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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

15.7.09

Do direito alternativo até aquele que a própria Constituição Federal encontra na rua.

15/7/2009
 
Do direito alternativo até aquele que a própria Constituição Federal encontra na rua.
 

"O famoso "dura lex sed lex", portanto, cujo ranço autoritário, arrogante e prepotente, sempre foi usado sem pudor mais para impor o "sabes com quem estás falando" do que para fazer justiça, vai sendo cada vez mais desmascarado e desmoralizado", escreve Jacques Távora Alfonsin, comentando a novidade do Direito Achado na Rua, que foi tema do artigo Justiça missioneira versus justiça "paulista de Antonio Cechin.

Jacques Távora Alfonsin é advogado do MST e procurador do Estado do Rio Grande do Sul aposentado.


Eis o artigo.

No caminho aberto pelo Irmão Antonio Cechin, em um dos seus artigos publicados neste site do IHU, dia 13 deste mês, sob o título Justiça missioneira versus justiça "paulista", abre-se oportunidade para uma pequena crítica que situe as/os nossas/os leitoras/es em torno do que ele afirmou sobre o "Direito Alternativo" e o "Direito Achado na rua."

É que, no fim da década de setenta do século passado (!), trabalhando com ele (que também é advogado), e que partilha comigo a autoria de alguns artigos aqui nas Notícias do Dia publicadas pelo  IHU, defendemos o direito humano fundamental à moradia de uma quantidade grande de famílias sem teto de Canoas, hoje residindo na Vila Santo Operário e na União dos Operários. Nessa prestação de serviço, debati com ele a grande contribuição que um grupo de juízes gaúchos estava fazendo em favor dos direitos humanos dos pobres com o "Direito Alternativo" e, em Brasília, um grupo de professores e advogados, com o "Direito Achado na Rua."

Ainda bem que o Irmão Antonio colocou um "salvo melhor juízo", quando me fez "descobridor" do Direito Alternativo. Sua grande generosidade colou mérito em quem não o tinha. Eu não passo de discípulo daquelas duas históricas fontes de inspiração jurídica, que tantos frutos já deram à doutrina e à jurisprudência dos tribunais do país, particularmente enriquecidas, daquela época em diante, com novas posturas hermenêuticas da lei e seus limites, visões mais críticas da realidade. 

Um bom resumo do que ocorreu, então, a partir daí, é feito pelo professor Roberto A.R. de Aguiar, em artigo publicado no volume 3 dos quatro já editados pela UNB sobre o Direito Achado na Rua:

"O direito tem de trabalhar com a globalidade do ser humano, imerso e atuando na concretude da história, nas contradições da sociedade e nos conflitos existenciais e materiais que a condição humana impõe. A fonte e o destinatário dos preceitos jurídicos é o cidadão; o Estado é um dos instrumentos (o hegemônico) para a realização desse direito. A conseqüência desse entendimento leva o Direito Achado na Rua a rejeitar as concepções monistas do Direito, que o entendem como emanação estatal." (...)  "O direito passa a ser plural. Não mais um só ordenamento jurídico sacralizado pelo Estado, mas vários ordenamentos em luta, pois os despossuídos, os dominados, na medida em que se organizam, criam direitos paralelos e forçam o direito hegemônico a se modificar, ou mesmo a desaparecer, no caso de uma revolução. Por isso a preocupação do Direito Achado na Rua com o direito de resistência,...." 

Note-se a relevância desse apoio jurídico explícito àqueles gestos que a população pobre do país executa em defesa do direito à alimentação e à moradia, para lembrar somente dois dos mais ligados à vida e que, de tão violados no Brasil, não raro só conseguem garantir-se em conflito com o direito de propriedade alheia. Nessas ocasiões, a criminalização dos pobres conta com a indignação da maior parte da mídia e do rigor dos tribunais, exceções raras à parte. Poucos se perguntam pela origem da tal propriedade e pelo respeito que ela deve à sua função social.

È justamente nisso que se encontra o grande diferencial daquilo que, hoje, o próprio Direito Constitucional encontra nas ruas, de onde nunca deveria ter-se retirado, fora dos tribunais e das repartições administrativas do Estado, em contato local, direto, com o povo pobre, no sofrimento de gente que somente conhecia juiz, pelo medo que sentia dele, como se autoridade, lei e pena fosse reservada para funcionar, mesmo, somente contra ela.

Sentenças, despachos judiciais e, ou, administrativos, artigos doutrinários de juristas, começaram a aparecer, abertas pelo Direito Alternativo, pelo Direito Achado na Rua, em grupo de juízes gaúchos como o NEC (núcleo de estudos críticos), por outro de São Paulo como o "Juízes para a democracia", em novos programas de faculdades de direito do país, cujo estudo dos direitos humanos não é mais um mero apêndice de alguma outra disciplina; em publicações que a UNB faz , mensalmente, por iniciativa do seu reitor, o professor José Geraldo de Souza Junior, um dos principais criadores do Direito Achado na Rua; em estudos e palestras com que o professor Boaventura de Sousa Santos, pensador português, de extensa contribuição jurídica e sociológica prestada a organizações populares de todo o mundo, acompanha de perto, aqui no Brasil, a evolução desse ideário de luta contra as injustiças sociais e de emancipação das/os pobres. Aqui no sul, ainda, o professor Lenio Luiz Streck, entre outros, embora em contexto diverso, sob fundamentação predominantemente filosófica, é um expoente de novas perspectivas hermenêuticas da realidade e da lei.

Entre essas merecem lembrança as chamadas substancialistas, que somente reconhecem a validade das Constituições naquilo em que essas evidenciam compromisso com os direitos fundamentais-sociais "como valores a serem concretizados", e a garantista, com grande influência em modernas concepções de direito, inclusive em matéria penal, que tem no jurista italiano Luigi Ferrajoli um dos seus principais criadores; a interpretação de todo o Direito Privado, o Civil especialmente, feita de modo fiel à constituição Federal, levando sempre em linha de conta, nos conflitos levados a Juízo, a dignidade humana e a cidadania, "despatrimonializando", por assim dizer, tudo quanto não pode ficar reduzido ao horizonte privatista e exclusivista da propriedade privada, oxigenando direitos sociais, reconhecendo aos últimos os poderes que, até então, somente aos individuais se dava atenção.    

O famoso "dura lex sed lex", portanto, cujo ranço autoritário, arrogante e prepotente, sempre foi usado sem pudor mais para impor o "sabes com quem estás falando" do que para fazer justiça, vai sendo cada vez mais desmascarado e desmoralizado. Mesmo assim, ainda mereceu chancela do próprio atual presidente do Supremo Tribunal Federal quando afirmou que o direito tem de se achar na lei e não na rua... Tivesse ele esperado pela lei, nem presidente seria, que o movimento popular de 1789 o comprove. 

Em análises posteriores, quem sabe, pela abertura que o IHU está nos permitindo, Irmão Antonio e eu poderemos oferecer as/os nossas/os leitoras/es, inclusive dialogando com elas/es, recebendo a crítica que esse site permite, esclarecimentos um pouco mais detalhados, a respeito desses novos paradigmas de concepção das garantias materiais que devem sustentar os direitos humanos das/os pobres. 

Por ora, em defesa de todas/os aquelas/es "radicais" que defendem os direitos humanos contra a brutal injustiça social que vitima o povo brasileiro, vale bem a pena lembrar Roberto Lyra Filho, criador, em Brasilia, da chamada Nova Escola Jurídica Brasileira (sigla Nair), cujas lições serviram de útero para o próprio Direito Achado na Rua: "É preciso exigir as estrelas para conquistar um pão. Quem negocia a partir da limitação a uma fatia, não consegue pão, mas pedra."

http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=23899

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Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz