A vitória de Trump representa, numa escala mais ampla, o fim da globalização, tal como a conhecemos nos últimos trinta anos.
Ela se junta ao chamado Brexit — a saída do Reino Unido da União Europeia.
Se a globalização se iniciou nos Estados Unidos de Reagan e no Reino Unido de Thatcher, é exatamente nestes dois pólos do poder econômico, político e militar que ela se despede.
Voltam à cena nacionalismo, protecionismo e um rígido controle de imigração.
É como se as potências tivessem se cansado de seus imigrantes. Passaram a ver neles obstáculos à sua retomada econômica.
Acrescente-se aí a questão do terrorismo. Nestes dias de hoje, imigrantes se tornaram suspeitos preferenciais de terror, seja nos Estados Unidos, seja no Reino Unido.
São, por tudo isso, amplamente indesejáveis.
Tudo isso foi dar em Trump, nos Estados Unidos, e no Brexit, na Inglaterra.
Ainda é cedo para falar nas consequências para o Brasil. Um baque nas exportações, que tanto contribuíram para o crescimento do país nas últimas décadas, é previsível.
Na nova ordem, voltaremos presumivelmente à condição de coadjuvantes que sempre nos coube — excetuados aí os anos de Lula, em que a voz do Brasil foi ouvida como nunca antes.
O certo é que o sonho de um mundo globalizado, quase fraternal, ruiu espetacularmente com a vitória de Trump.
Kotscho: após a vitória, surge um Trump meigo e conciliador
Do blog de Ricardo Kotscho:
Quem diria? Donald Trump não só assustou o planeta com a sua inesperada vitória, como voltou a surpreender todo mundo após a confirmação do resultado, ao ressurgir no palco, já alta madrugada de quarta-feira em Nova York, todo sorridente, meigo e conciliador:
"Serei o presidente de todos os americanos e isso é muito importante para mim (…) A todos os republicanos, democratas e independentes nesta nação, lhes digo que é momento que nos reconciliemos como um povo unido".
De um momento para outro, o republicano ensandecido da campanha se transfigurou no presidente "Trumpinho paz e amor", mostrando que é, acima de tudo, um grande artista.
Sobraram palavras doces até para a democrata derrotada: "Acabei de receber um telefonema de Hillary Clinton. Ela lutou muito bem (…) Hillary trabalhou muito e durante um longo período, e nós temos uma grande dívida de gratidão com ela por nosso país".
Ainda na véspera, ele ameaçava mandar prender a adversária se fosse eleito. Era outro homem:
"Para aqueles que optaram por não me apoiar, estou estendendo a mão para a sua orientação e ajuda para que possamos trabalhar juntos para unificar nosso grande país".
Em qual Donald Trump devemos acreditar agora?
Contra tudo e contra todos, inclusive os velhos grandes caciques do seu partido, o artista bilionário fez strike em sua estréia numa campanha eleitoral. Derrubou o establishment americano inteiro, a grande mídia, os institutos de pesquisa e os mercados financeiros, que começaram a desabar antes mesmo que a sua vitória fosse oficialmente confirmada.
Nos 16 meses de uma campanha alucinada, desde o lançamento da sua candidatura, em que passou de zebra pitoresca a 45º presidente dos Estados Unidos da América, Donald Trump virou o seu país e o mundo de cabeça para baixo, e é melhor agora ninguém mais fazer previsões sobre o que pode acontecer daqui para a frente.
Tinha até deixado sobre a mesa o título desta matéria, antes de cair de sono, no começo da madrugada, quando a apuração ainda mostrava uma disputa pau a pau nos estados-chave: "Ufa! O mundo respira aliviado". As pesquisas e projeções estavam erradas, eram mais torcida por Hillary do que ciência.
Como todos agora sabemos, e os comentaristas da TV demoraram a aceitar, aconteceu exatamente o contrário: o mundo acordou perplexo neste 9 de novembro de 2016, o ano que pode ser um divisor de águas no mundo civilizado.
Depois do que vimos acontecer nos referendos do Brexit no Reino Unido e no acordo de paz fracassado na Colômbia, e agora com a retumbante vitória do inacreditável Donald Trump nos Estados Unidos, não sei porque me lembrei do Ronald Golias, também um grande artista.
Certa vez, no antigo programa "Família Trapo", da TV Record, seu personagem, o Bronco, comentou com o cunhado, representado por Otelo Zeloni:
"Acho que a humanidade não está se comportando bem…".
E o mundo, naquela época, ainda não tinha perdido o juízo.
Vida que segue.
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