A linguagem diplomática do Vaticano
18/02/2013
Roberto Malvezzi (Gogó)
O bispo recentemente falecido aqui de Juazeiro da Bahia, D. José Rodrigues, uma vez nos contou uma história intrigante e esclarecedora.
Em uma das primeiras assembleias da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil) que participou, na década de 70, o Núncio Apostólico apareceu e disse aos bispos: o Papa Paulo VI está muito bem de saúde, envia um abraço a todos vocês e lhes deseja um bom trabalho.
Ao saírem para o almoço, D. Hélder Câmara bateu em seu ombro e lhe disse: “Menino, você conhece a linguagem diplomática do Vaticano?”
Meio surpreso, perguntou: “Por quê?”
Então D. Hélder retrucou: “O que o Núncio acabou de dizer é que o Papa está para morrer”.
Uma semana depois Paulo VI faleceu.
Eu não entendo nada de linguagem diplomática, muito menos daquela do Vaticano. Mas uma coisa me parece certa nessa renúncia de Bento XVI, isto é, esse foi o gesto mais extremo que ele poderia fazer para mostrar insatisfação com o andamento das coisas no Vaticano e na Igreja. A responsabilidade dele próprio nessa situação merece uma biblioteca. Mas, com toda certeza, é um gesto também político.
O chamado pensamento (método) binário, utilizando apenas o numeral 0 e o numeral 1, é muito bom para aplicar a modelos do mundo computacional, mas não para explicar situações complexas de uma instituição milenar como a Igreja Católica. Qualquer simplismo aí é incorrer em erro fatal.
A Igreja, premida por pressões internas e externas, ainda mais agora com a total liberdade de expressão proporcionada pela internet e outros meios de comunicação, terá que mudar. E ela vai mudar naquilo que lhe é possível mudar. Na essência do evangelho – amor, justiça, solidariedade, salvação, libertação, opção pelos mais pobres, etc. – ela jamais poderá mexer. O resto é instituição humana, formatada na história, que pode e deveria ter mudado há muito tempo, como é o caso do poder colegiado, valoração da mulher, valoração dos leigos, dispensa de honrarias e outras tantas necessidades evidenciadas pelo momento atual.
Pode parecer ingênuo, mas ninguém preveria um João XXIII quando ele aconteceu. Ninguém previa o fim do socialismo real, de dentro para fora, no momento em que ele se deu. A história tem surpresas – ela não é controlável pelo método 0 e 1 - e eu vejo nessa renúncia do Papa um dessas surpresas da história, como um sopro do Espírito, eivado de muitos significados. Para outros isso é uma ingenuidade, o Espírito não tem vez em meio a tantas diabruras humanas e a única realidade que decide é o jogo pesado de intrigas, disputas e escândalos.
Agora é impossível prever os desdobramentos desse gesto. Será interessante rever os fatos de hoje à luz do andamento da história.
Roberto Malvezzi (Gogó) é assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
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