Pedro e a Globo: cineasta que esteve em Pinheirinho completa seis dias algemado e em greve de fome
3/2/2012 0:54, Por Ana Helena Tavares - do Rio de Janeiro
Em frente à Rede Globo, Pedro Rios protesta contra a ação da PM em Pinheirinho e o silêncio da mídia conservadora
O cineasta Pedro Rios Leão, que esteve em Pinheirinho (São José dos Campos – SP) documentando tudo, completa nesta sexta-feira o seu 6º dia algemado e em greve de fome em frente à Rede Globo. O seu protesto é contra a omissão da mídia que acobertou a barbárie. Nesta quarta-feira, a editora do Quem tem medo da democracia?, Ana Helena Tavares, foi ate lá conversar com ele e reproduz a entrevista, aqui no Correio do Brasil.
Pedro tem tido sempre a companhia de diversos outros jovens. Tem sido muito bem tratado pelos pedestres, comerciantes e já até recebeu visitas cordiais de alguns funcionários da Globo. Contou também que um Tenente esteve lá, dizendo-se a mando do governador do RJ, e deu pra ele um número de celular para que ele o ligasse caso alguém o tentasse tirar de lá.
Formação marxista e “apartidarismo”
Com formação marxista, segundo ele “rígida”, porém “muito mais acadêmica do que ativista”, Pedro nunca militou em nenhum partido político. Vestido com a camisa 10 de Zico, comemorativa pelo título mundial do Flamengo, em 81, ele disse ter feito esta escolha “na tentativa de mostrar apartidarismo”.
Apenas participou do movimento “Ocupa Rio”, de vertente apartidária, que ele define como tendo sido “um protesto contra o capitalismo e a enganação que é a democracia representativa, um sistema baseado em abuso de poder econômico, tráfico de influência e força bruta”.
Considera que “estamos passando por um período de graves rupturas econômicas, entre elas a concentração de renda que se tornou absurda, com a exploração inegável e massiva do mercado privado, onde o assédio moral é implícito. No mundo inteiro a política de mercado livre falhou e criou monstros capazes de engolir governos. Em 1916, o Thomas Jefferson falou que ‘os bancos são mais perigosos que todos os exércitos ativos do mundo’”.
A sociedade não pode se fazer de “tadinha”
Segundo ele, há uma “quadrilha que controla o país há muito tempo, formada por banqueiros, empresários, congressistas…” E não adianta só reclamar, porque garante: “O Congresso liberal é feito para ser um balcão de negócios. Se são essas as pessoas que legislam, evidentemente as leis vão proteger os negócios corporativos.”
E vai mais fundo: “Há uma postura muito ruim da sociedade civil de acusar a polícia, o congresso e o governo de corrupção, como se a sociedade fosse cândida e passiva. Tadinha! Eu acho que está na hora de as pessoas relacionarem o sistema corrupto que elas sustentam com a preguiça e omissão delas de exercerem os seus direitos políticos. Não existem forças legalistas ou malvadas dentro do governo ou de um partido. Dentro de qualquer estrutura, seja partidária ou sindical, existem pessoas que aplicam a lei e outras que empregam práticas capitalistas”
A luta não é jurídica, é política
Pedro exemplifica: “O Daniel Dantas já teve pedido de prisão decretado algumas vezes, mas alguns juízes insistem em mantê-lo livre, baseados no absurdo descontrole que existe sobre o poder judiciário no Brasil. Então, as pessoas tem que se conscientizar de que não existe um sistema em funcionamento, existe uma guerra encarniçada, política, dentro do aparelho de Estado, que só vai se resolver para o nosso lado a partir do momento em que a sociedade civil intervir”.
A revolução da tecnologia de informação
“Hoje, a gente pode se comunicar, se expressar, mostrar as coisas. A pulverização da mídia beneficia e agrada o consumidor. As pessoas estão largando a televisão, um quadrado que fala sozinho, para se envolverem em debates”. E ele vê isso tudo positivamente: “Gera benefícios gigantescos na sociedade”.
O Caso Pinheirinho
Para Pedro Rios Leão, que presenciou o drama vivido em Pinheirinho, nem o governo nem a justiça nem a polícia vão aplicar a lei. Assegura que a única “força política” capaz de fazer isso é a sociedade civil. E explica porque resolveu ir até lá: “Quando eu estava aqui no Rio de Janeiro e já acompanhava a disputa política entre o Naji Nahas e seus braços no poder judiciário de São Paulo e o governo paulista contra o governo federal, eu já estava muito preocupado. Eu fui para lá na segunda-feira (23/01, dia seguinte à desocupação), mas antes eu vi o pacto federativo sendo rompido, soube que a Polícia Federal tinha sido expulsa a tiros e o Paulo Maldos (secretário nacional de articulação social da presidência da República) havia sido baleado.”
Se Marechal Lott fosse vivo…
“Se a gente tivesse um único general legalista neste país, se Marechal Henrique Teixeira Lott fosse vivo, isso não teria acontecido. Porque o que aconteceu é muito mais grave que uma questão da esquerda. Eu acho que um militante do Jair Bolsonaro consegue entender que a Polícia Militar não pode atirar na Polícia Federal. Por mais de direita ou conservador que você seja, você fica irritado quando mostram que estão te fazendo de otário, que mentem descaradamente na sua cara”.
Pedro acredita que as provas de eqüestro e ocultação de cadáver são “inencontráveis”, mas sustenta que há mortos. E vai mais longe: ”Qualquer um que pise em São José dos Campos, sabe disso”.
Sangue e pânico em frente à igreja
“Eu cheguei a São José na segunda-feira. Às dez da manhã, tinham matado um cara na frente de centenas de testemunhas e sumido com o corpo. Quatro tiros. Assim que eu cheguei, tinha sangue no chão. A população estava em pânico. E com certeza os crimes continuaram, porque a população estava encarcerada, em campos de concentração, (presa) pela mesma PM que estava chacinando eles.”, relata Pedro.
“É muito fácil sumir com provas assim, mas elas são vastas, abundantes, claras, evidentes. Pode demorar, porque são 6 mil pessoas, por isso eu vim fazer greve de fome. É um protesto pela dignidade humana, pela República. Porque, para que este crime seja punido de fato, existe uma urgência que se perceba a questão política. Se você tivesse pisado em São José, você perceberia que a Polícia Militar não escondia o fato de agir como uma gangue a mando do governador Alckmin, funcionando como empregado do Naji Nahas.”
E… “o governo federal não falou nada”
Pedro critica o que entende como omissão do governo federal, que tinha plena consciência dos fatos e não se pronunciou. “Isso assusta, porque há bandidos reincidentes, já que o Naji Nahas é sócio do Daniel Dantas, que a gente conhece muito bem a história… Esses criminosos têm tanto poder político que podem fechar o legislativo. Eles podem fazer o que quiserem”, preocupa-se. E vai além: “Eu sinto medo dentro do governo federal. Por isso eu fui para lá. Porque se essa quadrilha continuar agindo dessa maneira a gente vai entrar numa guerra civil. Foi o que aconteceu lá. E ninguém quer isso. Então, o que eu quero é tentar mobilizar o governo federal. Daí o (polêmico) título do meu vídeo, porque eu estava numa cidade em que a Polícia Militar atirava na Polícia Federal e eu estava tentando fazer uma denúncia. Eu chorei na rua de medo. Se você estivesse em São José, naquela situação de pânico e abandono – consegue imaginar?! – naquela hora, você também queria ‘matar’ a presidenta.” Já “a distância ameniza os sentimentos e a percepção”.
Enquanto isso, a barbárie continua
“Uma amiga minha esteve há dias em São José e a situação em Pinheirinho ainda era de pânico, de massacre, de desesperança. A única coisa que pode manter os responsáveis impunes é inércia do maior poder político do Brasil, que é a sociedade civil. E para manter esta inércia a força com a qual eles contam é a mídia corporativa”, conclui Pedro apontando para o prédio da Rede Globo.
Assista ao vídeo com a entrevista: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=dMk9AxAS3n8
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