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"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

28.7.17

Um coração maior que a vida

Um coração maior que a vida

13.03.11_Slavoj Zizek_Um coração maior que a vidaPor Slavoj Žižek.*

For the english version, click here.

Devo confessar que, muitas vezes, não gostei do que Hugo Chávez fazia, principalmente nos últimos anos do seu reinado. Não me refiro às ridículas acusações referentes à sua ditadura "totalitária" (às pessoas que afirmavam isto, aconselharia um ano ou dois numa ditadura de estilo stalinista!). De fato, ele fez muitas loucuras. Em matéria de política externa, não é possível perdoar-lhe a amizade com Lukaschenko e Ahmadinajad; em política econômica, a série de medidas improvisadas e mal formuladas que, em vez de resolver realmente os problemas, procuravam cobri-los de dinheiro para que não aparecessem; os maus tratos contra os prisioneiros políticos, a ponto de merecer uma reprimenda do próprio Noam Chomsky; até – no final – algumas medidas culturais ridículas como a proibição dos Simpsons na TV.

Mas tudo isto se torna insignificante diante do projeto fundamental com o qual se comprometera. Todos sabemos que, no capitalismo global dos nossos dias, com sua evolução espetacular, mas profundamente desigual, são cada vez mais numerosas as pessoas sistematicamente excluídas da participação ativa da vida social e política. O crescimento explosivo das favelas nas últimas décadas, principalmente nas megalópoles do Terceiro Mundo, das favelas da Cidade do México e de outras capitais da América Latina até a África (Lagos, Chade) à Índia, China, Filipinas e Indonésia, é talvez o acontecimento geopolítico crucial dos nossos tempos. Como, dentro em breve a população urbana da terra superará a população rural (ou, quem sabe, dada a imprecisão dos censos do Terceiro Mundo, já aconteceu), e como os habitantes das favelas serão a maioria nas populações urbanas, não temos condições de tratar com um fenômeno marginal.

Esses grupos enormes constituem evidentemente um dos objetos privilegiados da ajuda humanitária e das instituições assistenciais para as elites liberais – basta lembrar de imagens emblemáticas como a de Bill Gates abraçando uma criança indiana paralítica. Somos constantemente solicitados a deixar de lado as nossas divisões ideológicas e a fazer algo a respeito – quando vamos a uma loja da Starbucks para tomar uma xícara de café, sabemos que já estamos fazendo alguma coisa, porque uma parte do preço que pagamos vai para as crianças da Guatemala ou de outro país.

Mas Chávez via que isto não bastava. Ele via no horizonte os contornos de um novo apartheid. Ele via a luta de classes de outrora ressurgindo sob a forma de novas divisões e até mesmo divisões mais profundas. E ele fez alguma coisa a respeito. Ele foi o primeiro a não só "cuidar dos pobres", no velho estilo peronista, falando por eles, mas a canalizar com determinação toda a sua energia no seu despertar e efetivamente na sua mobilização como agentes políticos ativos e autônomos. Ele viu claramente que, sem a sua inclusão, nossas sociedades caminharão paulatinamente para um estado de guerra civil permanente. Basta lembrar da frase imortal do filme Cidadão Kane, de Orson Welles, quando Kane, acusado de falar pelos desfavorecidos contra a sua própria classe, responde: "Se eu não defender os interesses dos não privilegiados, alguém mais o fará – talvez alguém sem dinheiro ou propriedades e isto será muito ruim". Este "alguém mais" seria Chávez.

Portanto, enquanto ouvimos todo este palavreado a respeito do "legado ambíguo" de Chávez, do fato de ele ter "dividido a sua nação", sempre que o expomos a uma crítica muitas vezes merecida, não devemos esquecer o sentido de tudo isto. Ele se referia ao povo, ao governo de, para e pelo povo. Toda a confusão foi uma confusão criada pela dificuldade de realizar este governo. Com toda a sua retórica teatral, Chávez foi sincero a esse respeito, ele queria dizer isto mesmo. Seus fracassos foram os nossos fracassos.

Ouvi dizer que existe uma doença do coração – como órgão – que vai crescendo excessivamente sem conseguir funcionar como deve, incapaz de bombear todo o sangue através das veias dilatadas. Talvez Chávez tenha morrido porque tinha um coração grande demais.

*Tradução de Anna Capovilla, publicado no jornal
O Estado de São Paulo em 10/03/2013.

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Todos os títulos de Slavoj Žižek publicados no Brasil pela Boitempo já estão disponíveis em ebookscom preços até metade do preço do livro impresso. Confira:

Às portas da revolução: escritos de Lenin de 1917 * ePub (Livraria Cultura |Gato Sabido)

A visão em paralaxe * ePub (Livraria Cultura | Gato Sabido)

Bem-vindo ao deserto do Real! (edição ilustrada) * ePub (Livraria Cultura | Gato Sabido)

Em defesa das causas perdidas * ePub e PDF (Livraria Cultura | Gato Sabido)

Primeiro como tragédia, depois como farsa * PDF (Livraria Cultura | Gato Sabido)

Vivendo no fim dos tempos * ePub (Livraria Cultura | Gato Sabido)

O ano em que sonhamos perigosamente * ePub (Livraria Cultura | Gato Sabido

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Novo livro de Slavoj Žižek, Menos que nada: Hegel e a sombra do materialismo histórico, a partir deste fim de semana nas livrarias!

Sobre Menos que nada: Hegel e a sombra do materialismo históricode Slavoj Žižek

A filosofia ocidental tem se desenvolvido à sombra de Hegel, de cuja influência cada novo pensador tenta, em vão, escapar. Seu idealismo absoluto tornou-se, assim, uma espécie de bicho-papão, obscurecendo o fato de ele ser o filósofo dominante da histórica transição à modernidade – período com o qual nosso tempo guarda ainda espantosas semelhanças. Hoje, à medida que o capitalismo global se autodestrói, iniciamos uma nova transição. Neste livro Žižek defende que é imperativo não apenas voltar a Hegel, mas repetir e exceder seus triunfos, superar suas limitações e ser ainda mais hegeliano que o mestre em si. Tal abordagem permite que o autor, sempre à luz da metapsicologia de Jacques Lacan – o único verdadeiro rival de Hegel aos olhos de Žižek–, diagnostique nossa condição atual e trave um diálogo crítico com as principais vertentes do pensamento contemporâneo – Martin Heidegger, Alain Badiou, o realismo especulativo, a física quântica e as ciências cognitivas. Obra-prima de Žižek, Menos que nada retoma o legado hegeliano e apresenta um desenvolvimento sistemático de sua filosofia.

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Slavoj Žižek está no Brasil, a convite da Boitempo Editorial, para a realização de uma série de conferências no projeto Marx: A criação destruidora, assim como para o lançamento de Menos que nada: Hegel e a sombra do materialismo histórico. vem ao Brasil em março para apresentar uma série de conferências entituladas De Hegel a Marx… e de volta a Hegel! A tradição dialética em tempos de crise. O filósofo passará por cinco cidades brasileiras, como parte de um seminário internacional que trará, entre outros, David Harvey e Michael Heinrich. Confira a programação completa e mais informações no site oficial Marx: a criação destruidora

Amanhã, dia 12 de março, o filósofo se apresenta em Brasília, no Centro Comunitário da UnB, às 18h30. Para se inscrever, envie seu nome e telefone para zizek.df@laurocampos.org.br.

Na sexta-feira, 15 de março, o filósofo encerra seu ciclo de conferências em Recife, no evento ArtFlipo. A conferência será no Teatro da UFPE e conta com ingressos a R$20 (inteira) e R$10 (meia entrada), disponíveis para venda nas bilheterias do teatro ou através do site http://eventick.com.br/slavojzizek

A conferência de Slavoj Žižek em São Paulo foi gravada e será disponibilizada no no canal da Boitempo no YouTube em breve, assim como todas as atividades do projeto Marx: a criação destruidora!

Para mais informações sobre a programação, clique aqui.

Para mais informações sobre as inscrições dessas e outras atividades, clique aqui.

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Slavoj Žižek nasceu na cidade de Liubliana, Eslovênia, em 1949. É filósofo, psicanalista e um dos principais teóricos contemporâneos. Transita por diversas áreas do conhecimento e, sob influência principalmente de Karl Marx e Jacques Lacan, efetua uma inovadora crítica cultural e política da pós-modernidade. Professor da European Graduate School e do Instituto de Sociologia da Universidade de Liubliana, Žižek preside a Society for Theoretical Psychoanalysis, de Liubliana, e é um dos diretores do centro de humanidades da University of London. Dele, a Boitempo publicou Bem-vindo ao deserto do Real! (2003), Às portas da revolução (escritos de Lenin de 1917) (2005), A visão em paralaxe (2008), Lacrimae rerum (2009), Em defesa das causas perdidasPrimeiro como tragédia, depois como farsa (ambos de 2011) e o mais recente, Vivendo no fim dos tempos (2012). Colabora com o Blog da Boitempo esporadicamente.

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Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz