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pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

13.10.13

Festival do Rio Ladrao de Segredos - Carta Maior

12/10/2013 - Copyleft

Festival do Rio: Ladrão de Segredos

Léa Maria Aarão Reis

A ambiguidade, no documentário Roubamos segredos – a história do Wikileaks (2012), do americano Alex Gibney e apresentado no Festival do Rio, começa no próprio título. Nele, a sugestão é a de que Julian Assange e seus companheiros surrupiam documentos confidenciais. Mas quem, afinal, são esses ladrões de segredos nesta prolixa, confusa e tendenciosa versão de Gibney com mais de hora e meia de entrevistas entremeadas com imagens de efeitos digitais à moda do cinema matrix e reflexões filosóficas de bolso? 

 
Em uma das principais entrevistas de We steal secrets (em quase todas elas procura-se desqualificar o criador do Wikileaks, e, de carona, o soldado Bradley Manning) quem declara, sem pudor, e sorridente – “nós roubamos segredos” – é Hayden, ex-diretor da CIA e da notória agência de espionagem americana, a NSA. 

 
A mesma que meses depois da conclusão do filme de Gibney foi denunciada pelo analista Edward Snowden, protagonista do maior escândalo da história da espionagem eletrônica que abalou e continua sacudindo o mundo. Na época, o furacão Snowden ainda não estava em atividade - o que torna datado o filme de Gibney.

Roubamos segredos chega às telas em meio a uma polêmica e precedido do alerta de Assange - que se recusou a participar dele: é um filme sem ética. O diretor, por sua vez, diz que o criador de Wikileaks teria pedido um milhão de dólares para ser entrevistado. Não havendo acordo, além de não assisti-lo declara agora não ter gostado do seu filme. Assange nega que tenha havido a proposta. No site do Wikileaks contesta – o acesso é aberto -, com minuciosas observações anotadas no roteiro da produção, todas as passagens que, segundo ele, foram manipuladas. O velho e gasto recurso de retirar do contexto declarações de entrevistados e pinçá-las, distorcendo-as conforme a direção que se deseja imprimir ao trabalho e atendendo interesses de bastidores. 
 
É falso dizer que Assange não conhece We steal secrets. O tema central é a pessoa do australiano que, embora seja o convidado especial, não aparece. O filme então rodopia para a história de Manning e para a sua homossexualidade, e a ênfase vai para o seu amigo, o americano Adrien Lamo, que dedurou o soldado e é tido por muitos como informante do FBI. O hacker tem direito, no final, a um big close do rosto por onde escorre uma lágrima de arrependimento. Nada de menos bom gosto.
 
São poucos os fatos novos apresentados e relacionados ao Wikileaks além dos já conhecidos e repisados. São muitas as sequências onde Gibney relembra o episódio na Suécia no qual Assange se envolveu, servindo de pretexto para a perseguição judicial seguinte e o risco de extradição para os Estados Unidos. 
 
Uma mulher na contraluz e disfarçada com peruca relata, com minúcias, a sua relação sexual, e a de sua amiga, com o australiano.
 
Num tom de revista Caras continuam as revelações sobre a vida íntima e mais observações desairosas até sobre a aparência de Assange. Um repórter do New York Times, por exemplo, falando à Fox News, (depois do seu jornal, do Die Spiegel e do The Guardian terem se beneficiado com os furos proporcionados pelo Wikileaks) comenta ter encontrado Assange com um aspecto lastimável, “as meias caídas sobre os sapatos e certamente sem tomar banho há vários dias”. O narrador do filme (Gibney?) observa “o blazer barato” usado por ele.
 
O célebre vídeo feito por soldados americanos de bordo de um helicóptero Apache, em Bagdá, documentando o fuzilamento e a matança de um grupo de supostos terroristas, é reproduzido no início. Um dos homens alvejados era um pai levando o filho para a escola. Outro, um cinegrafista da Reuters com uma lente de sua câmera na mão ao contrário de uma arma como acreditaram os soldados antes de dispararem contra ele. A divulgação do vídeo pelo Wikileaks tornou famoso o grupo de Julian Assange que, apresentado por Gibney, gosta de cultivar o fato de ter se tornado um dos ícones da mitologia pop deste século. “No começo, era um hacker de Melbourne”, comenta o narrador, não perdendo a chance de ironizar aqueles que chama de assangistas assim como o refúgio na embaixada de Londres proporcionado pelo presidente Correa, do Equador.
 
Roubamos segredos apenas levanta a ponta de questões éticas cada vez mais importantes de serem revistas para um convívio viável, daqui para frente, entre países e governos. Não chega perto de se aprofundar. 
 
Um material deve ser divulgado mesmo sendo à custa da segurança de cidadãos comuns, nele presentes, com seus nomes revelados ou as suas imagens identificadas?
 
O escândalo originado por essa divulgação correrá o risco de se transformar em mero entretenimento de massa para logo em seguida ser consumido - e esquecido? E haverá mesmo a conveniência da manutenção, do sigilo nas operações da diplomacia clássica, cantada em prosa e verso por diplomatas decanos, em geral aposentados, nas entrevistas que estão sempre prontos a conceder à televisão daqui? Será que o Wikileaks, Assange, Maning, Snowden padecem de ruidoso “exibicionismo informático”, como quer Vargas Llosa? O que muda após a divulgação de informações que foram roubadas e são negadas ao cidadão?
 
Mas isto é um outro filme onde se inscreve a história dos vazamentos rápidos (wikileaks; de wiki, rápido, em dialetohawaiano) e sem o registro do final moralista de Roubamos segredos onde Gibney parece querer lembrar que ... o crime não compensa com as imagens da solitária de Manning e a punição perpétua e Assange confinado a “um quarto“ na embaixada equatoriana.
 
Há, porém, uma dúvida que não quer calar sobre os docs mais recentes de Gibney, diretor de Um táxi para a escuridão (Taxi to the dark side), seu melhor trabalho sobre a tortura do exército americano no Afeganistão e Oscar de melhor documentário em 2007. Ela também existe no seu filme Enron, sobre a crise de 2008; em Mea Maxima Culpa sobre negócios escusos do Vaticano e no doc finalizado este ano e mostrado em Veneza, sobre o ciclista Lance Armstrong revelando usar drogas – Armstrong Lie.
 
É o oportunismo dos seus “produtos” cinematográficos fast food.

http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Cultura/Festival-do-Rio--Ladrao-de-Segredos/39/29177

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Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz