Agora é Dilma
A tudo Dilma enfrentou com serenidade e coragem. Sentiu os golpes sim e a covardia por detrás deles. Mas não perdeu a linha. A contrário do seu adversário, que em matéria de programa nunca teve linha e em matéria de comportamento saiu da linha várias vezes, atacando jornalistas.
Flávio Aguiar
Dias atrás falei muito por que não votar em Serra. Agora é a vez da Dilma, por que votar nela.
Vi Dilma ao vivo e em cores quando de sua visita à Alemanha, na companhia do presidente Lula. Estivemos juntos, cara a cara, no trem que ia para Hamburgo. Dilma enfrentou ali o "fogo inimigo" da mídia brasileira reunida em torno dela.
Ela tem uma coisa que decididamente falta ao Serra.
Quando ela fala, você pode até não concordar com ela, mas percebe que ela está falando a verdade a seu próprio respeito. Você pode acreditar nela.
Quando o Serra fala, e eu também o vi ao vivo (mas dele é difícil dizer "em cores") algumas vezes, só que faz mais tempo, a impressão é outra. Você pode até concordar com o que ele está dizendo (no meu caso isso em geral só acontece com coisas como "vai chover", ou "vai fazer sol"), mas é difícil dizer que é aquilo exatamente que ele pensa. A impressão que ele deixa – e que nessa campanha ficou evidente aos baldes – é que entre ele e o o interlocutor há sempre um cálculo sobre o que é mais conveniente dizer naquele momento.
O principal obstáculo que Dilma enfrentou nessa campanha – e esse ela já venceu – foi o de convencer a galera que ela era uma candidata com luz e voz próprias. E nisso ela deu de dez no Serra. Ela não precisa receber telefonema de última hora dizendo como proceder, já que uma bolinha de papel bateu-lhe na cabeça.
Dilma enfrentou, e vai enfrentar ainda até o 31, uma das maiores barreiras de calúnias e difamações que já houve, algo capaz de fazer a campanha do Lacerda contra o Getúlio em 1954 parecer uma brincadeira. Essa está sendo uma das campanhas mais sujas e repelentes da história brasileira, tamanho é o desespero da direita. O desespero e a sanha. A frase da mulher do Serra sobre o "assassinato de criancinhas" é eloqüente. Atacam a Dilma – embora não tenham coragem para declarar isso abertamente – sobretudo por sua condição de ser mulher. Imaginem, uma mulher disputando a chefia de estado do Brasil, e com chances de vencer! Onde estamos, na Alemanha?! Na Finlândia?! Na Argentina?! No Chile?!
Não, no Brasil isso não pode acontecer!
Então ela só pode, para esse tipo de pensamento, ser uma fantoche – do Lula ou do José Dirceu. Bom, há ainda uma outra hipótese: fazer dela uma bruxa, e daí vem as fotos falsas dela com armas na mão, o suposto "assassinato das criancinhas", a pregação desse bispo de Guarulhos que enxovalha o nome do Cristo na heresia de sua postura blásfema e apóstata, além de covarde.
A tudo Dilma enfrentou com serenidade e coragem. Sentiu os golpes sim e a covardia por detrás deles. Mas não perdeu a linha. A contrário do seu adversário, que em matéria de programa nunca teve linha e em matéria de comportamento saiu da linha várias vezes, atacando jornalistas.
Dilma trouxe um programa para o Brasil. Só não o debateu mais porque o adversário fugiu da raia desse debate, escondido atrás da quantidade enorme de boatos e falsas afirmações que recobrem sua candidatura e sua falta de visibilidade programática. Dá para repetir de novo: você pode ler o programa da Dilma e não concordar com ele ou com partes dele (aliás, na segunda feira saiu esse programa). Mas, e nesse caso sem aquela arrogância que essa frase quase sempre embutia sob a forma de pergunta, você pode ficar tranqüilo, porque você sabe com quem está falando.
Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.
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