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"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

23.6.14

A hora e a vez dos corações valentes - Carta Maior

22/06/2014 - Copyleft

A hora e a vez dos corações valentes

Sem politizar a discussão dos modelos em disputa no país, a dinâmica do ajuste deslizará inevitavelmente para a chave do arrocho, ganhe quem ganhar em outubro.

por: Saul Leblon

O discurso da Presidenta Dilma na convenção do PT,  que ratificou sua candidatura  à reeleição, neste sábado,  merece mais do que a atenção dispensada  normalmente  à retórica  eleitoral.


Há ali, talvez, o sinal de uma importante transformação.


O economicismo perde espaço  como ferramenta central da luta pelo desenvolvimento na concepção  petista e no projeto de reeleição.


Essa primazia passa a ser agora da questão política.


A  pavimentação do  ‘novo ciclo histórico’ que se almeja construir, conforme as palavras da candidata, recai sobre uma democracia tonificada por reformas e pela ampliação de canais com a sociedade. 


“A transformação social produzida por nossos governos criou as bases para a promoção de uma grande transformação democrática e política no Brasil. Nossa missão, agora, é dar vida a esta transformação democrática e política, sem interromper, jamais, a marcha da grande transformação social em curso. Não vejo outro caminho para concretizar a reforma política do que a participação popular, mobilizando todos os setores da sociedade por meio de um Plebiscito (...) São tão amplos os desafios, as propostas e as tarefas que temos, que é mais apropriado chamar o que nos propomos construir de "novo ciclo histórico" - e não apenas de "novo ciclo de desenvolvimento", disse a Presidenta.


No centro das propostas para um quarto mandato do PT no país, portanto, está a reforma política, mas também a ampliação da democracia participativa, através dos conselhos populares,  e a democratização da comunicação, como lembrou outro orador do encontro,  o presidente do PT, Rui Falcão.


A nova ênfase  não ofusca a atenção aos desafios e metas para expandir os avanços econômicos e sociais acumulados nos últimos 12 anos.


‘Nosso Plano de Transformação Nacional será a ampliação do grande conjunto de mudanças que estamos realizando junto com o povo brasileiro’, disse Dilma.


E o  ex-presidente Lula lembrou que a vitória em outubro passa por uma ampla mobilização para comparar resultados, ‘entre o que eles fizeram e o que nós realizamos’.


O que emerge agora, porém,  é a aparente certeza de que nenhum outro compromisso relevante  com a população  será viável sem dispor do lastro institucional que assegure a celeridade e a sustentação do processo.


A babel partidária no Congresso, a supremacia do dinheiro privado nas campanhas , a desgastante formação das maiorias tornam impossível erguer as linhas de passagem para um novo ciclo de crescimento com a coerência e a rapidez requeridas pelos gargalos da economia e as urgências da sociedade.


Essa é a hora de um coração valente – como lembra o jingle da campanha pela reeleição.


Trata-se de um salto lentamente amadurecido no círculo dirigente do partido. Mas que ganhou impulso e a urgência de uma ruptura, a partir de dois acontecimentos: o processo da AP 470 e os protestos de rua por melhor qualidade de vida, iniciados em junho de 2013.


A narrativa martelada pelo dispositivo midiático conservador sobre esses episódios cuidou de selar o divisor de águas.


Não por acaso, na abertura do 14º Encontro dos Blogueiros e Ativistas Digitais, em 16 de maio, o ex-presidente Lula resumiria essa mudança  em uma declaração peremptória: ‘Sem reforma política não faremos nada neste país. E ela terá que ser construída pela rua, por uma Constituinte exclusiva. O Congresso que está aí pode mudar uma vírgula aqui, outra ali. Mas não a fará’, disse ele.


Não era força de expressão.


Trata-se de dar consequência institucional  ao vapor acumulado na caldeira das realizações e das conquistas, mas também das demandas, gargalos e impasses da última década.


Reconhecido pelo FMI como a nação que mais reduziu o desemprego em pleno colapso mundial – 11 milhões desde 2008, enquanto o mundo fechava mais de 60 milhões de vagas -  o Brasil avulta agora como a ovelha negra aos olhos do padrão ortodoxo.


O pleno emprego verificado em sua economia impede que os ganhos de produtividade se façam pelo método tradicional de compressão dos holerites.


A ‘purga’ de desemprego e arrocho é a alternativa da ‘ciência’ conservadora para devolver ‘eficiência’ à indústria e moderação aos preços.


A receita é vendida diuturnamente como parte de um calendário inevitável após as eleições, ganhe quem ganhar, embora o ‘consenso’ não conte com a anuência da candidata que lidera a disputa:


‘Eu não fui eleita para trair a confiança do meu povo, nem para arrochar salário de trabalhador! Eu não fui eleita para vender patrimônio público, mendigar dinheiro ao FMI, e colocar, de novo, o país de joelhos, como fizeram! Eu fui eleita, sim, para governar de pé e com a cabeça erguida!’, disse a Presidenta Dilma na convenção de sábado.


Excluir o arrocho das prioridades de governo para  relançar o crescimento encerra desafios respeitáveis.


Há problemas reais a enfrentar.


Ao resistir à ‘destruição criativa’ promovida urbi et orbi pela maior crise do capitalismo desde 1929, o Brasil tornou-se de fato um paradoxo.


De um lado, carrega um trunfo social vibrante.


Enquanto a renda do trabalho e a dos mais pobres esfarela em boa parte do mundo, vive-se o inverso aqui.


Entre 1960 e 2000, a fatia do trabalho na renda nacional havia recuado de 56,6% para algo abaixo de 50%.


Entre 2004 e 2010 essa participação cresceu 14,4%.


Em grande parte, segundo o Ipea, por conta do ganho real de poder de compra do salário mínimo, que cresceu 70% de 2003, como lembrou Dilma na convenção.


Sob governos do PT , os  10% mais pobres da população tiveram um crescimento de renda acumulado de 91,2%.


A parcela endinheirada ficou com um ganho da ordem de 17%.


Nas economias ricas, como demonstrou Thomas Piketty,  o ciclo recente agravou um padrão feito de desigualdade ascendente.


Em alguns casos, a mais-valia absoluta está de volta, através de políticas de corte salarial puro e simples, ou do seu congelamento, associado à ampliação da jornada de trabalho.


Grécia, Portugal e Espanha são os laboratórios desse revival da aurora capitalista.


No total, 24% dos europeus não tem renda para sustentar suas necessidades básicas, entre as quais, alimentar-se.


Nos EUA, 47,5 milhões vivem com menos de 2 dólares por dia. O salário mínimo  é inferior ao vigente na era Reagan.


Não é difícil imaginar o impacto dessa espiral regressiva na fragilização dos sindicatos e na predação de direitos.


Os custos salariais recuam celeremente em boa parte do mundo. O conjunto reposiciona os fluxos de comércio, as cadeias de produção e a renda no planeta.


A deterioração das relações de trabalho  no ambiente global fura o bloqueio das políticas progressistas brasileiras através do  canal do comércio exterior.


Uma parte da distribuição de renda promovida desde 2003 vaza para os mercados ricos, gerando encomendas e lucros por lá, através das importações baratas que sufocam a manufatura brasileira.


25% do consumo atual de manufaturados no Brasil tem origem em mercadorias importadas.


O déficit comercial específico nessa área em 2013 foi de US$ 105 bi.


A solução conservadora para esses desequilíbrios é martelada sem trégua pelo seu aparato emissor.


O Brasil precisaria, segundo essa visão das coisas,  de um choque de juros e de um aumento do desemprego; um tarifaço para ajustar os ‘preços represados’ --sem correção dos salários, naturalmente ; bem como uma abertura comercial ampla, com cortes de tarifas, câmbio livre e mobilidade irrestrita para os fluxos de capitais.


O conjunto, assegura-se, permitiria desmantelar a couraça de ‘atraso e populismo’ que impede o  país de  voltar a crescer com eficiência e competitividade.


Trata-se, em síntese, de trazer para o país a crise e os  desdobramentos  que o PT evita desde 2008. De forma algo tardia e em dose única.


Esse é o programa de Aécio e assemelhados para  colocar o Brasil em linha com o cânone  global. 


As intervenções da Presidenta Dilma  –reforçadas na convenção do PT--  rechaçam a panaceia conservadora.


Seu entendimento é o de que é possível interromper a sangria com medidas destinadas a elevar a produtividade, em duas frentes:  a média prazo,   com educação, reforma tributária e incentivos ao investimento;  a curto prazo, retomando a redução dos  juros e a desvalorização do câmbio, tão logo se consolide o recuo da inflação.


A aposta exige  forte coordenação do Estado sobre os mercados para funcionar.
E só funcionará  associada a uma ampla pactuação de metas para o ‘novo ciclo histórico’ preconizado pela Presidenta Dilma, com o  engajamento  de partidos, sindicatos e movimentos sociais nesse mutirão democrático.


Exatamente porque é  –e será, cada vez mais necessário politizar a discussão dos dois modelos em disputa no país, a reforma política e a regulação da mídia assumiram a centralidade das preocupações de Dilma, Lula e do PT.


Ampliar essa conscientização é o desafio da campanha progressista até as urnas de outubro.


Sem o engajamento de milhões de corações valentes, a dinâmica do ajuste  brasileiro deslizará inevitavelmente para  a chave do arrocho.


Ganhe quem ganhar no voto.


http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial/A-hora-e-a-vez-dos-coracoes-valentes/31215

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Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz