O Poder e a TV.
Recentemente o papa Bento XVI causou alvoroço ao dizer que não foi a pílula, mas a máquina de lavar roupa que trouxe condições suficientes para acontecer a grande revolução feminina. Sem entrar no mérito, embora achando que a pílula inventou a máquina, me lembrei de outros inventos que tomaram conta de nossos lares e mudaram a nossa vida: lembrei-me dos meios de comunicação, particularmente a TV.
A TV é o aparelho que tem lugar de destaque em nossos lares, não raramente planejamos os espaços considerando primeiro ela e depois outros equipamentos e utensílios. É o aparelho que é comum em praticamente todas as casas. Entramos em vários estabelecimentos comerciais, restaurantes, mercados, consultórios e lá está a TV, onipresente. Dizem que é diversão e informação, mas que diversão e que informação estamos recebendo?
Sabemos que a TV mostra um mundo a partir de interesses dos donos e que enquanto vamos assistindo ela (a TV) quer nos convencer que existem oportunidades iguais para todos, onde todos têm chance de conseguir o que os outros já possuem e é aí que começamos a nos enganar ou que começam a nos enganar. A TV sai do real e cria “novas imagens, atrativas e cheias de fantasias” (DA 38), uma sociedade de abundância de bens materiais, um mundo inexistente, mas que nos parece tão real e acessível tornando-se verdadeiramente o ‘ópio do povo’, com isso deixamos nos dominar a tal ponto que negamos muitas vezes o lado do convívio social e uma fuga da realidade.
Acompanhando alguns programas, especialmente os noticiários, percebemos os claros interesses e a mesma fórmula comum ao manter o tripé violência, diversão e “economês”.
A TV faz da violência uma obra cada vez mais carregada de “espetacularização” e sensacionalismo e mesmo com muito descrédito em vários setores a polícia aparece como o ‘poder’ capaz de resolver de qualquer maneira, quanto mais violenta melhor, quanto mais tiros, agressões e algemas para alguns fora dos padrões estabelecidos como local onde mora, cor da pele, profissão, mais adesões a tal ponto que cabe a pergunta. “Para a sociedade (uma parte) fica parecendo ‘normal’, e respirando com certo alívio, que o único remédio para quem cometeu um delito é uma camuflada pena de morte?” Violência Criminalizada – Banco de Dados do Centro de Estudos, Pesquisa e Direitos Humanos, Diocese de Caxias do Sul, 2008, pg.5. Somos inundados por programa de gosto duvidoso, com uma grande motivação no sentido de acharem que é a população quem decide através de uma participação telefônica ou internet, filmes e novelas apelativas para nos manterem em casa e assim evitar que realizemos encontros para conversarmos e juntos resolver problemas. Assistimos ainda depoimentos de pessoas tidas como entendidas em economia que participaram ou participam de governos e que ditam fórmulas que não foram capazes de implantar quando tinham condições de fazê-las.
E mais uma vez somos obrigados a dizer que isto acontece também nos programas feitos por cristãos católicos e em televisões cristãs católicas, com um agravante, na minha modesta forma de ver: levamos esta fuga do real não só nos programas ditos comuns entre emissoras, mas inclusive para as nossas celebrações onde os ritos, por mais tradicionais que sejam, ficam deslocados de nossa realidade como quisessem que abandonássemos a vida, deixássemos a vida pendurada num cabide na porta de fora de nossas igrejas para que nos baste os cantos, orações, emoções e incenso. O padre João Batista Libânio em seu livro As Lógicas da Cidade – 2ª edição, pg. 133 segue na mesma linha ao afirmar que “a fé cristã pode aparecer identificada com as formas religiosas apresentadas como evasão da realidade ou coloridas”.
“Será a Eucaristia matéria para marketing? Não é instrumentalizá-la da forma mais vil, a fim de ganhar a concorrência com os crentes?” – Editorial Perspectiva Teológica 32 (2000) p.150. Há muito tempo pessoas estudiosas do assunto já alertavam e viam que uma parcela significativa da Igreja caminhava para isso. Será que é inconscientemente que estamos fazendo desta forma, abrindo mão do ‘anúncio’ para disputar pontos na audiência da TV? Não quero acreditar que foi isso que Jesus pediu quando disse para proclamar a partir dos telhados (Mt 10,27).
Os bispos brasileiros nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora 2008-2010 nos orientam e nos estimulam com o “espírito crítico atento à manipulação da opinião pública pela mídia ajudando a selecionar, criticar, reagir e mesmo negar a audiência a programas que firam a consciência cristã e a lei moral” (DGAE 206b) “evitando a mercantilização e a banalização do sagrado” (DGAE 206e) e um mero “espetáculo para entreter o público” (DGAE 39).
É claro que a TV é um instrumento útil e que precisa ser usada para a evangelização, mas do jeito que estão utilizando fica prejudicada, uma vez que insistem em esconder a realidade que vivemos e longe de qualquer compromisso com a comunidade, com as pessoas, não celebrando a vida com suas alegrias e tristezas, deixam de fazer aquilo que D. Pedro Casaldáliga chama de “humanizar a humanidade”.
Como costuma dizer o meu amigo: Você sabe como usar o controle remoto de sua TV?
José Antonio Somensi (Zeca)
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