DEBATE ABERTO
Políticos e jornalistas: paradoxos brasileiros
Que os políticos gozam de pouca confiança, não é surpresa para ninguém. Eles estão entre as oito profissões que, segundo o GfK Trust Index 2009 merecem a confiança de menos de 50% da população. Qual seria a parcela de responsabilidade da mídia na construção de imagem de tal forma negativa dos políticos?
Venício Lima
O GfK, um dos maiores grupos de pesquisa de mercado do mundo, que opera em mais de 100 países, divulgou no início de junho os resultados do GfK Trust Index 2009, um survey realizado anualmente na Europa e nos EUA, sobre a confiança dos cidadãos em diferentes profissões e organizações (cf. http://www.gfk.es/pdf/pm_trust%20index_june%202009_efin.pdf).
Diante de uma lista de 20 profissões, pede-se aos entrevistados que informem quais são as profissões nas quais confiam mais e confiam menos. Os bombeiros confirmaram o primeiro lugar na confiança popular em todos os 17 países pesquisados e os políticos aparecem, inversamente em último lugar ou em primeiro lugar como a profissão na qual os cidadãos depositam menos confiança (ver quadro abaixo).
O press release da GfK chama a atenção para a queda de confiança que atingiu os profissionais que trabalham nos bancos, sobretudo na Suécia, na Inglaterra e nos EUA, entre 2008 e 2009. Presume-se que este seja um dos efeitos da responsabilidade ativa do comportamento ilícito de instituições financeiras globais no processo que levou à crise econômico-financeira mundial.
Merece registro a posição no ranking de confiança/desconfiança de algumas profissões do campo das comunicações. Publicitários, profissionais de marketing e jornalistas aparecem respectivamente em 19º, 16º e 15º lugares, na lista das 20 profissões pesquisadas.
No que se refere aos jornalistas, compreende-se que a profissão esteja em baixa na confiança popular depois da perda de credibilidade provocada pelos casos de manipulação da informação que se tornaram públicos relativos à cobertura da invasão/guerra do Iraque e/ou à rotina da cobertura política em jornais, como o conceituado New York Times. Lembre-se também a queda da circulação de jornais, conseqüência, dentre outros, da disseminação do acesso à internet em todo o mundo.
Surpresa no Brasil
No dia 16 de julho pp. o Jornal Hoje da Rede Globo de Televisão divulgou parcialmente os resultados do GfK Trust Index 2009 acrescidos de resultados obtidos em pesquisa realizada no Brasil (cf. http://g1.globo.com/jornalhoje/0,,MUL1232234-16022,00-BOMBEIROS+LIDERAM+RANKING+DE+PROFISSOES+MAIS+CONFIAVEIS.html ). Curiosamente, os resultados referentes à pesquisa brasileira não estão disponíveis no site da GfK, ao contrário daqueles referentes à Europa e aos EUA.
A chamada do Jornal Hoje colocava o foco na desqualificação dos políticos: "Uma pesquisa feita no Brasil, EUA e Europa mostra quais são as profissões mais confiáveis entre 20 categorias. Os políticos são os menos confiáveis em todo o planeta". Além disso, para surpresa daqueles que já conheciam os resultados do GfK Trust Index 2009 na Europa e nos EUA, entre as cinco profissões mais confiáveis no Brasil apareciam também os jornalistas, dez posições acima daquela registrada na média dos outros 17 países pesquisados.
Os dados fornecidos pelo Jornal Hoje foram:
Profissões mais confiáveis
BRASIL
Bombeiros - 95%
Carteiros - 90%
Médicos - 82%
Professores - 81%
Jornalistas - 79%
Profissões menos confiáveis
BRASIL
Político - 16%
Executivo de banco - 38%
Policiais - 48%
Sindicatos - 49%
Funcionalismo público - 53%
Que os políticos gozam de pouca confiança no Brasil e no mundo, não é surpresa para ninguém. Eles estão entre as oito profissões que, segundo o GfK Trust Index 2009 advogados, sindicalistas, jornalistas, profissionais de marketing, de bancos, executivos de grandes empresas e publicitários, nesta ordem merecem a confiança de menos de 50% da população. Mesmo assim, no Brasil, os políticos ainda merecem a confiança de 16% dos entrevistados enquanto na Grécia esse número é de apenas 6%!
É uma triste constatação de vez que não se conhece outra forma de se fazer política democrática a não ser com políticos profissionais. Independente dos inúmeros desvios de conduta envolvendo a atuação de políticos em todo o mundo, há questões que, infelizmente, não são formuladas:
Qual seria a parcela de responsabilidade da própria mídia na construção de imagem de tal forma negativa dos políticos?
Quais as conseqüências dessa imagem para o descrédito do processo democrático?
Já com relação aos jornalistas ocuparem o 5º lugar entre as profissões mais confiáveis no Brasil, colocando-se abaixo apenas dos bombeiros, carteiros, médicos e professores, o mistério permanece:
O que diferenciaria o jornalista brasileiro do jornalista da Europa e dos EUA que o tornaria tão mais confiável?
Para aqueles que acompanham criticamente a grande mídia e o trabalho dos seus jornalistas no Brasil, o resultado da pesquisa GfK divulgado pelo Jornal Hoje certamente mereceria uma boa investigação jornalística.
Venício Lima é Pesquisador Sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília - NEMP - UNB
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