Uma vez ao mês, mais ou menos, ele – o nosso melhor escritor – nos brinda com uma crônica que fala de tudo e de todos, em poucas palavras e linhas. Diz tudo, com a contundência, a erudição e o fervor moral de quem desvenda as leis ocultas do nosso tempo e as torna legíveis aos olhos de todos. Como se estivesse atendendo ao pedido desesperado de Brecht, quando falava da maior das dificuldades para dizer a verdade: não era a de descobri-la, a de separar as essenciais das inócuas, mas a de fazê-la chegar a quem mais precisa delas, as maiores vitimas das mentiras do nosso tempo.
Para isso, escolher uma linguagem compreensível, buscar exemplos do cotidiano, falar do que importa para uma vida melhor, denunciar o inaceitável e levantar esperanças donde só se pode ver miséria, desencanto e morte. Para que a verdade seja reconhecível para quem vive embrulhado por inverdades, principalmente pelas mentiras do silêncio sobre o que é fundamental, invisível aos olhos e corações, como tarefa cotidiana da imprensa mercantil.
Cada tanto tempo ele nos regala com livros. Alguma vez me perguntaram que livro eu recomendaria a alguém que fosse ler um único livro e eu respondi: O mundo de cabeça para baixo. Agora tenho que acrescentar: no século passado. Neste recém nascido, eu diria: Espelhos – Uma história quase universal.
Ele se chama Eduardo Galeano, vive em Montevidéu, mas habita o mundo e os nossos corações. É o mais subversivo dos seres humanos, por isso o Brasil é o único pais dos que eu conheço, que não publica suas crônicas regularmente na chamada grande imprensa. Não querem dar tiro nos seus próprios pés – ou no próprio bolso, permitir comparações com os ventríloquos dos poderosos que eles publicam diariamente. Fazem bem. Censuram por razões compreensíveis, tornam mais saborosos ainda os textos do Galeano.
Espelhos:
Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos nos recordam.
Quando nos vemos, nós os vemos.
Quando nos vamos, eles se vão?
Essa a abertura. Na última capa:
Este livro foi escrito para que não se vão.
Nestas páginas se unem o passado e o presente.
Renascem os mortos, os anônimos têm nome:
os homens que levantaram os palácios e os templos de seus senhores;
as mulheres, ignoradas pelos que ignoram o que temem;
o sul e o oriente do mundo, desprezados pelos que desprezam o que ignoram;
os muitos mundos que contêm e esconde;
os pensadores e os sentidores;
os curiosos, condenados por perguntar,
e os rebeldes e os perdedores e os loucos lindos que foram e são o sal da terra.
Não digo mais nada, não cito mais nada, me entristeci quando terminei a leitura dos quase 600 relatos, aí me alegrei quando recomecei. Só lhes digo: leiam, leiam todos os seus relatos. Mas sobretudo leiam a história de Rosa María, a primeira negra alfabetizada no Brasil, como nasceu, como viveu e como desapareceu. Nos enfeitiçamos com ela e com os espelhos em que reconhecemos o mundo que criamos e recriamos todas as horas, mas em que fingimos não nos reconhecermos.
Espelhos de nós mesmos. Obrigado, Galeano.
Postado por Emir Sader - 02/05/2008 às 12:46
pergunta:
"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"
Emir Sader
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Cancion con todos
Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.
Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.
Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.
Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.
Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz
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