29/01/2010
Em um debate radiofônico com um intelectual tucano radicado em São Paulo, eu comparei a atitude do atual governo brasileiro de repúdio ao golpe militar e ao governo de fato que daí decorreu e o apoio ao presidente legalmente eleito e vítima do golpe, com a posição do governo FHC diante do golpe de Fujimori, no Peru, que fechou o Congresso e dissolveu a Justiça. FHC foi absolutamente condescendente com o golpe peruano. Ao que parece, na visão dos tucanos e do seu candidato Serra, o Brasil não fez uma "trapalhada", fez o que eles consideram correto.
Foi, aliás, a atitude do politólogo tucano, que considera que Michelletti era o presidente legítimo de Honduras, diz que não houve golpe (em contradição com a unanimidade da comunidade internacional, que condenou o golpe e considerou Michelletti um presidente de fato, atitude até mesmo da imprensa brasileira). O golpista seria Zelaya (ele não se deu ao trabalho de ler a proposta dele ao Congresso, que não incluía a consulta para a reeleição, ao contrário do que a imprensa propagou).
O Brasil condenou e condena o golpe, apoiou o presidente legitimamente eleito em Honduras, emprestando as dependências da embaixada brasileira para que se abrigasse na tentativa de fazer valer o mando que o povo hondurenho democraticamente lhe havia conferido. Os tucanos, ao que parece, preferem outros métodos, como os do seu diário oficial, a FSP (Força Serra Presidente), que emprestou carros da empresa para acobertar operações de sequestro de opositores, para levá-los à tortura e à morte. A democracia e a ditadura levam a direções absolutamente contraditórias.
Trocando os pés pelas mãos e julgando que o mundo visto dos jardins de São Paulo lhe revela a atitude correta, repetiu as teses do governo de FHC-Serra-Lampreia-Lafer, cujas orientações, não tivessem sido rompidas pelo governo atual, teriam levado ao Brasil e a todo o continente à situação do México, com um Tratado de Livre Comércio com os EUA, epicentro da crise mundial, que nos afetaria profunda e prolongadamente.
Quanto à situação peruana, o politólogo tucano repetiu o que disseram os próceres desse partido no momento do programa do PT, que comparava os dois governos: não querem voltar ao passado. Também em política internacional não lhes convêm fazer comparações.
A política internacional do Brasil teria conduzido o país a um isolamento internacional – essa a ótica jardinesca do mundo. A consagração do ministro Celso Amorim e de Lula pelo mundo afora, lhes provoca profundas dores de cotovelo e tentam fechar os olhos para não se dar conta do fracasso que foi também a política exterior da subserviência aos EUA dos tucanos.
Caso chegasse à presidência do Brasil, estaríamos então de novo seguindo os ditados de Washington. Caso ocorresse de novo uma situação como a de Honduras – a do Paraguai aponta perigosamente para uma situação similar, que também poderia animar a golpistas na Nicarágua -, a política exterior do presidente tucano seria a da aceitação de golpes como os de Fujimori e de Michelletti. Não defenderia as eventuais vítimas dos golpes e apoiaria os governos de fato, considerando-os os legítimos governantes.
A política exterior costuma ser coerente com a política interna. Quem defende posturas golpistas aqui dentro, não teria como disfarçar suas atitudes no campo internacional. Os tucanos se preparam assim para, caso cheguem a governar de novo o Brasil, fazer não apenas mudanças substanciais na política econômica, nas políticas sociais, no papel do Estado na economia, mas também na política externa, tirando o Brasil do arco democrático e jogando-o de novo na vala comum dos governos subservientes às políticas dos EUA.
Postado por Emir Sader às 09:34
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