Flavio Koutzii
A idéia da pacificação política e da polarização tem sido na última década uma das leituras centrais da realidade gaúcha. É claro também que, em certa medida, se trabalha a mesma noção para avaliar o cenário nacional, talvez menos enfaticamente.
No caso gaúcho se pega carona nas tradições históricas e até nas "polarizações" esportivas, de Chimangos e Maragatos à Grêmio e Internacional, essa lógica binária seria de fato um jeito gaúcho de ser. Estas e outras referências sociais e esportivas são reais, o que é forçado, é estendê-las artificialmente para o ambiente político do Rio Grande do Sul nos últimos anos.
Na verdade trata-se de um artifício que visa recobrir o sentido natural das diferenças e tensões, bem como conflitos próprios da sociedade democrática. O que é inaceitável é produzir uma maximização desta suposta conflitividade para transformar a suposta pacificação numa grande receita política eleitoral.
É um bom truque, especialmente fomentado pela inteligência conservadora do estado. Mas é um mau serviço à democracia e sua pluralidade. É uma evidente demonização de divergências naturais e o fato que tenha se transformado em um aspecto muito central da política riograndense. Há vários exemplos sobre isto e que confirmam a centralidade do tema: a proposta de Pacto pelo Rio Grande do deputado Záchia; no ano seguinte a Convergência do deputado Alceu Moreira, também da Assembléia Legislativa e anteriormente a vitória de Rigoto para Governador, muito eixada na idéia do pacificador.
Minha insistência na análise deste aspecto é fruto da convicção de que provavelmente a construção deste mantra se deve em parte a própria presença significativa dos partidos e dos governos da esquerda gaúcha que se afirma fortemente ao longo da década de 90 e a uma dificuldade política ideológica de conviver por parte do conservadorismo local com um novo bloco político consistente e com peso eleitoral no quadro geral da política gaúcha.
Na verdade, uma questão derivada do tema pacificação é a instalação na plataforma das idéias-chaves, na política gaúcha, da proposta de união de todos os gaúchos, vide "Pacto" e "Convergência". Entendo, que a desejável união dos gaúchos só tem sentido e valor se isto trouxer embutido, a clara consciência que diferenças de projetos políticos, interpretações distintas de fenômenos sociais, hierarquias diferentes na forma de aplicar os recurso públicos - matéria prima das identidades políticas e administrativas – é a substância da democracia. Sem isto, o que nós temos, surpreendentemente, é um totalitarismo oculto - o discreto fuzilamento das idéias diferentes.
Apesar da minha crítica, reconheço que o tema está muito entranhado na sensibilidade da população gaúcha, exatamente porque ele foi induzido incessantemente como se fosse um eixo diferenciador estratégico, reforçado por sinônimos como conflitividade e beligerância.
Por isto a proposta de Tarso Genro, se eleito, de criar um Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) no Rio Grande do Sul, à maneira da experiência muito bem sucedida, feita a nível nacional a partir de proposta do Governo Lula, orientada e conduzida, em toda sua primeira fase, pelo próprio Tarso Genro, é uma forma e uma fórmula para superar esta falsa e cultivada dicotomia, por uma estrutura consultiva que refletirá amplos setores da sociedade gaúcha e inaugurará, de fato, uma perspectiva de consertação que poderá ajudar a levantar o Rio Grande, materializar as necessidade de desenvolvimento e neutralizar falsos dilemas, verdadeiros fantasmas induzidos.
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