Páginas

pergunta:

"Até quando vamos ter que aguentar a apropriação da ideia de 'liberdade de imprensa', de 'liberdade de expressão', pelos proprietários da grande mídia mercantil – os Frias, os Marinhos, os Mesquitas, os Civitas -, que as definem como sua liberdade de dizer o que acham e de designar quem ocupa os espaços escritos, falados e vistos, para reproduzir o mesmo discurso, o pensamento único dos monopólios privados?"

Emir Sader

29.5.08

Pedágios não! Plebiscito Já!

Clique aqui para enviar mensagem aos deputados estaduais em apoio ao PDL 13/2007

Por iniciativa do deputado Dionilso Marcon (PT) e mais 19 deputados estaduais tramita na Assembléia Legislativa o Projeto de Decreto Legislativo nº 13 /2007 que convoca o plebiscito sobre a prorrogação das concessões rodoviárias pelo Estado do Rio Grande do Sul (pedágios).

A proposta a ser votada na Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia - CCJ nas próximas semanas deve ser aprovada na CCJ para poder prosseguir e ser votada no plenário da Casa. A possibilidade de prorrogação dos pedágios e de seus pólos rodoviários, como propõe o pacote de projetos estruturantes lançado pela governadora Yeda Crusius, significa a implantação de novos pedágios e a prorrogação dos atuais contratos por mais 15 anos. Embora prometa uma revolução nos transportes, o que o programa reserva para os gaúchos é a duplicação do martírio de pagar valores exorbitantes e não receber a contrapartida à altura do desembolso.

Para garantir o investimento de R$ 1,2 bilhão em duplicações e outras obras nos 1,8 mil quilômetros sob a gestão de sete empresas, o governo estadual admite que vai renegociar a prorrogação das concessões de rodovias até 2028. Com o objetivo de seduzir a opinião pública, o Executivo acena com a possibilidade de reduzir as tarifas dos veículos leves. Já para os caminhões as notícias não são boas, pois o Executivo estuda o fim dos subsídios. Isso significa uma tarifa 67% maior. Outra idéia ventilada pelo governo tucano é reduzir a tarifa, mas aumentar o número de praças de pedágios. Sob qualquer ângulo, o Duplica - RS traz prejuízos para usuário. Como a atual proposta do governo Yeda afetará mais de uma geração de pessoas, o parlamentar entende que é fundamental justifica a consulta ao usuário-eleitorado gaúcho sobre o tema.

Segundo Marcon, se aprovado o projeto, a proposta interrompe imediatamente o processo de reprivatização das estradas até que a consulta plebiscitária seja realizada com a seguinte pergunta, a ser respondida sim ou não: “O prazo das concessões rodoviárias (pedágios) deve ser prorrogado?”

A deputada Marisa Formolo (PT), insatisfeita com os rumos da CPI dos Pedágios,afirma que a Comissão acabou sendo comandada por parlamentares que não queriam a sua instalação e a oposição deposita suas esperanças no Ministério Público. É para lá que foi encaminhado o relatório oficial e as declarações de votos apresentadas por deputados do PT, PC do B, PSB e PDT. "Não quiseram abrir a caixa preta, seguraram o cadeado e ainda colocaram uma chapa branca em cima", protestou a deputada Marisa Formolo (PT), lembrando que o relatório final, elaborado pelo deputado Berfran Rosado (PPS) não apontou nenhuma responsabilidade pelas irregularidades verificadas no decorrer de 120 dias de trabalho. "Esperamos, passados sete meses, que o Ministério Público dê continuidade às investigações e apure as responsabilidades", frisou a parlamentar.

­­­­Texto sugerido:

Senhor Deputado:

Solicito o seu empenho e de sua bancada na aprovação do PDL 13/2007 que convoca o plebiscito sobre a prorrogação das concessões rodoviárias pelo Estado do Rio Grande do Sul (pedágios). A iniciativa, se aprovada, consistirá na seguinte pergunta, a ser respondida sim ou não: “O prazo das concessões rodoviárias (pedágios) deve ser prorrogado?"

Clique aqui para enviar mensagem aos deputados estaduais em apoio ao PDL 13/2007

Escolhe, pois a política. Mas qual?

Acompanhamos, aproveitando as “benesses” que a internet, jornal, televisão, nos proporciona, a greve de fome (duas) -jejum ou qualquer outro nome que queiram dar- do bispo de Barra Dom Luiz Cappio referente ao projeto de transposição do Rio São Francisco, bem como o desenrolar de um dos fatos que gerou que é a discussão envolvendo alguns cristãos sobre fé e política. Recentemente a Escola de Fé, Política e Trabalho de nossa Diocese reuniu num livreto vários textos de professores, sociólogos, teólogos e estudiosos que deram a sua visão e o seu entendimento sobre o tema. Citando a Bíblia e pensadores da Idade Média até os dias de hoje foram construindo conceitos, tomando posições. Por entender e acreditar que fé e política caminham juntas como bem lembra o papa Bento XVI na encíclica Deus Caritas est “fé e política são distintas, mas sempre em recíproca relação” (28) com humildade e simplicidade vamos adentrando nesta discussão. Está na cabeça de muita gente que a política tornou-se um instrumento desnecessário e que melhor seria não existir, afinal de contas quando falamos de política ouvimos corrupção, troca de favores (é dando que se recebe – coitado do S. Francisco! Falo agora do santo canonizado, não do rio que também é santo), negociatas, privilégios e, se tem que fazer uma escolha, parece que a opção que se apresenta é simples e se dá entre o que está aí ou algo pior. É inegável que a forma de fazer política que tem sido realizada está esgotada e não cabe mais esta estrutura representativa onde tudo começa e termina com o voto e onde o voto já não tem mais muita importância, afinal de contas o “poder” não precisa dele, apenas o usa para vender uma imagem de democracia. Entendemos que Política não é só aquela que acontece a nível partidário e eleitoral, mas sim toda a ação que fazemos ou não (já disseram que a omissão é a pior ação política). Este princípio rege inclusive a escolha de bispo, na elaboração de um documento da Igreja, na homilia que se realiza nas celebrações. É política a decisão de matar a fome ou não num mundo que produz muito mais que o necessário para que todos tenham comida nas suas mesas, é política a decisão sobre aumento nas contas de água, luz, combustíveis, iptu... e esta decisão é a chamada vontade política, que no dizer do teólogo Jon Sobrino é na realidade vontade humana reafirmando que o ser humano é um ser político. Nesta mesma linha o filósofo italiano Giorgio Agambem afirma que a “separação entre o humano e o político que estamos vivendo na atualidade é a fase extrema da ruptura entre os direitos do homem e os direitos do cidadão” nos parecendo, então que quanto mais negamos a falar e fazer política, mais desumanos ficamos, mais crises provocamos. Dom Pedro Casaldáliga na sua teologia carregada de esperança nos lembra que “política é a organização da vida” e pede que a “política seja um exercício de amor, a celebração diária de uma convivência verdadeiramente humana”. É hora de deixarmos a política representativa para fazermos a “política participativa, aquela cidadã, de serviço e transparência”. Como cristãos acreditamos que a construção do Reino de Deus começa aqui onde estamos vivendo e a nossa ação (política) é fortalecida pela nossa visão de fé, de fidelidade a Cristo que seguiu os princípios da ética, justiça, solidariedade, amor ao próximo. Lembra-nos o Documento de Aparecida que os leigos e leigas conscientes de sua chamada à santidade em virtude de sua vocação batismal são os que têm de atuar à maneira de fermento na massa para construir uma cidade temporal que esteja de acordo com o projeto de Deus (505) e esta cidade temporal é construída com nossas ações e também omissões políticas. Nosso agir deve ser claro e decidido para que “assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras.” (Mt 5,16). Cabe a cada um de nós a escolha sobre o tipo de política que queremos realizar e as conseqüências de nossas decisões. José Antonio Somensi (Zeca)

Em busca de sabedoria ecológica

Por Leonardo Boff Adital - do Rio de Janeiro 27/5/2008 22:50:14 O paradigma civilizatório globalizado assentado sobre a guerra contra Gaia e contra a natureza está levando todo o sistema da vida a um grande impasse. Há sinais inequívocos de que a Terra não agüenta mais esta sistemática exploração de seus recursos e a ofensa continuada da dignidade de seus filhos e filhas, os seres humanos, excluídos e condenados, aos milhões, a morrer de fome. Mas precisamos estar conscientes de que esta guerra não será ganha por nós, mas por Gaia. Como observava Eric Hobsbawm na última página de seu conhecido livro A era dos extremos (1994): "O futuro não pode ser a continuação do passado; nosso mundo corre o risco de explosão e implosão; tem de mudar; a alternativa para uma mudança da sociedade é a escuridão". Como evitar esta escuridão que pode significar a derrocada de nosso tipo de civilização e eventualmente o Armagedon da espécie humana? É imperioso revisitarmos outras civilizações que nos podem inspirar sabedoria ecológica. Há muitas. Escolho a civilização maya, pelo simples fato de que tive a oportunidade no mês de março deste ano de freqüentar durante 20 dias as regiões da América Central habitadas ainda hoje pelos sobreviventes daquele extraordinário ensaio civilizatório e dialogado longamente com seus sábios, sacerdotes e xamãs. Daquela riqueza imensa quero ressaltar apenas dois pontos centrais que são grandes ausências em nosso modo de habitar o mundo: a cosmovisão harmônica com todos os seres e sua fascinante antropologia centrada no coração. A sabedoria maya vem da mais alta ancestralidade e é conservada pelos avós e pelos pais. Como não passaram pela circuncisão da cultura moderna, guardam com fidelidade as antigas tradições e os ensinamentos, consignados também em escritos como no Popol-Vuh e nos Livros de Chilam Balam. A intuição básica de sua cosmovisão se aproxima muito à da moderna cosmologia e física quântica. O universo é construído e mantido por energias cósmicas pelo Criador e Formador de tudo. O que existe na natureza nasceu do encontro de amor entre o Coração do Céu com o Coração da Terra. A mãe Terra é um ser vivo que vibra, sente, intui, trabalha, engendra e alimenta a todos os seus filhos e filhas. A dualidade de base entre formação-desintegração (nós diríamos entre caos e cosmos) confere dinamismo a todo o processo universal. O bem estar humano consiste em estar permanentemente sincronizado com esse processo e cultivar um profundo respeito diante de cada ser. Então ele se sente parte consubstancial da Mãe Terra e desfruta de toda sua beleza e proteção. A própria morte não é inimiga: é um envolver-se mais radicalmente com o Universo. Os seres humanos são vistos como "os filhos e filhas esclarecidos, os averiguadores e buscadores da existência". Para chegar a sua plenitude o ser humano passa por três etapas, verdadeiro processo de individuação. Ele poderá ser "gente de barro": pode falar mas não tem consistência face às águas pois se dissolve. Desenvolve-se mais e pode ser "gente de madeira"; tem entendimento, mas não alma que sente porque é rígido e inflexível. Por fim alcança a fase de "gente de milho": este "conhece o que está perto e o que está longe". Mas sua característica é ter coração. Por isso "sente perfeitamente, percebe o Universo, a Fonte da vida" e pulsa ao ritmo do Coração do Céu e do Coração da Terra. A essência do humano está no coração, naquilo que viemos dizendo há anos, na razão cordial e na inteligência sensível. É dando centralidade a elas que se mostram pelo cuidado e pelo respeito que podemos nos salvar. Leonardo Boff é teólogo e professor emérito de ética da UERJ.

Olá, tudo bem?

Estamos em maio e tinha a intenção de escrever sobre o trabalho e o trabalhador, mas ando com umas atitudes estranhas ultimamente. Vejam vocês que agora estou me detendo na reação das pessoas quando as cumprimento com um bom dia, boa tarde, boa noite, olá e outras expressões de cordialidade. Muitas vezes reconhecemos o espanto de quem não é acostumado a ouvir estas expressões, principalmente de um “estranho”, outras vezes percebemos que as pessoas respondem apenas por educação (?), outras tantas vezes respondem como se fizessem um favor responder, enfim uma verdadeira chateação. Tem pessoas que respondem de maneira agradável (pouquíssimos), retribuindo com carinho e há aqueles que simplesmente nos ignoram. São pessoas que encontramos no ponto do ônibus, nas ruas do nosso bairro, na porta de nossa igreja, no trabalho. Arrisco-me a dizer que com este tipo de observação podemos entender melhor porque vivemos num mundo tão individualista e competitivo. Criamos uma redoma tamanha que um simples gesto de cordialidade já é visto como uma agressão, invasão de privacidade, quebra de uma rotina ou outros interesses com objetivo único de levar a melhor. Se olharmos para história a gente percebe que desde o homem das cavernas até os avanços científicos atuais só foi possível a sobrevivência humana diante das adversidades porque souberam enfrentar as dificuldades através de uma convivência em grupo. Com o passar do tempo, mais precisamente neste último século, cresceu a cultura da concorrência, da disputa, do individualismo consumista. Fomos lentamente “moldados” para agirmos como se fôssemos “pitbuls humanos” (guardadas as proporções) que tomam conta dos noticiários freqüentemente, ou seja, criou-se em nossa sociedade o desejo de agressão, raramente física, mas do querer a qualquer preço, se necessário atropelar o colega de trabalho, que deixou de ser colega e tornou-se concorrente, querer mostrar para o vizinho que “está podendo”, mostrar que estamos consumindo o que existe de mais moderno, melhor, mais caro. Estamos deixando as relações sociais e criando aquilo que os estudiosos chamam de tensões sociais. Como mudar esta situação? O que um cristão pode fazer? Como afirma o filósofo Álvaro Valls “vivemos uma economia centrada no lucro, na ganância, no aumento da riqueza e do poder e para combatê-la é preciso inspiração religiosa que aumente o espaço para o amor e mesmo com os “pecados” e desvios na história do cristianismo têm uma mensagem de convívio fraterno”. Encontramos isso na vida de Jesus Cristo “sereis meus discípulos se amardes uns aos outros” (Jo 13,35) de São Francisco de Assis com sua “infinita humanidade do irmão”, Irmãs Dulce, Teresa de Calcutá e várias pastorais que antes de serem apenas assistencialistas são portadoras de um desejo de um mundo melhor. Se nossa geração é acusada de criar condições para acabar com o planeta Terra não sei quantas vezes pode ser também a geração que iniciará um novo tempo, um tempo de cooperação capaz de frear este individualismo sem perder a individualidade, de mostrar através de nossas ações um Deus humano e que consegue dialogar com as religiões existentes sem o medo de “perder fiéis”. Gandhi dizia que a verdade de uma religião está na fragrância de espiritualidade, amor e paz que emana de seus seguidores. Que saibamos ser esta fragrância capaz de vencer esta lógica do mercado através de nossa hospitalidade, acolhida, solidariedade e respeito às diferenças como bem nos lembra a Carta do 1º Fórum da Igreja Católica do Rio Grande do Sul ao afirmar que devemos transformar a lógica competitiva e excludente do sistema em práticas de solidariedade e inclusão. Podemos tentar fazendo algo sem muita dificuldade. Que tal começarmos com um olá, tudo bem? José Antonio Somensi (Zeca)

20.5.08

E o toco do eucalipto??

SUCESSÃO NO MMA

Carlos Minc: idéias novas e velhos adversários

Na primeira reunião com o presidente Lula após ser convidado para assumir o Ministério do Meio Ambiente, Minc prometeu agilidade no trato das questões ambientais, mas apresentou propostas que desagradaram os setores ligados ao agronegócio.

Maurício Thuswohl

RIO DE JANEIRO – O conteúdo da primeira reunião de Carlos Minc com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, revelou o perfil que deverá ter a gestão do novo ministro do Meio Ambiente. Na conversa de pouco mais de uma hora, realizada segunda-feira (19) no Palácio do Planalto, Minc prometeu imprimir em nível federal a mesma agilidade na concessão de licenças e na resolução de conflitos ambientais que marcou sua gestão como secretário do governo do Rio de Janeiro nos últimos 17 meses. Em contrapartida, o novo ministro apresentou uma série de propostas e exigências que deixaram clara sua opção política por seguir uma linha muito parecida com a trilhada por sua antecessora, o que indica que terá de enfrentar os mesmos (e fortes) adversários de Marina Silva.

Um dos pedidos de Minc ao presidente _ prontamente aceito, segundo o novo ministro _ foi o de não alterar a resolução do Banco Central que proíbe a partir de 1º de julho a concessão pelos bancos oficiais de qualquer crédito agrícola a produtores acusados de desmatamento ou em situação de irregularidade ambiental. Essa medida vem sedo combatida no Congresso Nacional pela bancada ruralista e é criticada pelos governadores e fazendeiros Blairo Maggi (Mato Grosso) e Ivo Cassol (Rondônia), mas, segundo Minc, sua manutenção é fundamental para garantir a continuidade do combate ao desmatamento da Amazônia.

Minc também pediu a Lula que liberasse os cerca de R$ 850 milhões do orçamento destinado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) que estão contingenciados para garantir a obtenção do superávit primário. Frente a essa reivindicação, que era também base de uma das principais queixas da ex-ministra Marina Silva, o presidente prometeu apenas “fazer o possível para liberar as verbas progressivamente”. Ainda assim, segundo Minc, Lula assumiu um compromisso: “Não sei quando e quanto sairá, mas o presidente garantiu que o dinheiro sairá”, disse o novo ministro.

Outra proposta apresentada foi a criação de um sistema nacional de incentivos fiscais aos estados que preservam o meio ambiente. Batizado por Minc como “Imposto de Renda Verde”, esse sistema seria semelhante ao ICMS Verde implantado em sua gestão como secretário estadual do Ambiente no Rio de Janeiro. No estado, a lei prevê que parte da cota de 25% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) destinada aos municípios fique com as prefeituras que adotam políticas ambientais como programas de despoluição de rios e mananciais ou criação de unidades de conservação, entre outras. Segundo Minc, Lula e Dilma “adoraram a idéia”.

Desmatamento zero

Carlos Minc também propôs ao presidente e à chefe da Casa Civil a implementação do projeto Desmatamento Zero, apresentado em outubro do ano passado por nove organizações do movimento socioambientalista. O projeto prevê um plano de metas anuais, incentivos sociais e pagamentos por serviços ambientais que reduza a zero o desmatamento da Amazônia até 2015, e tem custo inicial estimado em R$ 1 bilhão por ano. Os recursos para sua aplicação, segundo a proposta das ONGs encampada pelo novo ministro, viriam de fontes nacionais e internacionais.

Também aprovada pelo presidente, segundo novo ministro, foi a proposta de criação de uma Guarda Nacional Ambiental. Com o objetivo de defender as unidades de conservação brasileiras de atividades criminosas como desmatamento, caça e extração ilegal e biopirataria, essa força seria formada por policiais militares recrutados nos estados e funcionaria nos mesmos moldes da Força Nacional de Segurança (FNS). Antes de conversar com Lula e Dilma, Minc chegou a sugerir a participação das Forças Armadas nessa tarefa, mas foi demovido da idéia: “O presidente aceitou que se crie uma guarda nacional. Isso terá efeito mais imediato, pois não precisaremos mexer na Constituição”.

“Ecologista de Copacabana”

A postura de Carlos Minc antes mesmo de assumir oficialmente o cargo (o que acontecerá somente no dia 27 de maio) contrariou alguns setores ligados ao agronegócio no Congresso e no governo federal. Eterno líder da bancada ruralista, o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) disse que Lula “trocou seis por meia dúzia”. Outro luminar do agronegócio, Abelardo Lupion (DEM-PR) classificou Minc como “ecologista de Copacabana” e traduziu a expectativa de seus pares com o novo ministro: “O que se pode esperar de um sujeito que não conhece o Brasil?”.

Eleito inimigo-mor da Amazônia pelo movimento socioambientalista brasileiro, Blairo Maggi também já faz críticas públicas a Minc. O governador de Mato Grosso é atualmente a principal voz contrária à resolução do Banco Central que pune os proprietários agressores do meio ambiente com o fim da concessão de crédito agrícola: “O Governo de Mato Grosso não tem a mínima condição de licenciar todas as propriedades do bioma amazônico nesse prazo. Se for mantida, essa resolução do Banco Central vai acabar com a atividade econômica de muitas cidades”, disse Maggi, durante um evento realizado em Cuiabá no mesmo momento em que Minc conversava com Lula e Dilma.

Presente ao mesmo evento que Maggi, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, ainda sem saber da exigência de manutenção da medida do BC feita por Minc, seguiu a mesma linha do governador: “Antes mesmo da saída da ministra Marina, o governo já discutia a impossibilidade do cumprimento dessa medida. Alguns municípios de Mato Grosso tem apenas 4% de seu território localizado em bioma amazônico e, ainda assim, não conseguiram atender às exigências do Banco Central”, disse Stephanes.

O poder das barricadas

Título Original: Street-Fighting Years, an Autobiography of the Sixties
Subtítulo: uma autobiografia dos anos 60
Autor(a): Tariq Ali
Tradutor(a): Beatriz Medina
Páginas: 408
Ano de publicação: 2008

A década de 1960 – e, dentro dela, o explosivo ano de 1968 – ainda hoje é referência em termos de mobilização da juventude, utopia, revolução de costumes e liberação da mulher. Há quarenta anos, jovens do mundo todo se manifestavam contra a Guerra do Vietnã e transformavam as relações pessoais estabelecidas pela moral conservadora. Em todos os cantos, lutavam contra o autoritarismo e a repressão com as armas que possuíam, questionando estruturas sociais e de poder por meio da arte, da música e do comportamento. Se esses anos de luta não conseguiram mudar o mundo como pretendiam seus protagonistas, com certeza imprimiram transformações significativas.

O escritor paquistanês Tariq Ali viveu os anos 1960 intensamente, participando de acontecimentos políticos na Europa, na Ásia e nas Américas. Sua trajetória está relacionada aos episódios mais relevantes da década e é relatada em O poder das barricadas: uma autobiografia dos anos 60. O livro traça um panorama fundamental para a compreensão da avalanche de protestos que tomou conta do mundo durante o período.

A edição original da obra é de 1987, jamais publicada no Brasil. A Boitempo se baseou na versão de 2005, revista e ampliada pelo autor. Tariq Ali preferiu desconsiderar críticas ao texto original sob o argumento de que “não se deve ajustar a História às necessidades do presente”. Partindo desse ângulo, o livro retrata o que autor chama de “tempos de esperança”, com sua diversidade e riqueza cultural e política. A versão ampliada conta ainda com uma entrevista com John Lennon e Yoko Ono feita por Tariq Ali, em 1971.

O poder das barricadas: uma autobiografia dos anos 60 nos leva de Paris a Praga, passando por Hanói e Bolívia, com direito a encontros com figuras como Malcolm X, Bertrand Russell, Chu En-lai, Edward Said e Marlon Brando. O livro captura em detalhes o clima e a energia dos anos 1960, algo inesquecível mesmo para quem considera perda de tempo os acontecimentos do período. O sociólogo Emir Sader, responsável pela orelha do livro, sintetiza o impacto do texto: trata-se de “um grande elogio à militância política, que mostra a descoberta da rebeldia. Não se trata apenas de um livro de memórias, mas de uma introdução à política revolucionária, ao que significa ser militante”.

Sobre o autor

Tariq Ali é jornalista, escritor, historiador, cineasta e ativista político. Nascido em 1943 no Paquistão, atualmente vive na Inglaterra, onde colabora com diversos periódicos e é um dos editores da revista New Left Review. É especialista em política internacional e tem se destacado com análises sobre o Oriente Médio e a América Latina.

Que anos foram aqueles?


O fim de um ciclo expansivo

A década de 60, junto com a de 20, do século XX, apareceram como aquelas em que os grandes projetos anti-sistêmicos pareciam possíveis, porque décadas de crise hegemônica, em que as grandes estruturas de poder mundial mostravam fissuras e projetos alternativos exibiam força e pretensões. Na década de 20, a conseqüências da guerra, a derrota alemã – onde se concentrava a esquerda mais forte da época -, a vitória da revolução bolchevique – produziram um cenário de crise hegemônica.

Grandes transformações poderiam ser previstas naquele momento, de tal forma várias sociedades européias tinham sido profundamente afetadas pela guerra, tivessem ou não triunfador na guerra. Mas as derrotas da esquerda, em particular na Alemanha e na Itália, abriram campo para que as grandes transformações fossem fortemente regressivas, instaurando o fascismo e o nazismo. A década se concluía com a abertura de um período contra-revolucionário de massas.

Para chegar à década de 60, o mundo passou pela Segunda Guerra Mundial – que, com o passar do tempo, se assemelha cada vez mais a um segundo tempo da uma única guerra, de 3 décadas -, que terminou de concretizar aos EUA como nova potência mundial emergente, diante da superada Grã-Bretanha e da derrotada Alemanha. E, terminada esta, pelo mais longo ciclo longo expansivo do capitalismo, que na Europa foram chamados de os “30 gloriosos”, pela expansão econômica e pela afirmação de direitos sociais, incluindo o pleno emprego.

A “era de ouro do capitalismo” – segundo Eric Hobsbawn – viu o crescimento simultâneo das potências centrais do capitalismo – de suas locomotivas nesse ciclo, os EUA, a Alemanha e o Japão -, de núcleos do Terceiro Mundo – como os processos de industrialização no México, na Argentina e no Brasil – e do recém constituído “campo socialista”. Esse ciclo se dá com os EUA funcionando como o grande fator de reativação – com o Plano Marshall promovendo a reconstrução da Europa, em particular dos países derrotados, Alemanha e Itália -, assim como do Japão e da Coréia do Sul, sob ocupação militar dos EUA.

A crise do mundo bipolar

A ascensão dos EUA se institucionalizou com os acordos de Yalta, mas que ao mesmo temo formalizaram a constituição do “campo socialista”, sob a liderança da outra super-potência mundial – a União Sovética. O ciclo de maior expansão econômica capitalista foi, ao mesmo tempo, o da bipolaridade e o de maior extensão dos direitos sociais e políticos. Neste aspecto, coincidiram, não por acaso, anti-liberalismo e o momento menos injusto do capitalismo.

A década de 60 não se explica por fatores meramente econômicos, mas sua explosividade tem, também no plano econômico, condimentos importantes. As maiores mobilizações populares costumam dar-se no final de um grande ciclo expansivo, quando os direitos conquistados passam a ser colocados em jogo e as expectativas de continuidade da extensão dos direitos sofre uma freada. O longo ciclo expansivo, responsável, junto à força reivindicativa dos sindicatos, pelo pleno emprego, refletia uma correlação de forças social e ideológica favorável aos trabalhadores.

Esse ciclo revelava sinais de que terminava na entrada da década de 60, com diminuição do ritmo de crescimento das economias, ao mesmo tempo que as mobilizações populares seguiam lutando pela ampliação dos seus direitos.

Do ponto de vista político, a bipolarização entre as duas super-potências revelava dificuldades para seguir mantendo sob sua direção os processos políticos mundiais. A razão fundamental era o surgimento e o fortalecimento do chamado Terceiro Mundo, a partir da multiplicação acelerada da independência das colônias européias na Ásia e na África, ao lado da ascensão das lutas anti-ditatoriais e de anti-imperialistas na América Latina. Ao lado desse aspecto, as divergências sino-soviéticas projetavam a China como potência autônoma, com capacidade própria de liderança internacional.

A crise cubana foi um momento de intensificação dos conflitos entre as super-potências, que se concluiu com desgaste nas relações entre Cuba e a URSS, pela resolução entre esta e os EUA, sem consulta a Havana. Mas esse não foi o único risco à política de “convivência pacífica”, em que a competição e a colaboração econômica ia afirmando a interdependência entre as duas super-potências.

A vitória da revolução cubana, como resultado de um processo de guerra de guerrilhas, favoreceu a multiplicação dessa forma de luta na América Latina – com guerrilhas no Peru, na Guatemala, na Venezuela, somando-se àquelas da Colômbia e da Nicarágua -, mas também na África (como na Argélia,no Congo, em Angola, em Moçambique, na Guinea-Bissau, no Marrocos, entre outros) e na Ásia. Aqui, a resistência vietnamita lutava contra a ocupação militar norte-americana, depois de haver derrotado as forças japonesas e francesas, luta que se estenderia ao Laos e ao Cambodja, além das lutas na Indonésia – vítima de um dos maiores massacres do século XX, para contê-la.

A extensão das lutas guerrilheiras, incentivadas e apoiadas pela China e por Cuba – as duas maiores lideranças emergentes -, questionavam a política de “coexistência pacífica” entre EUA e URSS. O Movimento de Países Não-Alinhados organizava as forças da periferia, onde disputavam liderança a China e Cuba.

A China, acentuando suas divergências com a URSS, a partir da crítica do modelo de desenvolvimento econômico que, segundo ela reprodução os capitalistas, passou a criticar a política de coexistência pacífica e os acordos de desnuclearização, que mantinham esse poder nas potências que já dispunham dele, bloqueando o acesso de novos países à tecnologia nuclear. A intensificação da polêmica e a posta em prática pela China do processo de “revolução cultural”, radicalizaram as posições defendias por Mao-Tse-Tung, até caracterizar a URSS como “imperialista” ou “social-imperialista” – social nas palavras e imperialista de fato.

A caracterização da URSS como imperialista a igualava aos EUA, definindo os conflitos entre eles como divergências interimperialistas. Trata-se assim de romper com essa bipolaridade entre as duas super-potências, caracterizadas ambas como imperialistas. Porém a análise chinesa se radicalizava ainda mais, ao definir que o imperialismo norte-americano seria decadente – chamado de “tigre de papel” -, enquanto o soviético seria mais perigoso, por ascendente.

Colocavam-se assim as premissas para concentrar a luta contra a URSS como inimigo fundamental, assim como abrir espaço para uma aliança tática com os EUA – o que só começaria a concretizar-se no começo da década seguinte, em 1971, com a visita de Nixon à Pequim.

Cuba buscava espaços para as lutas guerrilheiras nos três continentes, coordenadas na Tricontinental e na Organização Latinoamericana de Solidariedade (Olas), ambas constituídas em reuniões em Havana. Tinha diferenças com a URSS – principalmente na atitude em relação aos EUA – e com a China, porém procurava não aprofundar conflitos com esses países. Na América Latina as diferenças eram mais acentuadas, pela presença dos partidos comunistas, que em quase todos ao países tinham conflitos com os movimentos guerrilheiros, na definição das estratégias nacionais.

A resistência vietnamita

O tema político aglutinador da década de 60 foi a solidariedade com a resistência vietnamita à ocupação militar norte-americana. A luta dos vietnamitas recebia a solidariedade da URSS, da China, de Cuba, dos movimentos de libertação e grande parte dos governos dos três continentes periféricos. Para os EUA pareciam representar simplesmente mais uma incursão militar, entre tantas outras, fácil, por atacar um país atrasado, agrícola, produtor de arroz. Tratava-se de ter sucesso onde o Japão e a França – potências coloniais decadentes – tinham fracassado. Tratava-se de “dar uma lição”, que tivesse eco em outros países em que se desenvolviam lutas guerrilheiras.

A força demonstrada pela resistência vietnamita foi levando os EUA a desenvolver uma escalada militar cada vez maior, chegando a ter 700 mil soldados no país, a minar o porto de Hanoi, a utilizar napalm para atacar zonas de ação da guerrilha. As atrocidades se sucediam, eram exibidas pela imprensa internacional, a quantidade de mortos norte-americanos enfraquecia a coesão interna nos EUA, intensificando-se tanto a solidariedade internacional com o Vietnam, como as lutas internas nos EUA pela retirada das tropas, pela negação de se incorporar às FFAA norte-americanas e pela deserção dos soldados já incorporados.

A coesão interna aos EUA era afetada também por outro movimento, além da luta pacifista. A luta pelos direitos civis, que buscava terminar com as discriminações raciais ainda existentes nos EUA. Sua combinação levará à maior crise de legitimidade do sistema política norte-americano, porque ela se dava no marco de outros acontecimentos, como os assassinatos de John Kennedy, do seu irmão Bob Kennedy, dos lideres negros Malcom X e Martin Luther King. Essa ruptura da unidade interna durante uma guerra externa costuma ser fatal para o sucesso bélico e se desenhava, surpreendentemente, uma grave derrota dos EUA.

A centralidade da luta contra o imperialismo dos EUA favorecia a extensa solidariedade. Pouco antes da sua morte na Bolívia, o Che havia lançado sua Mensagem à Tricontinental, em que, depois de criticar como as divergências entre a China e a URSS enfraqueciam o apoio ao Vietnam, que ficava solitário diante dessas divisões em um campo que deveria estar unificado diante do imperialismo norte-americano. O Che destacava a centralidade da luta dos vietnamitas de resistência à invasão norte-americana e como dela dependia o futuro da luta anti-imperialista. Mas concluía, destacando a melhor forma de solidariedade com os vietnamitas: “Criar dois, três, muitos vietnãs” – que se tornou logo um dos grandes lemas das lutas de 68.

Na Europa ocidental, especialmente na França e na Alemanha, formaram-se grande quantidade de Comitês de Solidariedade ao Vietnam. Foram estes comitês os que congregaram os estudantes e deram inicio às mobilizações que desembocariam nas barricadas de 68. Um deles, o da Universidade de Nanterre, foi o detonante das lutas de maio de 68. Bastaria isso para destacar o papel fundamental que os temas internacionais, em particular a solidariedade com os vietnamitas e contra o imperialismo norte-americano, tiveram em todas as lutas da década de 60.

O internacionalismo, a solidariedade

A imagem do Che foi a principal imagem que marcou a década, especialmente depois da sua morte, em outubro de 1967. Suas citações – além da já mencionada sobre o Vietnã –povoaram as lutas e os imaginários políticos e ideológicos: “O dever de todo revolucionário é fazer a revolução”; “É preciso endurecer, sem perder a ternura, jamais.”; “o verdadeiro revolucionário é feito de grandes sentimentos de amor.”

Sua imagem passou a representar a rebeldia, o compromisso ético da militância revolucionária, a solidariedade internacionalista, expressa da forma mais concreta na sua gesta no Congo, primeiro, na Bolívia em seguida. O movimento dos anos 60 tinha um forte componente internacionalista, solidário. Todas as lutas dos povos do mundo eram reivindicadas pelas mobilizações, pelos movimentos, pelas publicações, pelas palavras-de-ordem.

Em um caso concreto, quando Cohn-Bendit foi proibido de reingressar na França, onde vivia, embora fosse alemão de nascimento, os movimentos cunharam a expressão: “Somos todos judeus alemães”, de forma similar ao que havia feito a Comuna de Paris, quando, em pleno conflito bélico da França com a Alemanha, nomeou como Ministro do Trabalho a um operário alemão, para mostrar que os interesses dos trabalhadores de todos os países eram os mesmos e se situam por cima dos conflitos bélicos entre as burguesias dos vários países.

Postado por Emir Sader, 17/05/2008 às 18:34

9.5.08

Raposa Serra do Sol: questão de justiça

Escrito por Frei Betto 09-Mai-2008 Em 15 de abril de 2005, o presidente Lula assinou a homologação em área contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Este ano, a Polícia Federal, em cumprimento da lei, mobilizou-se para retirar da reserva seis arrozeiros. Os invasores da área, convencidos de que "índio atrapalha o progresso", reagiram com violência, inclusive bombas. Criaram o fato político capaz de induzir o STF a suspender a medida legal e reiniciar o atribulado percurso já transitado pelos três poderes da República. Roraima abriga pouco mais de 400 mil habitantes num território de 224.298 km² (pouco menor que o Equador). Raposa Serra do Sol é uma área de 1,67 milhão de hectares, situada no nordeste do estado, nas fronteiras com a Venezuela e a Guiana. A área foi demarcada pelo Ministério da Justiça, através da Portaria 820/98, em 1998, durante o governo FHC. Da área de Roraima, 46,35% são reservadas aos indígenas. Ali eles somam 46.106, distribuídos em 152 aldeias dos povos Yanomami (15 mil), Macuxi, Wapixana, Wai-Wai, Ingaricó, Taurepang, Waimiri-Atroari e Patamona. Políticos e arrozeiros queriam a demarcação em área descontínua, "ilhas" onde pudessem permanecer com suas terras (invadidas) e propriedades (ilegais). Três municípios foram criados dentro da reserva indígena: Normandia, Uiramutã e parte de Pacaraima. Raposa Serra do Sol não é apenas uma selva salpicada de tribos. Ali atuam 251 professores indígenas em 113 escolas de ensino fundamental e três de ensino médio. Os indígenas manejam um rebanho de 27 mil cabeças de gado. Funciona dentro da reserva a Escola Agropecuária de Surumu, que profissionaliza técnicos de nível médio. Conveniados com a Funasa, há 438 Agentes Indígenas de Saúde e 100 indígenas técnicos em microscópio, trabalhando em 187 postos de saúde e 62 laboratórios. Valoriza-se a medicina tradicional indígena. Dentro do território demarcado, seis rizicultores ocupam 6 mil hectares, com lavouras irrigadas, nas margens dos rios Cotingo, Tacutu e Surumu. Todos grileiros em terras da União. Utilizam agrotóxicos, destroem a mata ciliar, soterram lagoas e igarapés, abrem valas para canalizar a água dos rios às suas lavouras. A mesma água, poluída com agrotóxico e inutilizável para o consumo, retorna ao rio, matando os peixes. No verão, impedidas de fazer uso da água dos rios, as comunidades indígenas são obrigadas a cavar poços. Com a destruição das lagoas e da mata ciliar, as caças desaparecem. Os vilarejos dentro da reserva dão apoio ao garimpo ilegal e ali circulam bebidas alcoólicas, muitas vezes oferecidas às jovens indígenas. Os direitos dos povos indígenas estão garantidos pelo artigo 231 da Constituição; este assegura-lhes a posse permanente e o uso exclusivo de suas terras. Uma demarcação fracionada da área favorecerá a invasão de forasteiros, aumentará a incidência de conflitos e porá em risco a sobrevivência de culturas milenares. Na primeira semana de janeiro de 2004, o Jornal Nacional mostrou a mobilização de arrozeiros e latifundiários interrompendo estradas na tentativa de evitar a homologação de Raposa Serra do Sol. Com o apoio de lideranças indígenas cooptadas, seqüestraram três missionários católicos da Missão Surumu: os padres Ronildo Pinto França, brasileiro; Cézar Avellaneda, colombiano; e o irmão espanhol Juan Carlos Martinez, todos membros do Instituto Missão Consolata. O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, advertiu o governador Flamarion Portela, de Roraima, de que o governo federal tomaria providências para liberar os reféns e desmobilizar o protesto. A Polícia Federal agiu e libertou os seqüestrados. Eram seis horas da manhã de 23 de novembro de 2004 quando a comunidade Jauari foi despertada por tiros, gritos, roncos de máquinas. Quarenta homens armados mataram galinhas, porcos, cães e deram dois tiros no macuxi Jocivaldo Constantino, um deles na cabeça. De lá, marcharam para destruir as comunidades indígenas Brilho do Sol, Retiro São José e Homologação. Nas quatro aldeias derrubaram, com tratores, 37 casas e incendiaram os escombros, sem poupar a igreja, a escola e o posto de saúde; isolaram as áreas e fecharam as estradas. Ficaram desabrigadas 131 pessoas. Retroagir a homologação de Raposa Serra do Sol para área não-contínua representa grave precedente jurídico em relação aos demais processos demarcatórios e poderá estimular grileiros e oportunistas a realizarem invasões nos mesmos moldes das que ocorrem em Roraima. Quanto à Segurança Nacional, lembro que os povos indígenas têm, historicamente, desempenhado papel fundamental na preservação e defesa de nossos atuais limites territoriais. Não são os índios que promovem degradação ambiental, contrabando, garimpagem de minérios preciosos e derrubada de madeiras nobres. A hipótese de se criar uma faixa de 10 a 20 km de largura ao longo de nossas fronteiras abre o risco de atrair intenso movimento migratório de não-índios para a região, causando degradação ambiental e social, desmatamento e contaminação dos rios. Cabe ao STF fazer cumprir a Constituição, ou seja, confirmar a homologação em área contínua, e, ao governo, deslocar a sede do município de Uiramutã para as margens da rodovia BR-401 (que liga à Guiana); promover a regularização fundiária de Roraima e reassentar os posseiros em áreas definidas pelo Incra, com pagamento das justas indenizações; preservar as atuais rodovias, como bens públicos, para uso de cidadãos indígenas ou não. Retalhar Raposa Serra do Sol é retalhar a Constituição Brasileira, reforçar a discriminação aos indígenas e premiar o faroeste dos que apóiam os interesses de apenas seis arrozeiros. Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de "A Mosca Azul – reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros.

MST apóia retirada de fazendeiros de Raposa Serra do Sol

09-Mai-2008 O MST (Movimento Sem Terra) assinou nota de apoio à retirada dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, nesta quinta-feira (08/05). Os fazendeiros contestam a homologação da demarcação da área pelo governo Lula, em 2005, e pretendem impedir a reserva contínua da área. A área foi identificada como território indígena pela Funai (Fundação Nacional do Índio) em 1993, com a mesma extensão atual e depois foi demarcada administrativa e fisicamente durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1998). "A quase totalidade de não-índios que chegaram a ocupá-la de boa fé foi indenizada ou reassentada e a resistência à desintrusão da área se reduz a um pequeno grupo de arrozeiros, que se instalou ao sul da Terra Indígena no início dos anos 1990 e ampliou sua área de produção, mesmo sabendo tratar-se de terras de propriedade da União", diz a nota. O ministro-relator das 33 ações que tratam do assunto no STF (Supremo Tribunal Federal), Carlos Ayres Britto, deve concluir seu voto até o fim de semana. Segundo ele, o esforço será para que o tema seja julgado pela Suprema Corte ainda neste mês. Abaixo, leia a nota assinada por mais de 30 entidades. NOTA À RETIRADA DOS INVASORES DA TERRA INDÍGENA RAPOSA SERRA DO SOL E À PRESENÇA DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO EM RORAIMA Em vista do debate que vem ocorrendo no STF e pela mídia acerca da demarcação e da desintrusão da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima, os abaixo-assinados têm a declarar o seguinte: 1. Desde a colônia, reconhecem-se os direitos dos índios sobre suas terras, direitos que figuram também em todas as constituições brasileiras desde 1934. Desde a colônia também, os interesses econômicos e a cobiça de territórios encontraram subterfúgios para elidir a aplicação dessas leis. É por causa dessa cobiça que as populações indígenas mais numerosas se encontram para além da antiga fronteira econômica, tendo sido dizimadas nas regiões de antiga colonização. A Constituição de 1988 explicitou os direitos dos índios sobre suas terras e afirmou o caráter originário desses direitos. É inconcebível que neste novo milênio, se recorra outra vez a casuísmos para expulsar os índios das áreas que passaram a ser cobiçadas, repetindo assim práticas que deveriam nos envergonhar. 2. A ocupação tradicional indígena sobre a extensão integral da Terra Indígena Raposa Serra do Sol é comprovada por copiosa documentação histórica e foi determinante para a definição da fronteira brasileira com a Guiana. Mais de 18 mil índios Macuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona vivem nessa área, organizados em mais de uma centena de comunidades, que praticam suas línguas e costumes. 3. O processo de demarcação dessa terra se desenvolve desde o fim dos anos 1970. Foi identificada pela Funai em 1993, com a extensão atual, depois foi demarcada administrativa e fisicamente durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1998) e finalmente homologada pelo governo Lula em 2005, tendo sido rejeitadas todas as contestações apresentadas. 4. A quase totalidade de não-índios que chegaram a ocupá-la de boa fé foi indenizada ou reassentada e a resistência à desintrusão da área se reduz a um pequeno grupo de arrozeiros, que se instalou ao sul da Terra Indígena no início dos anos 1990 e ampliou sua área de produção, mesmo sabendo tratar-se de terras de propriedade da União. 5. Não existe nenhuma cidade instalada na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, mas apenas uma vila, com a quase totalidade da população atual sendo indígena. A Vila Surumu foi criada por fazendeiros que já saíram da Terra Indígena e falta apenas a Funai indenizar 11 moradores não-índios. A vila de Uiramutã, sede do município de mesmo nome, criado em 1995, foi excluída da Terra Indígena em 2005. A maior parte dos habitantes da sede deste município são moradores da aldeia indígena Uiramutã. Havia três bases de garimpo chamadas Socó, Mutum e Água Fria, as quais, com a retirada dos garimpeiros em 1994, passaram a ser reocupadas por indígenas. A Funai indenizou e retirou todos os não-índios e hoje essas localidades estão totalmente integradas às aldeias. 6. As terras indígenas são bens de propriedade da União, indisponíveis e inalienáveis, e hoje prestam relevantes serviços ambientais ao País, ao proteger as florestas contra o avanço do desmatamento, que destrói as fontes de água, altera o regime de chuvas e elimina a biodiversidade. 7. A Constituição preconiza a harmonia entre o pleno reconhecimento dos direitos indígenas e a presença do Estado nas Terras Indígenas, inclusive para a promoção da defesa nacional em áreas situadas em faixa de fronteira, que diz respeito à indispensável proteção do território e da própria população indígena. Hoje há bases militares em várias terras indígenas, inclusive em Raposa Serra do Sol, e parte significativa dos soldados é indígena. 8. Raposa Serra do Sol não é a única e nem a maior Terra Indígena situada em faixa de fronteira; a demarcação dessas terras contribuiu para a regularização fundiária, reduziu conflitos e não criou qualquer dificuldade para a atuação do Estado, e das Forças Armadas em particular, mesmo em regiões mais críticas, como a fronteira com a Colômbia. 9. Nunca surgiu em nenhuma Terra Indígena qualquer movimento que atentasse contra a integridade do território nacional, nem qualquer ação insurgente contra o Estado brasileiro. 10. A área de Raposa-Serra do Sol representa 7,7% do território de Roraima, sendo que uma parte com dupla destinação (área de conservação e terra indígena). O status de Terra Indígena reconhecido em 46,13% do território de Roraima tem razões históricas decorrentes da ocupação imemorial e não é discrepante da representação efetiva da população indígena no âmbito da população rural do estado. 11. O processo de demarcação de uma Terra Indígena não cria nada, apenas reconhece e protege uma situação de fato, qual seja, a ocupação tradicional indígena de um território. Todos os povos indígenas que habitam os locais onde hoje se encontram as fronteiras brasileiras já estavam ali muito tempo antes de elas serem politicamente estabelecidas. 12. A existência de terras federais com destinações específicas (Terras Indígenas e Unidades de Conservação federais) em Roraima não impede a sua governabilidade e o exercício de direitos pelos demais segmentos da sociedade local sobre o seu território. Excluídas essas terras federais, Roraima ainda conserva extensão superior à do estado de Pernambuco, onde vive uma população dez vezes maior. Por tudo isto, os signatários esperam que o STF não tarde a se pronunciar sobre o caso, encerrando essa polêmica que prolonga conflitos desnecessários, reafirmando a plenitude dos direitos constitucionais indígenas e a sua harmonia com os interesses nacionais. Assinam, Ação Educativa Articulação de Mulheres Brasileiras Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (ABONG) Associação Nossa Tribo - SP Associação Terra Laranjeiras (ATLA), SP Centro de Cultura Luiz Freire, PE Centro de Trabalho Indigenista (CTI) Comissão Ecologia e Ação (ECOA) Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia CONECTAS Direitos Humanos Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Conservation International Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) Fala Preta - Organização de Mulheres Negras FASE Fórum em Defesa dos Direitos Indígena (FDDI) Forum Nacional de Mulheres Negras Greenpeace Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC) Instituto Ethos Instituto Internacional de Educação do Brasil (IIEB) Instituto Socioambiental (ISA) Instutito Centro de Vida (ICV), MT Justiça Global Oficina Escola de Lutheria da Amazônia Saúde e Alegria Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC) Terra de Direitos MST - MOVIMENTO SEM TERRA

Críticas - de direita e de esquerda - ao governo Lula

O governo tem sido alvo de muitas críticas e elogios, de direita e de esquerda, contraditórios entre si, de forma alternada e, às vezes, simultânea. A virulência com que a direita critica e os massivos meios monopólicos de comunicação com que ela conta, provocam tanto uma defesa exacerbada de quem tem críticas, como a impressão de que essas posições são compartilhadas por muita gente na sociedade.

As pesquisas de opinião têm desvendado, cada vez mais, a esplêndida solidão dos Frias, dos Marinhos, dos Civitas, dos Mesquitas e seus funcionários. Eles seguem definindo, neuroticamente, a pauta que deveria ser a do país. Tomemos os últimos anos e nossa história seria uma cadeia de escândalos do governo, de não menos de 10, primeiro duravam meses, depois semanas, outros esboçam viver e morrer no nascedouro. São decadentes, mas se aferram a seus venenos, como bichos prensados contra a parede, desesperados pela sua impotência. Fazem a contagem regressiva para 2010, nervosamente.

Suas críticas são tipicamente as da direita, as mesmas que compartilham com o bloco tucano-pefelista: menos Estado – o que significa, para eles, não menos financiamentos privados, isenções, mas menos contratações de pessoal, menos gastos com políticas sociais, menos impostos; trocar a integração latino-americana e com o Sul do mundo, por aquela tradicionalmente submissa com o Norte; nenhum tipo de regulamentação estatal, nem no mercado de trabalho, nem na política de comunicações, nem na circulação de capitais; mais privatizações. Sua utopia se realizava no governo FHC, com quem se identificaram plenamente. Gostam de qualquer candidato que derrote Lula ou tire votos de quem seja o candidato mais forte a dar continuidade ao seu governo.

Prefeririam um neoliberal ortodoxo, como foi Alckmin, não gostam de certos tons desenvolvimentistas que Serra ainda poderia ter como herança, mas tem a garantia, pelos seus governos na prefeitura e no governo do estado, que atende a todas as demandas do grande empresariado, que é adepto de seguir as privatizações, de diminuir o tamanho do Estado, de diminuir impostos, de favorecer aos investimentos brancos, de não colocar obstáculos à especulação financeira.

É fundamental situar essas posições, para que críticas de esquerda não se confundam com elas, porque estas são absolutamente contraditórias com aquelas. Cito um caso de confusão entre as duas, que favorece a direita: na discussão sobre a CPMF, na versão final da proposta, se tratava do que a esquerda deveria pregar: um imposto difícil de ser sonegado, pago por quem dispões de mais recursos e todo ele para a saúde pública. Tudo o que a direita não quer: tributação sobre os mais ricos, que não podem contornar e que vai para políticas sociais. O senador do Psol votou contra, cometendo um grave equívoco, somando-se à direita e ajudando a confundir ainda mais o quadro de polarização entre direita e esquerda.

Há outros casos, mas este é mais recente e mais significativo, porque muito caro à direita: menos impostos, menos Estado e tratar de brecar as políticas sociais do governo – considerando que diminuiriam o prestígio do governo Lula e dificultariam a eleição de um sucessor seu. Tomam o governo Lula como inimigo fundamental, não se importam de se somar à direita para atacar o governo, aceitam a polarização entre governo/oposição, tem em comum com esta a vontade de enfraquecer o governo, de qualquer forma, pela consciência de que se o PT não desaparecer, não terão possibilidade alguma.

Em lugar de ser um crítico de esquerda, que apóia o que governo tem de esquerda – como veremos na segunda parte deste artigo, entre outros, a política externa, a política social, a política cultural, etc. -, atacam tudo e rifaram a possibilidade de construir uma alternativa à esquerda do PT, ficando relegados à intranscendência política.

Seria preciso assumir que o governo tem aspectos elogiáveis e outros condenáveis, do ponto de vista da esquerda. Qualquer simplificação leva a erros imensos, seja o de buscar justificativas de esquerda para a política econômica – uma verdadeira quadratura do círculo -, seja a condenar o governo como o inimigo fundamental da esquerda, o que leva a somar-se com a direita.

As ambigüidades do governo são inúmeras e o próprio Lula afirma que nunca os ricos – e aqui é preciso dizer, antes de tudo os bancos – nunca ganharam tanto e nunca os pobres melhoraram tanto de vida. Condenável a primeira, elogiável a segunda. Uma não é condição da outra, ao contrário, quanto mais ganhe o pior capital possível – não cria bens, nem empregos, chantageia com ameaças de forjar crise com fugas, etc -, menos recursos para impulsionar o desenvolvimento, criar riqueza, gerar emprego, aumentar os recursos para políticas sociais, etc.

Essa a primeira grande crítica que o governo merece da esquerda: não rompeu com a hegemonia do capital financeiro – na sua modalidade especulativa – e, ao contrário, lhe deu continuidade e consolidou a independência, de fato, do Banco Central, expressão política e institucional dessa hegemonia. Os juros remuneram ao capital financeiro, da mesma forma que os lucros ao produtivo e os salários à força de trabalho.

Manter as taxas de juros mais altas do mundo, atraindo o pior tipo de capital, não cobrar-lhe impostos para que circulem livremente para dentro e para fora do país, dar autonomia para que sua representação direta no governo defina uma variável fundamental para a economia do país, mas também para os recursos para políticas sociais, é um erro que tem que ser reiteradamente criticado pela esquerda. Mas como toda esquerda politicamente séria, não apenas crítica crítica e dogmática, é preciso apresentar alternativas e elas existem, recentrando a economia nos investimentos produtivos e as políticas sociais na criação de empregos.

Outro aspecto que merece crítica é a aliança com o grande capital exportador, especialmente o do agronegócio, seja pela forma de exploração da terra, seja pelo seu caráter monopólico, seja pela utilização de trangênicos, seja porque se voltam para a exportação e de um produto como a soja, com todas suas implicações negativas. Além de que inequivocamente essa aliança está na base da não promoção – que deveria ser central em um governo de esquerda – da economia familiar e da segurança alimentar, assim como do avanço totalmente insuficiente da reforma agrária.

Um terceiro aspecto central do governo, que deve ser objeto de crítica da esquerda, é a não caracterização dos EUA como cabeça do imperialismo mundial, com todos os danos que causa à humanidade, a começar pela política de “guerras infinitas”. O Brasil não pode se relacionar com os EUA como se fosse apenas um país rico, tem que levar em conta que é a cabeça do bloco imperialista que, de todos os pontos de vista – econômico, financeiro, tecnológico, político, militar, ideológico, mediático – representa o que de pior tem o mundo hoje, responsável pela concentração de renda, pelas políticas de livre comércio, pela miséria, pela degradação ambiental, pelas guerras, pela especulação financeira, pelos monopólios da mídia, pela propaganda de um estilo de vida mercantilista, etc, etc. Não tomar o imperialismo como referência central no mundo de hoje leva a cometer graves erros e a correr sempre riscos de se deixar levar pelas políticas do império.

Poderíamos acrescentar outros aspectos, como a repressão e não o incentivo a rádios comunitárias, o atraso (se bem que agora com uma boa posição no caso de Rondônia) sobre a delimitação das terras indígenas, a não abertura dos arquivos da ditadura.

Esta a primeira parte do artigo, a segunda, com os aspectos positivos do governo, que deveriam ser apoiados e incentivados pela esquerda, vem em seguida. Mas também com os elogios da direita, contraditoriamente distintos do da esquerda.

Postado por Emir Sader às 07/05/2008, 20:04

O intrépido Coronel Mendes

DEBATE ABERTO

No Rio Grande do Sul, subcomandante da Brigada Militar mobiliza um pequeno exército para reprimir MST e mobilizações de movimentos sociais. Defensor da pena de morte e da reação a assaltos por parte dos cidadãos, o coronel Paulo Mendes também é autor da máxima: "bandido tem que ir pro paredão mesmo".

Marco Aurélio Weissheimer

Os fatos relatados a seguir estão virando uma rotina no Rio Grande do Sul, Estado considerado por alguns como um dos mais politizados e civilizados do país:

Por volta das 13h, vários policiais começaram a se retirar da São Paulo 2. Mesmo assim, a identificação dos sem-terra continuou. No retorno, ruralistas que estavam na RS-630 saudaram o coronel Mendes, que desceu do carro para cumprimentá-los.

- Gostaríamos de ter assistido. - afirmou a vice-presidenta do Sindicato Rural de São Gabriel, Roselba Mozzaquatro.

O relato acima é do jornalista Homero Pivotto Jr., do jornal Diário de Santa Maria, em matéria publicada dia 9 de maio sobre a operação de guerra que a Brigada Militar montou, no dia anterior, para revistar um acampamento de sem-terra no município de São Gabriel, Fronteira Oeste do Estado. Ao justificar o aparato de 700 homens, cães, cavalos, computadores, comunicação via satélite e helicóptero, o coronel Paulo Mendes, subcomandante da Brigada, disse que era “para a segurança de todos”. Sobretudo para os ruralistas que o saudaram como a um herói, ao final da ação.

Denúncias de autoritarismo, humilhação e sadismo

Já para os deputados Adão Pretto e Dionilso Marcon, do PT, não há nenhuma razão para saudar a atuação de Mendes e sua tropa. Pelo contrário. Segundo o relato dos parlamentares, que tentaram sem sucesso entrar no acampamento, a ação da Brigada Militar foi marcada pelo autoritarismo, pela humilhação dos sem-terra com requintes de sadismo e pela violação dos direitos humanos. Eis um trecho do relato dos parlamentares, que foram ameaçados fisicamente e agredidos moralmente pelos ruralistas da região, quando chegaram na área para tentar acompanhar a ação da Brigada:

“A governadora determinou a mobilização de um pequeno exército de policiais militares (de 700 a 1200 homens), fortemente armados, para revistar o acampamento do MST que fica na Fazenda São Paulo II, área desapropriada em abril pelo Incra. Como não encontraram o objeto de sua busca, "materiais supostamente furtados da fazenda Southal”, o comando da BM, de forma suja, preconceituosa e de total violação dos direitos humanos, humilhou centenas de pessoas em uma histórica e vergonhosa ação. Inicialmente, os policiais proibiram a entrada de pessoas num raio de 4 km da área e se prepararam para revistar as famílias. O argumento era revistar para encontrar supostos objetos tirados da Fazenda Southall durante a última ocupação realizada em 14 de abril. No entanto, como não acharam nada, logo se viu que o objetivo da ação ali era outro: humilhar e violar”.

Começaram lentamente, rasgaram barraco a barraco de cada agricultor. Após, de forma sórdida, colocaram pás de terra nas panelas com a comida cozida, inutilizando dezenas de quilos de arroz e de feijão. O restante da alimentação foi levado pela BM, tornando esse sim, ato criminoso.

Os agricultores não demonstram nenhum tipo de resistência, no entanto, a BM dividiu os acampados em dois grupos. Os agricultores homens eram obrigados a ficar semi-nus com as mãos na cabeça. O outro, de mulheres e crianças, foram separados e obrigados a ficar na mesma posição. Durante duas horas esse foi o jeito que os agricultores foram obrigados a ficar até que fossem "identificados”. Os acampados ficaram por mais de 8 horas semi-nus, sem água ou alimentação. Também não tiveram acesso a nenhum advogado ou representação de direitos humanos que pudesse testemunhar o prazeroso ato de humilhação patrocinado pelo comando da operação”.

Segundo os sem-terra relataram aos parlamentares, em um determinado momento, o helicóptero da Brigada ficou a poucos metros do solo e, num gesto teatral bem ao gosto do coronel Mendes, do seu interior saiu uma bandeira do Rio Grande do Sul. Dionilso Marcon anunciou que denunciará o governo Yeda aos organismos internacionais de Direitos Humanos e detalhará todos os casos de violação do direito à vida praticada pelo governo gaúcho.

A “filosofia” do coronel Mendes

Considerado uma espécie de “Capitão Nascimento” dos Pampas, o coronel Paulo Mendes é conhecido também por suas declarações polêmicas. Como subcomandante da Brigada Militar, já defendeu a pena de morte e a ida de bandidos para “o paredão”. Além disso, em 2007, defendeu que os cidadãos deveriam começar a reagir aos assaltos, contrariando as recomendações da própria polícia que não aconselham esse tipo de comportamento.

Nos últimos meses, Mendes vem se notabilizando também por comandar atos de repressão contra ações e protestos de movimentos sociais e sindicalistas. Admiradora do trabalho do coronel, a governadora Yeda Crusius (PSDB) não quer nem ouvir falar em substituí-lo. Como o personagem central do filme “Tropa de Elite”, Mendes é visto – e se vê – como um líder que está combatendo o crime com mão-de-ferro. Admirador confesso do personagem, o coronel, durante um debate televisivo sobre o filme, resumiu: “gostei muito; é muito realista e tem muita ação”.

A tropa do coronel Mendes tem, de fato, proporcionado "muita ação" à vida política gaúcha.

Marco Aurélio Weissheimer é jornalista da Agência Carta Maior

Atuais desafios chineses

Escrito por Wladimir Pomar 08-Mai-2008 As principais questões macroeconômicas com as quais a China se defronta consistem em evitar que o ritmo do crescimento econômico torne sua economia superaquecida e que o aumento estrutural dos preços se transforme em inflação. Em outras palavras, trata-se de reduzir realmente o ritmo de crescimento para 8%, manter a inflação no patamar máximo de 4,8% e o desemprego no nível de 4,5%, criando, em 2008, 10 milhões de postos urbanos de trabalho e 8 milhões de postos de trabalho nas zonas rurais. As autoridades chinesas reconhecem que para alcançar tais metas será necessário fortalecer a agricultura como fundamento da nação, mudar o padrão de desenvolvimento, conservar energia, reduzir as emissões de gases, proteger o meio ambiente, assegurar o desenvolvimento social e o bem-estar do povo, aprofundar o desenvolvimento cultural, desenvolver a democracia e o sistema legal socialistas e acelerar a reforma do sistema governamental, sem esmorecer na realização das reformas e na abertura externa. Isto exige, de imediato, uma forte intensificação da regulação sobre o mercado. Será necessário controlar o suprimento de terras e créditos, aumentar as exigências de acesso ao mercado, reajustar as políticas monetária e fiscal e reduzir tanto o ritmo de investimentos em ativos fixos quanto os superávits comerciais externos. Isso tudo num contexto em que o mercado não deve ser desestimulado a continuar desenvolvendo os meios de produção, mas deve ser contido em sua tendência anárquica de produção de lucros independentemente das conseqüências. As medidas de regulação macroeconômica chinesas podem contribuir, de diferentes maneiras, para o desenvolvimento das economias dos países emergentes, como o Brasil. Em primeiro lugar, a redução dos investimentos na economia doméstica obrigará a China a exportar seus excedentes de capitais, como já vem fazendo, embora com certo atraso. Depois, a redução dos superávits comerciais levará a China a importar mais, em especial aqueles bens de consumo que estão escassos em seu mercado doméstico. Desse modo, atrair investimentos chineses e elevar as exportações para a China são dois itens importantes que o Brasil e os demais países emergentes precisam considerar seriamente. Além disso, os projetos chineses, relacionados com o fortalecimento da agricultura, novo padrão de desenvolvimento, economia de energia, redução das emissões, proteção ambiental, bem-estar social e desenvolvimento cultural, abrem inúmeras oportunidades que todos os países, especialmente os países em desenvolvimento, podem aproveitar com vantagens. O que os obriga a conhecer melhor o que a China pretende de fato realizar nos próximos anos. Wladimir Pomar é escritor e analista político.

PL-29: teles estrangeiras saem do armário para usurpar TV paga

Projeto deve ser votado na comissão nesta quarta. Parlamentares querem mais debates Bombardeado, piorado e propondo a abertura total da TV paga para o capital estrangeiro, o parecer do deputado Jorge Bittar ao projeto de lei que trata do setor de audiovisual e TV por assinatura (PL-29) deve ir a voto na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara nesta quarta-feira (7). Será a primeira prova de fogo do projeto, que sob a alegação de promover a ampliação do número de assinantes e o barateamento do serviço, que seriam gerados com a suposta concorrência causada pela entrada das teles estrangeiras, busca, na essência, oficializar o domínio ilegal e monopolista que estes mesmos grupos estrangeiros já exercem na TV por assinatura, seja ela a cabo, satélite ou MMDS. Por mais que o relator do projeto, nobre deputado Jorge Bittar, use de subterfúgios, perfumarias, aparentes necessidades causadas pelos “avanços tecnológicos”, ou propaladas preocupações com a produção nacional de audiovisual – vide as cotas insignificantes propostas para a produção nacional e nacional independente – o PL-29 se resume em beneficiar a espanhola Telefônica, dona da TVA, a Telmex, verdadeira dona da NET, e a Sky, pertencente a Rudolf Murdoch. Notem que são as três empresas que monopolizam, nos dois primeiros casos ilegalmente, todo o mercado de TV por assinatura no país e são as principais responsáveis pelos preços serem altos e pelo reduzido número de assinantes. Porém, mesmo sendo mais do que notório que a Telefónica seja a verdadeira dona da TVA e a Telmex da NET, isso ocorre em virtude de uma transgressão à lei brasileira, que proíbe, com justa razão e em defesa dos interesses nacionais, que grupos estrangeiros controlem empresas de TV a cabo. Mas, diante da complacência e do acobertamento da Anatel, a Telmex tem, na prática, 62,49% das ações ordinárias da Net. Isso está distribuído nos 37,5% que detém diretamente e 24,99% indiretamente, já que possui 49% da GB, que controla 51% do capital da distribuidora. Já a Telefónica, que comprou 86,7% das ações preferenciais da TVA do Grupo Abril, estabeleceu no Acordo de Acionistas que todas as decisões dos detentores das ações com direito a voto (ordinárias) estarão submetidas às decisões prévias dos detentores das ações preferenciais. Junto com a Sky, as três dominam a TV por assinatura, ou seja, monopolizam o setor. O que propõe o PL-29, sob a alegação de “quebrar” esse monopólio? Legalizar o monopólio, a transgressão da lei e permitir que a Telefónica e a Telmex retirem os contratos da gaveta e dispensem os complementos vitamínicos que utilizam para esconder o seu controle sobre a TVA e NET. O presidente da NET, José Antonio Felix, se deu ao luxo de revelar com antecedência que, caso aprovado o PL-29, “há um acordo entre a Globo e a Telmex que prevê que, assim que ocorra a mudança da lei, a Globo venderá 2% das suas ações para a Telmex, deixando esta com o controle acionário da Net”. “Essa opção já está assinada e acordada entre os acionistas”. Porém, como política compensatória, o relator lançou mão de uma suposta defesa da produção nacional e nacional independente, que passariam a ter cotas na grade de programação da TV paga. Corriqueiramente, o parlamentar não se cansa em propalar que se baseia em exemplos de outros países, como a França, para defender a proposta. É vergonhoso, para ser generoso, citar tais exemplos que destinam, em alguns casos, mais de 50% para a produção nacional de seus países para justificar cotas insignificantes que conseguem ser menores aos canais já ofertados atualmente pelas operadoras de TV, como bem lembrou Bráulio Ribeiro, representante do Intervozes, durante audiência na Câmara. Ele afirmou que “além dos canais de veiculação obrigatória, o menor pacote da NET, chamado Advanced Digital, já exibe 11 canais nacionais. Portanto, um a mais que o limite proposto pelo projeto. Ou seja, toda a base digital da NET já está de acordo com o PL e nenhum novo canal nacional, seja ele independente ou não, precisará ser acrescentado”. Pouparemos o leitor das idas e vindas do relator nas três versões apresentadas até agora em seu parecer. A última foi feita no dia 30, que apesar de aparentar mudanças substanciais, elas só ocorreram no complicadíssimo glossário criado para tentar explicar, mas que complica ainda mais o relatório. Mudança mesmo em relação às cotas só ocorreu na segunda versão, que diminuiu as já vergonhosas propostas no primeiro texto. A única novidade sobre o PL-29 ocorreu com o aparente rompimento da aliança entre o deputado Jorge Bittar e o Grupo Abril, que não ficou satisfeito com as muitas concessões recebidas e desceu a lenha no deputado. Como resposta, Bittar emitiu uma carta aberta, reclamando do “antipetismo” da Veja e que a revista “abdicou da imparcialidade” – como se um dia tivesse – para criticar as suas cotas, que segundo ele, “representa apenas 10% do horário nobre ao longo de uma semana”. Não seria demasiado ainda notar que o deputado afirmou em vários trechos que a revista publicou um “panfleto” contra ele com imprecisões e por “mero esquecimento”. Esquecimento de quê? Pouco a pouco os apoiadores do PL-29, como o grupo Abril, Telefónica e Telmex, começam a bater mais para ver se arrancam mais concessões. Se é que isso é possível. Do outro lado, os produtores nacionais começam a intensificar as manifestações no sentido de demonstrar que as cotas proposta não passam de encenação, pois além de insignificantes e para serem cumpridas a perder de vista, elas esbarrariam no verdadeiro gargalo para o setor de audiovisual que é justamente a distribuição. Entretanto, ao contrário do que pretendia Bittar, o PL-29 deverá mesmo passar por um debate maior na Câmara antes de ir ao Senado, pois cresce na Casa o movimento para extinguir o caráter conclusivo do projeto, fato que o levará para ser debatido e votado no plenário e não só na Comissão. ALESSANDRO RODRIGUES

Estados plurinacionales y Constituyente

Boaventura de Sousa Santos
Ecuador, en el momento actual se caracteriza por el hecho de que las fuerzas progresistas asumieron la bandera planteada por el movimiento indígena en la década de los 90 para la elaboración de una nueva Constitución que reconozca la diversidad de una manera profunda a través de la plurinacionalidad. Los avances en los últimos 20 años han permitido pasar de la invisibilidad a la visibilidad, de la resistencia a la propuesta y ahora de la interculturalidad a la plurinacionalidad. Es importante tener en cuenta esto para analizar el actual proceso constituyente.

La Constitución es simplemente un papel que ha sido fuente de frustración durante mucho tiempo. Varios derechos han sido incluidos pero los pueblos continúan siendo excluidos, empobrecidos, invisibilizados y oprimidos. Estamos ante un nuevo tipo de constitucionalismo que implica un proyecto político de país diferente, otra forma de cultura, de convivencia, de territorialidad, de institucionalidad del Estado.

Se trata de un período nuevo, interesante pero muy difícil ya que existen muchos enemigos internos y externos que están muy bien organizados. Lamentablemente las fuerzas progresistas no se organizan tan bien como sus opositores. El actual modelo de Estado es homogenizante porque implica una sola nación, cultura, derecho, ejército y religión. Esta idea de homogeneidad predomina en las cabezas de las élites, de la cultura y hasta en las fuerzas progresistas que son o pueden ser aliadas de este proceso. De allí la importancia de defender otro tipo de unidad en la diversidad que no sea simplemente aceptada sino celebrada. La unidad no tiene por qué ser homogénea y tampoco la diversidad tiene que ser desintegración. Estos son los retos que debe enfrentar la nueva Constitución para que efectivamente el actual proceso político implique una importante ruptura con el colonialismo que no terminó con las independencias. Las diversas iniciativas políticas que están emergiendo en el continente solo pueden ser entendidas reconociendo la existencia de un profundo racismo en la sociedad. Por ejemplo, no podemos entender los conflictos en Bolivia sin antes recordar que para sus élites un indio es solo un indio y no conciben que haya llegado a ser Presidente porque según ellos no es competente. Si revisamos la historia recordaremos que en la Colonia creían que los indios no tenían alma y fue un Papa en 1537 quien tuvo que reconocer que sí la tenían. Han tenido que pasar 500 años, un proceso histórico muy largo para que un indio sea elegido democráticamente.

En Venezuela también existe racismo, basta observar muchas de las críticas lanzadas contra el Presidente Hugo Chávez que lo tildan de macaco y de no pertenecer a las élites blancas de la sociedad dominante. De allí la importancia del reconocimiento de la continuidad del colonialismo y de que en el proceso constitucional, la plurinacionalidad es un acto de post-colonialidad que rompe con la herencia colonial. La independencia fue dada, concebida, conquistada por los descendientes de los colonizadores no por lo pueblos originarios; es decir, no fue realmente descolonizadora. En África sucedió todo lo contrario, las independencias se dieron por los territorios, por los países a los pueblos originarios con excepción de Sudáfrica que conquistó su independencia a mediados de los años 90.

Este nuevo tipo de constitucionalismo es importante pero no es exclusivo de América Latina. En el mundo existen varios países como Canadá, Suiza, Bélgica y España que se reconocen como plurinacionales. No se entiende entonces por qué el drama, el enfrentamiento y las dudas. En una reunión de SENPLADES (Secretaría Nacional de Planificación y Desarrollo) a la cual fui invitado les preocupó que la plurinacionalidad desintegre y destruya el país, como también a un periódico de gran circulación en el Ecuador, y les expliqué por qué no deben tener miedo. Primero, la plurinacionalidad tiene como objetivo descolonizar el país debido a esa profunda herencia colonial. Segundo, exige otra concepción del territorio y del manejo de los recursos naturales. Es allí donde surgen los temores respecto a la propiedad de la tierra, el manejo de los beneficios y las ganancias que producen los recursos naturales.

Este proceso político significa una nueva visión de país, una refundación del Estado ecuatoriano. Bolivia y Ecuador están inventado otro tipo de Estado, uno moderno que amerita nuevas instituciones y nuevos territorios con un marco político diferente que permita pasar del discurso a la práctica y que los cambios se reflejen de una manera visible.

La plurinacionalidad es un acto fundacional o de refundación del Estado y todos los actos fundacionales son transicionales. Pasar de las viejas estructuras a la construcción de nuevos estados es un proceso de transición que no es únicamente político sino cultural y que puede provocar enfrentamientos como está sucediendo en el Ecuador y Bolivia. Son choques sobre la memoria entre aquellos que no pueden olvidar y los que no quieren recordar. Esta confrontación que no es solo política sino también cultural exige construir otro tipo de memoria.

El nuevo modelo de Estado, implica una nueva institucionalidad, otra territorialidad pero también otro modelo de desarrollo. De allí la importancia de las concepciones indígenas que están ganando terreno porque van más allá de las reivindicaciones puramente étnicas. Hoy en día el punto de vista de los pueblos indígenas es importante en el continente y no solamente para ellos sino para todo el país porque el actual modelo de desarrollo está destruyendo los recursos naturales, el medio ambiente, contaminando el agua, particularmente en el Ecuador como es el caso de la Texaco que durante 30 años causó pobreza, destrucción ambiental y contaminó las aguas.

Este es un viejo modelo y posiblemente las palabras “de desarrollo” no sean las más adecuadas. Por qué entonces no utilizar la palabra “revivir” que tiene una connotación mucho más profunda y que da cuenta de una relación diferente con la Pacha Mama. El concepto de Naturaleza es muy pobre comparado con el de Pacha Mama, que es más profundo y rico porque implica armonía y cosmovisión. Los indígenas colombianos suelen decir “El petróleo es la sangre de la tierra, es nuestra sangre, nuestra vitalidad, si nos sacan la sangre nos matan”. Esta concepción que para los pueblos indígenas resulta muy natural empieza a tener otra aceptación. No solamente está en juego una crisis del capitalismo sino la supervivencia de la humanidad si se mantiene el actual modelo de desarrollo.

Este acto refundacional tiene una enorme potencialidad para el establecimiento de relaciones más amplias y el movimiento indígena tiene que estar preparado para la construcción de nuevas alianzas. Se trata también de otro modelo de democracia porque la actual es muy excluyente porque ha marginado a las grandes mayorías de la mesa de las negociaciones y de las decisiones. Por tanto, es necesario democratizar la democracia con nuevas formas de participación más incluyentes que bien pueden ser de origen occidental como la democracia participativa o de origen comunitario como las formas indígenas. La Constitución boliviana, por ejemplo distingue entre democracia representativa; y, democracia participativa y comunitaria.

La democratización de la democracia va acompañada de otro proceso interesante que es el de la ciudadanizacion de la ciudadanía, es decir la ampliación de la ciudadanía a formas de ciudadanía intercultural con diferentes formas de pertenencia. Cuando me preguntan si la plurinacionalidad puede poner en peligro la unidad del país yo respondo rotundamente que no porque esa ha sido mi larga experiencia con los movimientos indígenas de este continente y que básicamente muestran dos cosas. Los pueblos indígenas son originariamente transnacionales como es el caso de los aymaras, quechuas, mapuches que fueron divididos en varios países y ahora son chilenos, argentinos, peruanos, ecuatorianos o bolivianos. Se reconocen simultáneamente con su identidad nacional indígena y también con la ciudadanía de su país. Han guardado además lealtad a sus países en guerras fronterizas participando con mucha valentía en los ejércitos nacionales. Un ejemplo de esta doble pertenencia podemos observar en Canadá, por ejemplo, en donde no es lo mismo ser canadiense para un blanco que para un indígena, sin embargo todos son canadienses de una manera muy distinta.

Existen varias maneras de pertenencia y por tanto formas de convivencia. La unidad en la diversidad es una nueva solidaridad social que puede tener un impacto muy fuerte en los territorios y recursos naturales. Pueden producirse enfrentamientos pero en las rupturas también existen continuidades. Por ello, es importante que estos conflictos sean manejados dentro de un marco pacífico y democrático.

Pasar de la interculturalidad a la plurinacionalidad es un salto muy largo pero también en esto se da una continuidad. La actual Constitución Política del Ecuador establece las circunscripciones indígenas pero lamentablemente no fueron reglamentadas.

Cuando me insisten en el riesgo de que la plurinacionalidad pudiera resquebrajar la unidad nacional me pregunto, ¿Dónde están las pruebas, los resultados de estos fenómenos? Por el contrario, los agronegocios y grandes latifundistas de Santa Cruz de la Sierra en Bolivia que plantean el separatismo, ellos sí constituyen un grave peligro para la unidad del Estado. Por tanto, la desintegración no viene de los pueblos indígenas.

El objetivo de la plurinacionalidad no es solamente la idea del consenso sino del reconocimiento de las diferencias, de otra forma de cooperación nacional con unidad en la diversidad. Es un acto de justicia histórica que no puede ser resuelto como un tema de geometría de la democracia representativa. ¿Cuál es el porcentaje de indígenas en este país 30, 20, 7 mil personas? Cuanto más pequeña es la cantidad demuestra el nivel de exterminio y por tanto, la plurinacionalidad tiene que ser más profunda. Un reto para la institucionalidad es compatibilizar la igualdad con la diferencia. Es difícil pero no imposible.

Los pueblos indígenas son los defensores de la soberanía nacional en el actual periodo del neoliberalismo, en el que los Estados Unidos a través de la diplomacia y la estrategia militar han garantizado por años a sus multinacionales el libre acceso a los recursos naturales. Son para estos sectores que los pueblos indígenas constituyen una amenaza por sus concepciones de territorio, cosmovisiones y la propuesta de la plurinacionalidad. La arrogancia imperial no tiene límites al incluir los territorios indígenas y los recursos naturales como parte de su estrategia de seguridad nacional. Por ello, es importante analizar estos principios en el Ecuador y Bolivia como procesos más amplios que deben enfrentar grandes desafíos.

Varios son los retos que tiene el movimiento indígena como el de articular identidad cultural con interculturalidad igualitaria, formas propias de gobierno con participación política en parlamentos, instituciones y otras formas organizativas que no sean indígenas, sin perder su integridad, autonomía y la característica propia de pueblos indígenas. Otro, superar las divisiones internas, que de hecho existen, y analizar profundamente los errores cometidos en el pasado reciente. Transformar las energías milenarias en conquistas políticas. La gente no puede continuar siendo humillada. Este proceso constitucional puede tener retrocesos pero es irreversible.

La idea de la plurinacionalidad se traduce en una nueva institucionalidad, el concepto que nos propone es el de una asimetría constitucional. Las diferencias exigen instituciones apropiadas y las convergencias instituciones compartidas como la democracia representativa que permite la votación electoral. Por tanto, tiene que haber compatibilización entre éstas y las formas propias de autogobierno indígena.

El pluralismo jurídico es otra área que exige el reconocimiento de la jurisdicción como una institución con derecho propio, autónomo, que existe y coexiste con el derecho nacional. Las incompatibilidades se pueden resolver siempre y cuando los pueblos indígenas se sienten en la misma mesa de negociaciones y toma de decisiones para crear instituciones apropiadas o compatibles, como por ejemplo el Tribunal Constitucional Plurinacional propuesto en Bolivia. Ciertamente que no es fácil articular las viejas formas con la nueva institucionalidad de culturas, territorios, lenguas, cosmovisiones, pero es plenamente posible si asumimos que éste es un proceso transicional y por tanto, un Estado Experimental.

La lucha empieza cuando termina la Constitución no al revés. En este Estado Experimental la gente tiene temores y es necesario reconocer esos miedos para encontrar soluciones. En Bolivia hice una propuesta que lamentablemente no se pudo aplicar, quizás las condiciones en Ecuador sean diferentes. Consiste en la generación de un proceso global de participación popular que permita evaluar al cabo de cinco años los aspectos positivos, negativos o los fracasos de la nueva Constitución. Erróneamente se cree que la Constitución es algo permanente, pero no es así. Este proceso de experimentalismo puede disminuir los enfrentamientos como en el caso de Bolivia en donde cada vez se agudiza el conflicto.

La nueva territorialidad también implica el manejo de los recursos naturales y el miedo de la derecha e incluso de sectores progresistas es que los pueblos indígenas se apropien del agua y de todos los recursos naturales. Esto refleja el nivel de racismo existente.

Los pueblos indígenas reclaman participación en los procesos de decisión no para adueñarse de los recursos naturales sino para develar otro tipo de solidaridad nacional, de reparto de los beneficios, de un manejo distinto que no destruya la tierra o contamine el agua, de una visión para el conjunto de la sociedad y no simplemente para ellos. Una concepción que permita vivir bien y no ponga en riesgo la sobrevivencia de los pueblos. Esta tarea no es fácil porque los medios de comunicación están en contra y el movimiento indígena no ha podido comunicar bien su visión de país y tampoco ha logrado tejer alianzas con fuerzas progresistas e incluso aliados blancos que son actores importantes en este proceso. Los ecologistas son uno de ellos porque están luchando por entender mejor lo que es la Pacha Mama, una concepción absolutamente evidente para los indígenas que conciben los recursos naturales como parte de su cosmovisión, de su cultura a diferencia de la cultura euro-céntrica que separa la naturaleza del resto.

El movimiento feminista es otro potencial aliado que ha colocado la lucha de la mujer indígena contra el sexismo indígena en la sociedad blanca. Por tanto, es una alianza que se puede ampliar.

Finalmente, el Ecuador está en condiciones muy favorables para crear avances importantes en un marco de profundización democrática. Los ojos del mundo y particularmente del continente están puestos en el Ecuador. Es una oportunidad histórica que no puede desperdiciarla. (Editado por Lina Cahuasquí)

- Boaventura de Souza Santos es profesor de la Universidad de Coimbra (Portugal). Intervención magistral realizada en el Encuentro Internacional “Pueblos Indígenas, Estados Plurinacionales y Derecho al Agua”, Quito, 12-14 de marzo del 2008

Crisis alimentaria: ¡no se puede jugar al casino con la alimentación!


COMUNICADO DE PRENSA - Coordinadora Campesina Europea y Coordinadora de Organizaciones de Agricultores y Ganaderos

Si los disturbios por hambre en 40 países llamaron la atención de la opinión pública, la crisis alimentaria no data de hoy.

Después de décadas de desregulación del mercado internacional y europeo, bajo los auspicios muy ideológicos de la OMC y la UE, el balance es severo y dramático. La crisis actual pone de manifiesto que no se puede jugar con la alimentación y que la regulación de los mercados tanto a nivel internacional como a nivel europeo es indispensable para la seguridad alimentaria de las poblaciones.

En un contexto de reducción fuerte de las reservas alimentarias, los agrocombustibles industriales se han desarrollado en el mundo en los 2 últimos años, reforzando la presión en los mercados. La decisión política muy intervencionista de la UE de financiar su desarrollo y de obligar el mercado a incorporarlos, acentuó la perspectiva de competencia con las producciones alimentarias.

Después de sequías repetidas en Australia que influyeron los precios, la especulación financiera internacional, a partir del verano 2007, causó un aumento nuevo y brutal de algunos precios agrícolas. En numerosos países, la privatización de las reservas alimentarias favorece la especulación local.

El planeta, que según la FAO puede alimentar 12 mil millones de habitantes, no carece globalmente de alimentación; efectivamente la cosecha de trigo nunca estuvo tan buena como en 2007 y la de arroz estuvo muy buena. El problema es el acceso de las poblaciones pobres a esta alimentación y la dependencia de numerosos países de las importaciones, favorecida por las instituciones internacionales.

Recordemos que los precios alimentarios aumentaron mucho más que no lo justifica el aumento de algunos precios agrícolas. La agroindustria y la gran distribución tienen una responsabilidad grave.

¿Qué respuestas aportar a la situación actual?

- Necesitamos una política pública de agricultura, para administrar los mercados y las reservas, necesarias para la seguridad alimentaria. La regulación de los mercados es sin duda más una política del futuro que del pasado y la Comisión Europea, enfocada en un chequeo médico sin chequeo, debería ver más lejos.
- Es la agricultura campesina, local y social que garantizará la seguridad alimentaria de las poblaciones. Puede alimentar a la población del mundo entero.
- Esta agricultura campesina, asociada a una voluntad política de relocalizar las producciones y de dar la prioridad al comercio local y regional, puede también contribuir a enfriar el planeta, a proteger la fertilidad de los suelos y la biodiversidad.
- La soberania alimentaria es un desafío inevitable tanto en el Norte como en el Sur.

Bruselas, 7 de mayo 2008

Contactos: René Louail (CPE): +33672848792
Rafael Hernández (COAG): +34616436556

Cancion con todos

Salgo a caminar
Por la cintura cosmica del sur
Piso en la region
Mas vegetal del viento y de la luz
Siento al caminar
Toda la piel de america en mi piel
Y anda en mi sangre un rio
Que libera en mi voz su caudal.

Sol de alto peru
Rostro bolivia estaño y soledad
Un verde brasil
Besa mi chile cobre y mineral
Subo desde el sur
Hacia la entraña america y total
Pura raiz de un grito
Destinado a crecer y a estallar.

Todas las voces todas
Todas las manos todas
Toda la sangre puede
Ser cancion en el viento
Canta conmigo canta
Hermano americano
Libera tu esperanza
Con un grito en la voz