'Minha opção pelos pobres é pastoral', afirma Fernando Lugo

Alta velocidade não parece ser o estilo de Fernando Lugo. Pausadamente, ele respondeu a todas as perguntas, enquanto a caminhonete que o transportava serpenteava na estrada em direção a Villa Rica, ultrapassando motociclistas sem capacete e motoristas sem cinto de segurança. Lugo diz que há muito a ser feito no Paraguai, mas rechaça o rótulo de esquerdista que lhe foi unanimemente imposto. O ex-bispo trata de dizer que é de centro e que sua “opção preferencial pelos pobres”, lema máximo da Teologia da Libertação, é uma opção pastoral, não política. A única bandeira que levanta sem medo é a da renegociação do Tratado de Itaipu, lembrando também que o Mercosul precisa corrigir suas assimetrias. A reportagem é de Maurício de Moraes para a revista Carta Capital, nas bancas desse final de semana. A reprodução dos comentários de Lugo sobre alguns temas. Programa econômico “Queremos uma reforma agrária integral. Há 300 mil famílias sem-terra no Paraguai. O crescimento econômico precisa estar conectado com o social. Não há economia estável se ela não se reflete na microeconomia cotidiana dos mais pobres, o que também passa pela criação de empregos, cooperativização da produção, uma melhora da gestão e do gasto público. Vamos fazer um plano de emergência nacional, que não consiste em dar esmolas, mas formar a cidadania, para que as pessoas possam se associar e formar pequenas empresas e assim viver dignamente.” Esquerda e direita “Minha opção pelos pobres é pastoral. Não uma opção de classes como preconiza a ideologia da esquerda, que leva à confrontação e à violência. Muitos me interpretam como de esquerda, mas eu creio que sou de centro, que estou no centro do coração do povo, no centro da credibilidade que pode unir diferentes tendências, como é o caso da Aliança Patriótica para a Mudança. Eu pratico uma liderança moderada, que aglutina esses setores.” Partido Colorado “Os colorados já não têm a organicidade de outros tempos. Pela primeira vez, em 60 anos, vivem uma profunda crise interna. Essa debilidade nos ajuda. Mesmo assim, estamos organizando um forte esquema de controle, para que a máquina de fraudes dos colorados não tenha êxito nas eleições.” Hugo Chávez “Chávez é um líder forte. Fez transformações importantes em seu país, nacionalizou os hidrocarbonetos, estatizou empresas e favoreceu grandes massas. Mas há muita coisa que não compartilho com ele. Estou convicto de que temos de ter o nosso próprio processo e não importar modelos. Os que não têm argumentos sempre atacam quem está mais bem posicionado. Dizem que eu teria vínculos com Chávez, com as Farc, com os seqüestros e a ocupação de terras. Isso é parte da guerra suja da campanha eleitoral.” Brasil e Mercosul “Sempre se diz que se deve ter as melhores relações com os vizinhos e o Paraguai deve aprofundar as suas com o Brasil.” Sobre o Mercosul: “Nenhum país hoje pode se sobressair sozinho. A integração é um imperativo, mas há que aprofundar as relações econômicas, políticas, sociais e culturais. O Mercosul tem de crescer, em profundidade e intensidade, superando as assimetrias dos países pequenos. Paraguai e Uruguai estão em desvantagem. Um novo Mercosul é necessário, para intensificar e garantir o desenvolvimento aos países menores.” Vaticano Sobre a desaprovação de sua candidatura pelo papa, Lugo diz que “é coerente com o pensamento da Igreja, porque isso nunca aconteceu antes (um bispo renunciar para entrar na política). Aconteceu com padres, mas o bispo tem a plenitude do sacerdócio. Por isso, entendo o porquê de não aceitarem a minha renúncia, e assim o fizeram usando argumentos lógicos da teologia dogmática. Por mais que me doa, eu entendo. Ainda sou parte da Igreja Católica”.