No reino de Gilmar, a aula de democracia do juiz que soltou os jovens presos pela PM. Por Kiko Nogueira
Dois juízes deram uma aula de republicanismo, no bom sentido, nesta semana — fazendo com que você, que andava descrente de tudo, especialmente da Justiça brasileira, acostumado à onipotência de Sérgio Moro, recobrasse um fio de esperança.
O primeiro é Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, do Tribunal de Justiça de São Paulo, que determinou a liberação de 18 dos 26 jovens presos arbitrariamente pela PM antes do protesto contra Temer no domingo.
Na decisão, Camargo traçou um retrato da arbitrariedade do ato policial e referiu-se à ditadura:
O Brasil como Estado Democrático de Direito não pode legitimar a atuação de praticar verdadeira 'prisão para averiguação' sob o pretexto de que estudantes poderiam, eventualmente, praticar atos de violência e vandalismo em manifestação ideológica. Este tempo, felizmente, já passou.
As necessárias elementares do tipo de associação criminosa, estabilidade e finalidade de cometimento de delitos, não podem ser simplesmente presumidas pelo fato de os policiais terem encontrado com os averiguados uma barra de ferro, vinagre, material de primeiros socorros, extintor de incêndio e outros objetos, todos de porte lícito.
A prisão dos indiciados decorreu de um fortuito encontro com policiais militares que realizavam patrulhamento ostensivo preventivo, e não de uma séria e prévia apuração, de modo que qualificar os averiguados como criminosos à míngua de qualquer elemento investigativo seria, minimamente, temerário.
O "temerário" é obviamente suspeito, mas fica a seu critério achar que o termo tão bem empregado é uma alusão ao golpista. Havia outras palavras para usar e aquela, provavelmente, não foi por acaso. Como disse Dalton Trevisan a respeito da traição de Capitu, um personagem só tira o chinelo numa página se estiver resfriado na seguinte.
Já em Belo Horizonte, o juiz Carlos Alberto Simões de Tomaz, da 17ª Vara da Justiça Federal em MG, estava de plantão num fim de semana quando expediu três alvarás de soltura para um caso de comércio ilegal de cigarros.
No despacho, Tomaz diz que "não há causa justa para a manutenção da prisão". Em seguida: "Efetivamente, o custodiado está a ganhar seu pão, enquanto os bandidos deste país, que deveriam estar presos, estão soltos dando golpe na democracia".
Nem tudo está perdido no reino de Gilmar Mendes.
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