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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

15.5.16

As heranças malditas da ditadura

As heranças malditas da ditadura

por Emir Sader em 31/03/2012

Um regime brutal como a ditadura militar, que tratou de erradicar da sociedade e do Estado brasileiros tudo o que lhe parecesse vinculado à democracia, que se constituiu em uma ditadura de classe contra os trabalhadores e suas organizações, que tratou de ser um subimperiaismo, aliado privilegiado dos EUA na região – não poderia desaparecer sem deixar vestígios. Ainda mais que a ditadura militar brasileira não foi derrotada, como aconteceu nos países vizinhos.

Na Argentina, essa derrota se deu na tentativa desesperada dos militares de conquistar legitimidade com a aventura das guerra das Malvinas, encarnando uma justa reivindicação do povo argentino com uma bravata que terminou com uma vergonhosa derrota e retirada covarde da mesma alta oficialidade que havia mostrado sua "coragem" na repressão selvagem aos militantes da resistência popular. Sua derrota teve o efeito oposto, o de acelerar sua derrota e o fim do regime, que também por isso tem seus principais gendarmes presos, julgados e condenados.

No Uruguai e no Chile essas derrotas assumiram formas similares com referendos convocados pelas ditaduras militares para tentar perpetuar-se, em que foram derrotadas e tiveram que abrir caminho à transição para a democracia. Ali também se conseguiu reverter as anistias decretadas pelos militares e promover formas de investigação da verdade e da justiça correspondente.

No Brasil não houve algo similar. A ditadura conduziu o processo de transição à democracia, definindo suas formas e seus prazos. Conseguiu evitar as eleições diretas para presidente, impediu assim que uma eleição popular pudesse consagrar uma presidência como a de Ulysses Guimaraes, que representava de maneira mais cabal o impulso democrático acumulado pelas lutas de resistência à ditadura, para impor o mais moderado Tancredo Neves e, pelas contingências da história, terminando por ter o presidente do partido da ditadura e principal articulador contra as diretas, José Sarney, como o primeiro presidente civil desde o golpe militar.

Bastaria isso para explicar como o novo regime foi um híbrido do novo e do velho, nasceu de mais um pacto de elites na história brasileira, forjado em torno do Colégio Eleitoral e do pacto entre o PMDB e um partido nascido das costelas do regime militar, o então PFL. O anti-malufismo substituiu o anti-ditadura e quem se alinhava naquele bloco recebia o selo de "democrata", entre eles ACM, Marco Maciel, Jorge Bornhausen. Foi um caso típico do "transformismo", caracterizado por Gramsci, em que se muda a forma de dominação para preservar seu conteúdo.

A primeira das heranças desse parto conciliador do novo regime foi seu caráter profundamente liberal, no sentido de que a reinstauração da democracia se limitou às instâncias políticas, jurídicas e institucionais. Não se promoveu a democratização econômica e social da sociedade brasileira – que, de alguma forma, estava contida no programa democrático do PMDB, que não orientou o governo Sarney. A concentração ainda maior do poder da terra, dos bancos, das grandes corporações industriais e comerciais, dos meios de comunicação, das estruturas privadas nos campos da educação, da saúde, não foram tocadas e sobreviveram como uma das mais duras heranças da ditadura para a democracia brasileira.

A ausência das derrotas políticas que caracterizaram os países vizinhos fez com que a anistia auto-decretada pela ditadura militar sobrevivesse até hoje, bloqueando a busca da verdade e impedindo que mesmo crimes inafiançáveis como a tortura ficassem impunes no Brasil. Paralelamente, os militares mantem poder de pressão sobre este e outros temas, de forma totalmente indevida numa democracia, ainda mais pelos graves danos que a alta oficialidade das FFAA produziu no país.

Outra das heranças negativas foi o modelo econômico imposto pela ditadura a ferro e fogo, que teve alguns dos seus aspectos essenciais preservados no pós-ditadura. Ja nao foi possível manter o arrocho salarial e a intervenção militar em todos os sindicatos – que fez a festa do grande empresariado e foi um dos "santos" do chamado "milagre econômico". Mas o modelo econômico voltado para a exportação e para o consumo das altas esferas do consumo se manteve, sem que se desenvolvessem amplas politicas de distribuição de renda e de ampliacao do mercado interno de consumo popular – que só viriam a ocorrer a partir do governo Lula. A marca de país mais desigual do mundo, que se havia aprofundado na ditadura e se mantido no novo regime, acompanhou a democracia brasileira como a sua grande lacra.

Uma outra herança maldita da ditadura foi a deterioração dos serviços públicos. Ao arrochar os salários dos servidores públicos e diminuir os gastos sociais, a ditadura promoveu uma degradação da escola pública e da saúde pública no Brasil. Até aquele momento esses eram espaços que agrupavam os setores populares e a classe média, numa aliança e convivência que eram parte integrante da democracia e da construção da esfera pública. Com sua deterioração, a classe media se bandeou maciçamente para a escola privada e os serviços privados de saúde, a ponto de passar a fazer parte "natural" dos seus orçamentos familiares esses gastos enormes. Enquanto isso a escola e a saúde publica passaram a ser coisa de pobre, foram se degradando, assim como as condições de trabalho e de salários dos trabalhadores da educação e da saúde.

Os meios de comunicação foram outra elemento da herança maldita deixada pela ditadura. O elemento central dessa herança foi a constituição da Globo como o principal grupo monopólico dos meios de comunicação no Brasil, com todos os privilégios que a ditadura lhe permitiu, fazendo da TV Globo praticamente o órgão oficial da ditadura. Por outro lado, impediu que outros grupos das elites dominantes - como a Abril e o JB, entre outros – pudessem disputar hegemonia com a Globo, favorecendo seu monopólio inquestionado como setor dominante da mídia privada. As outras empresas, que haviam, todas, apoiado a golpe militar, dado cobertura à selvagem repressão da ditadura, e se valido da liquidação dos órgãos que não haviam tido essa postura – como a Última Hora e, de certa forma, o Correio da Manhã -, puderam aparecer como entidades identificadas com a democracia liberal durante o período de transição e bloquear o surgimento de imprensa alternativa.

Sem esgotar os elementos dessa herança, haveria que mencionar ainda a tentativa de descaracterização do aspecto ditatorial do regime militar, presente na "teoria do autoritarismo", formulada por FHC, segundo a qual não teríamos tido uma ditadura – menos ainda militar, cujo aspecto ele sempre desconheceu nas suas análises - , mas simplesmente um "regime autoritário".

A democratização, pelas propostas de FHC se limitaria a desconcentrar o poder político em torno do executivo e desconcentrar o poder econômico em torno do Estado – aparecendo como um formulador precoce as teses neoliberais no Brasil. A teoria do autoritarismo foi a ideologia da transição conservadora no Brasil, lhe deu respaldo teórico e favoreceu a sobrevivência das heranças malditas que a ditadura deixou para a democracia brasileira.


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Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz