"Crise é dramática há 40 anos. Governamos dentro da crise e mantivemos o Estado funcionando"
Marco Weissheimer
A crise financeira do Rio Grande do Sul foi um dos principais temas debatidos na campanha eleitoral para o governo do Estado em 2014. Os dois candidatos que disputaram o segundo turno, o então governador Tarso Genro (PT) e o ex-prefeito de Caxias do Sul, José Ivo Sartori (PMDB), tiveram a oportunidade de abordar o tema em mais de um debate. O endividamento do Estado foi o tema, por exemplo, do primeiro bloco do debate entre os dois candidatos na TV Pampa (ver abaixo), no dia 16 de outubro do ano passado. Tarso Genro questionou Sartori sobre as consequências do acordo de renegociação da dívida firmado pelo governo de Antonio Britto, em 1996. Sartori defendeu o acordo como necessário naquele momento e repetiu um de seus mantras de campanha baseado na metáfora do retrovisor: "não vamos ficar olhando para trás e transferindo a culpa para os outros".
No mesmo debate, o ex-governador defendeu o processo de renegociação dos índices de correção da dívida com a União e a abertura de um novo espaço fiscal para o Rio Grande do Sul na casa dos R$ 15 bilhões. Sartori, por sua vez, colocou em dúvida a concretização desse acordo com a consequente abertura do novo espaço fiscal e se comprometeu a articular uma aliança com os demais governadores do país para discutir a situação da dívida dos Estados com a União. Passados oito meses, o governo José Ivo Sartori ainda não começou a prometida articulação com os governadores e integrantes dos primeiros escalões do governo e de sua base aliada na Assembleia começam a abandonar a metáfora do retrovisor, jogando no governo anterior a responsabilidade pela situação financeira do Estado.
"Durante a campanha eleitoral, se houve uma pessoa de governo ou um quadro político de Estado que não escondeu a situação de extrema dificuldade do Rio Grande do Sul, esta pessoa sou eu", diz o ex-governador Tarso Genro ao comentar o debate sobre a situação financeira do Estado. "Sempre disse que a situação financeira era dramática e muito difícil, mas que nós tínhamos uma visão de médio e longo prazo de como sair da crise e repetíamos, como um mantra: o Estado só sai da crise crescendo; não sai da crise se apequenando. Optamos por contrair financiamentos e trabalhar para reestruturar a dívida pública do Estado, através de uma pressão fortíssima sobre o Governo Federal que eu, como governador, apoiava", assinala Tarso Genro.
O ex-chefe do Executivo gaúcho detalha e defende o caminho adotado no início do seu governo para enfrentar a crise financeira:
"Em primeiro lugar, tratamos de conseguir novos financiamentos. Em segundo, usamos os depósitos judiciais nos limites permitidos pela lei. Em terceiro, usamos o Caixa Único. Em quarto, tratamos de cobrar do Governo Federal valores atrasados que nos são devidos, não só da Lei Kandir, mas também de pagamentos relacionados com dívidas que a União tem com a CEEE. Em quinto, procuramos atrair mais empresas pra cá, democratizando os incentivos fiscais e reorganizando o sistema tributário do Estado. Nós fizemos tudo isso no nosso governo e conseguimos, assim, manter o Rio Grande do Sul funcionando".
"Já tínhamos um novo pedido de financiamento de R$ 2,5 bilhões"
Para Tarso Genro, alguém do governo atual dizer que é responsabilidade do governo anterior uma crise que se arrasta há mais de 40 anos é uma "vilania". "Não vi o governador dizer isso, vi alguns acólitos dele, em momentos de aperto, dizerem que a crise é responsabilidade do governo anterior. A situação financeira do Estado é dramática há 40 anos. É preciso muita capacidade de gestão, talento administrativo e um bom secretário da Fazenda para equacioná-la e, ao mesmo tempo, manter o Estado funcionando", diz ainda o ex-governador. Ele revela ainda o que pretendia fazer, no início de 2015, caso fosse reeleito: "Se ganhássemos a eleição, já tínhamos pronto um novo pedido de financiamento. Deixei um Termo de Referência para o novo governo, pelo qual eu iria encaminhar, ainda em novembro, um novo empréstimo de, no mínimo, R$ 2,5 bilhões".
A possibilidade desse novo financiamento, assinala, surgiu a partir da sanção da lei de reestruturação da dívida pela presidenta da República, Dilma Rousseff. "Como Governador, em novembro, já teria feito nova proposta para continuar financiando o Estado, usando a nova margem fiscal, que nós mesmos conquistamos no governo da Presidenta Dilma". Tarso Genro faz questão de repetir que não há saída, no curto prazo, para a crise financeira do Estado. A saída, defende, passa pela retomada do crescimento e pela negociação política com a União. "Não tem saída para a crise do Estado sem investimentos e sem fazer o Estado crescer. E tampouco há saída para a crise sem uma negociação firme com o Governo Federal", resume.
"Essas são coisas", acrescenta, "que disse e pratiquei durante quatro anos e disse durante a campanha eleitoral. Por isso, recuperamos capacidade de investimento, conseguimos financiamentos e corrigimos os salários". Tarso Genro critica o uso do arrocho salarial e do atraso no pagamento dos salários dos servidores como estratégia eficaz para enfrentar a crise. "O arrocho salarial a que os servidores foram submetidos antes do nosso Governo não ajudou a resolver a crise. Já recebemos o Estado em crise e governamos dentro da crise. O que fizemos, em relação aos servidores, foi repor as perdas e dar aumentos reais para determinadas categorias que estavam com salários irrisórios. Achar que praticar "arrocho" salarial tirará o estado da crise é um erro. Ao contrário, cai a segurança, o funcionamento da saúde e para de funcionar a educação".
"Arrocho contra servidores gera mais instabilidade e mais dívida"
A escolha desse caminho, conclui o ex-governador, gera uma situação de mais instabilidade, mais crises, mais retrocessos e mais despesas, com um aumento do estoque de dívida para com os servidores, que depois vai se transformar em precatórios, como ocorreu com a Lei Britto. "Passamos quatro anos pagando a Lei Britto, que não é herança do nosso governo: 70% dos precatórios e das RPVs, que quase dobraram no nosso Governo, foram da Lei Brito; não são originárias do meu governo. Se agora for violada alguma lei, a dívida se transformará em precatórios, mais tarde", adverte.
Tarso Genro destaca, por fim, três medidas estruturais, tomadas em seu governo, para tirar o Estado da crise: a criação do Fundo previdenciário dos servidores, a reestruturação da dívida pública do estado através de uma Lei Federal, e a reestruturação e democratização dos incentivos fiscais, que chegou às Cooperativas e outras instituições empresariais, e que eram oferecidos somente para meia dúzia de empresas. São essas medidas, defende, que podem ter impacto no médio e longo prazo. "O resto são medidas conjunturais: usar ou não usar os depósitos judiciais, o caixa único e assim por diante. Medidas que podem e devem ser usadas, mas se referem, normalmente, ao curto e médio prazo".
Tags: crise financeira, José Ivo Sartori, Rio Grande do Sul, Tarso Genro
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