Amélia e a nova mídia
Estimados sulvinteumenses, cá estamos, diante de mais um espetáculo da democracia, o momento em que cada um tira o pó do seu título de eleitor e vai lá e crau, cumpre com o seu dever cívico.
E, ao menos no nosso estimado Rio Grande do Sul, a eleição pode ser a primeira no Brasil a ser afetada, ou decidida pela nova mídia, aqui brilhantemente representada pelo meu, o seu, o nosso estimado Sul21. Ao que se pode perceber, desde a minha mansão em um bairro nobre de São Paulo, nenhum outro fato mais marcante ocorreu que explique o tombo da nossa estimada candidata pneumática, que não a publicação de sua história como CC do ex-marido no Congresso, onde praticava a nobre arte de estar em nenhum lugar ao mesmo tempo, recebendo um polpudo salário para isso.
Candidatos que posam de vestais sofrem quando cai o manto, não é mesmo? E nada disso teria acontecido se não houvesse uma nova imprensa, com outros alinhamentos, com outros espaços e credibilidade para dizer e impactar. Esse é o maravilhoso mundo da imprensa pós-industrial, caros leitores.
Eu sempre defendi aqui nesse nobre espaço a tese de que era hora de a esquerda parar de chorar pitanga e reclamar do tal e inventado PIG, e ir lá criar os seus veículos. Cá estamos, cá vivemos. Muito melhor do que antes, não parece a todos?
Do lado de cá, existe um veículo, do lado daí, existem leitores, e a massa crítica atingida parece ser suficiente para alterar a programação que o lado de lá sempre fez e sempre conduziu porque podia. Não pode mais, e essa é a marca dos nossos tempos.
A candidata dos bispos, aka Marina Silva, também tentou se valer do sistema antigo, das manchetes construtoras de realidades de isopor, e também fraquejou diante das novas formas de construção de estados de coisas. Ela vai lá e fala, a VEJA vai lá e propaga, as redes sociais vêm e acabam com a festa. Um ator americano faz um vídeo de apoio a ela, descobre pelo tuíter que a moça não gosta que os gays tenham direitos constitucionais, retira o apoio, a atmosfera tuiteira entra em efervescência, o mundo que interessa fica sabendo e reage. Bye, bye, Marina.
Hollywood descobriu isso há algum tempo. Eles gastam milhões divulgando o blockbuster mais recente. O público cai na esparrela e vai assistir. De dentro da sala, nos primeiros minutos, começam a teclar dizendo que o filme é uma solene droga, e pimba, o poder do marketing se esfarela. Assim andamos.
Na eleição americana de 2012, um vídeo feito em um smartphone, mostrando o candidato republicano espalhando maldades sobre o povinho americano acabou com uma campanha bilionária da direita. O vídeo não foi divulgado nas emissoras de tevê, mas no blog Mother Jones, e a casa caiu para Mitt Romney. Em 2007, na primeira eleição de Obama, o Huffington Post foi capaz de enfrentar toda a Fox News e sua fábrica de maluquices de direita. Ali a indústria descobriu que era praticamente impotente na luta com a pós-indústria.
Duvido que a Amélia tenha anotado ou compreendido a lição.
O que você, caro leitor, você, outro caro leitor, e o senhor aqui ao lado precisam entender, é que boa parte dos veículos que hoje estão por aí vão desaparecer em pouco tempo. Hoje mesmo o estimado New York Times reduziu sua equipe, assim como todos os demais jornais do mundo, exceção, taaalvez, do The Guardian, que deve ser o veículo tradicional que melhor se move nos novos tempos. A imprensa que a gente conhece está sumindo e vai sumir. O que vem depois, não sabemos, e nada garante que seja melhor. Povo passa a vida berrando contra a imprensa burguesa e de repente a igreja Universal compra a Folha. Melhor?
O que pode e deve ser feito é o que está sendo feito aqui mesmo. A criação de novos veículos, surgidos sob uma nova lógica, produzindo, processando, traduzindo a comunicação para um universo de pessoas cheias de informação e órfãs de significados. É importante compreender que não é na ausência dos antigos, mas na construção dos novos que está a chave do sucesso. Perfilzinho no Facebook não resolve a vida. Criar um anti-FB resolve, ou ajuda. Precisamos de muito mais ainda, por ser inventado.
O que vem ainda não chegou, está vindo. Mas, felizmente, parte já chegou, e bem na hora de estragar a festa de Amélia e associados. Com isso, já estamos justificados, e, o melhor é saber que a festa mal começou.
E ademã, e vamos em frente.
Marcelo Carneiro da Cunha é escritor.
http://www.sul21.com.br/jornal/amelia-e-a-nova-midia/
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