Páginas

pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

1.9.14

É junho de novo?

SUL21
1/set/2014, 21h11min

É junho de novo?

Antônio Escosteguy Castro*

A candidatura de Marina Silva foi catapultada ao status de postulante real à presidência da República, inicialmente, pela comoção decorrente da trágica morte de Eduardo Campos. A enorme cobertura de mídia daqueles acontecimentos, artificialmente aumentada, inclusive, porque a grande imprensa viu ali a efetiva oportunidade de garantir o segundo turno contra Dilma que lhe escapava, encontrou em Marina o papel apropriado, com sua figura messiânica, como a viúva política do presidenciável falecido. Tudo isso, mais um expressivo recall da eleição de 2010, só poderia ter como consequência um salto nas intenções de voto.

Mas passada aquela comoção, a consistência do processo de crescimento eleitoral de Marina, mesmo que não esteja nos níveis estratosféricos que lhe concedem algumas pesquisas, tem outras explicações. A candidatura de Marina parece ser o desaguadouro de uma insatisfação com a política e com o país da mesma cepa que deu origem às manifestações populares de junho de 2013. E nisto, paradoxalmente, repousam sua força e sua fragilidade. A força está em que se vê agora claramente que aquele mal-estar difuso de junho do ano passado não desapareceu, mas saiu das ruas e pode migrar para o voto em Marina. A fragilidade está em que aqueles movimentos de junho esvaíram-se ainda mais rapidamente do que haviam crescido, vitimados por suas inconsistências internas e pela eficaz reação do governo e dos movimentos sociais organizados. A onda Marina também pode esvair-se antes de 28 de outubro, quando teremos o decisivo segundo turno.

Em junho de 2013, a bandeira inicial da qualidade do transporte coletivo foi multiplicada exponencialmente, terminando no "contra tudo que está aí" que levou milhões às ruas. A falta de uma pauta mínima coerente, porém, e a chegada da violência, tolerada e até incentivada pelos grupos que comandavam os protestos, levou paulatinamente a seu esvaziamento. Mas os protestos não acabaram sozinhos. O Governo reagiu com uma série de propostas, diálogos e medidas e as centrais sindicais unificadas chamaram um Dia Nacional de Lutas, em 11 de julho, com pauta definida e progressista, tirando de vez os coxinhas das ruas. Sem uma reação política clara e propositiva, a tendência é que os protestos continuassem, embora menores.

Para açambarcar todo o "espírito de junho", condição necessária para vencer as eleições, Marina deve manter-se na mais completa generalidade, assumindo o "contra tudo o que está aí". Mas isto é muito difícil numa longa campanha presidencial. Se contarmos o segundo turno, que de fato parece estar garantido, são quase 60 dias de embates. E a cada dia, Marina tropeça num obstáculo. Dizer que o pré-sal, que pode nos render trilhões e resolver a educação no país, não é prioridade; igualar Neca Setúbal e Chico Mendes como membros da elite; negar que tenha sido contra os transgênicos; recuar no apoio à causa gay depois de levar um pito do Pastor Malafaia e por aí vai.

Mas apenas os eventuais tropeços de Marina não serão suficientes para tirar-lhe a vitória. Muito depende da forma como PT e PSDB reagirem a esta nova conjuntura eleitoral.

A tarefa do PSDB é hercúlea. Aécio Neves derreteu nas pesquisas com a ascensão de Marina e o partido corre o risco de sofrer uma derrota eleitoral que compromete seu futuro. Ficando fora do segundo turno, deixa de ser o grande pólo aglutinador anti-PT e pode ainda perder Minas Gerais e até São Paulo, se a crise da água agravar-se o suficiente para levar Skaff ao Palácio Bandeirante, situação que lhe deixaria na inanição política. Mas Aécio não pode jogar a toalha e deve estancar o movimento que tem feito setores ligados a Serra e aliados como Ana Amélia, aqui no RS, a afastarem-se de sua candidatura e aproximarem-se de Marina. Se os tucanos não fizerem pelo menos perto dos 20% dos votos, conseguirem uma expressiva bancada com seus aliados e ganharem no mínimo um grande estado da nação, perdem a liderança da oposição se Dilma for reeleita e provavelmente serão rachados com a cooptação de setores inteiros do partido por Marina se esta vencer . Está em jogo a sobrevivência do PSDB e Aécio tem pouco mais de um mês para convencer o empresariado e a classe média que é a alternativa confiável e segura ao PT, como começou a fazer no recente debate da Band ao anunciar desde já o queridinho dos bancos, Armínio Fraga, como seu ministro da Fazenda. No programa eleitoral do sábado (30/8), Aécio alterou sua estratégia e dialogou diretamente com os possíveis eleitores de Marina.

A candidatura de Dilma, neste primeiro momento não foi diretamente afetada pelo crescimento de Marina. A variação nas pesquisas ficou dentro da margem de erro e cresceram tanto a avaliação positiva do governo como o otimismo com a economia. Mas se a situação do PT não é de lutar por sua sobrevivência, é bastante grave, estando em sério risco uma eleição que há 30 dias parecia garantida.

A estratégia do PT, que esperava a polarização com Aécio, era comparar seus governos com os governos tucanos. Mesmo sendo verdade o dito popular que "eleição não se ganha com o passado, mas com o futuro", o PT apostava em que o eleitorado se daria conta que um governo do PSDB seria a mera repetição das fórmulas de FHC e Malan. Esta estratégia não tem mais sentido, mas ainda comanda os programas eleitorais do partido. No mesmo sábado (30/8), o programa do PT era ainda a fórmula de mostrar obras, obras e mais obras de Dilma e então Lula aparecer para dizer que o segundo governo será ainda melhor. A adversária de Dilma agora é Marina e esta não tem um programa definido a ser comparado…

O que dá consistência à candidatura de Marina é novamente aquele sentimento difuso de mal-estar de junho passado e é isto que tem que ser enfrentado pelo PT. Os fundamentos concretos daquele mal-estar são a rejeição da juventude a um sistema político que apodreceu (e que o PT é visto como parte dele) e a busca das classes emergentes do período Lula/Dilma por mais qualidade de vida e, portanto, por melhores serviços públicos. Dilma, pois, tem de agregar à apresentação de suas realizações de governo (afinal, tem um latifúndio televisivo) uma resposta política eficaz à pauta que já está presente desde junho de 2013. Embora à época o governo tenha reagido bem, a maior parte daquelas iniciativas diluiu-se, com poucas exceções, como o Mais Médicos. A questão da Reforma Política tem que ocupar um espaço maior do discurso do PT e a generalidade de "os investimentos vão continuar" tem que ganhar a concretude do "vamos investir para melhorar a vida dos mais pobres".

Mas não adianta o PT querer disputar um campeonato de promessas com a Sonhática. É impossível vencer a esperança no etéreo. Os projetos de futuro devem ser alicerçados na demonstração de que foi assim, pouco a pouco, com maioria parlamentar e social, que mudou-se o Brasil. No debate da Band de governadores no RS, Tarso Genro, num duelo com Robaina, do PSOL, foi claro e exemplar: o PT é um partido aliancista que obteve avanços porque negociou. Este choque de realidade deve nortear a confrontação com o projeto "não-político" de Marina. Uma diferença para as manifestações de junho é que uma eleição presidencial é um espaço muito mais afeito à racionalidade que um protesto.

Por fim, o PT não pode negligenciar a importância da crise deflagrada pelo jatinho da campanha do PSB. Há crime eleitoral confessado. Não há como alugar ou comprar um avião para comprovação posterior à eleição. E nossa legislação eleitoral é clara: pouco importa se o candidato mandou fazer ou se sabia. Basta ter se beneficiado da ilegalidade e isto é inconteste. É óbvio que a pressão da grande imprensa e de nossas elites, que agora veem em Marina a melhor chance de derrotar o PT, não irá tornar possível uma impugnação de sua candidatura. Mas a única forma de impedir esta impugnação é defender que a lei não se aplique para Marina. E este é um bom começo de onde mostrar ao povo de como será a tal de "nova política"…

*Advogado


http://www.sul21.com.br/jornal/e-junho-de-novo/


Nenhum comentário:


Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz