentabilidade dos pequenos e médios agricultores. Não podemos admitir a perpetuação do latifúndio, símbolo da injustiça no campo, tanto improdutivo como produtivo.



A nossa jornada de lutas apresenta propostas de desenvolvimento para o campo brasileiro, defendemos um projeto de geração de emprego, com promoção de educação e saúde.

Por isso, nessa jornada exigimos do governo federal:



1- Retomada das desapropriações de terra e assentamento das famílias acampadas por todo o país. Famílias de trabalhadores rurais permanecem anos e anos embaixo da lona preta na luta pela Reforma Agrária:

– Plano emergencial de assentamento de todas as 150 mil famílias acampadas
– Alteração dos índices de produtividade
– Criar um mecanismo que acelere os trâmites internos para os processos de desapropriação
– Aprovação do projeto de lei que determina que as fazendas que exploram trabalho escravo sejam destinadas para reforma agrária
– Destinar áreas hipotecadas no Banco do Brasil e na Caixa Econômica Federal para a Reforma Agrária

2- Criação de uma linha de crédito específica para assentamentos, que viabilize a produção de alimentos para a população das cidades. O Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) não considera as especificidades das áreas de Reforma Agrária. A burocracia dificulta que as famílias assentadas tenham acesso ao programa.

O Incra, como instrumento do governo, deve criar uma nova linha de crédito com o objetivo de criar as condições estruturais de produção e de infra-estrutura social, na modalidade de fomento, para estruturar os assentamentos nos primeiros anos, incentivando formas comunitárias de associação. Defendemos também a criação de um novo crédito bancário para estruturação da base produtiva nos assentamentos. O governo deve garantir a aquisição de toda a produção, por meio da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) com preços justos e seguro agrícola.

3- O MST vem desenvolvendo junto com o Incra, em parceria com a Caixa Econômica Federal, um programa de reforma e construção de casas no meio rural e em especial nos assentamentos de Reforma Agrária. O total da demanda para a habitação rural para 2007 era de 100 mil unidades, de acordo com o grupo de trabalho composto por movimentos sociais. O governo prometeu conceder crédito para a construção de 31 mil unidades até o final do ano passado. Até agora, foram contratadas apenas 8 mil unidades, sendo que somente 2 mil foram destinadas para assentamentos.

Por isso, reivindicamos a contratação de todos os projetos que se encontram na Caixa Econômica Federal até julho de 2008 e o atendimento da demanda de 100 mil habitações rurais para o ano de 2008. Pedimos também a criação de um programa específico de habitação rural, desburocratizado e que atenda as especificidades do meio rural, coordenado pelo Incra em parceria com os movimentos sociais que atuam no campo para atender todas as famílias assentadas.

O Brasil precisa de um novo modelo agrícola, que dê prioridade à agricultura familiar voltada ao mercado interno, aos pobres do país. Com isso vamos garantir a nossa soberania alimentar e produzir comida para os 80 milhões de brasileiros que não têm acesso suficiente aos alimentos. A Reforma Agrária e o fortalecimento da agricultura familiar é uma premissa fundamental para a construção de um país com justiça social e soberania popular.

A conspiração contra Chávez

16/4/2008 11:49:32

Por Ignácio Ramonet
- de Paris

Chávez não havia mandado disparar contra os manifestantes como alguns canais de televisão disseram de forma mentirosa (refiro-me às trucagens que a emissora Venevisión difundiu mundialmente). As provas de que ocorreu o contrário existem e mostram que os primeiros tiros foram dados contra os partidários de Chávez, vindos de franco-atiradores misturados aos manifestantes golpistas e fazendo quatro mortos.

Este gravíssimo golpe contra a democracia, com seu aspecto caricatural (uma junta militar presidida pelo chefe de uma associação patronal), fez a América Latina retroceder, durante 48 horas, a uma era política que pensávamos superada, os anos de pinochetismo e da repressão. Foi uma terrível advertência para todos os dirigentes latino-americanos que quiserem se opor ao modelo neoliberal. Essa advertência se dirige, em primeiro lugar, a Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do Partido dos Trabalhadores à presidência do Brasil, que as pesquisas de intenção de voto colocam como favorito para as eleições de outubro.

Toda essa conspiração se desenvolveu enquanto eu estava em Caracas, uma semana antes dela ser efetivada. A atmosfera era de extrema tensão, sentia-se que o golpe viria.

A Venezuela possui uma estrutura econômica escandalosamente desigual. 70% da população vive na pobreza. Durante quarenta anos, dois partidos, a Ação Democrática e o Copei, repartiram o poder e a riqueza nacional. Os níveis de corrupção alcançaram dimensões gigantescas.

Percorríamos à noite as ruas de Caracas e Hugo Chávez me dizia que a Venezuela havia recebido, de 1960 até 1998, o equivalente a quinze Planos Marshall em venda de petróleo. "Com um único Plano Marshall – me dizia Chávez – pode se reconstruir toda a Europa destruída pela Segunda Guerra Mundial. Com quinze Planos Marshall, só conseguimos que certos corruptos conquistassem algumas das maiores fortunas do mundo, enquanto a maioria da população vive na miséria".

Esse sistema de corrupção, combatido por Chávez, acabou de ser derrubado em 1998. Os partidos AD e Copei foram rejeitados e desapareceram. Chávez foi eleito presidente com um programa de transformação social e com o propósito de fazer da Venezuela um país mais justo e menos desigual. Alguns pensaram que, como tantos outros, uma vez no poder, Chávez se esqueceria de suas promessas e tudo seguiria igual. Mas esse comandante, de origem humilde, admirador dos grandes lutadores da liberdade na América Latina, estava decidido a não decepcionar seus eleitores, aqueles que viam nele a última esperança para sair da pobreza, da falta de educação e da humilhação. "A luta pela justiça, a luta pela igualdade e a luta pela liberdade – me dizia Chávez – alguns chamam socialismo, outros chamam cristianismo, nós chamamos de bolivarismo."

Seu governo lançou toda uma série de reformas sociais: escolas nos bairros esquecidos, realizações em favor dos indígenas, microcréditos para as pequenas empresas, lei de terras em favor dos camponeses sem terra, melhoras da infra-estrutura no interior do país etc. "Estamos diminuindo o desemprego", contava-me Chávez. "Criamos mais de 450 mil novos postos de trabalho. Nos últimos anos, a Venezuela subiu quatro posições no Índice de Desenvolvimento Humano. O número de crianças escolarizadas aumentou em 25%. Mais de 1,5 milhão de crianças que não iam à escola já estão integradas e recebem roupa, comida, material e merenda. A mortalidade infantil diminuiu. Estamos construindo mais de 135 mil moradias para famílias pobres. Estamos repartindo as terras aos camponeses sem terra. Criamos um Banco da Mulher que concede microcréditos. No ano de 2001, a Venezuela foi um dos países com maior crescimento no continente, cerca de 3%... Estamos tirando o país da estagnação e do atraso".

À medida que essas reformas entraram em prática, muitos dos que apoiaram Chávez deixaram de apoiá-lo. Tratavam-no como o "caudilho", chamavam-no de autocrata e essa liberdade de crítica jamais havia existido antes. Ninguém foi preso por crimes de opinião. Mas a minúscula classe rica e a classe média alta, essencialmente brancas, viam com pavor a perspectiva de ver subirem na escala social os negros e os mestiços que aqui, como em toda a América Latina, ocupam os lugares mais inferiores da sociedade. "Existe um racismo incrível em nossa sociedade", me dizia Chávez. "Chamam a mim de El Mono, ou O Negro, não suportam que alguém como eu tenha sido eleito presidente".

Assim se chegou à situação de 11 de abril. Uma situação de confrontação de classe contra classe. Por um lado, o presidente Chávez, apoiado por uma parte majoritária do povo comum, por outro, uma aliança neo-conservadora, a burguesia que ocupava as ruas do bairro rico com panelas, apoiada pela associação patronal, os meios de comunicação ferozmente hostis, mentindo de forma descomunal, inventando rumores e calúnias, falseando as evidências, e a camada aristocrática dos trabalhadores (do setor do petróleo), mobilizados pela CTV, a central sindical considerada a mais corrupta da América Latina.

Essa aliança reacionária declarou uma guerra sem quartel ao presidente Chávez, com o apoio de alguns meios internacionais (como, por exemplo, o canal CNN em Espanhol) e com o apoio dissimulado dos Estados Unidos. Washington, com sua vontade de dominar o mundo depois do 11 de setembro, não podia suportar, como declarou Colin Powell semanas atrás, a independência diplomática da Venezuela, seu papel na Opep, sua falta de apoio ao Plano Colômbia, sua atitude militante contra a globalização neoliberal.

Faz alguns meses, a administração Bush nomeou como subsecretário de Estado para Assuntos Americanos Otto Reich, antigo colaborador de Reagan, colaborador no caso Irã-contras, especialista na organização de sabotagens e de atentados, mestre na arte da contra-revolução. Otto Reich foi o arquiteto oculto da conspiração contra Chávez.

Essas más intenções dos Estados Unidos, na véspera do golpe, Hugo Chávez já percebia com enorme lucidez. "A greve geral de 9 de abril é só uma etapa da grande ofensiva norte-americana contra mim e contra a revolução bolivariana. E seguiram inventando uma série de coisas. Não me admiraria que amanhã inventem que escondo Bin Laden na Venezuela. Não estranharia que mostrassem algum documento com datas e provas de que Bin Laden e um grupo de terroristas da Al-Qaeda estão nas montanhas da Venezuela. Preparam um golpe e, se fracassam, preparam um atentado.

Ignácio Ramonet é jornalista, sociólogo e editor do Le Monde Diplomatique. Texto publicado em 20/02/2008 na Revista Fórum. O texto foi republicado neste espaço por conta dos 6 anos do golpe midiático contra o governo Chávez, que se deu em 11 de abril de 2002.

14.4.08

Uma visão sobre Cuba

Dirlene Marques Professora da UFMG e Conselho Federal de Economia Participei de um grupo de mineiros que esteve em Cuba do dia 20 de janeiro a 5 de fevereiro de 2008, nas Brigadas de Solidariedade. A carta renuncia de Fidel e os comentários da imprensa e das diversas pessoas que encontro, me levaram a escrever este texto, considerando o que vivi, vi, ouvi, observei e estudei. Influenciadas (os) pela intensa propaganda na imprensa, fomos a Cuba procurando a miséria e a ditadura. E, no nosso subconsciente, o povo deveria ser muito passivo e muito bronco, para manter uma ditadura de 49 anos. E o que encontramos? Tivemos um choque pois encontramos um povo com um nível cultural bem acima da media do povo brasileiro. Tivemos liberdade de ir e vir, de bisbilhotar, entrar em todos os lugares e de conversar com todos. Aliás, atá de forma muito invasiva, entrávamos nas casas, nas escolas infantis, nos museus. Procurávamos crianças e adultos de pés no chão, mendigando, dormindo debaixo de marquises, casas miseráveis. Só então entendemos a verdade do outdoor próximo ao aeroporto: “Esta noite, 200 milhões de crianças dormirão nas ruas do mundo. Nenhuma é cubana”. Outro: “A cada ano, 80 mil crianças morrem vitimas de doenças evitáveis. Nenhuma delas é cubana”. Sabemos que milhares delas são brasileiras, a 8a. economia do mundo. Chegamos um dia apos o encerramento do processo eleitoral, onde se elegeu o Parlamento, eleição não obrigatória, com 95% de participação. E, para nossa surpresa, ficamos sabendo que o Partido Comunista Cubano não é uma organização eleitoral e portanto não se apresenta nas eleições e nem postula candidatos. Os candidatos são tirados diretamente, em assembléias públicas nas diversas formas de organizações existentes: do bairro, das mulheres, jovens, estudantes, campesinas. Que depois vão se reunindo por região, estado e finalmente, no nível nacional. Estes representantes nacionais, elegem o presidente e o vice. Todos os representantes podem ser destituíveis, a qualquer momento, pelas suas bases, caso não estejam respondendo ao projeto de sua eleição. E vimos como 46% dos eleitos são mulheres (e no Brasil conseguimos as cotas de 30% para concorrer!!). As estruturas de funcionamento são mais próximas de uma democracia direta. Parece-me um contra-senso chamar este processo de ditadura. Seguramente, é diferente da democracia burguesa, onde após colocar o voto na urna finda a obrigação do eleitor. Os críticos valem-se da mágica de que “o que é bom para os EUA é bom para o resto do mundo”. Tentando entender o que víamos - pouca riqueza material, um povo simples e culto, simpático e sem stress - procuramos estatísticas: alfabetização de 99,8% (no Brasil 86,30%) e que de 1959 a 2007, a quantidade de escolas passou de 7.679 a 12.717, os professores passaram de 22.800 para 258.000, com uma população em torno de 11 milhões de habitantes sendo o pais com o maior índice de professores por habitante do mundo. No IDH 2007 da ONU, o Brasil comemorou o fato de figurar em 70º lugar. Cuba figura em 51º lugar. O país conta com 70.594 médicos para uma população de 11,2 milhões (1 médico para 160 habitantes); índice de mortalidade infantil de 5,3 para cada 1.000 nascidos vivos (nos EUA são 7 e, no Brasil, 27); 67 universidades gratuitas. Dados da Unesco em 2002 mostram que 98% das residências cubanas possuíam instalações sanitárias adequadas (contra 75% no Brasil). Dados da CIA, central de inteligência americana, estimava em 1,9% o desemprego em Cuba, no Brasil era de 9,6% no ano de 2007. E que, a expectativa de vida ao nascer na ilha era de 77,41 anos e no Brasil era de 71,9 anos. Esses são alguns números que encontramos, a despeito de ser uma pequenina ilha, ao alcance de um tiro de canhão disparado de Miami, que resistiu a uma tentativa de invasão norte-americana (Baía dos Porcos, 1961) e a várias outras de assassinato de Fidel Castro e ações terroristas orquestradas pela CIA, ter um bloqueio econômico e político apenas rompido por países com autonomia como Venezuela, Bolívia, China e alguns paises da Europa. Continuamos procurando outros sinais de desmandos: e os presos políticos? De fato, há pessoas detidas mas não pelo que pensam, mas pelo que fazem, como o de organizar grupos financiados pela embaixada dos EUA. Fora isso, todas as personalidades importantes da dissidência estão em liberdade, mantendo suas atividades políticas como Martha Beatriz Roque, Vladimiro Roca e Oswaldo Paya. E importante ressaltar que Cuba sofreu intensamente com o terrorismo nos últimos 40 anos, perfazendo mais de 3500 mortos. Documentos oficiais dos EUA confirmam o financiamento de cubanos exilados para promover ações contra o governo cubano. O museu na Praia Giron (ou Baia dos Porcos) é um monumento de denuncia as ações terroristas, iniciadas desde 1961 com o rompimento das relações diplomáticas e a instauração do bloqueio econômico. Alguns dados: em 1963 o democrata Kennedy, aprova o plano de manter todas as pressões possíveis com o fim de perpetrar um golpe de Estado, obrigando Fidel Castro a viver como nômade. Nos anos 90, a Lei Torricelli reforça o bloqueio econômico (seção 1705) “Os Estados Unidos proporcionará assistência governamental adequada para apoiar a indivíduos e organizações não governamentais que promovam uma mudança democrática não violenta em Cuba”. Esta lei vai ser reforçada na administração de Clinton, pela lei Helms-Burton: “O presidente dos EUA está autorizado a proporcionar assistência e oferecer todo tipo de apoio a indivíduos e organizações não governamentais independentes com vistas a construir uma democracia em Cuba”. O governo Bush não podia ficar atrás e, em 2004 aprovou um financiamento de 36 milhões de dólares para financiar a oposição a Cuba, em 2005 mais 14,4 milhões de dólares, em 2006 mais 31 milhões de dólares alem de 24 milhões de dólares para a Radio e TV Marti, transmitida dos EUA para Cuba neste caso, infligindo a legislação internacional que proíbe este tipo de transmissão. Querem impor a Cuba a democracia (sic) que estão implantando no Iraque. Com o nosso olhar de turistas de classe média, nos chocava alguns problemas da vida cotidiana como habitações modestas, transporte publico precário, limitações econômicas para se ter papel higiênico (e pensávamos, pobrezinho dos cubanos). Estas são carências verdadeiras, além de várias outras apresentadas pelo secretário do partido comunista, em uma palestra para os brigadistas: o aumento da prostituição, dos pequenos delitos, da corrupção e da desigualdade social. Sabiam dos problemas que poderia acarretar a abertura para o turismo apos o fim da União Soviética e a intensificação do bloqueio, nos anos 90. O investimento no turismo e posteriormente, com a criação da moeda turística, cresce a entrada de divisas, possibilitando um rendimento para os trabalhadores destes setores acima do restante da população, ocasionando o aumento da desigualdade social. Afirma ele que vivem em uma quádrupla ilha: geográfica; única nação socialista do Ocidente; órfã de sua parceria com a União Soviética e bloqueada há mais de 40 anos pelo governo dos EUA. Consciente destes novos problemas, buscam construir respostas coletivas. Desencadearam um processo de críticas e sugestões, através das organizações de massa e dos setores profissionais. Até agora, mais de 1 milhão de sugestões foram recebidas e estão sendo trabalhadas. Mas, para nos brasileiros de classe média (somos quantos? 5%? 10%?) e que não conhecemos a realidade dos 90% do nosso povo, que não tem como pagar um plano de saúde, com educação precária, com pouca alimentação, que fica com os restos do desperdício dos 10%, é difícil entender a lógica econômica de uma sociedade voltada para os 100% da população. E ficamos horrorizados por eles não terem papel higiênico. Mas não nos deixam horrorizados que tenham bibliotecas e livrarias em toda escola e em toda cidadezinha. Ou que tenham acesso à saúde e educação da melhor qualidade, habitação com saneamento e aparelhos eletrodomésticos novos que economizam energia. Ou, que vivam em um país sem degradação ambiental. E a busca do conhecimento? E as escolas? Como é possível ver os círculos infantis, crianças de 1 a 4 anos, assentadas ouvindo historias, sem a professora estar gritando, mandando ficarem quietas? E ver os portões destas escolas abertas e as crianças não fugirem? Como é possível não serem estressadas? E conversando com as crianças do pré-escolar e do escolar (5 a 11 anos), ficávamos surpresas com as perguntas cheias de inteligência e informação sobre nosso pais. Como nos permitiam entrar nas salas de aulas, fotografar, bisbilhotar as bibliotecas onde encontrávamos livros de Marx a Lênin, de Jorge Amado, Machado de Assis, a Shakespeare? Imagine isto aqui no Brasil? Ficávamos encantadas. Eu, como professora da UFMG, tida como uma das melhores do Brasil, me encantava com aquelas bibliotecas. E as livrarias? Na pequenina Caimito onde ficava o acampamento, literalmente invadimos uma livraria, comprando tudo quanto e tipo de livro, pela sua qualidade e pelo preço (comprei um livro do Boaventura de Souza Santos por 8 pesos cubanos (mais ou menos a R$ 0,50), outro do Che Guevara sobre Economia Política de 397 págs. por 22 pesos cubanos, portanto em torno de R$ 1,40. E o investimento na potencialidade do ser humano não pára ai. O desenvolvimento das artes – dança, pintura, música, poesia, desportos – e encontrado em cada escola, em cada esquina, em cada cidade. Tivemos também as frustrações no contato com pessoas, especialmente em Havana onde impera o espírito da cidade turística, buscando sempre ganhar alguma coisa, passar a perna, apenas diferenciando pela intensidade dos problemas, com as nossas cidades turísticas como Rio de Janeiro. E mais ingênuo, meio estilo anos 60. De todo jeito, frustrante. Nos entristeceu encontrar cubanos sonhando em sair da ilha, acreditando por exemplo, que o Brasil é um paraíso, visão que tem através das telenovelas (que todos lá assistem). E assim, uma sociedade muito diferente que nos estimula e atrai. Aliás, nada melhor para expressar isto do que a crônica do Clovis Rossi, o “pop star” se aposenta do dia 20 de fevereiro na FSP, relatando o episodio de um encontro do GATT, com a presença dos chefes de estados, diferentes autoridades mundiais e jornalistas de todo o mundo. Diz ele que o burburinho na sala do encontro e na sala dos jornalistas era enorme, com a atenção dispersa. Quando se anunciou Fidel Castro houve uma grande agitacao, com todos procurando o melhor lugar para assistí-lo e “ao terminar, uma chuva de aplausos, inclusive de seus pares, 101% dos quais não tinham nem nunca tiveram nenhum parentesco e/ou simpatia com o comunismo. Difícil entender o que aconteceu ali.” Para terminar, quero colocar uma idéia desenvolvida na mesa redonda integrada por vários cientistas cubanos e sintetizada pelo jornalista Jesus Rodrigues Diaz, falando sobre o potencial no desenvolvimento do conhecimento quando ele se da de forma coletiva: “Temos que insistir também que, quando falamos do Potencial Humano criado pela revolução, não nos referimos exclusivamente à quantidade de conhecimentos técnicos incorporados em nossa população. Mais importante ainda é a semeadura de valores éticos, de atitudes ante a vida. Na sociedade do conhecimento faz falta um cidadão com vocação de aprender e de criar, e de levar seus conhecimentos aos demais seres humanos. Os conhecimentos técnicos nos podem dizer como se trabalha, porém são os valores os que nos fazem compreender porque se trabalha e deles tiramos as motivações e as energias para seguir adiante. Que se passa agora se os conhecimentos se voltem ao fator mais importante da produção, inclusive os bens de capital? Não é difícil de prever. A resposta do capitalismo é a intenção de converter também o conhecimento em Propriedade Privada. Porém, a boa noticia é que isto não vai funcionar. O conhecimento não e igual ao Capital. Está nas pessoas e não se pode facilmente privatizar. O conhecimento requer circulação e intercâmbio amplo. As leis da propriedade intelectual inibem este intercãmbio. O conhecimento é validado pela sua aplicação social, não pela sua venda. O uso amplo dos produtos do conhecimento é o que os potencializa”, termina o jornalista. Esta é a grande limitação do raciocínio capitalista em entender a potencialidade da criação coletiva. Ignoram que a criação humana coletiva tem muito mais possibilidades do que as leituras positivistas do conhecimento. O maior feito desta pequenina ilha, com um povo cheio de dignidade e coragem, terá sido o de mostrar ao mundo que é possível construir uma sociedade baseada no ser humano e não na mercadoria e na acumulação de capital. E isto ameaça o mundo capitalista, e é rejeitada pela imprensa burguesa e pelos setores médios que querem impor as condições de suas vidas para a totalidade do mundo. Mas, Cuba não esta só. Existe hoje uma rede internacional de solidariedade ocasionada pelos médicos e professores cubanos em mais de 100 países, pela Operação Milagros, pelas brigadas de solidariedade e por todos aqueles que acreditam que Um Outro Mundo é Possível e que lutam pela sua construção.

Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz