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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

31.7.07

A INVENÇÃO DA CRISE

30/07/2007 18:48h

Marilena Chauí
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Era o fim da tarde. Estava num hotel-fazenda com meus netos e resolvemos ver jogos do PAN-2007. Liguei a televisão e “caí” num canal que exibia um incêndio de imensas proporções enquanto a voz de um locutor dizia: “o governo matou 200 pessoas!”. Fiquei estarrecida e minha primeira reação foi típica de sul-americana dos anos 1960: “Meu Deus! É como o La Moneda e Allende! Lula deve estar cercado no Palácio do Planalto, há um golpe de Estado e já houve 200 mortes! Que vamos fazer?”. Mas enquanto meu pensamento tomava essa direção, a imagem na tela mudou. Apareceu um locutor que bradava: “Mais um crime do apagão aéreo! O avião da TAM não tinha condições para pousar em Congonhas porque a pista não está pronta e porque não há espaço para manobra! Mais um crime do governo!”. Só então compreendi que se tratava de um acidente aéreo e que o locutor responsabilizava o governo pelo acontecimento.
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Fiquei ainda mais perplexa: como o locutor sabia qual a causa do acidente, se esta só é conhecida depois da abertura da caixa preta do avião? Enquanto me fazia esta pergunta e angustiada desejava saber o que havia ocorrido, pensando no desespero dos passageiros e de suas famílias, o locutor, por algum motivo, mudou a locução: surgiram expressões como “parece que”, “pode ser que”, “quando se souber o que aconteceu”.
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E eu me disse: mas se é assim, como ele pôde dizer, há alguns segundos, que o governo cometeu o crime de assassinar 200 pessoas? Mudei de canal. E a situação se repetia em todos os canais: primeiro, a afirmação peremptória de que se tratava de mais um episódio da crise do apagão aéreo; a seguir, que se tratava de mais uma calamidade produzida pelo governo Lula; em seguida, que não se sabia se a causa do acidente havia sido a pista molhada ou uma falha do avião. Pessoas eram entrevistadas para dizer (of course) o que sentiam. Autoridades de todo tipo eram trazidas à tela para explicar porque Lula era responsável pelo acidente. ETC.
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Mas de todo o aparato espetacular de exploração da tragédia e de absoluto silêncio sobre a empresa aérea, que conta em seu passivo com mais de 10 acidentes entre 1996 e 2007 (incluindo o que matou o próprio dono da empresa!), o que me deixou paralisada foi o instante inicial do “noticiário”, quando vi a primeira imagem e ouvi a primeira fala, isto é, a presença da guerra civil e do golpe de Estado.
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A desaparição da imagem do incêndio e a mudança das falas nos dias seguintes não alteraram minha primeira impressão: a grande mídia foi montando, primeiro, um cenário de guerra e, depois, de golpe de Estado. E, em certos casos, a atitude chega ao ridículo, estabelecendo relações entre o acidente da TAM, o governo Lula, Marx, Lênin e Stálin, mais o Muro de Berlim!!!
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1) Que papel desempenhou a mídia brasileira – especialmente a televisão – na “crise aérea”?
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Meu relato já lhe dá uma idéia do que penso. O que mais impressiona é a velocidade com que a mídia determinou as causas do acidente, apontou responsáveis e definiu soluções urgentes e drásticas! Mas acho que vale a pena lembrar o essencial: desde o governo FHC, há o projeto de privatizar a INFRAERO e o acidente da GOL, mais a atitude compreensível de auto-proteção assumida pelos controladores aéreos foi o estopim para iniciar uma campanha focalizando a incompetência governamental, de maneira a transformar numa verdade de fato e de direito a necessidade da privatização. É disso que se trata no plano dos interesses econômicos.
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No plano político, a invenção da crise aérea simplesmente é mais um episódio do fato da mídia e certos setores oposicionistas não admitirem a legitimidade da reeleição de Lula, vista como ofensa pessoal à competência técnica e política da auto-denominada elite brasileira.
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É bom a gente não esquecer de uma afirmação paradigmática da mídia e desses setores oposicionistas no dia seguinte às eleições: “o povo votou contra a opinião pública”. Eu acho essa afirmação o mais perfeito auto-retrato da mídia brasileira!
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Do ponto de vista da operação midiática propriamente dita, é interessante observar que a mídia:
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a) não dá às greves dos funcionários do INSS a mesma relevância que recebem as ações dos controladores aéreos, embora os efeitos sobre as vidas humanas sejam muito mais graves no primeiro caso do que no segundo. Mas pobre trabalhador nasceu para sofrer e morrer, não é? Já a classe média e a elite... bem, é diferente, não? A dedicação quase religiosa da mídia com os atrasos de aviões chega a ser comovente...
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b) noticiou o acidente da TAM dando explicações como se fossem favas contadas sobre as causas do acontecimento antes que qualquer informação segura pudesse ser transmitida à população. Primeiro, atribuiu o acidente à pista de Congonhas e à Infraero; depois aos excessos da malha aérea, responsabilizando a ANAC; em seguida, depois de haver deixado bem marcada a responsabilidade do governo, levantou suspeitas sobre o piloto (novato, desconhecia o AIRBUS, errou na velocidade de pouso, etc.); passou como gato sobre brasas acerca da responsabilidade da TAM; fez afirmações sobre a extensão da pista principal de Congonhas como insuficiente, deixando de lado, por exemplo, que a de Santos Dumont e Pampulha são menos extensas;
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c) estabeleceu ligações entre o acidente da GOL e o da TAM e de ambos com a posição dos controladores aéreos, da ANAC e da INFRAERO, levando a população a identificar fatos diferentes e sem ligação entre si, criando o sentimento de pânico, insegurança, cólera e indignação contra o governo Lula. Esses sentimentos foram aumentados com a foto de Marco Aurélio Garcia e a repetição descontextualizada de frases de Guido Mântega, Marta Suplicy e Lula;
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d) definiu uma cronologia para a crise aérea dando-lhe um começo no acidente da GOL, quando se sabe que há mais de 15 anos o setor aéreo vem tendo problemas variados; em suma, produziu uma cronologia que faz coincidir os problemas do setor e o governo Lula;
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e) vem deixando em silêncio a péssima atuação da TAM, que conta em seu passivo com mais de 10 acidentes, desde 1996, três deles ocorridos em Congonhas e um deles em Paris – e não dá para dizer que as condições áreas da França são inadequadas! A supervisão dos aparelhos é feita em menos de 15 minutos; defeitos são considerados sem gravidade e a decolagem autorizada, resultando em retornos quase imediatos ao ponto de partida; os pilotos voam mais tempo do que o recomendado; a rotatividade da mão de obra é intensa; a carga excede o peso permitido (consta que o AIRBUS acidentado estava com excesso de combustível por haver enchido os tanques acima do recomendado porque o combustível é mais barato em Porto Alegre!); etc.
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f) não dá (e sobretudo não deu nos primeiros dias) nenhuma atenção ao fato de que Congonhas, entre 1986 e 1994, só fazia ponte-aérea e, sem mais essa nem aquela, desde 1995 passou a fazer até operações internacionais. Por que será? Que aconteceu a partir de 1995?
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g) não dá (e sobretudo não deu nos primeiros dias) nenhuma atenção ao fato de que, desde os anos 1980, a exploração imobiliária (ou o eterno poder das construtoras) verticalizou gigantesca e criminosamente Moema, Indianópolis, Campo Belo e Jabaquara. Quando Erundina foi prefeita, lembro-me da grande quantidade de edifícios projetados para esses bairros e cuja construção foi proibida ou embargada, mas que subiram aos céus sem problema a partir de 1993. Por que? Qual a responsabilidade da Prefeitura e da Câmara Municipal?
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2) Como a sra. avalia a reação do Governo Lula à atuação da mídia nesse episódio ?
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Fraca e decepcionante, como no caso do mensalão. Demorou para se manifestar. Quando o fez, se colocou na defensiva. O que teria sido politicamente eficaz e adequado? Já na primeira hora, entrar em rede nacional de rádio e televisão e expor à população o ocorrido, as providências tomadas e a necessidade de aguardar informações seguras. Todos os dias, no chamado “horário nobre”, entrar em rede nacional de rádio e televisão, expondo as ações do dia não só no tocante ao acidente, mas também com relação às questões aéreas nacionais, além de apresentar novos fatos e novas informações, desmentindo informações incorretas e alertando a população sobre isso.
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Mobilizar os parlamentares e o PT para uma ação nacional de informação, esclarecimento e refutação imediata de notícias incorretas.
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3) Em “Leituras da Crise”, a sra. discute a tentativa do impeachment do Presidente na chamada “crise do mensalão”. Há sra. vê sinais de uma nova tentativa de impeachment ?
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Sim. Como eu disse acima, a mídia e setores da oposição política ainda estão inconformados com a reeleição de Lula e farão durante o segundo mandato o que fizeram durante o primeiro, isto é, a tentativa contínua de um golpe de Estado.
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Tentaram desestabilizar o governo usando como arma as ações da Polícia Federal e do Ministério Público e, depois, com o caso Renan (aliás, o governador Requião foi o único que teve a presença de espírito e a coragem política para indagar porque não houve uma CPI contra o presidente FHC, cuja história privada, durante a presidência, se assemelhou muito à de Renan Calheiros). Como nenhuma das duas tentativas funcionou, esperou-se que a “crise aérea” fizesse o serviço. Como isso não vai acontecer, vamos ver qual vai ser a próxima tentativa, pois isso vai ser assim durante quatro anos.
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4) No fim de “Simulacro e Poder” a sra. diz: “... essa ideologia opera com a figura do especialista. Os meios de comunicação não só se alimentam dessa figura, mas não cessam de instituí-la como sujeito da comunicação ...Ideologicamente ... o poder da comunicação de massa não é igual ou semelhante ao da antiga ideologia burguesa, que realizava uma inculcação de valores e idéias. Dizendo-nos o que devemos pensar, sentir, falar e fazer, (a comunicação de massa) afirma que nada sabemos e seu poder se realiza como intimidação social e cultural... O que torna possível essa intimidação e a eficácia da operação dos especialistas ... é ... a presença cotidiana ... em todas as esferas da nossa existência ... essa capacidade é a competência suprema, a forma máxima de poder: o de criar realidade. Esse poder é ainda maior (igualando-se ao divino) quando, graças a instrumentos técnico-cientificos, essa realidade é virtual ou a virtualidade é real...” Qual a relação entre esse trecho de “Simulacro e Poder” e o que se passa hoje ?
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Antes de me referir à questão do virtual, gostaria de enfatizar a figura do especialista competente, isto é, daquele é supostamente portador de um saber que os demais não possuem e que lhe dá o direito e o poder de mandar, comandar, impor suas idéias e valores e dirigir as consciências e ações dos demais.
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Como vivemos na chamada “sociedade do conhecimento”, isto é, uma sociedade na qual a ciência e a técnica se tornaram forças produtivas do capital e na qual a posse de conhecimentos ou de informações determina a quantidade e extensão de poder, o especialista tem um poder de intimidação social porque aparece como aquele que possui o conhecimento verdadeiro, enquanto os demais são ignorantes e incompetentes.
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Do ponto de vista da democracia, essa situação exige o trabalho incessante dos movimentos sociais e populares para afirmar sua competência social e política, reivindicar e defender direitos que assegurem sua validade como cidadãos e como seres humanos, que não podem ser invalidados pela ideologia da competência tecno-científica. E é essa suposta competência que aparece com toda força na produção do virtual.
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Em “Simulacro e poder” em me refiro ao virtual produzido pelos novos meios tecnológicos de informação e comunicação, que substituem o espaço e o tempo reais – isto é, da percepção, da vivência individual e coletiva, da geografia e da história – por um espaço e um tempo reduzidos a um única dimensão; o espaço virtual só possui a dimensão do “aqui” (não há o distante e o próximo, o invisível, a diferença) e o tempo virtual só possui a dimensão do “agora” (não há o antes e o depois, o passado e o futuro, o escoamento e o fluxo temporais).
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Ora, as experiências de espaço e tempo são determinantes de noções como identidade e alteridade, subjetividade e objetividade, causalidade, necessidade, liberdade, finalidade, acaso, contingência, desejo, virtude, vício, etc. Isso significa que as categorias de que dispomos para pensar o mundo deixam de ser operantes quando passamos para o plano do virtual e este substitui a realidade por algo outro, ou uma “realidade” outra, produzida exclusivamente por meios tecnológicos.
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Como se trata da produção de uma “realidade”, trata-se de um ato de criação, que outrora as religiões atribuíam ao divino e a filosofia atribuía à natureza. Os meios de informação e comunicação julgam ter tomado o lugar dos deuses e da natureza e por isso são onipotentes – ou melhor, acreditam-se onipotentes.
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Penso que a mídia absorve esse aspecto metafísico das novas tecnologias, o transforma em ideologia e se coloca a si mesma como poder criador de realidade: o mundo é o que está na tela da televisão, do computador ou do celular.
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A “crise aérea” a partir da encenação espetacularizada da tragédia do acidente do avião da TAM é um caso exemplar de criação de “realidade”. Mas essa onipotência da mídia tem sido contestada socialmente, politicamente e artisticamente: o que se passa hoje no Iraque, a revolta dos jovens franceses de origem africana e oriental, o fracasso do golpe contra Chavez, na Venezuela, a “crise do mensalão” e a “crise aérea”, no Brasil, um livro como “O apanhador de pipas” ou um filme como “Filhos da Esperança” são bons exemplos da contestação dessa onipotência midiática fundada na tecnologia do virtual.
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Pedi à professora Marilena Chauí para responder a essas perguntas para usar no curso sobre “Telejornalismo” que dou, no momento, na Casa do Saber, em São Paulo. (http://www.casadosaber.com.br/)
Esse texto entra no ar, aqui no iG, no Conversa Afiada, ao mesmo tempo em que os alunos do curso recebem uma cópia.
Os livros citados são: “Leituras da Crise”- “Diálogos sobre o PT, a Democracia Brasileira e o Socialismo”, Editora Fundação Perseu Abramo, São Paulo, 2006, com entrevistas também de Leonardo Boff, João Pedro Stedile e Wanderley Guilherme dos Santos; e “Simulacro e Poder” – Uma Análise da Mídia” – Marilena Chauí, Editora Fundação Perseu Abramo, São Paulo, 2006. (PHA).

PROGRAMAS na TVE BRASIL

29/07, 18h - Xingu – a Terra Ameaçada
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Após 22 anos, documentarista Washington Novaes volta ao Xingu para mostrar os efeitos causados pelo homem branco e a globalização
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Um retorno ao misterioso universo dos povos do Xingu, guiado pela narrativa poética do jornalista e documentarista Washington Novaes. A equipe comandada pelo jornalista produziu, em 1984, a série Xingu, a Terra Mágica, revelando ao país e ao mundo a beleza e encantamentos de cinco grupos indígenas da região – Waurá, Kuikuro, Yawalapiti, Metuktire e Panará.

No ano passado, a equipe retornou para documentar os índios, e o resultado é a nova série Xingu – a Terra Ameaçada, que estréia no domingo, dia 29 de julho, às 18h, na TV Cultura e na TVE Brasil. A série, que tem 16 episódios, será exibida até dia 11 de novembro, sempre aos domingos, às 18h.

Mas o que aconteceu aos povos do Xingu em duas décadas de convivência mais próxima com o branco, aceleração das mudanças climáticas, evolução tecnológica e globalização?

Washington Novaes reencontra o Xingu ilhado entre pastagens, estradas, hidrelétricas e extensas áreas desmatadas para o plantio de soja.

O Parque Indígena e seus habitantes sofrem os efeitos da devastação ambiental a sua volta e da proximidade cada vez maior com a sociedade envolvente.

As aldeias estão invadidas por antenas parabólicas, placas de energia solar, motores a diesel e toda uma parafernália eletrônica. Os pajés já são poucos, porque os jovens não assumem mais a missão longa e sacrificada. Querem assistir TV, usar roupas de fábrica, tênis, óculos escuros, dançar forró e – suprema ambição – passear de moto pelas aldeias.

“O mundo do índio é muito diferente do nosso”, lembra Washington. “É regido pelos espíritos da água, do fogo, da terra, dos animais, das coisas, enfim, tudo tem relação com o sagrado”. Ele recorda que, neste território, a tecnologia e recursos científicos do branco contribuem para o risco da perda definitiva da identidade com a exposição exacerbada dos jovens à cultura do branco.

Mas, felizmente, como diz Washington, “ainda é um momento de coexistência das duas culturas, a do índio e a do branco”. Graças a isso, o telespectador de Xingu – a Terra Ameaçada ainda vai poder se encantar com os belos e comoventes flagrantes de manifestações culturais mantidas bem vivas pelos grupos indígenas novamente documentados.

A Festa do Pequi, a Festa do Espírito do Beija Flor, a Dança do Papagaio, o Kuarup – festa maior do Alto Xingu, ritual para agradar o espírito que roubou a alma de um rapaz –, a iniciação dos jovens com a bateção de marimbondos entre os Panará, e uma emocionante e espontânea reconstituição feita pelos Metuktire do momento histórico do primeiro contato com os irmãos Villas Boas.

A série original foi ao ar em 1985, sendo consagrada pelo público e pela crítica como uma das mais belas narrativas de não-ficção já exibidas pela TV brasileira. Recebeu diversos prêmios no Brasil e no exterior, como no Festival de Cinema e TV de Havana e no Festival de Seul, e contou com uma sala especial na prestigiada Bienal de Veneza, em 1986.

Para a nova série, Washington Novaes reuniu grande parte da mesma equipe de 1984: além do diretor de fotografia Lula Araújo e do diretor de edição João Paulo Carvalho, o renomado artista plástico Siron Franco assina novamente a direção de arte.

Contou ainda, com a colaboração de dois jovens cineastas indígenas como assistentes de fotografia – Maricá Kuikuro e Kiampopri Panará. Também se juntaram ao projeto os quatro filhos de Washington: Pedro Novaes, como diretor de produção, Marcelo Novaes, como cameraman e fotógrafo de still, João que divide a produção executiva com Guilherme Novaes, Cláudio Pereira e com o jornalista Roberto D´Ávila, sócios da Intervídeo, que também co-produziu a série original. Além destes, Pedro Moreira foi ao Xingu como técnico de som.

O programa de estréia, Xingu – A Terra Ameaçada mostra o contraste entre a realidade dos povos do Xingu em 1984 e os dias de hoje.

Patrocínio da Natura e da Petrobras, através da Lei Rouanet e da Lei do Audiovisual.
Realização TV Cultura e TVE Brasil.


quartas, 22h30
sábados, 23h -
O Silêncio dos Intelectuais

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O pensamento da intelectualidade brasileira volta a se refletir na programação da TVE Brasil, por meio da série O Silêncios dos Intelectuais, no ar em cinco programas, as quartas, 22h30, e aos sábados, 23h.

O primeiro, O Silêncio, que discute o tempo da reflexão do intelectual, irá ao ar na quarta-feira, 1° de agosto, com depoimento do poeta e filósofo Antonio Cícero sobre a relação do intelectual com a mídia, e a atuação deste em espaços democráticos.

O final desse primeiro programa aponta para a sensação de mal estar que permeia os depoimentos de vários intelectuais, como o de José Raimundo Maia: “Tem de existir uma saída para que os intelectuais não se vejam falando para os seus pares”.

Intelectuais nacionais e estrangeiros dão depoimento e consistência à série de palestras como a filósofa Marilena Chauí, o professor da École Normal em Paris Francis Wolff, o filósofo Sérgio Paulo Rouanet, a professora de filosofia da França Geraldine Muhlmann, o historiador francês e especialista na questão intelectual Jean-François Sirinelli, e Renato Janine Ribeiro, professor de filosofia da USP, falam nos demais programas que abordam os temas: O processo, O século dos intelectuais, Do adeus à razão à deusa mídia, e Um mundo novo, uma nova palavra.
Roteiro Adauto Novaes, Ana Izabel M. de Aguiar e Eduardo Nunes.
Direção Eduardo Nunes.
Produção Geral Ltda Associação Cultural Mundo Brasil.
Produtor associado 3 Tabela Filmes.
Ministério da Cultura.
Fundo Nacional da Cultura.

O MASSACRE - ELDORADO DOS CARAJÁS: UMA HISTÓRIA DE IMPUNIDADE

LIVRO

Eleuda de Carvalho da Redação
30/07/2007 03:13

O escritor Eric Nepomuceno acaba de lançar O Massacre - Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade (Planeta). No livro-reportagem, que tem fotos de Sebastião Salgado, ele investiga a morte de 19 agricultores no Pará, há 11 anos, à luz de uma reflexão sobre as questões da terra no Brasil
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O livro-reportagem
O Massacre - Eldorado dos Carajás
tem fotos de Sebastião Salgado

O surdo correndo, braços abertos, tomou uma chuva de balas, foi ao chão. Seria o primeiro. Um a um foram caindo, eram 19 corpos destroçados no começo da manhã do dia 17 de abril de 1996. Dos centenares de agricultores que viraram a noite na curva do S, na estrada próxima à fazenda Macaxeira, em Eldorado dos Carajás, Pará, os que escaparam carregam as marcas do horror. "Rubenita Justiniano da Silva, no dia do massacre, tinha 26 anos. Levou um tiro na boca, teve a mandíbula fraturada, a língua rasgada, perdeu seis dentes, e a bala ficou para sempre alojada em sua garganta... Com a frequência das rotinas cruéis, sem aviso, o pescoço desanda a latejar, o local ferido inflama, os olhos ficam avermelhados, a visão enevoada".

Nenhum dos implicados na desastrada operação policial, mesmo condenados - como o coronel Pantoja (sentenciado a 228 anos de cadeia), está preso. Seria mais um capítulo sangrento das questões ligadas à terra no Brasil, mais uma história para ser esquecida.

O escritor Eric Nepomuceno não se resignou. Por três anos, percorreu os meandros do conflito - dos antecedentes do século 16 ao processo judicial que condenou o coronel. E ouviu, de perto, quem ainda sofre na carne o resultado do confronto desigual.

O Massacre - Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade acaba de sair pela editora Planeta. O registro fotográfico é de Sebastião Salgado.

"Tudo o que aquela gente queria era ser ouvida pelas autoridades", escreve Eric Nepomuceno, sobre os sem-terra de Eldorado de Carajás, no seu livro indignado no qual ele faz a conexão entre capitanias hereditárias, o sistema de sesmarias do século 16 (que, não se espante o leitor, ainda traz pretensos herdeiros de imensidões de terras ao século 21), e os continuados conflitos agrários espalhados por todo o país. Apenas na região Norte, os dados oficiais sobre trabalho escravo são de estarrecer. Mas não dão conta da extensão desta tragédia denunciada (e, como sempre, impune). Eric lembra o seringalista Chico Mendes, a missionária Dorothy Stang, outros homens e mulheres ainda vivos, mas marcados para morrer.

"O que se vê pelo interior do Pará são imensos cemitérios a céu aberto", atestou no seu livro, onde também registrou o desmatamento sem limite, a destruição da floresta mas também a esperança e a firme dignidade que ele viu nos sobreviventes ao massacre de Eldorado de Carajás. Eles conquistaram o direito ao Assentamento 17 de Abril. A preço muito caro.

O POVO - Você passou três anos elaborando o livro. Mas, como começou tudo? A partir de que momento você resolveu encontrar os muitos fios desta história?

Eric Nepomuceno - Tudo começou com um telefonema de Nilo Batista, meu amigo, um dos maiores advogados criminalistas do país. Ele me sugeriu escrever sobre o julgamento dos policiais militares que haviam participado da chacina. Expliquei a ele que não tinha a menor vontade de voltar a escrever literatura de não-ficção, ou seja, reportagens, ensaios, essas coisas. Estava dedicado aos meus contos e às traduções de livros de meus amigos. Mas comecei a dar voltas ao assunto, e me interessei. Fui conversar com advogados que haviam atuado no caso, e aí mergulhei fundo, não parei mais. Tudo isso aconteceu no começo de 2004, terminei a última revisão em junho de 2007. Foi um trabalho exaustivo, desgastante, mas que espero tenha valido a pena. A idéia foi escrever um livro que possa ao menos tentar ajudar a impedir que essa história brutal caia no esquecimento.

OP - O que o marcou mais em sua viagem a Eldorado, ao Norte? Como foi encontrar, cara a cara, este pedaço do Brasil?

Nepomuceno - Da mesma forma que a imensa maioria dos brasileiros do sul, eu pouco ou quase nada conhecia do norte. Nunca havia estado no Pará, por exemplo. Foi uma descoberta e tanto. É difícil dizer o que mais me marcou, já que foram tantas as marcas. Mas eu mencionaria duas coisas. Primeiro, a desolação da paisagem naquela área que percorri. Pastos imensos, salpicados por troncos queimados. A castanheira é de madeira nobre, morre de pé. Aquela vastidão desolada impressiona. E segunda e definitiva imagem que me marcou: os olhos das pessoas com quem conversei. Nos assentamentos, nas ocupações de terras, há um olhar de orgulho, de dignidade, de esperança, uma luz que a gente não vê por aí... Os meios de comunicação, na época do massacre e depois, quando do primeiro julgamento, fizeram coberturas bastante corretas e, em alguns casos específicos, muito boas. Depois, o tema foi caindo no limbo da memória. Entendi que deixar que o esquecimento encubra essa história seria matar duas vezes as mesmas pessoas, mutilar de novo os sobreviventes, e contribuir para que tudo continue como está.

OP - Em um trecho do livro você escreve: "A marca da impunidade é evidente". Lembrei de Os Sertões, o "livro vingador" de Euclides da Cunha e seu espanto - que fez com que não esquecêssemos aquela história. Olhando as imagens do Sebastião Salgado, até parece que vemos os rostos das mulheres e dos poucos homens que sobraram do massacre de Canudos... Impunidade que vem de muito tempo, não?

Nepomuceno - Muito, muito tempo sim - e não vejo em horizonte algum a possibilidade de que isso termine. O que entendo cada vez mais é que nosso país vive a mesma estrutura de poder, vive debaixo do mesmo sistema em que uma engrenagem leva a outra, para que tudo permaneça tal como está. E para isso, a impunidade é essencial.

OP - E bulir com esta gente grande, em dinheiro, terras e poder. Você sofreu algum tipo de coação, enquanto esteve lá, pesquisando, entrevistando para o livro?

Nepomuceno - Absolutamente nenhum tipo de coação, nenhuma ameaça, pressão alguma. Agora, não sei como será.

OP - O agronegócio destrói a floresta numa velocidade de míssil. Os assentamentos, devagarinho. A Floresta Amazônica, entre grileiros, mega-empresas e pequenos agricultores - estaria condenada?

Nepomuceno - Não creio que seja exatamente assim. Os grileiros devastam, as mega-empresas também, a política agrícola baseada na agro-indústria ainda mais. Não vi, porém, assentamentos destruindo a floresta. Ao contrário: os que vi já foram instalados em áreas devastadas antes. Veja bem: me refiro ao que constatei. No resto do Pará, ou no resto do Brasil, não sei. Mas até onde pude ver, não senti que a linha mestra seja a devastação. Nem tenho notícia concreta de que isso ocorra com os assentamentos no resto do país. Pode até ser que aconteça, mas não senti que seja essa a política dos que reivindicam terras no Brasil.

OP - E a questão indígena, em meio a isto tudo?

Nepomuceno - Meu tema foi o massacre de Eldorado dos Carajás. Não me propus, nem poderia, a tratar do tema da terra no país inteiro... Mas acho sua pergunta muito pertinente. Espero que alguém se dedique a esse assunto, que é urgente, claro.

OP - Qual a diferença entre os sesmeiros do século 16 e os donos atuais de imensos hectares? Os Mutran, a Vale do Rio Doce, os antigos donos da fazenda Macaxeira (onde ocorreu o massacre)?

Nepomuceno - Não há nenhum nome que eu mencione no livro como exemplo isolado, como um responsável único. O que pretendi foi contar histórias que, no meu ponto de vista, e que aliás é o mesmo das pessoas daquela região, simbolizem um mecanismo muito mais amplo. Tudo que o livro conta está fartamente documentado, mas não se trata de dizer que fulano ou que tal empresa tem a responsabilidade exclusiva. Não: todos são responsáveis, somos todos responsáveis. Uns pela ação, outros por omissão, o sistema pela sua permanência, sua sobrevivência.

OP - "Todo mundo sabe. E tudo continua na mesma", escreve você. Ao se deparar com todos estes dados que você investigou, e ao fim do trabalho - surge um desânimo, uma descrença? Este governo de Lula, tão sonhado, não vem conseguindo avançar em relação às questões do campo. Qual sua opinião?

Nepomuceno - Não penso que seja uma questão deste ou de qualquer outro governo. Enquanto não houver vontade política, determinação real, de se encarar a questão da terra a sério no Brasil, nada vai mudar. Tenho, é verdade, uma certa descrença, que não vem de hoje nem se deve ao atual governo. Às vezes bate, sim, um certo desânimo. Mas aí recordo a lição que recebi de um grande amigo meu que se foi, o Darcy Ribeiro. Ele dizia, com toda clareza, que na América Latina só podemos ser duas coisas: resignados ou indignados. E eu não vou me resignar nunca.

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O Massacre - Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade - Romance reportagem do jornalista e escritor paulistano Eric Nepomuceno com fotografias de Sebastião Salgado. Lançamento Editora Planeta. 216 páginas, R$ 32,50

Quem é o autor - O escritor e jornalista Eric Nepomuceno nasceu em São Paulo, em 1948, mas criou-se e vive no Rio de Janeiro. "Só morei em São Paulo anos mais tarde, de 1964 a 1973", conta ele, por e-mail. Entre 73 e 83, viveu na Argentina, México e Espanha. Em 86, resolve se dedicar apenas à literatura, embora colabore para o jornal espanhol El País e o Página 12, da Argentina. "Publico contos desde 1977, livros de não-ficção (reportagens, ensaios, biografias) desde 78. Tenho livros sobre Cuba, Nicarágua, Zapata, Hemingway na Espanha. Tenho contos em antologias de meia dúzia de países. Traduzi Eduardo Galeano, Julio Cortázar, Juan Rulfo, Juan Carlos Onetti, Mario Benedetti, Juan Gelman, Antonio Skármeta, Gabriel García Márquez - a lista é grande, foram 50 livros. Agora, estou fazendo a nova tradução (a primeira não é minha) de Cem Anos de Solidão. Ah, sim: escrevi o texto de introdução do livro Trabalhadores, do Sebastião Salgado, e o texto do documentário Vinícius, do Miguel Faria Jr". Nepomuceno é autor dos livros A garota do trombone, Coisas do mundo, Quarta-feira, As palavras andantes, O livro da Guerra Grande (em parceria)e organizou Somos todos culpados: pequeno livro de frases e pensamentos de Darcy Ribeiro.

19.7.07

Vaias e explicações



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Escrito por Wladimir Pomar
18-Jul-2007

Num país em que a oposição, de direita ou de ultra-esquerda, não tem bandeiras que mobilizem as grandes massas da população, vaias e palmas, na abertura de uma competição esportiva, podem ser um bom pretexto para montar uma armadilha, tornando-as o centro da discussão política. Se o PT e o governo quiserem evitar a arapuca, talvez o melhor seja reconhecerem que há uma camada da população descontente, e descobrirem o por quê.

No caso, tanto faz que as vaias tenham sido preparadas pela claque da prefeitura do Rio, ou por qualquer grupo oposicionista. Ou que elas tenham vindo de pessoas de outros estados que não o Rio. O fato é que elas ocorreram, sendo acompanhadas pela maior parte dos presentes no Maracanã.

A versão da mídia de que esse público era diversificado, em virtude dos ingressos mais baratos variarem entre dez e vinte reais, apenas lança uma cortina de fumaça. O povão, mesmo tendo melhorado de vida, só sacrifica vinte reais em jogo de time popular. A grande maioria, naquele evento, era constituída por pessoas de classe média, tanto do Rio quanto de outras cidades. Quem tem condição de pagar entrada acima de cinqüenta ou cem reais é funcionário público com cargo comissionado, micros e pequenos empresários bem sucedidos, funcionários e executivos bem remunerados de empresas privadas e uma gama variada de gente que pode ser assalariada, mas possui algum tipo de propriedade.

Era realmente um público diversificado, mas de um mesmo grupo social. Além disso, ausente de lá, mas pertencente ao mesmo agrupamento, e compartilhando com ele suas desventuras, há os setores das classes médias que já não têm como viver as mesmas condições. São os pequenos e médios lavradores que perderam suas propriedades e fonte de trabalho, para os bancos, ou para o agronegócio, ou para os grileiros; os funcionários públicos de baixa remuneração; os micros e pequenos empresários urbanos que foram levados à falência; e uma mistura grande de pessoas que possuíam alguma propriedade e estão ameaçadas de perdê-la ou já a perderam.

Há algum tempo, o governo e o PT vinham sendo alertados, não por inimigos, mas por amigos, de que as classes médias sentem-se desamparadas e espoliadas, e estão sendo empurradas para a oposição. Uma parte delas reclama que trabalha demais para pagar impostos e não é beneficiada pelos programas assistenciais. Outra parte afirma que o governo está arrancando o seu couro para dividir entre o sistema financeiro, de um lado, e os mais pobres, de outro. Todas se recusam a pagar a conta, que supõem ter que ser paga pelos mais ricos. E consideram que seus reclamos não são ouvidos.

Nessas condições, a representação momentânea das classes médias pode ter aproveitado a oportunidade única para, através das vaias, ser ouvida. Outras explicações são até possíveis. Mas será uma pena se o PT e o governo também não aproveitarem o acontecimento para refletirem sobre a possibilidade da versão acima ser a mais importante.

Wladimir Pomar é escritor e analista político.

O aplauso das vaias



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Por Flávio Aguiar - de São Paulo
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Mais uma vez a direita e a extrema esquerda dão-se as mãos. Desta vez é para aplaudir as vaias contra Lula no Maracanã. Na imprensa oligárquica comemora-se e denuncia-se: quem falar que houve orquestração nas vaias é idiota. Voltam as teses de preconceitos vários: é a classe média contra o Bolsa Família, é o Sudeste/Sul contra o Norte/Nordeste, e por aí vai. Voltam os velhos clichês: o Rio é mesmo “irreverente”, etc.

O Estadão eletrônico pelo menos registrou que houve divisão no estádio: uma parte vaiou, outra parte aplaudiu, quando os aplausos foram puxados a partir da tribuna de honra. Ou seja, houve reação às vaias. É claro que a importância da notícia fica com as vaias, mas pelo menos houve, nesse caso, o registro da não-unanimidade. Porque o que a direita e a esquerda da esquerda comemoram é que “O Maracanã vaiou Lula”, “O Rio vaiou Lula”.

De minha parte, não conheço na história, numa circunstância dessas, nem vaia nem aplauso que não parta de uma orquestração. A puxada dos aplausos partiu da tribuna; quem terá puxado as vaias? DEMs distribuídos? Os incansáveis PSTUs e PSÓIS compactados? Tudo junto? É mais provável. Mas vá-se saber ao certo. O que é certo é que em estádio, vaia e aplauso pegam mais do que riso em teatro e cinema.

Pegou novamente pela direita e pela extrema esquerda a campanha implícita (não é preciso conspiração clássica para tanto, venho insistindo nisso) de que é necessário, absolutamente necessário “parar o governo Lula”. Com suas ainda que por vezes timoratas iniciativas populares, o governo Lula moveu o nosso Leviatã (o paquidérmico Estado brasileiro) alguns graus a bombordo, isto é, à esquerda em relação à sua proa. Isso é insuportável tanto para a direita quanto para a extrema esquerda. Para a direita porque lhe provoca pânico (de perder privilégios e rendas) e asco (de ver o povão feliz). Para a esquerda da esquerda porque lhe rouba público potencial.

De quebra, como demonstra o artigo de Bernardo Kucinski (o segundo da série sobre os bancos), Lula, seja por vocação, esperteza, intuição ou vontade explícita (ou tudo junto incluído), produziu o milagre de por no nosso Coliseu político, pela primeira vez desde Vargas, algo que pode se transformar num projeto hegemônico e nacional para a sociedade brasileira, quiçá para a América
do Sul. É uma articulação política que contempla os de cima, acaudilha os de baixo, promove mobilidade social no meio, ou pelo menos abre vias e faz acenos para que isso aconteça, através do acesso, ainda que mitigado por ora, da classe média mais baixa e do proletariado (ops, desculpem o palavrão) mais alto ao ensino superior.

No plano externo, o governo Lula dá oportunidade à estratégia da diplomacia à esquerda dos “barbudinhos”, como se chamou historicamente a então nova geração de diplomatas formados depois que Azeredo da Silveira assumiu o Itamarati no governo Geisel. Essa oportunidade deu espaço a um passo histórico, fazendo que o Brasil assumisse uma posição de liderança na negação da Alca, na afirmação do Mercosul, na luta contra a desigualdade do comércio mundial, puxando até a Índia e a África do Sul, além da Argentina e quem sabe um dia o México, para essa frente.

Ocorre que tudo isso é insuportável para a nossa burguesia e seus “protegés” que guardam o espírito oligárquico. Esse setor da sociedade brasileira desenvolve urticárias, erisipela, furúnculos, herpes, cada vez que ouve falar em “América Latina”, em “projeto nacional”, e coisas assim. Foi-se o tempo, por exemplo, em que parcela da burguesia quatrocentona (para dar um exemplo) de S. Paulo se orgulhava de ter na família “uma avó caçada a laço” (a expressão corrente era essa mesma), apontando sangue índio nas veias, para se distinguir dos imigrantes recém chegados, sobretudo os italianos.

Agora essas e outras famílias dessa classe (nem todas, vamos assinalar) e também de outras partes do país se orgulham é de ter filhos estudando nos Estados Unidos e na Europa; ao mesmo tempo em que adoram elogiar o transporte público nas cidades do “primeiro mundo”, querem mesmo é ter espaço para seus carrões. Se fizessem um plebiscito nessa classe em S. Paulo, garanto que ganharia a abolição do rodízio de carros e dos corredores exclusivos de ônibus e táxis, embora isso, como se provou dramaticamente no começo deste julho, levasse a cidade ao completo caos.

Historicamente predominou nessa burguesia e em seus arautos na imprensa a hegemonia da não hegemonia, isto é, a felicidade privilegiada de administrar, no território pátrio, a hegemonia alheia, através da integração subordinada ao comércio mundial. Para essa parcela, numericamente não desprezível da população, ainda que esmagadoramente minoritária, se tivesse consciência histórica, a época áurea do Brasil estaria na República Velha, quando a oligarquia de então, depois de se ver livre do imperador e da maldita princesa que lhe tirou os escravos remanescentes sem pagar indenização, e de neutralizar os positivistas mais exaltados, conseguiu estabelecer o reino do “seu” liberalismo, aquele em que as liberdades constitucionais valem mesmo para os bem nascidos ou os bem acolhidos em seu universo de favores.

Esse universo, caracterizado pela ineficiência de nossa carta constitucional, qualquer que ela seja, além de criar ao longo da história as mazelas que ora vemos explodir no Congresso Nacional (mas que a imprensa oligárquica agora aponta como um “mal de Lula”), cai como luva para a retórica dos extremos da esquerda, cujo objetivo momentâneo, já que “não estão dadas as condições históricas para o grande salto”, é a conquista de adeptos. A opção do governo Lula “rouba” espaço a essa retórica, e hostiliza o imobilismo que ela contém, sempre preocupada mais em demonstrar que a razão sempre lhe pertence, do que em fazer avançar a situação, as condições de vida e a consciência dos próprios direitos por parte dos de baixo.

Não resta dúvida de que, mesmo com suas titubeações e inconsistências por vezes irritantes, o governo de Lula é o fato mais perigoso para a estabilidade desse quadro histórico brasileiro (desde Vargas, volto a citar) hoje ainda caro à oligarquia dominante e interessante para que a retórica de esquerda possa medrar. Por isso cabe mesmo orquestrar vaias contra o presidente, dentro dos estádios e nas páginas e telas eletrônicas.

Flávio Aguiar é editor-chefe da Carta Maior - 16/7/2007 22:50:40

14.7.07

A vaia do Rio de Janeiro branco

"Onde estavam os negros na linda festa do maior templo do esporte mundial? Onde estavam os pobres que todos os dias atormentam os motoristas nos sinais de trânsito, esmolam nas esquinas, balançam nos trens e nos ônibus lotados?", pergunta David Coimbra, jornalista, em artigo publicado no jornal Zero Hora, 14-07-2007.

Eis o artigo.

"A vaia do Maracanã ao presidente Lula foi maciça, foi pesada e foi humilhante. Mas há um aspecto nessa vaia que não se pode deixar passar: foi a vaia do Rio de Janeiro branco. Onde estavam os negros na linda festa do maior templo do esporte mundial? Onde estavam os pobres que todos os dias atormentam os motoristas nos sinais de trânsito, esmolam nas esquinas, balançam nos trens e nos ônibus lotados? Quem atravessou a cidade da Barra da Tijuca ao Maracanã viu onde eles estavam: nas favelas pingentes, nas malocas infectas, vivendo no fedor do mangue, entre balas perdidas e papagaios empinados.

Isso não desmerece nem desautoriza a vaia do Maracanã. Os bem nascidos e bem alimentados também têm direito à vaia, e foram 90 mil bem nascidos e bem alimentados que vaiaram o presidente. Mas foram, sim, os bem nascidos, os bem alimentados.

Eu estava no Maracanã. Eu vi: eram todos limpos, corados, vestidos de acordo com a moda, caminhando sorridentes com seus filhos pela mão. Repito: não havia pobres no Maracanã. E repito: isso não torna a vaia menor. Mas isso deixa exposta a maior chaga do Brasil. O Brasil são dois: o Brasil branco, que trabalha, ri, se diverte e protagoniza uma festa tão magnífica como a de ontem. E o Brasil que vive à margem, subnutrido, revoltado, muitas vezes de fuzil na mão, como nas favelas do Rio.

Lula veio deste Brasil. Do Brasil negro. Provavelmente mereceu a vaia. Mas quem o vaiou vem de um lugar do qual ele jamais pertenceu. E talvez tenha sido esse o motivo de ter sido a vaia tão maciça, tão pesada, tão humilhante."

As vaias no Pan
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A abertura dos Jogos Pan-Americanos do Rio, ontem no Maracanã, teve um show de vaias: a Argentina, eterna rival do Brasil, foi poupada no desfile das delegações, mas sobrou para os atletas dos EUA, da Bolívia e da Venezuela. No entanto, quem mais foi apupado não era esportista: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acabou vaiado todas as vezes em que apareceu no telão ou teve seu nome anunciado. E, em uma quebra de protocolo, Lula não fez o pronunciamento de abertura oficial dos Jogos - desde a primeira edição, em Buenos Aires, em 1951, os chefes de Estado são responsáveis pelo anúncio. A notícia está nos principais jornais do País, hoje, 14-07-2007.

Lula teria sido vítima de uma gafe do presidente do Comitê Olímpico Brasileiro e do Co-Rio, Carlos Arthur Nuzman. Afinal, o presidente estava com o texto e o microfone à mão na tribuna de honra, e foi anunciado pelo presidente da Organização Esportiva Pan-Americana (Odepa), o mexicano Mario Vasquez Raña. Mas Nuzman se antecipou e acabou dizendo:

- Em nome de todos, declaro abertos os Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro.
Para a manhã de hoje, estava prevista a presença do presidente na praia de Copacabana para entregar as primeiras medalhas do Pan do Rio, na prova de maratona aquática.
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Desabafo indignado
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Assisti a abertura do PAN pela televisão, e li os textos publicados no IHU On-line de 14/07/2007 - "As vaias no Pan" e "A vaia do Rio de Janeiro branco", e diante disso, gostaria de expressar minha opinião sobre os fatos ocorridos, intitulados como "quebra de protocolo" ou a "gafe do presidente do Comitê Olímpico Brasileiro e do Co-Rio, Carlos Arthur Nuzman".
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Acho ingênuo acreditar que em um evento como o PAN possa ter havido "quebra de protocolo" ou "gafe", mas na verdade o que ocorreu foi mais uma demonstração do "ódio de classe da burguesia brasileira", como já bem se pronunciou Jorge Borhausen (DEM), cuja declaração foi muito bem analisada pelo sociólogo Emir Sader (em artigo publicado na Agência Carta Maior, em 28/8/2005), a quem respeito e admiro pela clareza de idéias.
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Como descreve David Coimbra (artigo "A vaia do Rio de Janeiro branco"), as pessoas que estavam presentes no Maracanã no dia 13/07/2007 eram as que formam "o Rio de Janeiro branco", os "bem nascidos e bem alimentados". Não haviam pobres, negros, e todos os excluídos do sistema capitalista mundial..., nem na platéia e muito menos no Comitê Olimpico Brasileiro.
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Por isso, reitero que não acredito no que a mídia oligárquica ousa chamar de "quebra de protocolo" ou "gafe". Mas, os fatos que marcaram a abertura do PAN como uma "festa" excludente e burguesa, devem-se a divisão do Brasil em dois: "o Brasil branco, que trabalha, ri, se diverte e protagoniza uma festa tão magnífica como a de ontem. E o Brasil que vive à margem, subnutrido, revoltado, muitas vezes de fuzil na mão, como nas favelas do Rio", como definiu Coimbra.
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mfernandams
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Desabafo indignado

Assisti a abertura do PAN pela televisão, e li os textos publicados no IHU On-line de 14/07/2007 - "As vaias no Pan" e "A vaia do Rio de Janeiro branco", e diante disso, gostaria de expressar minha opinião sobre os fatos ocorridos, intitulados como "quebra de protocolo" ou a "gafe do presidente do Comitê Olímpico Brasileiro e do Co-Rio, Carlos Arthur Nuzman". Acho ingênuo acreditar que em um evento como o PAN possa ter havido "quebra de protocolo" ou "gafe", mas na verdade o que ocorreu foi mais uma demonstração do "ódio de classe da burguesia brasileira", como já bem se pronunciou Jorge Borhausen (DEM), cuja declaração foi muito bem analisada pelo sociólogo Emir Sader (em artigo publicado na Agência Carta Maior, em 28/8/2005), a quem respeito e admiro pela clareza de idéias.
Como descreve David Coimbra (artigo "A vaia do Rio de Janeiro branco"), as pessoas que estavam presentes no Maracanã no dia 13/07/2007 eram as que formam "o Rio de Janeiro branco", os "bem nascidos e bem alimentados". Não haviam pobres, negros, e todos os excluídos do sistema capitalista mundial..., nem na platéia e muito menos no Comitê Olimpico Brasileiro. Por isso, reitero que não acredito no que a mídia oligárquica ousa chamar de "quebra de protocolo" ou "gafe". Mas, os fatos que marcaram a abertura do PAN como uma "festa" excludente e burguesa, devem-se a divisão do Brasil em dois: "o Brasil branco, que trabalha, ri, se diverte e protagoniza uma festa tão magnífica como a de ontem. E o Brasil que vive à margem, subnutrido, revoltado, muitas vezes de fuzil na mão, como nas favelas do Rio", como definiu Coimbra.
mfernandams

12.7.07

Decálogo para falar mal de Hugo Chávez




Lembrete pendurado na frente de jornalistas da mídia oligárquica:
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1. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele recupera o papel do Estado, desqualificado e enterrado por nós há tempos.
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2. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele se diz anti-imperialista e esse é um tema proibido na mídia há tempos.
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3. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele funda um novo partido, quando martelamos todos os dias que todos os partidos são iguais, que são negativos, que sempre refletem interesses de grupinhos.
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4. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele recupera o papel da política, quando todo o trabalho cotidiano da mídia é para dizer que a política é irrecuperável, que só a economia vale a pena.
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5. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele vende petróleo subsidiado aos países que não podem pagar o preço do mercado - inclusive a pobres dos Estados Unidos -, o que evidentemente fere as leis do mercado, pelo qual tanto zela a midia.
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6. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele é um mau exemplo para os militares, que só devem intervir na política quando seja necessário um golpe militar e nunca para defender os interesses de cada nação.
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7. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele ataca a mídia privada e fortalece a mídia pública. Porque ele acabou com o analfabetismo na Venezuela, tema sobre oqual devemos calar. Porque ele vai diminuir a jornada de trabalho em 2010 para 6 horas e esse tema é odiado pelos patrões.
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8. Devo falar mal de Hugo Chávez porque assim me identifico com os interesses do dono do meio em que trabalho, garanto o emprego, fortaleço os partidos e as empresas aliadas do patrão.
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9. Devo falar mal de Hugo Chávez porque ele faz com que se volte a falar do socialismo, depois que nos deu muito trabalho tratar de enterrar esse sistema, inimigo do capitalismo, a que estamos profundamente integrados.
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10. Devo falar mal de Hugo Chávez (e de Evo Morales e de Lula e de todos os nao brancos), senão eles vão querer dirigir os países, os jornais, as televisões, as empresas, o mundo. Será o nosso fim.
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Postado por Emir Sader, 10/07/2007 às 06:27

As folhas e as raízes

Escrito por Wladimir Pomar
11-Jul-2007
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Virou lugar comum, em certos setores da esquerda, afirmar que o governo Lula é neoliberal. Seja porque quer construir a hidrelétrica do rio Madeira, seja porque pretende fazer a interligação do rio São Francisco com as bacias do semi-árido nordestino, seja ainda porque continuaria dando prioridade aos grandes grupos econômicos e não à sociedade.
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Haveria vários exemplos desse neoliberalismo. O financiamento ao setor de papel e celulose, "voltado majoritariamente para a exportação", responsável por "desertos verdes" e agravamento da "concentração de terra e renda", seria um deles. O financiamento ao agronegócio, para produção de etanol, "em sistemas de monocultivo da cana", seria outro. A "ausência do debate e da construção de políticas públicas que apóiem a soberania energética do país e sejam baseadas em modelos sustentáveis, na economia camponesa, nas pequenas e médias unidades de produção", seria o determinante. .
Segundo esses setores, para escapar ao neoliberalismo, o governo deveria voltar-se para o atendimento das "demandas históricas da sociedade brasileira, como saneamento básico, moradia popular, agricultura produtora de alimentos para o mercado interno e não de matérias-primas para exportação", e para o financiamento de uma "matriz energética limpa e modernizada". .
Vê-se que eles enxergam as folhas, mas nada sabem sobre as raízes que sustentam as árvores. Falam em neoliberalismo, sem atacar o capitalismo. Parecem não saber que o neoliberalismo é uma solução atual do capitalismo. Para eles, o que está colocado é um simples problema de prioridade, que dependeria, exclusivamente, da vontade do governo. Nada teria a ver com a correlação concreta de forças econômicas e sociais. Nem com o fato do Estado brasileiro ainda ser um Estado capitalista, com seu aparato, há décadas, sob a hegemonia e domínio das forças sociais e políticas capitalistas ou burguesas.
. Não se apercebem que a economia camponesa não é sustentável no atendimento às "demandas históricas" de saneamento, moradia e produção de alimentos para o mercado interno. Para atender a tais "demandas", é preciso que as forças produtivas industriais e agrícolas se desenvolvam numa escala capaz de gerar um excedente de riqueza tal que possa atender tanto a elas quanto à reprodução ampliada da própria produção social. O que demanda, por sua vez, uma infra-estrutura energética, de transportes e de telecomunicações, capaz de permitir tal desenvolvimento. .
Portanto, querem dar à pequena agricultura de alimentos um papel estratégico diferente do que pode ter. Ou seja, querem que o governo substitua o grande capitalismo pelo pequeno capitalismo (é disso que realmente se trata), sem dizer com que forças contaria para isso. Assim é fácil adjetivar e criticar.
. Wladimir Pomar é escritor e analista político.

7.7.07

Caxias é capital da Cultura!??

De onde a Prefeitura terá verba? Leia por favor as informações do site da ONG responsável pela escolha: www.capitalbrasileiradacultura.org Não há nenhum recurso automático. Todos os recursos deverão vir de onde já vêm hoje: da própria Prefeitura ou da iniciativa privada, através de projetos culturais. "Caberá ao PARCEIRO PÚBLICO, caso seja necessário, providenciar a captação de recursos de patrocínios junto às empresas, públicas e privadas, para complementar eventualmente os recursos que estiverem alocados no Orçamento Municipal para executar o seu programa como CAPITAL BRASILEIRA DA CULTURA 2008." Sendo que: 5% de todos os recursos captados pela Prefeitura deverão ir para a tal ONG. E se essa ONG, por ventura captar algum recurso, em nome dos projetos da Prefeitura de Caxias, ou em nome de Caxias, ficará com 10%. Então com que entra a ONG? - Com a divulgação no seu site da internet. - Com assessoria para o desenvolvimento do programa CAPITAL BRASILEIRA DA CULTURA 2008, através da participação de uma pessoa da ONG. - Auxílio na assessoria de imprensa. - Divulgação em TVs de um VT fornecido pela Prefeitura (isso em TVs onde obtiver parceria, ou seja, sem pagar). Fácil, né? Foi uma excelente idéia da ONG! Porque será que outras cidades não se inscreveram? Apenas 4? Isso quer dizer que é um mico? Não completamente. Pode sim reverter positivamente para a cidade. Mas não é automático, depende muito mais de uma postura do poder público do que de um título.

OMS coloca o estresse ocupacional como um fator social

Estudos da OMS chamam a atenção dos países emergentes para o estresse no local de trabalho e a influência dos fatores sociais na vida dos trabalhadores Estudos da Organização Mundial da Saúde referentes aos anos de 2005 e 2003 revelam que os problemas relacionados ao estresse ocupacional estão associados às constantes mudanças sociais, como, por exemplo, a globalização, o aumento da economia informal e as mudanças que ocorrem no ambiente de trabalho.
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O estresse ocupacional é definido como a soma de respostas físicas e mentais, ou ainda, reações fisiológicas, que, quando intensificadas, transformam-se em reações emocionais negativas. Ele aumenta consideravelmente o número de trabalhadores afastados e reflete na vida das organizações, seja em perda de produtividade, seja na diminuição da qualidade dos produtos e serviços prestados.
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A globalização, como parte de um processo de mudanças sociais, traz consigo novas reformas econômicas e sociais, as quais exigem dos trabalhadores e das organizações, adaptações e reorientações quanto ao sistema de saúde ocupacional. De acordo com o estudo, os principais problemas relacionados à globalização incluem o desemprego, as condições de trabalho precárias devido às novas relações industriais e a crescente ausência de prioridade de aspectos sociais em várias partes do mundo.
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O estudo, ao citar o aumento na economia informal dos países em desenvolvimento, ressalta a importância da realização de pesquisas detalhadas com o objetivo de analisar as diferenças culturais e comportamentais, que variam de país para país.
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Uma outra observação apontada pela OMS refere-se ao foco das iniciativas organizacionais. Estas, normalmente, consideram somente aspectos preventivos em saúde e segurança, como a exposição a agentes químicos, físicos e biológicos, e não levam em conta os riscos psicossociais. Este tipo de risco é negligenciado e insuficientemente compreendido por pertencer ao contexto dos países em desenvolvimento.
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Outro aspecto apontado no estudo está voltado para a divisão entre as condições de trabalho e o ambiente de trabalho, que faz com que os riscos psicossociais sejam difíceis de serem identificados pelos profissionais da área de SST. Além disso, a ausência de políticas de desenvolvimento que considerem este tipo de risco no ambiente de trabalho torna mais difícil a implementação de práticas efetivas de controle e a elaboração de estratégias para tal questão, por parte das empresas.
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Outros fatores que limitam as empresas de detectarem as causas que levam trabalhadores ao estresse ocupacional são relacionados ao ambiente externo de trabalho e incluem as desigualdades entre homens e mulheres, baixa participação e envolvimento de cidadãos nas questões sociais, além da gestão precária de saneamento básico.
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Tais aspectos sociais influenciam na percepção individual e, com isso, modificam a maneira das pessoas reagirem ao que pode ser considerada “boa” ou “má” condição de trabalho. Um exemplo pode ser observado quando o trabalhador se submete a comportamentos autoritários de empregadores e gestores e a condições precárias de trabalho para garantir seu emprego.
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O estudo conclui, ainda, que, nos países emergentes, a maior parte da força de trabalho é terceirizada e concentra-se nas empresas pequenas e familiares, que, por sua vez, estão na economia informal.
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Além disso, a ausência de infra-estrutura, de recursos, de disponibilização de informações, a precariedade na cobertura dos serviços em saúde e saúde ocupacional, são fatores que acometem e levam milhões de trabalhadores ao chamado estresse ocupacional.
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Números que estressam
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A OMS estima que, no mundo, de 5 a 10 por cento dos trabalhadores dos países em desenvolvimento, têm acesso aos serviços de saúde ocupacional, enquanto nos países de primeiro mundo, de 20 a 50 por cento dos trabalhadores possuem esse acesso. De acordo com a organização, dois milhões e quatrocentas mil pessoas vivem e trabalham em países subdesenvolvidos, o que representa 75 por cento da força mundial de trabalho. A taxa de exposição de trabalhadores submetidos à exposição de risco no local de trabalho em países em desenvolvimento atinge de 20 a 50 por cento.
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Enquanto isto, nos países industrializados, mais de 80 por cento da força de trabalho estão nas médias e pequenas empresas e 50 por cento dos trabalhadores, segundo a OMS, julgam o trabalho como algo “mentalmente estressante”.
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Com base em tudo isto, a cada ano existem 120 milhões de acidentes ocupacionais com 200 mil fatalidades, e de 68 a 157 milhões de doenças existentes no local de trabalho. Condições precárias de saúde ocupacional e capacidade reduzida de trabalhadores causam perda econômica de 10 a 20 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) de um país em desenvolvimento.
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A OMS disponibiliza, em inglês, o documento para leitura intitulado “Global Strategy on Occupational Health for All”, em www.who.int/occupational_health/en/oehstrategy.pdf.Nele, estão informações voltadas a compreender como as novas tendências da economia global, os problemas sociais e ocupacionais emergentes e o empoderamento da sociedade, contribuem para ações efetivas no ambiente de trabalho.
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A urgência em mudanças
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Na América Latina, por exemplo, o estresse ocupacional é presente e reconhecido como sendo uma das maiores epidemias da vida moderna. Ao mesmo tempo, muitos profissionais de SST acreditam que o estresse ocupacional está associado às condições ergonômicas de trabalho e ao conforto. Com esta idéia, o foco dos regulamentos continua sendo trabalhado nas questões físicas, químicas e de exposição, ao estabelecerem condições que julgam ser seguras quanto aos riscos de acidentes. Outros aspectos que dificultam a implementação de regulamentos mais efetivos estão nos longos turnos e na insegurança no trabalho.
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Isto significa que, a maior parte dos regulamentos elaborados aos trabalhadores representam a adoção de limites de exposição no modelo tradicional de saúde ocupacional, sem levar em consideração os aspectos psicossociais.
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Conseqüências para os trabalhadores
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Se as causas apontadas no estudo mostram que o estresse ocupacional resulta da interação entre trabalhadores e as condições de trabalho, por outro lado, o estudo aponta que devem ser levadas em consideração os aspectos individuais, tais como, a personalidade, idade, educação, experiência e estilo de vida.
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Considerar os aspectos e as diferenças individuais demandam estratégias complementares de prevenção que foquem o indivíduo e promovam formas de prevenção.
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Algumas respostas individuais, tais como as fisiológicas, estão normalmente associadas a fatores externos, podendo resultar em aumento da pressão arterial, infarto do miocárdio, aumento da tensão muscular, suor excessivo, entre outros. Entretanto, de acordo com o estudo, as reações emocionais e os aspectos cognitivos devem ser também levados em consideração ao analisar a reação de indivíduos. As reações emocionais são aquelas que desencadeiam o medo, a irritação, a alteração no humor, ansiedade e falta de motivação, enquanto os aspectos cognitivos estão associados à diminuição da atenção, mudança de percepção, esquecimento, diminuição na capacidade de aprendizado, entre outros.
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Ao considerar de grande importância todos estes aspectos individuais, o estudo da OMS ainda observa que os fatores comportamentais (aqueles associados à diminuição da produtividade, aumento excessivo no consumo de cigarros, erros freqüentes e ausência no trabalho por motivos de doença) contribuem para o aumento do estresse.
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O estresse feminino
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O estudo da OMS revela ainda que, tanto em países emergentes como nos países desenvolvidos, as mulheres no ambiente de trabalho geralmente apresentam maior estresse se comparadas aos homens.
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As razões que explicam esta mudança de comportamento são a dupla jornada de trabalho que exige das mulheres a responsabilidade no lar e no local de trabalho, o assédio sexual, seguido de discriminação quanto às diferenças de renda e pressões exercidas no ambiente profissional. Ainda de acordo com o estudo, os países emergentes, em particular a América Latina e a Ásia, empregam mulheres em escritórios e fábricas, ambos caracterizados como fonte de estresse.
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Em uma estimativa global, a OMS aponta a mulher, como contribuinte indispensável nas economias nacionais, representando, ao redor do mundo, 42 por cento da força de trabalho. A violência doméstica também expõe a mulher como um fator condicionante ao estresse ocupacional, conforme mostra o estudo.
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Gestão do estresse
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Outro estudo voltado para a gestão de riscos no ambiente de trabalho que leva em conta os aspectos psicossociais foi realizado pelo órgão regulador Britânico, Health and Safety Executive (HSE), em maio de 2007.
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O documento, com 126 páginas, analisa desde a atuação de gestores no local de trabalho e sua contribuição no cotidiano dos trabalhadores, até o mapeamento da prevenção de riscos para a redução do estresse ocupacional.
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Outros aspectos como a detecção dos sinais do problema, medidas de ação, análise dos fatores de risco, plano de ação, implementação do plano de ação e avaliação da intervenção, surgem como indicadores para a gestão do estresse ocupacional e auxílio aos especialistas da área de SST.
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O estudo (todo em inglês), está disponível para download em www.hse.gov.uk/research/rrhtm/rr553.htm.
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Alexandra Rinaldi
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Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz