É curioso por que os mesmos proselitistas que rechaçam qualquer possibilidade de um operário ser presidente são os mesmos que desconhecem as leis brasileiras
06/08/2009 Adriano Ribeiro Machado
A derrubada do diploma de ensino superior para o exercício do jornalismo pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em junho, fez aflorar no meio acadêmico e, principalmente na grande mídia o velho discurso da necessidade do diploma de nível superior para o exercício de cargos públicos, mas especificamente para presidente da República. É curioso o brilho nos olhos de algumas pessoas na tentativa de desqualificar Luiz Inácio Lula da Silva, um torneiro mecânico, um operário, que não cursou faculdade alguma: como pode ser presidente?
É curioso por que os mesmos proselitistas que rechaçam qualquer possibilidade de um operário ser presidente, pois um trabalhador braçal seria "ignorante" e "incapaz" de gerenciar um país como o Brasil que enchem a boca para dizer que o presidente fala errado e vive cometendo gafes são os mesmos que desconhecem as leis brasileiras e não sabem (como deveriam) que à Constituição Federal, que serve como bíblia política para todos, assegura que o Estado brasileiro deve ser isonômico, ou seja, dar iguais condições de disputas políticas a qualquer cidadão, sendo inaceitáveis preconceitos de ordem social, étnica, sexista e grau de instrução.
Por exemplo, o artigo 14 da Constituição, que trata justamente das premissas jurídicas para a ascensão aos cargos de representação política e versa sobre os direitos políticos de todos, determina alguns quesitos básicos para os postulantes ao cargo de presidente da República. Lula, obviamente, preenche todos estes quesitos, por tanto juridicamente estaria em consonância com a legislação eleitoral. Mas, existe no Brasil um tipo de argumento fácil e totalmente incoerente de que pobre não sabe votar, de que pobre não sabe escolher e de que pobre não sabe e não deve governar.
Se pudessem, as elites organizadas deste país estabeleceriam que o voto do rico vale dois e do pobre vale um, ou ainda voltaríamos ao voto censitário, quando apenas quem tinha um certo poder aquisitivo poderia escolher seus representantes. Isto talvez explique um pouco do endeusamento das elites ao diploma universitário como pré-requisito aos candidatos à Presidência da República. A pergunta que não quer calar é a seguinte: que instituição de ensino no Brasil oferece curso de como ser presidente da República? Que universidade? Aliás, que universidade no mundo oferta esta faculdade?
Imagine, hipoteticamente, que o MEC determine a criação de cursos desta natureza, qual seria o currículo do curso? Como escolher ministros? Como se relacionar com a mídia? Como criminalizar os movimentos sociais? E o corpo docente? Poderíamos chamar ex-presidentes como Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e professor da Sorbonne, que ensinaria como privatizar empresas estatais com dinheiro do BNDES, como provocar crise energética e apagão, como endividar o país até o pescoço e ser refém do capital estrangeiro. Poderíamos chamar o senador e ex-presidente Fernando Collor para ensinar como um político é impeachmado e volta à cena política. A duração do curso seria de quatro anos (como um mandato), com direito a reeleição de mais quatro. A idéia não é ótima?
É irônico e totalmente paradoxal, àqueles que defendem a obrigatoriedade do diploma universitário para o líder do Executivo não conseguem explicar o fato de um presidente operário ter avançado mais na área da educação do qualquer outro governo antecessor. É claro que achamos tímidos os avanços, mas foram importantes para mudar a cara da educação brasileira. Um exemplo disso são as escolas técnicas que foram esquecidas e jogadas às traças por FHC. Quando refederalizou as escolas técnicas totalizavam 140 em todo o país, isto é, em toda a história brasileira foram construídas 140 técnicas até o fim de 2010, o governo federal, entregará mais 214 escolas técnicas dando um salto para 354 no total.
E o que dizer então do ProUni, talvez o mais importante programa deste governo, que já colocou mais de 600 mil estudantes pobres no ensino superior e logo, logo, chegará a um milhão de beneficiados. A relação entre a falta de diploma do presidente e a criação de oportunidades para que outras pessoas tenham este mesmo diploma é direta, ou seja, só quem sofreu e sofre preconceito por não ter uma faculdade sabe o que isto pode significar para os futuros profissionais e até futuros políticos deste país. Os doutores e senhores do saber tiveram seus governos e nada foi tão revolucionário na educação brasileira do que o ProUni, seguramente.
É uma pena que num Estado Democrático de Direito, como deveríamos ter, existam pessoas que se acham superiores as demais pelo simples fato de terem cursado uma faculdade, mesmo sabendo que o acesso ao ensino superior não é uma escolha que qualquer um pode fazer, mas uma oportunidade que poucos possuem e não podem desperdiçar.
Adriano Ribeiro Machado é jornalista e membro da Juventude do Partido dos Trabalhadores
Nenhum comentário:
Postar um comentário