quinta-feira, 23 de agosto de 2012
"Por que defendemos Assange"
Por Michael Moore e Oliver Stone, no sítio Outras Palavras:
Passamos nossas carreiras de cineastas sustentando que a mídia norte-americana é frequentemente incapaz de informar os cidadãos sobre as piores ações de nosso governo. Portanto, ficamos profundamente gratos pelas realizações do WikiLeaks, e aplaudimos a decisão do Equador de garantir asilo diplomático a seu fundador, Julian Assange – que agora vive na embaixada equatoriana em Londres.
O Equador agiu de acordo com importantes princípios dos direitos humanos internacionais. E nada poderia demonstrar quão apropriada foi sua ação quanto a ameaça do governo britânico, de violar um princípio sagrado das relações diplomáticas e invadir a embaixada para prender Assange.
Desde sua fundação, o WikiLeaks revelou documentos como o filme “Assassinato Colateral”, que mostra a matança aparentemente indiscriminada de civis de Bagdá por um helicóptero Apache, dos Estados Unidos; além de detalhes minuciosos sobre a face verdadeira das guerras contra o Iraque e Afeganistão; a conspiração entre os Estados Unidos e a ditadura do Yemen, para esconder nossa responsabilidade sobre os bombardeios no país; a pressão do governo Obama para que outras nações não processem, por tortura, oficiais da era-Bush; e muito mais.
Como era de prever, foi feroz a resposta daqueles que preferem que os norte-americanos não saibam dessas coisas. Líderes dos dois partidos chamaram Assange de “terrorista tecnológico”. E a senadora Dianne Feinstein, democrata da Califórnia que lidera o Comite do Senado sobre Inteligência, exigiu que ele fosse processado pela Lei de Espionagem. A maioria dos norte-americanos, britânicos e suecos não sabe que a Suécia não acusou formalmente Assange por nenhum crime. Ao invés disso, emitiu um mandado de prisão para interrogá-lo sobre as acusações de agressão sexual em 2010.
Todas essas acusações devem ser cuidadosamente investigadas antes que Assange vá para um país que o tire do alcance do sistema judiciário sueco. Mas são os governos britânico e sueco que atrapalham a investigação, não Assange.
Autoridades suecas sempre viajaram para outros países para fazer interrogatórios quando necessário, e o fundador do WikiLeaks deixou clara sua disposição de ser interrogado em Londres. Além disso, o governo equatoriano fez uma oferta direta à Suécia, permitindo que Assange seja interrogado dentro de sua embaixada em Londres. Estocolmo recusou as duas propostas.
Assange também comprometeu-se a viajar para a Suécia imediatamente, caso o governo sueco garanta que não irá extraditá-lo para os Estados Unidos. Autoridades suecas não mostraram interesse em explorar essa proposta, e o ministro de Relações Exteriores, Carl Bildt, declarou inequivocamente a um consultor jurídico de Assange e do WikiLeaks que a Suécia não vai oferecer essa garantia. O governo britânico também teria, de acordo com tratados internacionais, o direito de prevenir a reextradição de Assange da Suécia para os Estados Unidos, mas recusou-se igualmente a garantir que usaria esse poder. As tentativas do Equador para facilitar esse acordo entre os dois governos foram rejeitadas.
Em conjunto, as ações dos governos britânico e sueco sugerem que sua agenda real é levar Assange à Suécia. Por conta de tratados e outras considerações, ele provavelmente poderia ser mais facilmente extraditado de lá para os Estados Unidos. Assange tem todas as razões para temer esses desdobramentos. O Departamento de Justiça recentemente confirmou que continua a investigar o WikiLeaks, e os documentos do governo australiano de fevereiro passado, recém-divulgados afirmam que “a investigação dos Estados Unidos sobre a possível conduta criminal de Assange está em curso há mais de um ano”. O próprio WikiLeaks publicou emails da Stratfor, uma corporação privada de inteligência, segundo os quais um júri já ouviu uma acusação sigilosa contra Assange. E a história indica que a Suécia iria ceder a qualquer pressão dos Estados Unidos para entregar Assange. Em 2001, o governo sueco entregou à CIA dois egípcios que pediam asilo. A agência norte-americana entregou-os ao regime de Mubarak, que os torturou.
Se Assange for extraditado para os Estados Unidos, as consequência repercutirão por anos, em todo o mundo. Assange não é cidadão estadunidense, e nenhuma de suas ações aconteceu em solo norte-americano. Se Washington puder processar um jornalista nessas circunstâncias, os governos da Rússia ou da China poderão, pela mesma lógica, exigir que repórteres estrangeiros em qualquer lugar do mundo sejam extraditados por violar suas leis. Criar esse precedente deveria preocupar profundamente a todos, admiradores do WikiLeaks ou não.
Conclamamos os povos britânico e sueco a exigir que seus governos respondam algumas questões básicas. Por que as autoridades suecas recusam-se a interrogar Assange em Londres? E por que nenhum dos dois governos pode prometer que Assange não será extraditado para os Estados Unidos? Os cidadãos britânicos e suecos têm uma rara oportunidade de tomar uma posição pela liberdade de expressão, em nome de todo o mundo.
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2012/08/por-que-defendemos-assange.html?spref=tw
"Por que defendemos Assange"
Ilustração: Iván Lira |
Passamos nossas carreiras de cineastas sustentando que a mídia norte-americana é frequentemente incapaz de informar os cidadãos sobre as piores ações de nosso governo. Portanto, ficamos profundamente gratos pelas realizações do WikiLeaks, e aplaudimos a decisão do Equador de garantir asilo diplomático a seu fundador, Julian Assange – que agora vive na embaixada equatoriana em Londres.
O Equador agiu de acordo com importantes princípios dos direitos humanos internacionais. E nada poderia demonstrar quão apropriada foi sua ação quanto a ameaça do governo britânico, de violar um princípio sagrado das relações diplomáticas e invadir a embaixada para prender Assange.
Desde sua fundação, o WikiLeaks revelou documentos como o filme “Assassinato Colateral”, que mostra a matança aparentemente indiscriminada de civis de Bagdá por um helicóptero Apache, dos Estados Unidos; além de detalhes minuciosos sobre a face verdadeira das guerras contra o Iraque e Afeganistão; a conspiração entre os Estados Unidos e a ditadura do Yemen, para esconder nossa responsabilidade sobre os bombardeios no país; a pressão do governo Obama para que outras nações não processem, por tortura, oficiais da era-Bush; e muito mais.
Como era de prever, foi feroz a resposta daqueles que preferem que os norte-americanos não saibam dessas coisas. Líderes dos dois partidos chamaram Assange de “terrorista tecnológico”. E a senadora Dianne Feinstein, democrata da Califórnia que lidera o Comite do Senado sobre Inteligência, exigiu que ele fosse processado pela Lei de Espionagem. A maioria dos norte-americanos, britânicos e suecos não sabe que a Suécia não acusou formalmente Assange por nenhum crime. Ao invés disso, emitiu um mandado de prisão para interrogá-lo sobre as acusações de agressão sexual em 2010.
Todas essas acusações devem ser cuidadosamente investigadas antes que Assange vá para um país que o tire do alcance do sistema judiciário sueco. Mas são os governos britânico e sueco que atrapalham a investigação, não Assange.
Autoridades suecas sempre viajaram para outros países para fazer interrogatórios quando necessário, e o fundador do WikiLeaks deixou clara sua disposição de ser interrogado em Londres. Além disso, o governo equatoriano fez uma oferta direta à Suécia, permitindo que Assange seja interrogado dentro de sua embaixada em Londres. Estocolmo recusou as duas propostas.
Assange também comprometeu-se a viajar para a Suécia imediatamente, caso o governo sueco garanta que não irá extraditá-lo para os Estados Unidos. Autoridades suecas não mostraram interesse em explorar essa proposta, e o ministro de Relações Exteriores, Carl Bildt, declarou inequivocamente a um consultor jurídico de Assange e do WikiLeaks que a Suécia não vai oferecer essa garantia. O governo britânico também teria, de acordo com tratados internacionais, o direito de prevenir a reextradição de Assange da Suécia para os Estados Unidos, mas recusou-se igualmente a garantir que usaria esse poder. As tentativas do Equador para facilitar esse acordo entre os dois governos foram rejeitadas.
Em conjunto, as ações dos governos britânico e sueco sugerem que sua agenda real é levar Assange à Suécia. Por conta de tratados e outras considerações, ele provavelmente poderia ser mais facilmente extraditado de lá para os Estados Unidos. Assange tem todas as razões para temer esses desdobramentos. O Departamento de Justiça recentemente confirmou que continua a investigar o WikiLeaks, e os documentos do governo australiano de fevereiro passado, recém-divulgados afirmam que “a investigação dos Estados Unidos sobre a possível conduta criminal de Assange está em curso há mais de um ano”. O próprio WikiLeaks publicou emails da Stratfor, uma corporação privada de inteligência, segundo os quais um júri já ouviu uma acusação sigilosa contra Assange. E a história indica que a Suécia iria ceder a qualquer pressão dos Estados Unidos para entregar Assange. Em 2001, o governo sueco entregou à CIA dois egípcios que pediam asilo. A agência norte-americana entregou-os ao regime de Mubarak, que os torturou.
Se Assange for extraditado para os Estados Unidos, as consequência repercutirão por anos, em todo o mundo. Assange não é cidadão estadunidense, e nenhuma de suas ações aconteceu em solo norte-americano. Se Washington puder processar um jornalista nessas circunstâncias, os governos da Rússia ou da China poderão, pela mesma lógica, exigir que repórteres estrangeiros em qualquer lugar do mundo sejam extraditados por violar suas leis. Criar esse precedente deveria preocupar profundamente a todos, admiradores do WikiLeaks ou não.
Conclamamos os povos britânico e sueco a exigir que seus governos respondam algumas questões básicas. Por que as autoridades suecas recusam-se a interrogar Assange em Londres? E por que nenhum dos dois governos pode prometer que Assange não será extraditado para os Estados Unidos? Os cidadãos britânicos e suecos têm uma rara oportunidade de tomar uma posição pela liberdade de expressão, em nome de todo o mundo.
* Tradução de Daniela Frabasile
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